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zé roberto padilha

AO FLA-FLU, EU VOLTEI

por Zé Roberto Padilha


Eu cheguei em frente ao portão 18
O segurança me afastou latindo
Minha mochila revistou e me barrou
Eu voltei

Nada estava como era antes
Dos anos 70 em que joguei
Policiais, cavalos, seguranças por toda parte
Trocaram Andrade, Adílio e Zico
Por Rômulo, Marcio Araújo e Cuellar

Estava explicado o confronto armado, torcedores revoltados
E eu voltei, ao Fla-Flu eu voltei
Nada estava como era antes
Quase tudo se modificou
Tantos anos se passaram, mas meus netos pediram
Que reabrisse as lembranças depois daqueles portões
E eu lhes dei as mãos
E voltei

Comprei ingresso, a rampa subi devagar
Mas deixei a massa passar primeiro
Passos indecisos caminhei
Todo o passado recordei
E entrei
Ao Fla-Flu com meus netos, eu voltei

Um telão imenso na parede
Roubava cenas do gramado
Meio amarelado pelo tempo
Em preto e branco meus lances nem reprisou
Como a perguntar ao tempo se joguei
E eu falei
Eu voltei


Sem saber depois de tanto tempo
Se um só torcedor, repórter ou vovô
Saberia com quem joguei
E parei

Eu voltei para os arquibaldos que deixei
Eu voltei para os geraldinos que nem encontrei
E chorei com saudades do elástico do Rivelino no Alcir, foi logo ali
da magia e categoria de Paulo César Cajú
E chorei

Recolhi meus netos em silêncio, pela estrada a Três Rios eu voltei,
E voltei porque o Maracanã não era mais o meu lugar

BELAS E LIBERTADORAS DA AMÉRICA

por Zé Roberto Padilha

Estão há tanto tempo atuando ao lado que pouco são exaltadas. Mal dão entrevistas. Era para carregá-las no colo, como num gol decisivo, mas as chuteiras e as glórias estão calçadas em pés egoístas e famosos que as tornaram invisíveis ao mundo da bola. Porque nos microfones atrás da meta os gols só são dedicados a “Filhas, papai te ama!”. Mulheres de jogadores de futebol. As mães dos nossos filhos que já nos concederam netos, percorreram gramados que não escolheram, falaram a língua que nem estudaram, mas arrumaram as malas com carinho como se escolhessem seu próprio destino. E foram escrever histórias pelos passaportes que abrimos. Os lápis, cenários, vieram embutidos no contrato de cidades e clubes que mal opinaram. Isto cabia ao empresário. Não a mulher que embarcou ao lado para escrever a história do marido com a bola. E anestesiar grande parte da sua.

Nossos álbuns são recheados de clubes diferentes, as paredes da sala emolduradas com pôsteres e as cristaleiras ficam com a missão de exibir troféus e medalhas. E em um álbum apenas estão presentes posando: o de casamento. Que, aliás, poucos que nos visitam querem folhear. Cadê você jogando no Flamengo? E sua passagem pela Arábia Saudita? E a foto do Vasco ao lado do Roberto Dinamite?

Algumas mal tiveram lua de mel diante do calendário opressivo, e cederam seus maridos para passar a noite encantada na concentração. Outras nem puderam celebrar a formatura dos seus filhos, eram obrigadas a trocar de colégio, apartamentos, ginecologistas, mercados sem direito a levar amizades recentes como as raras que fez em Campinas, quando se tornou amiga da esposa do goleiro da Ponte Preta. Seu marido foi emprestado para Chapecoense e só lhe restou arrumar de novo as malas. E desarrumar de vez a sua vida.


Bela, a encantadora mulher do meu compadre Zé Mário, nos inspirou a homenagear, hoje, todas as Rossanas, Elizabeth Cristinas, a Leila Pinho, que o Jorginho retirou do Círio de Nazaré para viver em Areal, a colombiana Sonia Galaxe que foi “seqüestrada” pelo nosso coringa quando de uma excursão tricolor em Cáli, a Gracinha, que meu primo Vinícius carregou para Portugal…. e todas vieram a tona porque meu genial cabeça-de-área postou ontem, no Facebook, as 35 camisas que defendeu. E fiquei a viajar com minha comadre pelas cidades e países que não escolheu, pelas camisas que nem usou mas lavou e passou, diante da criação dos filhos nômades que teve que se virar para educar.

