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QUANDO O GÊNIO CANTA DE GALO

por Luis Filipe Chateaubriand


Em 1985, Telê Santana estava de volta ao comando técnico da seleção brasileira de futebol. Seu desafio era classificar o Brasil para a Copa do Mundo de 1986, passando, nas eliminatórias, por Bolívia e Paraguai.

No primeiro jogo, com a Bolívia em Santa Cruz de la Sierra, o Brasil havia vencido de 2 x 0, dois gols de Casagrande.

Foi o escrete canarinho, então, a Assunção, para enfrentar os alvi colorados.

Jogo difícil, disputado, Casagrande faz 1 x 0 para o Brasil ainda no primeiro tempo.

Na segunda etapa, os paraguaios pressionam, mas uma jogada genial, de um brasileiro genial, selaria o destino da partida.

A bola está com Leandro, na intermediária direita do campo de ataque. Percebe Zico desmarcado um pouco atrás da meia lua. Faz o passe diagonal, com a perfeição habitual.

No entanto, devido ao campo irregular, a bola chega atrás de Zico, levantando-se suavemente.

O jogador convencional precisaria se virar de costas para o gol, e de frente para a bola, para dominá-la. Mas Zico, o Galo, decididamente não é um jogador convencional…

Mesmo com a bola ficando atrás dele e tendo quicado no campo, faz uso do inusitado: puxa a bola de calcanhar para a frente, ela sobe pelo seu lado direito até a altura de seu pubis, mas sem tocar nela, decai e, antes de chegar ao chão, Zico emenda de primeira, ainda atrás da meia lua.

A bola segue baixa, mas não rasante, quica de leve no campo já na pequena área, e vai morrer no fundo do gol, no canto esquerdo do impotente goleiro guarani.

Fica claro que o Galo concebeu o gol, sabendo o que faria antes da bola chegar. Gênio!

Um gol sensacional, que determina o 2 x 0, placar definitivo do cotejo, deixando bem encaminhada a classificação brasileira à Copa do Mundo de 1986.

Anos mais tarde, Zico faria o lindíssimo “gol escorpião”. Mas, já então, fez o “passe meio escorpião lançando para si próprio”, que culminou em gol.

Toda a lógica mostrava que o jogador qualquer teria que se virar para a bola, dominá-la, girar o corpo em direção ao gol e, quando fosse chutar, já estaria bloqueado pelos adversários. Zico simplificou as coisas. A genialidade está na simplicidade, como o Galo nos ensinou em mais de 20 anos de carreira do maior jogador brasileiro do Pós Pelé.

“A BOLA PELA QUAL ZICO ESPEROU NA CARREIRA INTEIRA”

por Luis Filipe Chateaubriand


Arthur Antunes Coimbra, o Zico, é o jogador de futebol brasileiro mais completo que este escriba conheceu. Era bom para lançar e concluir, como Armando Nogueira bem definiu certa vez, arco e flecha. Passava e chutava de perna direita e de perna esquerda. Cabeceava como poucos. Batia faltas de forma divina. Sabia usar o calcanhar com perfeição. Driblava de forma vertical.

Uma estória pouco lembrada da carreira do “Galinho de Quintino” aconteceu em 1988: jogo pelo Campeonato Brasileiro, no Maracanã, o Flamengo venceu o Criciúma por 3 a 0.

No primeiro tempo, o Flamengo vencia de 2 x 0, dois gols de Bebeto. Com o segundo tempo em andamento, Bebeto recebe a bola na grande área, em seu lado esquerdo. Domina, ajeita o corpo e, mansamente, rola a bola para a meia lua, na entrada da grande área. Zico, um pouco atrás de onde a bola chegaria, corre, arma o chute e desfere uma “bomba” no ângulo direito do goleiro do clube de Santa Catarina.

Um gol fora de série!

No vestiário, comentando o gol, Zico fala sobre o passe de Bebeto:

– Esperei minha carreira inteira que alguém rolasse uma bola como essa, para fazer um gol assim!

