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Vozes da Bola

VOZES DA BOLA: ENTREVISTA PITA


Algumas palavras são fáceis de serem encontradas no dicionário e basta uma procura despretensiosa para conhecer a sua etimologia. Pita é, segundo o seu significado, um pão achatado, arredondado, com uma massa muito fina e leve, geralmente, dobrado em envelope e servido com recheio.

Pita foi um meia com uma massa de 81 quilos muito fina, com 1,76 metro de altura de pura leveza. Seu futebol dobrado em dois tempos de 45 minutos cada, servidos com recheio de jogadas plásticas e gols antológicos.

Camisa 10, jogador de cabeça erguida que arquitetava lances mirabolantes como se fossem projetos pessoais inacabados que resultavam em gols.

Arquiteto dos bons e de belos gols, e põe belos gols nisso! Como aquele tento marcado no Campeonato Brasileiro contra o Palmeiras, em 16 de março de 1985, no empate de 4 a 4. Neste dia, Pita fez um gol de placa quando driblou toda a defesa do Alviverde, inclusive, o goleiro Leão e só não entrou com bola e tudo porque teve humildade.

Quando lhe perguntavam como foi o gol a resposta era um sorriso tímido. Sua categoria fez com que Ailton Lira, ao voltar ao time alvinegro praiano depois de uma longa suspensão, dissesse ao técnico Formiga: “Dê a camisa 10 para o garoto. Ele merece”.

Mas o nilopolitano Pita nasceu Edivaldo Oliveira Chaves, em um 4 de agosto de 1958, e passou a maior parte da infância vendendo siris às margens da rodovia Anchieta. Morou em Cubatão, uma das cidades mais poluídas do mundo à época, mas a categoria cristalina da perna esquerda o levou ao juvenil do Santos. Uma de suas inspirações era o ponta-esquerda Edu que formava aquele ataque mortal do Santos com Pelé e Coutinho.

O ‘último romântico’, como era chamado pelo ex-treinador Cilinho (1939-2019), no São Paulo, foi o primeiro jogador a vestir com maestria a camisa 10 do Santos, após o Rei do futebol encerrar sua carreira pelo Peixe, em 1977.

O Museu da Pelada tem a honra de entrevistar para a série Vozes da Bola, o craque Pita, que chegou a ser comparado ao francês Michel Platini, quando vestiu a camisa do Racing Strasbourg e foi representante da primeira geração dos ‘Meninos da Vila’.

Por Marcos Vinicius Cabral

Edição: Fabio Lacerda


Você teve uma infância muito difícil em Nilópolis, região metropolitana do Rio de Janeiro onde nasceu, e em Jardim Casqueiro, bairro pertencente a cidade de Cubatão, em São Paulo, onde morou. É verdade que você chegou a vender siris? Gostaria que nos contasse um pouco sobre isso.

Eu só nasci em Nilópolis, na Baixada Fluminense, e cheguei no Jardim Casqueiro, em Cubatão, com um ano de idade. Na verdade, eu vendia siri para brincar com meus amigos, já que era um garoto e essa brincadeira era comum entre nós. Não foi por necessidade. Nada disso! Meu pai trabalhava na Petrobras, e apesar de termos uma vida simples, era uma vida sem luxo mas tranquila financeiramente falando.

Aos 13 anos de idade, você foi convidado a disputar um campeonato de futebol na praia e se destacou. Como foi isso?

Sim. Fui destaque a ponto de ser convidado por um observador da Portuguesa Santista, onde dei meus primeiros chutes numa bola de futebol. Eu joguei um ano pela Portuguesa Santista, no campeonato de praia, em Santos, onde me destaquei, e quando menos esperava, surgiu o Olavo Martins, treinador do juvenil do Santos e me faz o convite para treinar na Vila Belmiro. Graças a Deus fui bem recepcionado por todos os garotos de lá, pelo próprio treinador, e não senti nada.

Muito antes de surgirem os ‘Meninos da Vila’ com Diego e Robinho, em 2002, ou com Neymar e Paulo Henrique Ganso, em 2010, existia jovens talentosos como você, Juary, João Paulo e Nílton Batata, que em 1978, também eram considerados ‘Meninos da Vila’. Na sua opinião, o Santos sempre foi um clube revelador de talentos? E como foi ser revelado por lá?

É do DNA do clube, revelar bons jogadores. Eu acho que ficando nas categorias de base do clube por três anos surgiu a primeira geração de ‘Meninos da Vila’, que teve eu, Juary, Gilberto Costa, Célio de Oliveira, Zé Carlos e outros craques. Formamos a primeira geração que recebeu a alcunha de ‘Meninos da Vila’. Depois, vieram esses que você citou na pergunta que foram excepcionais também. Mas o Santos vai sempre estar revelando jogadores para o futebol brasileiro. Faz parte de seu DNA e isso não se pode mudar.

No Santos, você esteve de 1978 a 1984, ou seja, seis anos e com um título apenas conquistado, o Paulista de 1978. Não acha que foi pouco pelo jogador que você foi?

Eu joguei de 1978 a 1984, e acho que foram seis anos de muitas conquistas. Conseguimos ser campeões Paulista em 1978, e logo após, houve muita mudança de jogadores, que acabaram deixando o clube. Mesmo assim, fomos vice-campeões Paulista em 1980 e vice-campeão Brasileiro em 1983. Acho que chegamos em três decisões, e naquela época, logo que surgiram os meninos no Santos, houve vendas. Mas acredito que em seis anos, foram três decisões em que joguei e que ganhei apenas uma. Mas foram seis anos maravilhosos no Santos.

