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zé roberto padilha

ENTRE DELAÇÕES E SIMULAÇÕES

por Zé Roberto Padilha


por Zé Roberto Padilha

Estamos, desde quarta-feira passada, hipnotizados diante da televisão esperando o momento do presidente da república reagir diante de um empresário corrupto que se vangloria de aliciar juízes, procuradores e de obstruir investigações da Lava-Jato. Não contra a qualidade ou legalidade das gravações, como enfaticamente tem feito. Se ele, que se apossou ilegitimamente do trono republicano, acha tudo normal, e não chama a SWAT, a Interpol ou a Polícia Federal para prender o porta voz daquela carne estragada, o que seria anormal no Brasil? Troco de canal, fecho as obscuras manchetes de domingo e vou assistir Vasco x Bahia pela manhã em busca de algo mais decente.

Pelo WhatsApp recebo fotos dos amigos dos meus netos, Lucas e Miguel, chegando com seus pais a São Januário. A mãe, que as postou, dizia orgulhosa “Tudo pelos filhos!”. Realmente os gêmeos, duas figuras adoráveis, bons de bola e educados, mereciam assistir a um espetáculo, ao vivo, mais decente do que os reprisados incessantemente pela GloboNews.

Aos 23 minutos do primeiro tempo, porém, Kelvin entra em velocidade pela esquerda, cruza no primeiro pau e Luís Fabiano toca de primeira para o goleiro baiano, Jean, realizar uma grande defesa. O jogo prometia, vai valer a pena a viagem dos meninos, imaginei. Mas no lugar de se levantar, o arqueiro baiano lembra dos conselhos que recebeu de uma velha raposa da posição, talvez arqueiro da JBS Futebol Clube: “Após uma grande defesa, permaneça caído. E levante o braço pedindo atendimento mesmo sem ser atingido!”.

No meio isolado em que vivem e se postam, onde antigamente mal nascia grama, chama-se “O pulo da raposa!”. No lugar do escanteio, ou da rápida reposição de bola, a TV é obrigada a reprisar toda a defesa, várias vezes, enquanto durar a paralisação. E ela acaba imortalizada ao conceder aos goleiros replays apenas destinados aos artilheiros. E indo para a galeria do G10.


Pouco adianta, neste momento complicado do nosso país, tirar as crianças da sala para não assistir aos maus exemplos dos nossos políticos. Existem várias muralhas desabando fora dele, em campo, sob o menor impacto com o centroavante adversário. Mas e quando os tiramos da cama e os levamos cedo para São Januário a procura de bons jogos e belos exemplos?

Com um cigarro Vila Rica às mãos, nosso canhotinha de ouro, Gérson, então tricampeão mundial, afirmou certa vez em um comercial: “O negócio é levar vantagem em tudo, certo?” Errado. O Vasco ganhou por 2×1, amenizou a crise, mas deve ter sido difícil, na viagem de volta, Leonardo e Olivia explicarem para seus meninos novos gestos ilícitos privados tomados em causas públicas, como a do Jean, que logo se levantou após seus 30 segundos de simulação.


Então, meus goleiros, dar logo sequencia ao jogo e não simular a queda é um exemplo que precisa ser dado neste momento em que o nosso país precisa levantar rápido, sair jogando com ética e pegar a corrupção no contra ataque.

IDADE AVANÇADA?

por Zé Roberto Padilha


Zé Roberto Padilha

A expectativa de vida da população brasileira acompanhou a média mundial: subiu 41,7 anos em menos de meio século. Hoje, é de 75,5 anos de acordo com o IBGE. O avanço da medicina, a prática regular de atividades esportivas e a diminuição do cigarro foram fatores determinantes neste aumento, embora o consumo de álcool e a fartura de drogas estejam resistindo perigosamente do outro lado. Sendo assim, seria normal que aumentasse em igual proporção a permanência em campo dos jogadores de futebol.

No lugar de se aposentar com 35 anos, como fez a minha geração, e virar comentarista com 36 anos, esticariam suas carreiras até os 40, desde que se cuidassem e os seus meniscos, os divisores de águas da saúde da bola, não tivessem sidos atingidos ou torcidos ao pisar num buraco. O maior exemplo de que isto é possível foi dado por Léo Moura, na primeira rodada do Campeonato Brasileiro.