A magia de futebol é composta de lances que marcam a nossa memória. Este aconteceu há 29 anos, mas, em minha mente, parece que aconteceu ontem. Bendito futebol, que nos dá a chance de ter recordações como essa!

*Luis Filipe Chateaubriand é estudioso das questões acerca do calendário do futebol brasileiro. Foi consultor do Bom Senso Futebol Clube para o assunto. Escreveu vários livros e artigos a respeito, entre os quais “Um Calendário de Bom Senso para o Futebol Brasileiro”. Foi membro do Grupo de Trabalho de Reformas do Calendário da Confederação Brasileira de Futebol. Vascaíno, é um grande admirador do futebol de Zico, com quem sofreu durante a juventude.

ETERNA JUVENTUDE

por Sergio Pugliese

Em maio, esse time de pelada da foto completou 57 anos. Nesse período, revelou nomes como Wanderley Luxemburgo, Paulo César Puruca (ex-América) e Zé Mário, campeão invicto pelo Vasco, em 77. Já estaria ótimo para um time que nasceu sem obrigação de nada. Mas conte cinco da esquerda para a direita na fila de baixo. O moleque franzino, que nessa idade já encantava torcedores e assombrava adversários, é Zico. O time, Juventude de Quintino.


EM PÉ, ZÉZINHO,CHIMANGO, SÉRGIO GORDO, JAIR PEPÉ, JOÃO, TEOPHILO, JARUBA, XANDINHO, TUNICO, PEDRINHO, PAULO PIRÃO E ANTUNES. AGACHADOS, BARATA, PAULINHO, ZÉ BRACINHO, CLAUDIO, ZICO E SIDNEY.

– Esse time faz parte da minha vida, da minha história – recordou, feliz. 

E histórias não faltam. Mas quem poderia contá-las? Onde encontrar aquela imagem que todos dão como perdida? Quem saberia o nome dos jogadores que passaram por lá? As datas, as legendas das fotos? Para essas perguntas, a resposta era a mesma: “O Nando!”, “Só com o Nando!”, “O Nando deve ter!”, “Com certeza o Nando sabe!”. 

Todos os times de pelada têm um responsável pelas anotações, estatísticas e até estatuto. No Juventude é o Nando! Na verdade, essa crônica deveria ter apenas um personagem principal, o Galinho de Quintino, até Nando Coimbra ser solicitado. E ele entrou em campo disposto a mostrar serviço, apresentou um ótimo repertório de jogadas e garantiu a vaga de titular. Nando é um dos irmãos bons de bola de Zico e além de poeta, pintor, estilista (ele é quem desenha as camisas do time) e ótimo contador de histórias é o arquivo ambulante da família e, claro, do Juventude. 

– As histórias do nascimento do Juventude são especiais, mágicas, e continuam vivas em minha cabeça – disse. 

Continuam vivas porque ele é o único dos irmãos (Zico, Zezé, Antunes, Edu, Tonico e o falecido Zeca) que ainda mora numa casa arejada de Quintino, a mesma que Sandra, mulher de Zico, morou um dia. A rua é a Lucinda Barbosa. Nela o Juventude nasceu. Na casa vizinha, morava o Galinho e numa outra pertinho ainda existe a quadra de futebol de salão que transbordava em dias de jogos. Ele voltou lá com a equipe do A Pelada Como Ela É e presenciou um espaço quase abandonado. 

– Vou mandar trocar esse piso, pintar essas paredes – prometeu, enquanto tirava o lixo do caminho. 

De volta para a casa mostrou as fotos mais marcantes do vermelho e branco, todas digitalizadas, e embarcou num mar de lembranças e emoções. Lembrou-se do dia em que vários jogadores, já consagrados, estavam em sua casa comemorando um aniversário do Juventude quando chegou o cantor João Nogueira para animar a roda de churrasco e cerveja. Estavam lá, Zico, Cantarelli, Liminha, Jaime, Geraldo, Zé Mário, Tadeu, Edu, Volmir, Bráulio, Alex, Luisinho Tombo, Flecha, Paulo César Caju, Paulo César Puruca, entre outros. 

