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zé roberto padilha

ENCURRALADO

por Zé Roberto Padilha

Não tinha assistido o filme, quando consegui e percebi aquele caminhão desgovernado vindo pra cima, logo me veio a triste lembrança do dia em que fui atropelado. Em campo.

O Fluminense foi enfrentar o Corinthians, no Pacaembu, e Pinheiro, nosso treinador nos Juniores e interino nos profissionais, me levou na delegação. Era reserva do Lula e, aos 19 anos, faria a minha estreia. O Filme “Encurralado” também ia para as telinhas em 1971.

Fiquei na reserva e aos 25 minutos do segundo tempo, 1×0 para gente, Pinheiro me coloca para segurar o resultado. Até ia me saindo bem se Félix, nosso tricampeão, não resolvesse confiar demais em mim e saísse jogando perto da grande área.

No que fui dominar no peito, ela subiu um pouco, o suficiente para um caminhão, disseram que a placa tinha o número 2, me desse um chega pra lá, roubasse a bola, tabelasse com o Vaguinho e, chegando à linha de fundo, cruzado a bola na cabeça do Geraldo. 1×1.

Terminou assim. Entrei meio sem graça nos vestiários, mas logo fui confortado por todo mundo. O caminhão era o Super Zé Maria, lateral da seleção, já uma lenda do Timão. Mas quando entrei no chuveiro ouvi a voz do Gerson. Em direção ao Félix. Não era uma conversa amistosa entre dois tricampeões mundiais.

– Que coisa, hein Papel. No lugar de jogar essa “porra” pra frente, resolve sair jogando com esses “cabaçudos!”. Olha no que deu!

Cabaçudo. Poderia ter voltado sem essa. Era a cruel designação destinada aos recrutas que ousassem se meter com as velhas raposas. Quando a bola escapa, então.

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Tive novas chances que muitos não tiveram. De aprender que sair jogando perto da grande área será sempre um risco enorme. A sorte de Fernando Diniz, e suas cenas de correr riscos à beira da grande área, é que o Super Zé se aposentou. Caso contrário entraria em cartaz : “Encurralado 2!”

E Calegari teria tudo para ser o protagonista do retorno desse clássico dos cinemas. Ou teria outro nome, que não fosse “cabaçudo”, para quem ousa tirar a bola das mãos do Ganso e bater um pênalti daquele jeito?

QUEM LIBEROU ESSES CARAS?

por Zé Roberto Padilha

Quando o futebol arte predominava, ninguém tirava os olhos de campo para prestar atenção nos treinadores. Conheciam o seu lugar e sabiam que eram coadjuvantes e, como diretores teatrais, ensaiavam durante a semana. E não ficavam ao lado do palco para tirar o improviso dos artistas. Apenas no intervalo corrigia uma fala. Ou uma jogada.

Aí o nível técnico cai e um infeliz cria o burródromo. Um lugar demarcado para que um ser estranho passe a fazer parte do jogo. Nenhuma grande mexida tática foi feita ao vivo, diante dos nossos olhos. Jogador desconhece. Alguns comentam baixinho: quem deixou esse cara ali em pé?

Todo esse preâmbulo para mostrar o quanto esse treinador do Palmeiras, Abel Ferreira, pode atrapalhar um clássico de alto nível. Ele que está passando nervosismo e inconformismo aos seus jogadores ao reclamar de tudo. E olha que o árbitro é o melhor do país.

Sua falta de equilíbrio pode criar um clima de extrema animosidade nessa decisão. E nos privar, como torcedores de outros clubes, de assistir uma grande partida de futebol.

Que tal uma campanha para levar essa gente de volta ao banco de reservas? Um lugar que Telê Santana, Parreira, Zagallo, Evaristo de Macedo jamais deixaram para mostrar sua competência e intervir no talento alheio.

Aí o Dunga apresentou a grife da filha, o Cuca fez um castelo de copos de água mineral, o Joel inova e leva uma prancheta como alegoria de mão. Até um dia em que um fotógrafo aumentou o zoom e o pegou fazendo um jogo da velha…

Ali, acreditem, tudo é farsa , tudo é falso, tudo é marketing. E nada soma ao mundo da bola.

ANGÚSTIAS DE 76

por Zé Roberto Padilha

As rádios só tocavam Belchior em 76: ” Estava mais angustiado que o goleiro na hora do gol…”.

E era natural que ao colocar a bola na marca da cal para bater o terceiro pênalti da decisão da Taça Guanabara, entre Flamengo X Vasco, diante de 124 mil pagantes, entre eles toda a minha família que chegara de Kombi, de Três Rios, tenha lembrado da música.

E uma imensa vontade de corrigir aquela letra. Pois ninguém fica mais angustiado que o batedor na hora do pênalti. Se o Mazarópi pega, vira herói. Se eu perco, viro o vilão daquela decisão.