Um lançamento primoroso de um meio campista gaúcho, algo parecido com os de Didi, Gérson e Rivellino, cruzou todo o campo do Botafogo e encontrou Léo Moura disparando em velocidade pela direita. Carregado de informações do Google, o lateral esquerdo alvinegro subestimou sua descida, tinha informações suficientes da sua recém trajetória ladeira abaixo, e fez pouco caso da trajetória da bola lançada sua cabeça acima. Segundo seu tablet, consultado antes da partida, Léo Moura havia feito seu jogo de despedida no Maracanã, pelo Flamengo, depois foi jogar em um clube americano para fechar a aposentadoria e, na volta, deu uma parada em Recife para disputar seu fraco estadual pelo Santa Cruz e…..já havia completado 38 anos de idade. Não teria mesmo como alcançá-la, imaginou.

Para sua surpresa, e certamente seguida de um puxão de orelhas no intervalo pelo Jair Ventura, Léo Moura não apenas alcançou a bola no ponto futuro como a dominou com extrema categoria, calculando sua descida e colando-a a seus pés. Pode parecer fácil, mas só foi simples para Nilton Santos e Carlos Alberto Torres. Próximo à linha de fundo, levantou a cabeça, deu um passe na cabeça do seu centroavante e, no bate e rebate, o Grêmio abriu o placar.

Para os amantes da arte que perderam Juninho Pernambucano, Caio Ribeiro, Denílson e Roger Flores cedo demais para os microfones, a primeira rodada do Brasileiro foi uma esperança de manter em cena por mais tempo nossos maiores craques. Fora o Seedorf que no seu auge virou treinador.

A única preocupação que temos, às vésperas da votação da reforma da previdência pelo Senado, é se a jogada de Léo Moura será exibida no telão durante a plenária. Pode ter um porta voz da temeridade a usá-las para justificar 49 anos de contribuições ininterruptas para o trabalhador brasileiro ter o direito de se aposentar com o teto. Neste caso, aquele tiro do lateral gremista pela beirada, destaque da primeira rodada, sairia pela culatra.

CALMA, GENTE!

por Zé Roberto Padilha

A final do estadual carioca de 1973 também foi entre Flamengo x Fluminense. No dia 22 de agosto, quarta-feira à noite, com 74 mil pagantes e arbitragem de José Faville Neto, chovia muito. Havia disputado a Taça Guanabara ao lado do Rubens Galaxe, Abel, Marinho, Nielsen Elias e Marco Aurélio porque naquele tempo o Fluminense cedia jogadores à seleção brasileira, como Lula e Marco Antonio. O jogo foi 4×2 para o Fluminense e o Manfrini marcou dois gols e foi o destaque daquela decisão.


Zico

Estava no banco de reservas quando o treinador rubro-negro, Zagallo, lançou o Zico no meio campo ao lado do Paulo César e do Liminha. Aos 42 do segundo tempo, descobri que poderia ser tudo na vida, menos profeta. Porque o galinho foi tentar buscar no desespero uma bola que saíra pela lateral, escorregou na poça, caiu perto do nosso banco e a massa rubro-negra, impaciente e já derrotada, não perdoou sua queda. E lhe deu uma tremenda vaia. Quando levantou, ainda magro e sem o trabalho de reforço da massa muscular que José Roberto Francalazzi lhe faria mais tarde, virei para o lado e comentei com o Rubens:

– Coitado deste menino. Não deve ir muito longe!

Zico tinha apenas 20 anos. Não era fácil, nem mesmo para quem despontava Zico, ser titular com esta idade em qualquer grande time do Brasil. Tanto que ele só foi convocado para a seleção brasileira três anos depois e se tornou campeão mundial de clubes aos 29 anos. Havia ciclos, do Zizinho, do Dida, Silva, o Batuta, e eles duravam alguns anos, nada deste troca troca intermitente que mal dá tempo para a Panini organizar seu álbum de figurinhas. Quando ela tira a foto e o jogador vai para o pacotinho, há um grande risco do garoto comprar a figurinha nas bancas e o atleta já estar em outro clube.


