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zé roberto padilha

O TERNO DO PAULO CÉZAR

por Zé Roberto Padilha


O azar dos nossos gênios da bola, entre eles essa dupla aí, é que tinha na ponta esquerda um não tão gênio assim, mas que prestava atenção em tudo. Talvez pensasse que poderia virar um escritor. E contar toda a magia que viu de perto. Na ponta da sua chuteira.

Estava aí ao lado nesse dia. Paulo Cézar Caju embarcava com a Máquina Tricolor. E chegou trajando esse terno. Toninho Baiano, que foi recebê-lo comigo, não perdeu a oportunidade. “Nossa, Paulo, que terno feio!”.

PC nem deixou quicar:

– É baratinho. Cara é a passagem. Veio dali…

Ai Toninho justificou minha vigília por ali. E pegou de voleio:

– Ainda bem. Isto prova que o mau gosto é internacional!

O certo é que o terno nunca mais apareceu.

Quanto ao futebol era até covardia.

Felizmente, os foras de série, ao contrário do terno, um Cristian Dior, eram nacionais.

COMO NÓS PRECISAMOS DE HERÓIS

por Zé Roberto Padilha


A culpa foi do Fantasma, do Mandrake, do Super-Homem e quem mais, durante nossa adolescência, fizesse justiça nas bancas de jornais com as próprias mãos.

Se tinha um cara no colégio que jogava mais do que a gente, outro que disputava a morena mais bonita da sala e o Alcendino, que insistia em tirar as notas mais altas, encontrávamos naquelas páginas os atos de heroísmo que não alcançávamos.

Crescemos assim, trocando de objetivos, ideais e jogando nas costas do Flávio, o Minuano, os gols que nos fariam, como torcedores do Fluminense, mais felizes e campeões cariocas.

Não parou aí. Emerson Fittipaldi, seguíamos pelas Quatro Rodas. O Rei Pelé, pelo Placar, e Michael Jordan num cantinho em que o O Globo reservava para acompanhar o esporte pelo mundo.

Pouco sabiam que um pódio, um gol e uma cesta de três pontos influenciariam o humor e a autoestima na vida de um distante morador de Três Rios.

Hoje, sou uma velha raposa que, num domingo à tarde, ainda liga a TV à procura de atos de heroísmo. Fred, o meu de carteirinha, estava entregue à garra dos baianos na Fonte Nova, mas foi no Gremio que fechei com aquele que tornaria minha tarde mais justa.

Ele se chama Diego Souza. Quase rebaixados, os tricolores do sul entraram contra o Corinthians com a garra que faltou aos nossos. Tão importante o confronto, o repórter informou que até os jurados que julgavam a tragédia da Boate Kiss, em Porto Alegre, suspenderam a sessão.

E esse rapaz, que parece interminável, fez um gol fantástico que deu ao Gremio esperanças de não cair para a segunda divisão.

Obrigado, Diego Souza, que começou em Xerém, e mesmo com as três cores trocadas nos reservou um ato de coragem, conquistado em meio a uma selva de “loucos” torcedores da Fiel.

Boa sorte, Grêmio, mesmo com o empate levado no fim, vocês, além de motivaram nossa tarde esportiva, mostraram a garra e a coragem próprias dos heróis que merecem permanecer na elite do nosso futebol.

PARABÉNS, FLAMENGO!

por Zé Roberto Padilha


Como tricolor, senti uma pontinha de inveja por durante tanto tempo não ver as ruas inundadas com a nossa camisa. E olha que poucos clubes tem uma camisa tão bonita.

Tamanha mobilização, parecia que a partida era pela Copa do Mundo.

Moramos num país em que poucos passam em primeiro lugar em concursos, mas não são capazes de respeitar quando um clube de futebol tira em segundo lugar em toda a América Latina.

Já imaginaram quantos clubes possui a América Latina?

Outra coisa, por que não reconhecer os méritos do adversário e procurar culpados pela derrota. Fazemos isso quando nosso time ganha?

A vitória encobre todos os erros, mas a derrota não pode continuar a encobrir todas as virtudes.

Jogou mal, sim, e daí? O primeiro tempo, então, foi um horror. Mas não acontece no ofício da gente? Pegar uma folha em branco, uma caneta, ter uma ideia na cabeça e não conseguir traduzi-la para o papel?

Inspiração. Essa não está a venda nem no Black Friday.

Não somos robôs, que bom, pra sorte da humanidade, pra sorte do futebol somos Andreas num dia, Deyverson no outro.

A vida continua. As ressacas de quem ganhou ou perdeu vão passar juntas. Quem duvida?

Parabéns Bruno, Aline, Roberta, Priscila, Luísa, Felipe , meio Gabriel, Jane, Daniela, Gustavo e Fabio, a porção rubro-negra da nossa família pelo vice-campeonato. Quem sabe um dia será respeitado?

Parabéns, Flamengo!

