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zé roberto padilha

TRISTEZA, POR FAVOR, FIQUE DO LADO DE FORA

por Zé Roberto Padilha


Dizem que apenas Deus, e o resultado da Mega-Sena, um titulo alcançado aos 45 minutos do segundo tempo, podem decidir, quem nesta terra dos homens que amam o futebol, e perseguem a sorte, alcançará a felicidade.

Mas naquele domingo, 16 de julho de 1950, ele estaria nas mãos de um simpático e ardiloso mineiro. Seu Chico, radialista da Rádio Pequeri, era quem decidiria se sua gente explodiria de alegria, ou sucumbiria junto a todo país na mais completa dor do holocausto. Digo, perdão, Maracanaço.

No começo da década de 50, nem todos tinham rádio portátil em Pequeri, pequeno distrito de Bicas, zona da mata mineira, que só seria emancipado dois anos depois, localizado a 300 km de Belo Horizonte.

Os que tinham em suas casas, e ouviam a Voz do Brasil, Gerônimo, o Herói do Sertão, Emilinha e Marlene disputando o cetro de melhor voz pela Rádio Nacional, permaneceram desligados. Todos foram convocados para a praça principal para acompanhar pelas cornetas, fixadas aos postes, a final entre Brasil X Uruguai.

Era seu Chico quem comandava o microfone e ele estava inspirado. Era a bola sair pela lateral que ele fazia graça, baixava o volume que vinha da Radio Globo e anunciava um patrocinador.

Nem quando o Uruguai empatou a partida ele esmoreceu. E avisava, interrompendo seguidamente Waldir Amaral e Jorge Curi, onde a maioria das rádios pelo Brasil pegavam caronas: “O empate é nosso, minha gente. Brasil, zil,zil…”

E quando Gighia, aos 34 minutos do segundo tempo desempatou, Chico foi mais rápido do que o porta-voz do Apocalipse. E desligou o botão. E gritou, em nome dos ambulantes, que precisavam vender, da sua gente, tão esquecida, “Acabou! Somos campeões mundiais!”

Se o árbitro sempre dava minutos a mais, porque não posso antecipar alguns e evitar um trauma coletivo? No seu fundo musical certamente se ouvia: “Tristeza, por favor vá embora…”

Dizem, os mais antigos por lá, que a festa vazou a madrugada enquanto todos os 5 mil municípios pelo país ardiam em dor. E Pequeri, em Minas Gerais, foi, por 12 horas, a única cidade a comemorar o primeiro título mundial do futebol.

Quando acordaram e souberam do ocorrido, perdoaram o Chico. Que estava corrido. Para todos eles, foi um sonho vivido, uma festa não interrompida, um pesadelo superado, mesmo porque toda ressaca é ruim com qualquer resultado.

Nada que um Melhoral, quem se lembra, não resolvesse dia seguinte. Mesmo porque a tristeza, a verdade, a realidade nua e Gighia estava a caminho, pelas ondas médias da Rádio Globo, para recolocar a tristeza no seu devido placar.

SANTO EDEMA MUSCULAR

por Zé Roberto Padilha


Melhor do que todas as contratações realizadas este ano, a permanência no elenco de uma das maiores revelações de Xerém, Gabriel Teixeira, foi a grande notícia que nós, tricolores, poderíamos receber neste começo de temporada.

Camisa 10 do elenco Sub-20 que encantou o país, há dois anos, seria um absurdo deixar escapar o que de melhor aquela notável fabrica de talentos, erguida na Baixada Fluminense, tem revelado.

Depois de chegar aos Emirados, de ter sido aprovado no exame do Al Wasl, a Fifa, que se mete em tudo e agora tem um Centro Medico também, detectou o edema e vetou sua contratação.

Posso afirmar que nosso melhor momento, ano passado, foi quando Gabriel Teixeira ocupou o lado esquerdo do ataque e Caio Paulista o direito. E com o Luiz Henrique vindo de trás costurando, Fred voltou a ser o melhor pivô do país. E fomos passando de fases e apresentando, neste breve período, um grande futebol.


Depois esse menino machucou, Nenê foi para o Vasco, trocaram o treinador em plena competição, e aí…

Seja bem-vindo, Gabriel. Quem foi formado nas divisões de base, como fomos, carrega aquele sentimento raro de gratidão, amor ao clube que nos formou e orgulho de defender aquela camisa.

Fora que você joga muita bola e seria um desperdício, para o futebol brasileiro, ver sua categoria ser exibida onde todo o talento emana dos petrodólares e por seus imensuráveis valores serão adquiridos.

CAMPEONATO CARIOCA: O INÍCIO DO FIM

por Zé Roberto Padilha


Não duvidem dos incapazes: se não são competentes, são ousados e atrevidos. E se introduzem no que não sabem porque quem sabe não quer saber.

Exemplo maior é o futebol carioca. Ferido na sua origem, quando acabaram com o futebol do interior, uma fonte inesgotável de craques, e que acaba de receber sua extrema unção quando decidem acabar com a Taça Guanabara.

