Eagle ou É gol?
texto: Sergio Pugliese e André Mendonça | fotos: Marcelo Tabach
vídeo: Simone Marinho | edição: Daniel Planel
A grama verdinha, bem aparada, tênis de travas, bandeirinha tremulando ao fundo, e Tita, o cracaço Tita, alternando o olhar entre a bola e o alvo. Concentrado, dá alguns passos para trás, respira fundo e dispara com a mesma precisão dos áureos tempos. Com os olhos, acompanha o trajeto da bola e, e, e, e… bingo!!!!!!!!! Braços erguidos, corre em direção da torcida, no caso, a equipe do Museu da Pelada, e, alucinado, grita: “É gol!!!, É gol!!!!!!!”. Estão achando que ele batia uma peladinha, né? Erraram feio. Era golfe e o grito não era de gol, como imaginávamos, mas “Eagle!!!! Eagle!!!!”, uma jogada de mestre, que consiste em, explicando toscamente, acertar um buraco, de uma determinada distância, em três tentativas das cinco estipuladas. Na comemoração, só faltou cobrir o rosto com a camisa, como fez, pioneiramente, na final do Carioca, de 87, no gol do título contra o Flamengo, no Maracanã lotado.
– Não conseguia fazer um Eagle há 15 anos, vocês me deram sorte!!! – berrava.
A minha sensação era exatamente a sentida nos segundos que antecedem a uma cobrança de falta, uma de suas especialidades no futebol. Mãos cerradas e uma reza silenciosa. Tudo porque a videomaker Simone Marinho posicionara a câmera próximo à bandeirinha. Vai que… seria demais se ele encaçapasse (sou um homem da sinuca!) aquela bolinha e registrássemos!!!! Capricha, Tita!!!! Concentração e tac!!!! Acompanhamos a redondinha deslizando na grama e sendo engolida pelo alvo!!!! Me senti no estádio quando o mesmo Tita deu o título do Carioca, de 87, ao Vasco em cima do Mengão, seu ex-clube. É surreal porque na final de 79 Tita me fez perder uma aposta e tive que voltar andando do Maracanã até Santa Teresa, onde morava. Ele fez, de cabeça, o gol da vitória de 3 x 2 do Flamengo no Vasco.
– Poucos atletas tiveram o privilégio de decidir finais, com gols, jogando por arquirrivais – comentou, orgulhoso.
Como exemplo citou Edmundo e Bebeto, que, segundo ele, fizeram mais sucesso no Vasco do que no Fla, e Petkovic, que só fez gol do título pelo Mengão. O segredo de Tita? O craque era caxias, determinado, se entregava em campo e nos treinos. Essa disciplina o levou ao quinto do ranking carioca de golfe amador. Ele passa até oito horas treinando. Nos encontramos no Itanhangá Golf Club e, de carona no típico carrinho, ele nos contou sobre o Flamengo rolo-compressor dos anos 80, sobre a dificuldade de adaptação no alemão Bayer Leverkusen, onde, papão de títulos, conquistou a Copa UEFA de 88, sobre sua melhor fase física e técnica da carreira, no Grêmio, campeão da Libertadores, de 83, sobre a brilhante passagem pelo León, do México, clube pelo qual fez tantos gols de falta que até hoje seu nome é gritado pela torcida quando algum jogador prepara-se para a cobrança, na entrada da grande área. É ou não é para tirar muita onda?
– Me dediquei tanto aos times, que muita gente, por exemplo, tem dúvida se sou Flamengo ou Vasco.
– E você, é o quê? – quis saber.
Tita gargalhou e deixou claro que o coração é uma mistura de paixões vascaínas, rubro-negras, gremistas, “leonistas” e “bayerleverkunistas”. Preferi não insistir porque acho bacana esse mistério, mas se tivesse que chutar arriscaria Vasco da Gama pela forma carinhosa com que falou sobre sua passagem por São Januário. Também teve seleção brasileira, claro! Aos 32 anos foi convocado para a Copa de 90, na Itália, mas, na reserva, não disputou nenhuma partida. Também falou sobre a mística camisa 10, sua preferida. Quando Zico foi para a Udinese, na Itália, ele assumiu o posto. Na seleção, também chegou a vesti-la. Mas o polivalente Tita revelou algo surpreendente: prefere a carreira de treinador a de jogador.
– Como técnico você cuida do todo, pensa na estratégia, em cada detalhe, e quando o resultado chega você sente a sua mão ali – resumiu.
Citou Paulo César Carpegiani como o seu melhor técnico. Tita treinou Vasco, Volta Redonda, Olaria, Remo, América (RJ), Tupi, León e Urawa Reds, do Japão, e, ontem, estava em ação dirigindo o Macaé contra o Friburguense. Perdeu de 1 x 0. Deve estar de cabeça quente porque “perder” não faz parte de seu vocabulário. O golfe talvez sirva para amenizar o seu estresse e é inegável, conquistou o seu coração, mas o futebol, ah, o futebol está na alma e não o abandonará nunca.