Você chegou no São Paulo em 1984, conquistou o campeonato paulista de 1985 e o segundo título nacional do Tricolor Paulista, em 1986. Apesar das conquistas, quase deixou o Morumbi por problema de relacionamento com o técnico Cilinho. O que aconteceu naquele episódio que a diretoria teve que bancar sua permanência no clube?

Eu fui vendido para o São Paulo em 1984, e acho que era o momento adequado de sair do Santos. Estive um bom tempo no Peixe, vivi uma fase extraordinária no clube e chegando no São Paulo encontrei grandes jogadores, como Oscar, Darío Pereyra, Careca e Renato “Pé Murcho”. Depois, mais tarde surgiram grandes talentos como Muller, Silas, Sidney, Nelsinho, então, formou aquele grande time que ficou conhecido como os ‘Menudos do Morumbi’. Fomos campeões Paulista em 1985 e 1987, Brasileiro em 1986. Em 1985, na verdade, não foi um desentendimento com Cilinho. Nada disso! Na decisão do Paulista de 1985, ele preferiu colocar o Falcão e me sacar do time. Achei que a minha barração naquele momento foi injusta. Vivia um excelente fase, tanto fisica, como tecnicamente. Foi isso. Admito que eu já pensava em sair do São Paulo, mas aí, o presidente Carlos Miguel Aidar e o Juvenal Juvêncio, me chamaram para conversar e acertamos nossa permanência. Tanto que fiquei no clube, voltei a jogar, conquistamos títulos juntos e acabou sendo uma coisa boa para mim e para o São Paulo.

Em 1987, mais um Campeonato Paulista para o currículo e o reconhecimento como craque pela exigente torcida tricolor. Como foi para você ser ídolo nesta imensa galeria de tantos outros nomes marcantes na história do São Paulo Futebol Clube?

Sem dúvida! Eu acho que esses anos no São Paulo, onde conquistei títulos, o carinho e o reconhecimento da torcida, foram inesquecíveis. Em 1987 foi muito especial. Foi um ano tão marcante, que minhas atuações levaram-me à Seleção Brasileira para disputar o Pan-Americano. É um orgulho, uma satisfação, fazer parte dessa história de grandes jogadores que passaram aqui no Morumbi e escreveram seus nomes na história do São Paulo Futebol Clube.

Ainda sobre o São Paulo, em 2012, você foi contratado como observador do clube. No entanto, acabou demitido em janeiro de 2016. Passados quatro anos, já te disseram o motivo da demissão? Ainda guarda mágoa do clube?

Não. Isso é passado. Entrei no São Paulo em 1996, fiquei até 2000, e depois sai e voltei algumas vezes. Em 2012, com o Juvenal Juvêncio, sendo observador técnico dele. Em sua saída, houve essa mudança e sem ser avisado fui parar no RH e demitido. Mas eu tenho muita gratidão pelo São Paulo e nenhuma mágoa. Apenas achei uma falta de consideração a maneira como foi feita a coisa e não por eu ser o Pita. Acho que faltou um pouco de respeito! Mas tenho uma imensa gratidão pelo clube. Para ter uma idéia, eu já retornei ao clube e zero de mágoa nesse episódio. Aproveito essa oportunidade por meio dessa entrevista para vocês, do Museu da Pelada, para agradecer a todos que me deram essa oportunidade. Então, depois que eu parei de jogar futebol, iniciei uma carreira dentro da base, que é um clube revelador de talentos para o futebol brasileiro e internacional. Quero deixar registrado minha gratidão ao clube.

Você jogou no futebol francês, no Racing Strasbourg, e ficou lá por três temporadas. Como foi viver essa experiência e é verdade que a imprensa local chegou a compará-lo a Michael Platini?


Em 1988, eu fui vendido para o Racing Strasbourg, que era uma equipe recém promovida à primeira divisão. Foi uma mudança que senti muito, pois aqui no Brasil eu jogava para disputar títulos e lá comecei a jogar para não cair para segunda divisão. Vale ressaltar que foi muito boa a experiência, joguei lá durante dois anos, e os primeiros seis meses foram os mais difíceis por causa da adaptação devido ao frio intenso e o idioma. Comecei a sofrer com as contusões que aqui no Brasil era raro eu ter, mas depois que comecei ter uma sequência de jogos, eu realmente vivi grande fase no clube e cheguei a ser comparado ao Platini. Mas acredito ter deixado uma boa impressão nessa minha passagem pelo clube francês e ser comparadomaqior jogador francês da época. 

Como surgiu o apelido Pita?

O apelido Pita vem de infância. No meu nascimento, meu pai queria colocar meu nome de Pitácio, em homenagem ao meu avô, e como minha mãe não quis, e me deu o nome de Edivaldo. Esse Pita foi desde minha época de criança e acabou pegando. Hoje, graças a Deus, onde eu vou, os amantes do futebol conhecem o Pita e não o Edivaldo.

Na Seleção você se sagrou campeão Pan-Americano de 87, mas por que jogou apenas sete partidas com a Amarelinha?

Na Seleção, eu estive em 1980, convocado por Telê Santana, e em 1982. Joguei a partida amistosa contra o Uruguai, vencemos por 1 a 0, no Castelão, em Fortaleza, fui muito bem e acabei não jogando mais por causa daquela grande Seleção que tinha. Sinceramente, eu acho que merecia ir para a Copa do Mundo na Espanha, mas acabei não indo. No ano seguinte, voltei a vestir a camisa da Seleção Brasileira com o Carlos Alberto Parreira jogando algumas partidas. Em 1986, mesmo vivendo grande fase, não fui chamado, e entendo que talvez o Telê Santana não gostasse do meu futebol, ou eu não me enquadrava dentro do esquema tático que ele quis implantar nos campos mexicanos. Mas em 1987, um ano maravilhoso que eu tive no São Paulo, voltei à Seleção, disputei o Pan-Americano de Indianápolis e fui campeão. Mas analisando minha passagens defendendo o país, acho que foi com o Carlos Alberto Silva que conquistei, ao lado de meus companheiros, a medalha de ouro.