– Aí, o João Nogueira levantou-se e fez a convocação. Disse que estava tudo ótimo mas faltava uma peladinha. 

Em minutos todos estavam descalços jogando na Franco Vaz, rua de paralelepípedo, no fim da Lucinda Barbosa. 

– Foi maravilhoso! Impossível nos dias de hoje com tantos papparazzis. Juntou foi gente para assisti-los! – divertiu-se. 

Por um lado foi ruim não ter um registro desses, mas para eles essas peraltices faziam parte do dia a dia. A família estava acostumada a reunir multidões. O Juventude tinha um fã-clube enorme. Zico, muito pequeno e magrelo, fazia miséria com a bola. Quando entrava em campo junto com os grandões muitos adversários o ironizavam e após o jogo ficavam estarrecidos com suas apresentações. Telê foi vê-lo jogar incontáveis vezes. 

– O time completo era difícil perder – assume Zico. 

Nando estava animado com as histórias mas durante a entrevista seu celular tocou. Era a convocação para a pelada no Grêmio Esportivo Vital. Garantiu que estaria lá em cinco minutos. Sua mochila já estava pronta. 

– Amigo, é muita história! Depois continuamos, combinado? A peladinha é prioridade! 

E aos 72 anos se mandou pelas ruas de Quintino esbanjando juventude, uma eterna juventude.


UM DUELO DE TITÃS – ZICO X MARADONA

por Serginho5Bocas


De alguns anos para cá, a imprensa tem-se perguntado constantemente quem foi o melhor, Pelé ou Maradona? Dúvidas à parte, em minha opinião chega a ser brincadeira esta comparação, Pelé sempre esteve acima de todos.

Alguém seria capaz de escolher e me dizer em qual critério Pelé perderia para Maradona? Prefiro dizer que Maradona deveria ser primeiro o melhor disparado de sua época, como Pelé foi em todas as épocas.

Lembro na minha infância e adolescência que Maradona de tempos em tempos duelava com Zico pelo trono de melhor do mundo. E para a surpresa de muita gente de agora, o argentino não levou vantagem em nenhum confronto direto, mas indiretamente, pois eles não se enfrentaram na Copa de 1986. Maradona fez a diferença que Zico não conseguiu fazer pelo Brasil em Copas do Mundo e daí a superioridade que muitos dizem que ele teve sobre o Zico.

Em 1979, Zico tinha saído de uma Copa horrorosa em todos os sentidos para ele, pois perdeu a vaga de titular e quando finalmente recuperou a posição, sofreu uma distensão muscular. Mas foi exatamente quando a Argentina comemorava seu aniversário da conquista que Zico deu a primeira mostra ao mundo de quem era o melhor naquele momento.


A FIFA reuniu os melhores do resto do mundo e enfrentou os argentinos. Maradona abriu o placar, enquanto Zico estava no banco por ter chegado atrasado para o jogo. O Galinho entrou na segunda etapa, fez o gol de empate e deu o passe para o gol a vitória, deixando a imprensa mundial estarrecida tal o futebol apresentado por ele.

Naquele mesmo ano, voltariam a se enfrentar pela Copa América e nova propaganda foi feita questionando quem era o melhor dos dois. Brasil 2×1 Argentina com um gol de Zico e passe do craque para Tita fazer o outro.

Já em 1981, voltariam a se enfrentar pela terceira vez, desta vez num amistoso entre Flamengo e Boca Juniors no Maracanã, que também era a despedida de Carpegiani do futebol. Flamengo 2×0 Boca Juniors, com dois gols de Zico e mais um show da bola, mesmo apresentando 38° de febre e furúnculos pelo corpo.


No ano seguinte, na Copa da Argentina seria o verdadeiro tira teima, já que o Brasil dava show a cada jogo e a Argentina era o time campeão de 1978 reforçada por Maradona e Ramon Diaz. Brasil venceu o jogaço por 3×1 com um gol de Zico, um passe para Júnior marcar outro e o passe para Falcão cruzar na cabeça de Serginho. Maradona além de perder pela quarta vez e assistir a mais uma exibição do Galinho, deu uma entrada dura em Batista e foi expulso do jogo e da Copa.