Agora, no afã de vender sua maior promessa das divisões de base, porque Vinícius Júnior é apenas uma promessa (quantos não ficaram presos no elevador da subida com síndrome de pânico diante das responsabilidades e contusões?), Zé Ricardo abre mão de tentar ganhar do Atlético Mineiro, no ultimo sábado, e deixa de colocar em campo um jogador com mais bagagem, entrosado com o elenco e que fez parte do grupo que vencera o estadual, para antecipar seu ciclo. A ordem que veio de cima pouco combina com a maturidade administrativa da gestão Bandeira de Melo:

– Precisamos logo colocar este menino na vitrine!

Só que a roupa que vai vestir o modelo a ser exposto no Santiago Bernabeu para o mundo da bola deve ser moda de hoje. A que está sendo exposta é a do futuro, e para alcançá-lo este menino precisará de uma carteira de motorista para dirigir o seu destino – e sua idade só permite que conduza uma moto de 125cc de casa até o Ninho do Urubu. Jogar após às 22 no horário global? Melhor esquecer, menores de 18 anos são proibidos de trabalhar no horário noturno e a legislação brasileira os proíbe de serem expostos em condições perigosas e insalubres como, por exemplo, enfrentar o Rodrigo, do Vasco.

Para fechar, tem coisa pior e mais constrangedora: se quiser viajar para Madrid com sua Marquezine vai precisar de autorização do papai e da mamãe. Que tal esperar madurar este menino? E chamar o Professor Francalazzi para encorpar?


SONHOS DE UM COADJUVANTE

por Zé Roberto Padilha


Zé Roberto Padilha

Dizem que o novo assusta. Imaginem um novo com doses de genialidade, como o elástico de Roberto Rivellino, os dribles de Mané Garrincha, a bicicleta de Leônidas da Silva. Quantos, então, não se assustaram com o corta luz de Pelé sobre o goleiro uruguaio Mazurkiewicz na Copa do Mundo de 1970, no México? Se o estádio se calou e televisões assombraram torcedores pelo mundo, calculem a emoção dos que vestiam a mesma camisa amarela, como, Tostão e Jairzinho, e presenciaram toda a obra de arte ao seu lado?

Nós, ex-jogadores de futebol, privilegiados coadjuvantes das raras genialidades que por nossos gramados reinaram em décadas passadas, cuja ultima espécime a lhes dar vida foi o Neymar, às vezes acordamos no meio da noite de um sonho vivido. Teria acontecido mesmo aquele lance de verdade? Após conferir a jogada na lembrança, em meio a breve e escura vigília, e voltar a dormir, prometemos contar no dia seguinte para todo mundo. Não seria justo guardar as pérolas que assistimos de camarote, na Sala VIP do futebol, a centímetros da ponta das nossas chuteiras. Esta passagem me fez despertar no domingo, e buscar uma folha de papel, uma caneta, antes que a memória desperte cada vez mais preguiçosa.

Era meu primeiro treino no Flamengo, em Miguel Pereira, onde o clube fazia sua pré-temporada. Quando descia pela esquerda no coletivo sob o comando de Carlos Froner, via todo meu time me olhando, esperando lhes conceder o objeto de desejo, que estava ali rolando aos meus pés. Menos o Zico. Mesmo livre, às vezes, não me olhava. E eu tinha a bola. Estaria olhando pra quem? Não queria me dar moral por ter sido trocado pelo Doval? Daí eu a atrasava para o Júnior, procurava o Geraldo para a tabela ou cruzava na área para o Luisinho. Ao final do primeiro tempo Júnior se aproximou de mim. E perguntou:


Zé Roberto Padilha vestiu a camisa 11 no Flamengo

– Está com raiva das gratificações? Tá rico, não precisa do bicho? Notei que você não meteu uma só bola para o Galo!

Retruquei:

– Mas ele sempre olhava para o outro lado, como lhe passaria a bola?