Podemos dizer que o gol que você marcou contra o Palmeiras, em 1985, no empate por 4 a 4, no Pacaembu, quando você fez uma fila de palmeirenses, entre eles os volantes Paulinho e Rocha, driblou o goleiro Emerson Leão e empurrou para as redes, é o mais bonito da sua carreira?

Esse gol contra o Palmeiras foi um dos mais bonitos da minha carreira. Eu era um meia com muita facilidade em driblar e tem inclusive outros gols que fiz parecidos com este citado por você. Mas esse tem sua relevância, já que foi num clássico pelo Campeonato Brasileiro e no Pacaembu. A recordação que tenho é que o gol foi uma jogada iniciada no meio de campo em que driblei o Paulinho e o Rocha, depois o Vagner Bacharel e o Toninho. Por fim, o Leão, antes de tocar para o fundo das redes. Sem dúvidas que foi o gol mais bonito da minha carreira.

O que o futebol representou para o Pita?

Representou muita coisa na minha vida, e modéstia à parte, acho que eu representei muito para para os clubes do futebol brasileiro. No Santos, sinto muita gratidão e muito orgulhoso em fazer parte dessa história do clube, ser mais um nessa constelação de craques do passado. Já no São Paulo, meus mais sinceros agradecimentos, pois só tenho boas recordações do clube do Morumbi. Acho que honrei as camisas que vesti e representei a essência do futebol arte, jogado com alegria, prazer, técnica e com habilidade. Por isso, acredito que os jovens se espelhavam no Pita dentro de campo. Mas o futebol representou muita coisa para mim e eu pude retribuir, contribuindo para os mais jovens nesses dois grandes clubes do país em que passei.

Como tem enfrentado esses dias de isolamento social devido ao Coronavírus?

Eu tenho ficado, desde o começo da pandemia, a maior parte do meu tempo no meu sítio em São João da Boa Vista. Como as coisas começaram a melhorar, fui morar em Cotia, na Região Metropolitana da cidade, entre a capital e o interior. Depois de um certo tempo, eu vim trabalhar no São Paulo, onde sou o coordenador de captação. Mas realmente foi um momento muito ruim para todos, e nós aqui do clube, esperamos que surja a vacina. Esperamos que isso volte a se normalizar o mais rápido possível no mundo.

Quem foi seu melhor treinador?

Tive grandes treinadores que fizeram parte da minha vida. No Santos eu trabalhei com o Formiga entre 1978 e 1983, o Pepe e Cilinho no São Paulo. Os três foram os mais marcantes para mim, mas o Cilinho foi um treinador mais moderno com uma metodologia de trabalho diferente e foi um pouco mais especial. Por isso, coloco o Cilinho numa prateleira acima dos outros citados e como o melhor treinador com quem eu trabalhei.

Você jogou numa época em que cada clube tinha um camisa 10 que causava medo. Na sua opinião, por que esse número está em extinção nos clubes?

Verdade. Havia nos grandes clubes um grande camisa 10. Eu no São Paulo, Mário Sérgio no Palmeiras, Zenon no Corinthians, Dicá na Ponte Preta, Aílton Lira no Guarani, Assis no Fluminense, Roberto Dinamite no Vasco, Zico no Flamengo, Mendonça no Botafogo, e tantos outros camisas 10 que realmente causavam medo. Era necessário marcá-los em cima. Hoje, eu não sei o que aconteceu no futebol, que surgiram poucos como o Alex, o Djalminha, o Ricardinho, e outros jogadores. Eu acho que o importante é incentivar esses garotos que chegam na base a desenvolver as qualidades necessárias para serem um camisa 10. Vale frisar que quando surge um garoto com essas qualidades de saber chegar na área, lançar, cobrar faltas, ter boa visão de jogo e decidir partidas, é importante incentivá-lo e treiná-lo. Sinceramente, eu acho que é a grande dificuldade encontrar este talento nas cateforias de base. 


Quem foi seu ídolo no futebol?

Jonas Eduardo Américo, ou Edu, como queiram, ponta-esquerda do Santos. Eu lembro que quando eu jogava na base e fazia a preliminar, ficava assistindo ele jogar. Gostava tanto, mas tanto do seu futebol, que mudava de lado na arquibancada para ver de perto ele jogar. Para mim, foi um dos grandes jogadores que tive a felicidade de ver atuar. Edu era gênio!

Você ainda defendeu o Guarani, de 89 a 90, e depois foi jogar no Nagoya Grampus, do Japão, onde ficou de 90 a 93, para encerrar a carreira na Internacional de Limeira em 94. Qual o balanço que você faz da sua carreira como jogador de futebol?