Até hoje enquanto lutam em campo por uma vaga na Taça Libertadores, poucos jogadores de futebol percebem que a companheira que buscou em casa, passou pelo altar e prometeu um mundo que não passou de Recife, já os libertou da solidão de uma difícil profissão. Cuidaram com gelo e Tandrilax das suas contusões e, ao contrário do jornal, do Neto e dos cartolas, estarão sempre ao seu lado. Com qualquer resultado, serão sempre belas e libertadoras da América..

A VOLTA DOS NOSSOS BRAVOS NATIVOS

por Zé Roberto Padilha


Não há clubes pequenos, acreditem, e sim clubes atualmente com menor poder aquisitivo. Todos eles, sem exceção, possuem uma importante história de construção ao congregar sua comunidade em torno de uma atividade social e esportiva, proporcionando lazer e entretenimento a muitos que ocuparão suas piscinas, salões e arquibancadas, além de oportunidades de trabalho e projeção aos que irão para campo defender suas cores. E erguer suas bandeiras.

O Goytacaz Futebol Clube é um destes clubes que há anos sobrevive com uma modesta receita diante da sua grandeza. Não há por parte da Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro um olhar carinhoso para o interior, o que é acompanhado pela grande mídia, que praticamente ignora as divisões de acesso. Sem apoio de quem organiza e divulga, só resta mesmo aos que o defendam superação.


Foi o que o competente treinador Ricardo Barreto e seus atletas certamente empreenderam pela nossa amada cidade de Campos, onde tive o privilégio de defender seus dois maiores clubes, Americano e Goytacaz, trazendo o clube da Rua do Gás de volta à elite do nosso futebol. E o azul e branco vai trazer de volta às telinhas, orgulhosamente, o símbolo maior da nossa história: os nativos goytacazes.

Segundo a historiadora Graziela Escocard, eles eram altos, brancos e fortes e não aceitavam ser domesticados pelos conquistadores europeus que ocuparam nossas terras. Sendo assim, ano que vem o Campeonato Carioca de Futebol terá como mascotes o urubu, o bacalhau, o pó-de-arroz, o cri-cri e até o diabo de volta. Mas a presença daqueles índios que os portugueses primeiro, e os cartolas depois, tentaram extinguir das nossas terras e gramados estarão de volta. Queiram ou não, toda rodada do estadual 2018 terá jogo de índio. E a nossa arbitragem conhece bem o refrão entoado um dia nos salões: eles querem respeito no apito se não o pau vai comer. No bom sentido, é claro. Sejam todos muito bem vindos.

MALDITO TIME MISTO

por Zé Roberto Padilha


Zé Roberto Padilha

Pior do que torcer por um time ruim é torcer por um time misto. Você não é Corinthians, nem Grêmio, a brigar pelo título, muito menos é Atlético Goianiense ou Avaí, que vão lutar toda semana para não cair. Seu time é o Avarinthians. Um misto entre o líder e o lanterna da competição que vai entrar em campo todo semana para te decepcionar. Este time, frio, misto e mal calculado, entrou ontem no Engenhão contra o Botafogo vestindo a camisa do Flamengo.

Sem o Diego e o Réver da Fiel, mas com o Rômulo e o Matheus Sávio do sul, segundo meu filho rubro-negro, nem deu para torcer. Tão apáticos e fora do lugar, mal tiveram como lutar. Porque se tem algo no futebol que não está à venda é o entrosamento. E ontem ele faltou ao Flamengo. Que escalou o entro e deixou o samento no banco de reservas. O juiz da partida poderia até autorizar que subisse a placa de 24 horas de acréscimo que Éverton Ribeiro, já entrosado com Diego e William Arão, com a proteção de Márcio Araújo, ainda pediria mais um dia para se entender com um tal de Geuvânio. Sabia que tinha um chamado assim que jogava, e muito, no Santos, mas o que o Flamengo comprou e escalou ao seu lado nem chega perto.