Vai ser disputado em turno único para se livrarem logo dele no calendário. E priorizar Copa do Brasil, Brasileirão e Libertadores.

De que adianta os clubes cariocas se reforçarem em campo se enviam para o arbitral da FERJ, que decide as regras da competição, representantes insensíveis e incompetentes?

Eles não tem ideia do que é uma Taça Guanabara, o primeiro turno que apontava o primeiro finalista. Disputei três, e nenhuma delas recebeu, na final, um público abaixo dos 100 mil torcedores.

Em 1974, ao lado do Gerson, fomos vice do América. Em 1975, Campeões ao lado de Roberto Rivelino e PC Cajú. E em 1976, vice-campeões, ao lado de Zico e Junior.

Essa bandeira carrego há alguns anos, em textos e livros: se nossos clubes de futebol inevitavelmente são presididos por seus associados, que o Diretor de Futebol seja um ex-atleta, para não permitir tais barbaridades.

Esse é o papel da História: deixar rastros, nas paredes das cavernas, em livros, no coração de quem a viveu de perto, testemunhas reais, para que não sejam apagados pelo descaso.

Se Tita estivesse no arbitral representando o Flamengo, Deley, o Fluminense, Jairzinho, o Botafogo e Waldir, o Vasco, eles jamais permitiriam o fim da Taça GB.

Muito menos, ser desprestigiado desse jeito aquele que era o mais charmoso campeonato estadual do país.

E que, infelizmente, vai sucumbindo diante dos nossos olhos e de uma omissão coletiva.

A FALTA QUE FAZ O TORCEDOR

por Zé Roberto Padilha


Outro dia, conversando com o Dé, o Aranha, essa figura maravilhosa que só o futebol foi capaz de revelar, relembramos uma partida que marcou muito as nossas vidas. Foi um Flamengo 3 X 1 Vasco, terceira rodada da Taça GB, no dia 04/04/76.

O jogo valia apenas os três pontos, não decidia nada, mas os moradores da Cidade Maravilhosa combinaram, depois da praia, ir ao Maracanã. Foi tudo uma enorme coincidência.

Nos vestiários, pelo barulho, já sentíamos que tinha algo diferente acontecendo lá dentro do estádio. E quando entramos, tomamos um susto. Tinham policiais retirando torcedores das marquises. Nunca vimos tanta gente.

Foram 174.465 pagantes, o quinto maior publico da história do Maracanã. Não jogamos, lembramos, levitamos. Foi inesquecível. Não dá para subestimar o calor ao vivo que potencializa o atleta a ir além dos seus limites.

Hoje, porém, no inicio do Campeonato Carioca, O Globo anuncia que teremos o estadual mais rentável financeiramente dos últimos anos. Para isto, todos os esforços foram feitos para ele, torcedor, ficar em casa. Ser apenas um telespectador.

Serão jogos transmitidos por TV Aberta (Record TV), pay-per-view, plataforma oficial (Carioca TV), canais dos clubes, além da “transmissão bet” e quatro canais de streaming.

Cada vez mais retiram dos estádios o calor do torcedor. O poder, a empatia, a cumplicidade até de uma vaia que chegam até os artistas principais. Seus desempenhos pouco importam. O que vale é o lucro.

Sabe, Dé, se eles soubessem o quanto essa emoção nos faz jogar melhor…mas aí não seriam cartolas. Seriam dirigentes. E como eles fazem falta na organização do futebol brasileiro.

A ordem, a partir de hoje, é esquecer o ingresso. Comprar pipocas, latas de Brahma, reunir os amigos. E pagar caro para ver de longe a falta que todos eles nos fazem por perto.

A CONTA CHEGA

por Zé Roberto Padilha


Jogara toda a Taça GB 74. Carlos Alberto Parreira no comando, Gerson no seu último ano, Cleber e Pintinho voando nos seus primórdios.

Na última partida antes da final, contra a Lusa, meu tornozelo direito encontrou um buraco. O Maracanã naquele tempo tinha buracos. E ali fraturei o maléolo. Muito grave.

Fora da final, o Fluminense perdeu o título para o América, eu minha maior promoção. No vestiário da derrota, Parreira explicava: “Faltou o Zé Roberto!!”

Quase meio século depois, veio a conta. Como em toda profissão. Tomado pela artrose, desembarquei no Rio em busca de um especialista. Se a medicina esportiva não conhecia os parafusos que o fixaria corretamente, agora precisa dar um jeito de amenizar as consequências.

Como evitar que a gente caminhe com dificuldades. Segundo Henfil, no Pasquim, a gente só percebe que está mancando quando as crianças começam a nos atirar pedras.

Eu lembro do Coca-Cola, saco nas costas, barba na altura do peito, andando a esmo pelas ruas de Três Rios e toda a molecada, eu no bolo, correndo atrás.

Como disse, as contas e as pedras, os buracos no campo e o desrespeito com os mais sofridos, chegam um dia para qualquer um.