De forma positiva. Posso dizer que foi uma trajetória no futebol vencedora. Comecei no Santos, o clube que eu torcia em virtude dos grandes times que vi jogar, e me alegra muito saber que marquei época no clube. Depois no São Paulo, um clube maravilhoso que eu tenho um carinho enorme e que marquei época também, pude chegar à Seleção Brasileira vestindo a camisa Tricolor. É lógico que nem tudo é do jeito que a gente espera, pois não disputei uma Copa do Mundo, que é o objetivo de todo atleta, porém, consegui conquistar uma medalha de ouro no Pan-Americano de Indianápolis em 1987, nos Estados Unidos. Já a minha passagem na Europa foi boa, pois na França consegui jogar um bom futebol. No Guarani, fiz parte de um time que fez uma grande campanha, mesmo não tendo conquistado o título. Eu costumo dizer que quando o clube é campeão você sempre marca, mas mesmo sem o título foi uma boa passagem lá em Campinas. Nos meus três anos de Japão, país em que fui bem recebido e tenho muita gratidão, foi uma experiência fantástica. Em 1994, surgiu a oportunidade de ir para a Inter de Limeira, fiz um contrato curto para ver se ainda existia dentro de mim aquele amor em jogar futebol. Mas como não senti isso, de disputar jogos, de concentrar, acabei achando melhor parar. Mas tenho muita gratidão a Deus por tudo que Ele me proporcionou na carreira e pela rica experiência em ter passado pelos lugares em que passei. No meu modo de pensar, foi uma carreira vencedora.

Defina Pita em uma única palavra?

Família.

VOZES DA BOLA: ENTREVISTA PAULO SÉRGIO


Santa Teresa é um bairro situado no topo de uma colina com uma atmosfera encantadora, ruas íngremes e sinuosas, ladeadas de mansões antigas e elegantes, muitas com hotéis, bares e restaurantes com vista para a baía.

Mas o bairro de tantas belezas naturais e arquitetônicas escondia um menino, então, com 14 anos, que era goleiro do Capri e destaque nos campeonatos promovidos pelo Jornal dos Sports, no Aterro do Flamengo.

Numa dessas partidas, Paulinho – que apesar de ser chamado no diminutivo, se agigantava – chamou a atenção de um senhor conhecido como Farias, à època, técnico do dente de leite do Fluminense.

Era 1968, quando colocou as ‘mãos’ pela primeira vez nas Laranjeiras, e anos depois, conduzido por Pinheiro (1932-2011), ex-zagueiro e ídolo Tricolor, passou a conviver com Félix, Carlos Alberto Torres, Edinho, Rodrigues Neto, Marco Antônio, Marinho Chagas, Dirceu, Zé Mario, Pintinho, Rivellino, Paulo Cezar Caju, Gil e outras peças que eram consideradas a engrenagem de uma máquina de jogar futebol na década de 1970. 

Era um plantel que havia 16 jogadores com passagens pela Seleção.

No entanto, a idade, felicidade, vontade, identidade, plasticidade, elasticidade e a eletricidade demonstradas pelo camisa 1 embaixo das traves nos campos do Aterro não foram suficientes para fazê-lo assumir a titularidade: era o quarto goleiro, atrás de Félix, Roberto e Nielsen.

Sua estreia coincide com a de Rivellino na goleada por 4 a 1 sobre o Corinthians quando o Fluminense mandou abrir alas que a ‘Máquina Tricolor’ estava colocando seu bloco na rua no dia 8 de fevereiro de 1975.

Paulo Sérgio substitituiu Roberto na etapa complementar do clássico que marcava a chegada de Rivellino ao Rio de Janeiro como uma das transações mais fenomenais da história do futebol brasileiro.

Era sua redenção?

De forma alguma! Acabou preterido do clube onde deu suas primeiras espalmadas numa bola.

Foi em busca de novos caminhos e chegou em Maceió para defender o CSA e na volta ao Rio de Janeiro, jogou pelo Volta Redonda, Americano, Botafogo.

Saiu para o Planalto Central para fechar o gol no Goiás, e voltar à sua cidade natal para jogar no América e Vasco da Gama.

No Glorioso, – clube que o levou à Copa do Mundo da Espanha em 1982, sendo reserva de Waldir Peres – viveu a melhor fase na carreira e deixou sua superstição aflorada quando entrava no ônibus do clube e sempre sentava na poltrona 21, onde não abria mão de jeito nenhum em dias de jogos.

Econômico em títulos nos 16 anos que passou no futebol de campo – apenas conquistou a Taça Guanabara em 1986 com o Vasco – não lhe restou outra profissão a escolher antes de ser hexacampeão no Beach Soccer de 1994 a 2000: virou economista, formado pela Faculdade Cândido Mendes, em 1987!

Paulo Sérgio de Oliveira Lima não foi o ‘Anjo Irônico’ com 1,85 metro de altura, pernas arqueadas, cabelos vermelhos encaracolados e que jogou no Bayern Munique-ALE em toda carreira chamado Seep Maier.

Também não foi o sempre bem colocado e de defesas incríveis que viveu o apogeu no Vasco da Gama, clube que lhe proporcionou título e prêmios pessoais de nome Andrada (1939-2019), goleiro argentino mais conhecido por ‘El Gato’, e que por um triz não pegou a cobrança de Pelé que originou o milésimo gol do Atleta do Século XX.

Não, não foi de forma alguma Seep Maier – a quem considera o maior goleiro – e Andrada – seu ídolo.

No entanto, fez história como um dos maiores goleiros do futebol brasileiro.

O Museu da Pelada bateu uma bola com o dono da poltrona 21 do ônibus do Botafogo de Futebol e Regatas, e que coincidentemente, foi o número de anos que o Alvinegro de General Severiano ficou sem levantar um troféu de campeão.

Superstições à parte, o goleiro Paulo Sérgio é o nosso vigésimo personagem do Vozes da Bola desta semana.

Por Marcos Vinicius Cabral

Edição: Fabio Lacerda

Como foi o início de carreira?

O início da carreira, como a maioria dos garotos, era no time do bairro. Era o Capri, de Santa Teresa. A gente disputava os tradicionais campeonatos no Aterro do Flamengo promovido pelo Jornal dos Sports. Numa dessas partidas, um senhor chamado Farias, que era o técnico do dente de leite do Fluminense, me viu jogando e me levou para as Laranjeiras. E foi dessa forma que dei início a minha carreira. Das pelas peladas no Aterro do Flamengo para o Fluminense.