Mas Zé Rueda, o treinador misto de um técnico que montou o grupo e outro que chegou no fim pedindo informações ao Jayme de Almeida para conhecê-lo, embolou as figurinhas. E mandou a campo um Flamengo completamente desentrosado. Porque quando resolveu esquentá-lo no microondas com Berrio, Arão e Éverton, o Botafogo já estava aquecido. Desde o início. E aí já era tarde e o que restou foi a luta isolada do Guerrero. Este sim, já veio esquentado na embalagem, não há zaga ou companheiros ruins que conseguem esfriá-lo. E luta do começo ao fim.

Sou do tempo que as equipes tinham um time titular. E seu time reservas. Os melhores jogavam, os outros aguardavam a sua vez. Campeonato Brasileiro da Série A não é laboratório para ver o que vai dar com Cuellar, Rômulo, Matheus Sávio e Geuvânio. É algo sério, valendo vaga na Taça Libertadores, que poderia ter se aproveitado das derrotas dos líderes e até brigar pelo título. Mas preferiram, os sábios da cozinha, poupar os titulares e escalá-los em um jogo treino contra o Volta Redonda. Deve ter razão o Zé Rueda, jogando daquele jeito em breve irá mesmo enfrentá-lo valendo uma vaga no G4 da Série B.

INFELIZMENTE, CURADO

por Zé Roberto Padilha


O mais bacana no futebol é a paixão. Desmedida, então…. Ter o direito de escolher um lugar na arquibancada, vestir a camisa do seu clube e assumir aquela breve loucura que lhe dá o direito de abraçar com ardor, o dono da camisa ao lado, esteja vestida em quem for, xingar o juiz, ofender o zagueiro adversário e deixar que o resultado guie pelas próximas horas os rumos do seu sentimento. Feliz ou chateado, depende de quem acertou aquela bola na veia e correu para o abraço. Agora, vá se vestir de Pato da FIESP e ir para a Avenida Paulista cruzar com o boneco do Lula com uma bandeira vermelha nas mãos…..

Dezessete anos correndo atrás da bola, defendendo sete equipes em quatro estados diferentes me roubaram esta preciosa emoção. A realidade dos cartolas insensíveis, a fria concentração, o tapinha nas costas que vai virando com o tempo ostracismo na alma, nos roubou a parte mais bonita do imponderável. Não há fantasia que resista a uma barração na portaria de um clube que você entregou seus meniscos, fraturou seus tornozelos e ajudou a erguer sete títulos. Quem viveu o mundo da bola sabe que paixão por lá é sinônimo de ingratidão.


E quando o Ramon acertou aquele tiro cruzado, dando a vitória ao Vasco, não fiquei triste como deveria sendo torcedor tricolor desde garotinho. Pensei no contrário, o Léo nos dando a vitória e o Vasco ficando a um ponto da zona de rebaixamento. Outra vez. O futebol carioca, o brasileiro, não pode ficar sem o Vasco para nos lembrar sempre das nossas origens. De mais um navegador português que passou ao largo do nosso descobrimento e encontrou um caminho alternativo, contornando a costa africana, apara alcançar as preciosidades das Índias. E como apagar do futebol a história de Ademir, Barbosa, Andrada e Roberto Dinamite? Quando dei por mim torcia pelo conjunto da obra futebol movido pela razão. E a paixão tricolor foi posta de lado, não havia mais espaço dentro de mim para a emoção. Que pena!

Bom mesmo era ser tricolor doente, discutir com o André Seixas, rubro-negro, provocar o Décio Barbosa, botafoguense, e buscar na Internet outra piada de vice para sacanear o Professor Filipe. Mas sábado à tarde descobri, no hospital da minha sala em meio a Fluminense x Vasco, que não sou mais um torcedor doente como o meu amigo Andmar Andrade. Recebi alta de uma fria junta médica formada pelos dos deuses da bola e estou curado. Bom para o jornalismo que terá relatos isentos. Pior para mim que perdi a parte insana a que tinha direito no meio de uma multidão encoberta pelo fascínio de um pó de arroz.