Aí o capacete, que há mais tempo convivia com nosso camisa 10, explicou que ao pressentir que receberia um passe, Zico abria seu olhar giroscópio em busca de um repertório maior, para dar seqüência imediata às jogadas. Quando tinha certeza de que, livre, seria acionado, segundos antes já abria o GPS a notar se o Toninho passava apoiando a sua direita, o Tadeu estaria ao seu lado para cadenciar a jogada, Rondinelli, o Deus da Raça, livre mais atrás para reorganizar a saída de bola. Isto quando não partia em direção ao gol ao perceber a zaga adversária desarrumada. Como anteveria tantas opções olhando para quem, como eu, queria lhe passar a bola?

Depois da lição, lembrei da frase sábia de Neném Prancha: “O bom jogador vê, o craque antevê”. No segundo tempo do treino, mesmo diante do novo, do inusitado, tratei de acioná-lo imediatamente. Aliás, jogando no Flamengo consegui comprar o único apartamento de toda a minha carreira. Se não fosse o conselho do Júnior, e o destino glorioso que o Zico concedeu às jogadas que iniciamos, estaria vivendo de aluguel até hoje!

O SILÊNCIO DOS INOCENTES

por Zé Roberto Padilha


Zé Roberto Padilha

Certa tarde, acompanhando o América FC, de Três Rios, na terceira divisão, notei que um amigo meu, professor de educação física, entrara em campo em Mesquita para apitar a partida inaugural do estadual de 2012.

– Até que enfim renovaram a arbitragem da FERJ! Este juiz eu conheço de perto – com esta frase carregada de certezas, tranquilizei os ocupantes da van ao meu lado que se acomodavam junto ao alambrado.

Aí o atacante da casa simulou um pênalti e ele mandou colocar a bola no cal. Foi uma indecência. Completamente sem graça, ouvi quietinho todas as gozações na viagem de volta.

– Imagine se você não conhecesse aquele ladrão, o que faria com a gente!

No segundo turno teve o jogo da volta e ele, novamente escalado, marcou um outro pênalti, também inexistente, desta vez a nosso favor no Estádio Odair Gama. Nem precisava, jogávamos melhor. Após a partida ele nos confessou os temores desta nova profissão:


Wagner do Nascimento Magalhães apitou a decisão do Carioca

– Sem segurança nenhuma, o máximo que mandam a nos proteger são guardas municipais.

Com a van com a logo da FERJ parada perto das arquibancadas em um estacionamento aberto, torcedores colados ao alambrado, na dúvida, você escolhe: ou sai daquela cidade mandante debaixo de garrafadas, ou administra o resultado. Invertendo laterais a irritar a equipe visitante. Distribuindo cartões amarelos de cara para toda a sua zaga e inibindo a marcação. Na dúvida, expulsa um deles. E guarda a marca do pênalti como ultima instância.

– É o nosso instinto de sobrevivência! – revelou.


“Vai longe este menino”, pensei. O problema é que o instinto incorpora, dá origem a arbitragem caseira e vira regra carreira afora. Que sonha sair seguro de campo mesmo na neutralidade de um Maracanã. E quando entram em campo já consagrados e percebem ao redor que existe um gigante do tamanho do Flamengo do outro lado, e a barulheira é tamanha que na dividida e na dúvida… reza a cartilha do instinto de sobrevivência ser melhor não enxergar uma carga do Rever. Tão comum aquele empurra-empurra, quem há de notar? A não ser que alguém reclame. E ninguém com a camisa tricolor se prestou a reclamar da arbitragem naquele decisivo momento.

O que nos assombrou, como tricolores, foi o silencio do Henrique. Desabou como uma criança abandonada e levantou como uma desamparada, daquelas que apanham e se calam por não conhecer os seus direitos. Já peço desculpas antecipadas aos meus leitores tricolores, mas pela vez primeira queria o Rodrigo, do Vasco, atuando em nossa zaga. Pelo menos naquela jogada.


Primeiro, não desabaria daquele jeito por sua complexão física. Segundo, levantaria com o dedo no nariz do árbitro, a confusão seria formada, Abel invadiria o campo, os bandeirinhas seriam consultados e….poderia até não dar em nada. Mas aquele silêncio dos inocentes, partido de um jogador experiente, foi tão nefasto quanto a porção de margarida untada nos braços do Diego Cavalieri. E que a canhota do Guerrero, que não tem nada com esta lambança, apareceu na história para enfiar a bola para dentro do gol e decretar a nossa derrota.