Você começou no Fluminense em 1972, mas teve o talento ofuscado por Félix, goleiro tricampeão mundial na Copa do Mundo de 1970. Como encarou ser reserva dele e como era a relação entre vocês?


Comecei no Fluminense em 1972, apesar de ter iniciado no dente de leite em 1968, passando em seguida para o futebol de salão. O senhor Farias me colocou para jogar futebol de salão para que eu não saísse das Laranjeiras. Quando deu minha idade para o juvenil, o Pinheiro, ex-zagueiro do Fluminense, que era o técnico, me levou para os profissionais. Da pelada de campo no Aterro fui convocado por um dos maiores nomes da história do clube para integrar a equipe do futebol profissional. Joguei todos os campeonatos juvenis com a camisa Tricolor e quando estourei a idade passei para o time profissional. Fui reserva do Félix, tricampeão do mundo em 1970. Vale ressaltar que quando cheguei às Laranjeiras, era o quarto goleiro – Félix, Roberto, Nielsen, e eu. Tive a honra de jogar na Máquina Tricolor de 1975. Neste momento ganhei muita experiência. Tinha ao meu lado craques como Rivellino, Gil, Pintinho, Paulo Cezar Caju, Edinho, Carlos Alberto Torres e outros grandes jogadores. Mas a minha relação com os outros goleiros era ótima. O Félix era um professor. Foi primordial para minha evolução.

Seu pai Osmar foi seu grande incentivador?

Sem dúvida. Ele quem me levava para os jogos no início da minha carreira no juvenil, e quando cheguei no profissional, eu não deixava ele assistir mais meus jogos porque ele ficava muito nervoso (risos). E me transmitia nervosismo também. Meu pai foi minha fonte de motivação.

Qual o motivo de ter saído do Fluminense em 1976 para jogar no CSA?

Eu saí do Fluminense em 1976 e fui emprestado para o CSA. O Pinheiro, que havia sido meu treinador no juvenil, falou que por ser o quarto goleiro, seria muito difícil eu vestir a camisa número 1 do Fluminense. Naquele momento, uma saída para mim seria bom para eu pegar experiência, jogar em um outro time, disputar outros campeonatos, conhecer um outro universo no futebol. E de fato esse empréstimo me ajudou. Fez um ter maios oportunidades e ter uma vida pessoal sozinha, por exemplo. Eu tinha que me virar! Em tudo na vida eu sempre tive esse lado que eu considero positivo: extrair sempre algo bom das oportunidades e foi assim no CSA, em 1976. Quando eu voltei, o Fluminense acabou me dando passe livre e num primeiro momento fiquei completamente desnorteado. Era garoto ainda, tinha grandes aspirações no futebol e queria ser um grande goleiro e vencer nesse esporte. Lembro foi uma barra. Eu cursava o terceiro grau à época fazendo Arquitetura e passei para Economia. Aí eu pensei: “Poxa vida, o Fluminense me mandou embora, acho que eu não vou ter mais chances. O que vou fazer?”, perguntei para mim mesmo. Fui no clube e pedi para me deixarem ficar treinando para eu ter um condicionamento físico até aparecer um clube interessado em minha contratação. Foi isso.

Como tem enfrentado esses dias de isolamento social devido ao coronavírus?

Desde março que estamos trabalhando home office e na TV, tenho feito meus comentários de casa. É utilizando o distanciamento, máscara para todos os lugar quando eu tenho que sair, e me exercitando na medida do possível. No início do ano deixei de ir para academia, aluguei uma bicicleta ergométrica da academia e faço meus treinamentos em casa. Mas de vez em quando, monto um circuito e faço meu treinamento em um campo de futebol que tem perto de casa e fico sozinho fazendo. Essa foi a forma que encontrei para enfrentar o isolamento e o distanciamento social. A vida profissional segue tendo todos esses cuidados e a vida social em casa assistindo TV, lendo livros e estudando.

Antes de chegar no Botafogo, você passou primeiro pelo Volta Redonda e depois no Americano, até ser contratado em definitivo pelo Glorioso no início de 1980. Como foi jogar em dois clubes considerados de menores investimentos, embora cidades importantes para a Economia do Estado? Já que cursou Economia!? (risos)?

Foi o Félix. Ele apareceu mais uma vez na minha vida e falou: “Paulinho, o Volta Redonda tá querendo me contratar e eu não vou, mas vou te indicar. Você quer?”, perguntou-me. Aceitei de imediato. Fui para o Volta Redonda e até hoje não esqueço que quando cheguei no clube para acertar o contrato o presidente disse: “A gente queria o Félix, mas ele indicou você, e a gente realmente tá precisando de um terceiro goleiro” (risos). Caramba! Terceiro goleiro do Volta Redonda, foi o que pensei! Mas tudo bem! Vou tentar mais esse ano. Foi em 1977. Eu vou tentar, se der continuidade na carreira, ok! Caso contrário, continuo dando seqüência aos estudos. E graças a Deus, deu tudo certo, eu passei pelo Volta Redonda, depois pelo Americano, e vale um registro. Esses dois clubes foram muito importantes na minha carreira profissional. Além de me dar visibilidade, porque eu jogando diretamente no Campeonato Carioca, e enfrentando os grandes clubes, é óbvio que você é muito atacado e estando bem fisicamente, você acaba se destacando. E foi exatamente isso o que aconteceu, fiz grandes partidas no Volta Redonda e no Americano e chamei a atenção de muitos clubes que começaram a ver no goleiro Paulo Sérgio um grande goleiro. Já o interesse do Botafogo surgiu após eu fechar o gol numa no Maracanã. Sabe aqueles dias em que tudo dá certo? Pega até pensamento? Foi desse jeito. Estávamos dentro do vestiário comemorando a vitória e tomando banho. De repente, veio Sebastião Leônidas (um dos maiores zagueiros da história do Botafogo que foi contratato junto ao América, campeão de 1960, para substituir o Nílton Santos) que havia sido meu treinador no Volta Redonda e ele era auxiliar técnico do Botafogo. Aí ele falou: “Paulinho, o pessoal do Botafogo tá querendo conversar com você, está querendo te contratar”, disse. Fiquei feliz, mas como estava com o contrato até dezembro com o Americano, mas nada que impeça de conversarmos. E foi o que ocorreu. Numa folga minha fui conversar com o Rogério Corrêa, que era o vice-presidente do Botafogo. Fui em sua casa e acertamos o contrato. Isso era em setembro, meu contrato com o Americano foi cumprido até o fim de ano, religiosamente, e em janeiro de 1980, me apresentei ao Botafogo para retornar a um grande clube do país. 