O FIM DE UM SONHO OLÍMPICO

por Zé Roberto Padilha


Disputei o Pré-Olímpico e o Torneio de Cannes, em 1971, ambos preparatórios para as Olimpíadas de Munich, em 1972. Como o Fluminense foi campeão carioca Sub-20, em 1970, formamos a base da seleção com seis titulares. Nielsen, Abel, Rubens Galaxe, Marinho, Marco Aurélio e eu.

Ganhamos invictos o Torneio de Cannes e nos classificamos, com alguma dificuldade, no Pré-Olimpico disputado no Paraguai. E foi na partida decisiva, contra a Argentina, que eu assinei meu atestado de óbito. Fui cortado por contusão e permaneci no Rio enquanto meus companheiros de clube partiam para viver o sonho maior de todo o atleta.

Envergonhado, fiquei uma semana sem ir ao Fluminense. E com contrato vigente.

Na véspera da partida, decisiva com a Argentina, nosso massagista preparou o contraste porque eu e o Marinho éramos dúvidas. Ambos lesionados nos tornozelos.

Um balde de água gelada, outro de água quente foram preparados. Você começa no gelo e acaba no quente. Ao final, uma massagem com Reparil Gel e uma atadura de crepe enfaixada para proteção fecham o sofrimento.

Não é um tratamento agradável. Mas funciona.

Entre as camas, minha e a do Marinho, os baldes foram colocados. E fizemos juntos o tratamento. Pela manhã, o médico veio nos avaliar. Vetou o Marinho e ficou impressionado de ver como meu tornozelo desinchara.

– Milagre, Zé! Esta liberado para o jogo!

Tão feliz, dei um salto da cama e fui escovar os dentes antes de ir tomar um café. E ao pisar, soltei um grito de dor. Foi tudo em vão. Passei toda a noite tratando o pé contrário. O esquerdo. A contusão era no direito.

Como faço tudo com a canhota, na hora de começar ela foi acionada por instinto. Daí o pé vai ficando vermelho e você não percebe mais o erro. Tem mais: ainda queimei levemente a inocente canhota que me conduzira com a bola até lá.

Fui motivo de piada, com razão, e sofri bullying, sem razão. Eles foram pra Munich e só me restou retomar os estudos. Fiz vestibular de Direito e comecei a estudar na Universidade Gama Filho. A decepção foi muito grande, precisava procurar um novo ofício.

Só voltei ao clube quando as más notícias começaram a chegar da Alemanha. Houve um atentado terrorista e a nossa seleção bancou o maior vexame de sua história olímpica: perdeu para o Irã e a Dinanarca, e empatou com a Hungria por 2×2. Terminou em último e voltou bem cedo para casa.

– Bem feito!

Essa foi a senha que me levou de volta às Laranjeiras.

Tinha 20 anos e era um ser humano comum.

De carne fraca, ossos dos tornozelos queimados e lesionados, magoado com tudo e que se consolava no fracasso alheio para recuperar a sua autoestima.

“Bem feito!”

ESQUECI DE VOCÊS

por Zé Roberto Padilha


Era, como a maioria, um torcedor apaixonado pela seleção de futebol do meu país. E jamais pensei que uma partida sua passaria ignorada por mim. Fui dormi e nem lembrei, no último domingo, que jogaríamos contra a Colômbia.

Não sei quando nos separamos, mas desconfio dos primeiros sintomas. Tinha 18 anos quando assisti, no auge da repressão militar, as mesmas mãos que decretaram o AI-5 e condenaram o Herzog, receberem dos nossos heróis, em Brasília, a Taça Julio Rimet.

Desceu queimando e fiquei desconfiado. Eles não tinham o direito de usar a nossa mais autêntica arte em prol de encobrir seus escusos objetivos.

Depois, quando todas as classes se envolveram na luta pela redemocratizacao do país, com a exceção da Democracia Corinthiana, não vi nenhum dos nossos selecionáveis subir num palanque pedindo a Anistia.

Muito menos, naquele célebre comício da Candelária pelas Diretas Já, nossa classe colocar sua idolatria na reta.

Depois, os jogadores se afastaram da nossa realidade. Se já não combatiam o aumento da gasolina e do gás de cozinha morando aqui, imaginem quando foram jogar na Euripa recebendo em euros e falando outra lingua?

Hoje, se limitam a desembarcar de jatinho com fones de ouvido, cercado de seguranças para ficar longe do assédio dos torcedores e nem autógrafos assinam. Mesmo porque ninguém quer o autógrafo do Gabriel Jesus.

Enfim, que pena constatar que no país do futebol sua maior expressão, a nossa seleção, pouco significa para sua gente. Não jogam por nós, não lutam por nós, correm pelos seus interesses e desconhecem os interesses daqueles que pagam ingressos para vê-los jogar.

E para quem viu Gerson, e seus lançamentos de 50 metros, Roberto Rivelino, e sua patada atômica, jogar, assistir as limitações da canhota de Lucas Paquetá é desanimador.

E esquecível. Como toda a seleção estrangeira formada por brasileiros que pensa que nos representam.