Quando ajeitei a bola e levantei a cabeça, cadê o gol? Cabeças da geral se juntaram as cabeças das cadeiras que encaixaram na dos arquibaldos. Só dava para distinguir os filetes brancos das traves.

E o goleiro vascaíno ainda estava de preto, quase um vulto a proteger aquela tela de Djanira que escondia o alvo fininho das redes.

Para complicar ainda mais os refletores eram precários, lâmpadas de Led eram luzes de tempos distantes. Perante tamanha falta de visão só nos restou a súplica, um último desejo ao destino que me jogara até ali: que não errasse a bola. Tão pequena, branca com a marca Drible e inocente à minha frente.

Depois de haver perdido um pênalti em uma preliminar de juvenis, Lula, ponta esquerda titular do Flu e da seleção, me chamou após um treinamento nas Larajeiras e revelou o seu segredo.

Bater forte com o peito do pé e de curva à direita do goleiro, tendo como referência a trave para a bola realizar uma trajetória contraria ao salto do goleiro.

E quando fui bater na bola, Mazarópi, que nos conhecia das divisões de base, se atirou para aquele canto. E uma tia kardecista, que nunca faltou na minha família, percebeu a manobra e em cima da hora virou meu tornozelo para o outro lado.

A bola caprichosamente encontrou as redes do outro canto. Assustado, confuso e aliviado, voltava para o meio campo quando ouvi de passagem o comentário de um Apolinho da Globo: “Quem sabe, sabe!”

Não, ninguém sabe o que passa na cabeça de um cobrador de pênaltis. Em decisões, então, esquece. São tantas alegrias e tristezas que serão definidas por uma cobrança que ela deveria ser mesmo batida pelo presidente do clube. Se machucado, pelo presidente do Conselho Deliberativo.

Se convertemos, com um gol daquele tamanho, nada mais fizemos do que a nossa obrigação. Perdendo, pergunte ao Marquinhos o que ele sentiu quando acertou a trave da Croácia e nos eliminou da Copa do Mundo do Catar.

Certamente, foram angústias vividas em 2022 que nem o Belchior, essa sim uma perda bem maior, estava entre nós para descrever o que passou na cabeça daquele rapaz latino americano, sem parentes importantes e vindo do interior.

Só quem bateu e perdeu sabe do que estou falando.

A propósito, perdemos a decisão e alcancei a proeza, no Flamengo, de ser vice do Vasco. Minhas tias kardecistas não foram escaladas para todas as penalidades.

POR FAVOR, PAREM E PENSEM! AGORA!

por Zé Roberto Padilha

(Foto: Alexandre Durão)

Em algum momento de suas peneiras, em meio a tantas escolinhas espalhadas com sua grife pelo país, um garoto frágil e habilidoso, como Zico, certamente foi menosprezado pelo opção da base em ter no time jogadores altos, fortes e aplicados na marcação.

Alguns hábeis jogadores devem ter ficado pelo caminho.

Sem um olhar para defender a arte, dominadas pelos trogloditas de plantão que privilegiam a força, é duro assistir essa nova geração de esforçados corredores que o clube colocou em campo contra o Audax.

Não há um só atleta que coloque um freio na bola e lhe conceda uma cadência. Que acelere o jogo ou faça a bola circular até achar a hora de dar o bote, conforme o Modric. E demonstre um mínimo de habilidade e categoria para oferecer uma assistência, dar um drible e encantar o torcedor.

Não há um só pensador em meio a tantas pernas que se embaralham com outras numa correria desenfreada.

Eliminados na Copinha pelo Avaí, com um a zerinho suado contra o esforçado clube de Angra dos Reis, o Flamengo, que estreou no Carioca não apenas deixou saudades do Arrascaeta.

Mesmo o aposentado, Diego foi lembrado diante da tamanha falta de um maestro que ordenasse a seus cabelinhos pintados: “Por favor, parem e pensem. Agora!”.

ADEUS, AMIGO

por Zé Roberto Padilha

Era assim que nossos treinadores pediam para fazer: “Não deixem o Roberto chegar perto da área!”. Às vezes, eu, Gerson, Assis e Marco Antonio (foto) exagerávamos. Nessa jogada, Taça Guanabara 74, devo ter lhe acertado por trás. Foi mal.

Nesta hora que você nos deixa, e alcança o plano superior, gostaria de lhe agradecer pelo prazer de ter jogado, desde os juvenis, contra um dos mais talentosos e leais centroavantes que enfrentei em minha carreira.

Minha cidade, Três Rios, que teve a honra de sediar seu casamento com a Jurema, junta-se a todos os que, neste momento difícil, solidarizam-se com os seus familiares.

Descanse em paz meu amigo.