É verdade que quando o Botafogo vencia, você repetia o mesmo uniforme para o próximo jogo, e no ônibus do time, fazia questão de ocupar sempre a mesma poltrona, a de número? Você era supersticioso mesmo?

Sou supersticioso sim e fiquei muito mais quando cheguei no Botafogo! Gostava de cuidar do meu uniforme todo. Trazia para casa e a minha mãe que lavava. Repetia o uniforme quando eu atuava bem na última partida. Eu era tinhoso! Fazia tudo da mesma forma (risos): as mesmas luvas, o mesmo calção, a mesma camisa, os mesmos meiões, e era tudo certinho. Já o lance da poltrona 21 é a mais pura verdade, já era cadeira cativa. E tinha uma outra superstição que você não abordou na sua pergunta e que eu era sempre o último a sair do ônibus. E aí todo mundo brincava comigo. Teve uma vez que foram me pregar uma peça, e o pessoal se escondeu lá atrás no ônibus. Olhei, já tinha todo mundo saído. E ao descer do ônibus o pessoal começou a me zoar e por coincidência o time acabou perdendo. Só sei que eles nunca mais fizeram isso e deixaram eu e as minhas superstições da poltrona 21 e sair por último em paz (risos).

O Maracanã soprou 70 velhinhas. Quais são as suas primeiras lembranças como jogador no estádio?

Poxa vida, foi no Maracanã onde eu tive as melhores atuações e o privilégio de jogar com 180, 190 mil pessoas! Impossível hoje em dia em função da redução de sua capacidade. Mas foram bons tempos. As arquibancadas estavam lotadas e podia, inclusive, conversar com alguns torcedores que ficavam nas gerais e os repórteres atrás do gol. Que saudades, cara!

Qual foi o maior goleiro que você viu no futebol?


Foi o Sepp Maier da Alemanha. Eu olhava e o achava um goleiro excepcional, apesar de meu ídolo na posição ter sido o goleiro Andrada do Vasco. Eu achava ele com o biotipo muito parecido com o meu, um goleiro baixo e muito ágil. Lembro das vezes que fui ao Maracanã só para vê-lo jogar. Ficava atrás do gol olhando seu posicionamento e como ele jogava. Como ídolo foi o Andrada, no entanto, o maior de todos foi o Seep Maier.

Em 1981, com a camisa 1 da seleção brasileira, você enfrentou a França, no Estádio Parc des Princes, em Paris. Quais as lembranças daquela partida?

Foi a minha estreia na Seleção Brasileira contra a França na excursão pela Europa. Convocado pelo saudoso Telê Santana. Além da vitória contra a França, que no ano seguinte foi à semifinal da Copa do Mundo da Espanha, ganhamos da Inglaterra,, em Wembley, e da Alemanha, em Stuttgart. Para mim foi especial. Primeiro que nesse mesmo jogo, o Zico marcou seu gol de número 500, e antes da partida, o Pelé recebeu o troféu de ‘Atleta do Século’. Lembro que ele passou perto de mim e até brincou comigo quando estava aquecendo: “O menino, não vai tremer não, né?”, perguntou sabendo que era minha estreia. Imagina, um garoto que estava até pouco tempo atrás no Volta Redonda e no Americano e tendo a chance na Seleção Brasileira. E o nosso Rei vira e fala isso para você? Mas foi uma estreia muito boa, marcante e a vitória por 3 a 1 contra uma grande equipe da França que tinha Platini, Gérard, Tigana, Trésor e Didier Six. Mas a nosso time era muito bom também.

Em grande fase, convocado, você foi reserva de Waldir Peres na Copa do Mundo da Espanha, em 1982. Foi uma injustiça aquele time não ganhar o título pelo futebol que jogou?

Sim, foi injusto, apesar de achar que não existe justiça no futebol. Foi um dia em que não fomos felizes e acabamos sendo derrotado pela Itália, que tinha um time muito bom, mas o nosso time era bem superior. Acredito, inclusive, que em condições normais, e sem cometer erros como aconteceu nesta partida, acho que nós seríamos merecedores da vitória, e consequentemente, do título, pois o nosso time era muito bom.

“Depois do nosso primeiro compromisso na Copa do Mundo de 1982, passei um dia inteiro tentando convencer o Waldir Peres de que ele não tinha falhado no gol da União Soviética”, disse você à Placar de 20 de agosto de 1982. Como era a relação sua com o nosso camisa 1 e titular do Brasil naquela Copa do Mundo?