Em 1985 se enfrentariam duas vezes, uma num empate entre a Udinese e o Napoli em 2×2 com 2 gols de Maradona (sendo um de mão) e depois jogariam festivamente no jogo da volta de Zico da Itália, quando o Flamengo venceu um combinado de amigos dele por 3×1 com outro gol do Galo.

Podemos defender Maradona dizendo que em poucos confrontos destes citados, ele jogou em uma equipe tão boa quanto a do Zico, mas talvez a diferença residisse justamente neste ponto: até que ponto cada um influenciou decisivamente nos confrontos? O saldo não deixa dúvidas, não mente, Maradona nunca venceu o Galinho, e mais, a única vitória do baixinho habilidoso, foi na Copa de 90, sem Zico, mesmo tendo levado um chocolate na bola, apesar de ter saído vencedor com um gol de Caniggia em passe primoroso seu.

Acho que Maradona foi um dos maiores de todos os tempos, mas na década de 80 que foi o seu apogeu, ele não reinou sozinho, pois além de dividir as atenções com Zico, o francês Platini também gastava a bola e era nome certo em qualquer eleição de melhor do mundo.

O tempo amplifica os feitos, para o bem e para o mal, e a atuação magistral de Maradona em 1986 foi o que ele precisava para deixar na história sua marca eternizada como o melhor daquela Copa, mas continuo a achar que ele foi um deles e não o melhor acima de todos daquela época.

Fica aí a polêmica e podem me bater de porrete, mas, meninos, foi o que eu vi…

MEIO-CAMPISTA

por Rubens Lemos


Queria ter sido um meio-campista. Queria ser o primeiro convocado e disputado nas peladas e campeonatos de rua contra rua. Desejava saber driblar, controlar a bola em embaixadinhas, igual ao menino que brinca com laranjas no sinal de trânsito à espera de esmolas no sentimento comodista da piedade geral dos motoristas e caronas.

Nunca me meti a fazer nada do que não sei por entender que quem se mete onde não deve, se dá mal, faz errado. Médico é médico. Nenhum leigo pode receitar remédio ou dar diagnóstico. Estrada e prédio é com engenheiro. No jornalismo, não. Todo mundo se mete porque a profissão não se respeita. Qualquer zemané entende de marketing, de estratégia e redação.

Nunca andei de bicicleta, patinete ou dirigi carro. Não sabia e tinha certeza de que minha pele desapareceria de cima dos ossos de tantas quedas que levaria. Sem talento para o meio-campista pretendido, rebatia bolas na defesa e até arriscava toques curtos e medidos, tímidos para quem rasgava as defesas em fintas e danças feiticeiras aterrorizando zagueiros.

Restaram-me algumas ideias e as mãos para teclar em Olivettis, Remingtons e agora em modernos teclados que suportam letras e formulações tortas. Mas é o que ainda consigo. É o meu limite. Todo homem deve conhecer o seu lugar e a sua fronteira.

Não fui um meio-campista, mas sou um adorador dos legítimos, aqueles que sabiam dominar a bola com carícia, olhar o campo do oponente antecipando a jogada, arquitetando o gol na inteligência de um bom poeta, na perspicácia de um criterioso ourives, na afinação do violonista completo.

Então, não aceito boleiro grosso na função que foi de Didi, Gerson, Ademir da Guia, Jair Rosa Pinto, Zizinho, Paulo Cézar Caju, Rivelino, Zico, Sócrates, Dirceu Lopes, Geovani do Vasco, Adílio do Flamengo, Pita do Santos e do São Paulo. E do Rei Potiguar, Alberi.

Boleiro atual é escalado para tarefa nobre com seu futebol remediado. Nem tão pobre e nada exuberante. É limitado, tímido, falta-lhe a sensualidade, o deboche do craque subversivo, desobediente a táticas burras. Boleiro atual não aprende que a timidez é proibida na missão de iluminar uma partida de futebol. Eu não fui um meio-campista. Boleiro atual – exceto Phillipe Coutinho – também não é.