Ótima. Nossa relação era ótima. Depois do primeiro jogo na Copa do Mundo de 1982, em que o Waldir Peres falhou no jogo contra a União Soviética, todo mundo ficou ventilando que eu ia jogar, que eu ia entrar e que ele falhou. É lógico que a minha vontade era de jogar, claro, eu queria ser titular, mas quando você trabalha, com senso coletivo bem desenvolvido, sinceramente, seria injusto da minha parte assumir a posição por causa de uma infelicidade do companheiro. Jamsia apunhalaria o Waldir Peres ou outro goleiro para tentar sobrepor-me diante de uma falha que acontece com todo o goleiro. E revelo para vocês, do Museu da Pelada: eu dei força para ele no nosso reservado e para os outros eu falei que ele não havia falhado, mas obviamente, que ele falhou. No chute, tecnicamente falando, ele fez uma entrada errada na bola, e a gente conversou internamente sobre isso. Lembro que eu falei para ele: “Waldir Peres, eu e o Carlos estamos aqui para te dar força, mas se o Telê me chamar para jogar é lógico que eu vou, mas estamos aqui para te apoiar e dizer que estamos contigo”. 

A última sobre 1982: você pode nos contar como era fazer parte daquele grupo? Como era o ambiente? Todos ali se davam bem de verdade? Telê realmente era muito fechado?

O grupo de 1982 era brincadeira (gíria carioca para designar algo único, que designa alto nível de pessoas)! Depois da Seleção Brasileira de 1970 foi o grande grupo de uma Seleção Brasileira de todas as que participaram de Copas do Mundo. A Seleção de 1970 era grande, e a de 1982 também. Eu só tenho que agradecer pelo privilégio em ter jogado junto com eles. Para ter uma ideia, a gente era, não uma Seleção, mas um grupo de amigos em primeiro lugar. Companheirismo de verdade. Após a classificação para a Copa do Mundo de 1982, a seleção fazia um amistoso por mês. A reunião estava garantida, porque o plantel só tinha dois que jogavam no exterior: o saudoso Dirceu e o Falcão. Os demais atuavam no Brasil. Então, nós tínhamos uma afinidade muito grande. Era de extrema relevância esse encontro com grandes jogadores, cada um estrela no seu time, mas na Seleção era em prol de um grupo. Foi uma pena a gente não ter ganhado, mas que ficou na lembrança de todos. Essa grande Seleção ficou.

É verdade que o ‘seu” Graciano Espíndola, seu sogro, comprou seu próprio passe e o alugou para o Goiás em 1985?

Essa história foi muito interessante, pois era final de 1984 e eu estava no Botafogo. Ocorreu que meu sogro, um empresário no mercado de Comércio Exterior, falou que tinha a possibilidade de dois clubes me contratarem. Achei legal, mas falei para ele que achava muito difícil o Botafogo me vender, e caso me vendesse, ia querer um preço enorme, já que eu era um jogador valorizado e de Seleção. O que a gente fez: como eu tinha algumas luvas atrasadas a receber do clube, fizemos um acordo e o meu sogro comprou o meu passe. A ideia era logo em seguida me vender para não ficarmos com o passe na mão. Mas acabou não dando certo. Apareceu o Goiás querendo que eu disputasse o Campeonato Brasileiro, e a gente achou uma oportunidade de ter a reciprocidade do retorno que a gente havia empenhado junto ao Botafogo. Foi isso que a gente fez. Alugamos o meu passe para o Goiás e acabamos de certa forma tirando um pouquinho do prejuízo.

No verão de 1985, você pensou em abandonar os gramados. Na época, cursava o último ano do curso de Economia da Faculdade Cândido Mendes. Porque resolver enveredar para uma outra área?

Quando voltei do Goiás, realmente, eu pensei em abandonar a carreira. Já estava me formando em Economia e tinha essa proposta de trabalhar nessa empresa de comércio exterior, onde estou atualmente. Mas como estava no Goiás, clube que fiquei apenas três meses, e quando voltei, fiquei dois meses sem contrato e só treinando. Aí apareceu na história o Lancetta que tinha sido meu preparador físico no Botafogo. Ele estava no América e me convidou para jogar. Movido a desafios, resolvi ir para dar continuidade na carreira. Retomei a carreira e passei pelo Vasco em 1986, clube em que me sagrei campeão da Taça Guanabara. Depois disso, já campeão e com uma boa passagem pelo Vasco, voltei ao América, que começou a atrasar salários. Mas como já tinha uma vida para cuidar, filho e tudo mais, resolvi dar seguimento a minha vida em outro setor e parei de jogar. Mas é bom deixar claro que eu parei de jogar em função dos salários atrasados e porque eu tinha contas a pagar e não podia ficar vivendo de sonhos. No entanto, depois disso, veio a seleção de Master do Luciano do Valle que me convidou para fazer parte daquele time sensacional. Reencontrei o Rivellino. Lembra que eu disse ter sido do plantel da Maquina Tricolor há 45 anos?  Foi um momento mágico também. Jogávamos todo os domingos. Foi organizado Mundialito. Foi um sucesso. Pendurei minhas luvas em 2000 no futebol de areia. 

Qual foi o melhor treinador com quem você trabalhou?

Telê Santana na Seleção Brasileira e Paulinho de Almeida no Botafogo.


E o treinador de goleiros?

Muitos treinadores de goleiros foram importantes na minha carreira, como Raul Carlesso, que foi o meu primeiro treinador no Fluminense, onde foi o começo de tudo. Depois tive o prazer de ter o Sebastião Leônidas no Botafogo, no qual reputo como um excelente treinador. Mas o Nielsen foi o melhor com quem eu trabalhei.

Novamente no Rio de Janeiro, você firmou seu compromisso com o América e na temporada de 1986, alugou seu passe ao Vasco da Gama. Como foi essa passagem pelo clube?

Aliás, esse time do Vasco foi campeão da Taça Guanabara e era treinado por Antônio Lopes. Sobre a minha passagem? Basta dizer que esse time tinha Romário, recém lançado aos profissionais, Roberto Dinamite e Mauricinho. Tá respondido?

Em campo, seu último time foi o América, no entanto, na areia, você jogou por mais doze anos. Que balanço você faz da carreira?

Foi legal. Agradeço tudo que eu passei. Minhas vitórias, derrotas, demissões, no caso quando eu fui mandado embora e recebi passe livre do Fluminense, e tudo na vida (risos)! O que vale é a experiência. A carreira de jogador profissional, além de ter me dado muita coisa financeiramente falando, produziu uma imagem positiva e de profissionalismo.

Qual era o segredo para ter uma ótima impulsão, já que você tinha apenas 1,78 metro de altura?

Eu sou oriundo da areia, apesar de ter nascido em Santa Teresa. Mas você já nasce com a musculatura preparada para isso e desde muito cedo que eu treinava no Aterro do Flamengo. Inclusive, sempre joguei nos campeonatos de praia e depois fui morar em Botafogo, e continuei jogando minhas peladas. Então foi assim. Fui crescendo na areia, e por meio dela, que consegui uma impulsão muito grande. No entanto, o grande segredo não era só a impulsão, mas a colocação, que foi isso que aprendi com o Andrada. Ele tinha uma ótima impulsão, mas a colocação dele era muito boa. A colocação do argentino dava condições de antever a jogada para um salto ou melhor posicionamento para fazer a defesa de um chute. Lógico que quando a bola ia muito longe você tinha que usar sua impulsão, sua elasticidade, mas o grande segredo foi que eu nasci com musculatura propícia para isso e aperfeiçoei na areia.

Defina Paulo Sérgio em uma única palavra?

Batalhador.

VOZES DA BOLA: ENTREVISTA MAURO GALVÃO


Por alguns anos, foi atribuído erroneamente ao bairro Menino Deus, em Porto Alegre, a música do cantor e compositor baiano Caetano Veloso.

Anos depois, em entrevista ao programa Patrola da RBS TV (afiliada da Rede Globo na cidade gaúcha), o gênio da MPB relata ter conhecido, na capital do Rio Grande do Sul, um ‘menino’ tão lindo que para ele era um ‘Deus mitológico’, razão da escolha do título de sua bela canção.

Se os versos harmônicos deste sucesso de 1978 tornaram o bairro conhecido despretensiosamente, havia ali, desde muito cedo, um garoto que costumava jogar bola até o sol se despedir.

Com as estrelas batendo à porta do céu em sua chegada, o pequeno ‘Maurinho’, com 10 anos de idade, era chamado por seu Oquelésio e pela saudosa dona Luzia para vir tomar banho, jantar e dormir.

No dia seguinte, a maratona recomeçava: colégio, casa, futebol até tarde e casa novamente.

Com destreza, começou precocemente a mostrar na ponta-direita do União dos Onze – time tradicional do bairro – um futebol que chamava atenção.

“Eu vestia a camisa 7 e apesar de ser ponta-direita, voltava para ajudar na marcação”, diz já mostrando um sentido de coletividade desde pequeno que marcou seus quase 24 anos de carreira.

Certa vez, foi jogar contra o Grêmio defendendo as cores amarelo e verde com listras vermelhas na manga do União dos Onze, na casa do temido adversário.

Com os olhos fixados no gramado do campo suplementar – que ficava ao lado do estádio Olímpico – olhava os pingos fortes da chuva, que fizeram com que o confronto contra o tricolor gaúcho fosse cancelado.

Tudo em vão, porém, antes de ir embora, um convite do diretor Fernando Zacouteguy mudaria sua vida para sempre: era atleta do Grêmio e deixou de ser chamado de Maurinho para virar Mauro Geraldo Galvão.

Mesmo se destacando nas categorias inferiores da equipe gaúcha de 1971 a 1975, numa gangorra sem fim de um sobe e desce interminável, decidiu ir para o Internacional graças aos ouvidos argutos de seu Abílio dos Reis – considerado o maior garimpador de talentos do futebol gaúcho, tendo inclusive uma biografia escrita contando alguns casos de suas descobertas envolvendo a dupla ‘Gre-Nal’ – e  começou a escrever sua história.

Lançado por Ênio Andrade nos profissionais com 17 anos de idade, começou a trocar passes com Falcão, chupar laranjas com Jair, dividia esparadrapo com Mário Sérgio, pegava gaze emprestado com Batista, revezava aparelhos na academia de musculação com Valdomiro, matava a sede após os treinos  no mesmo bebedouro onde o goleiro Benítez matava a sua e extraia o máximo dessa rica convivência que aqueles jogadores lhe proporcionavam.

Certa vez, em um treino de dois toques, Falcão o reeprendeu por não ter dado um ‘bico’ na bola.

“Mas onde é o bico?”, respondeu ao ídolo Colorado, deixando todos em volta com olhos arregalados.

Mas se o menino se tornou campeão  Brasileiro em 1979 de forma invicta, o futebol conheceria um dos maiores zagueiros de sua história: Mauro Galvão!

Clássico e com uma tranquilidade impressionante, Mauro Galvão se tornou um quebrador de jejuns durante a trajetória dentro dos campos de futebol quando conquistou a Taça Rio pelo Bangu em 1987 – o último troféu erguido pelo alvirrubro havia sido em 1966 pelo goleiro Ubirajara – o Carioca pelo Botafogo em 1989 – desde 1968 que a torcida alvinegra estava com o grito de campeão preso na garganta – a Copa América pela Seleção Brasileira no mesmo ano de 1989 – após quatro décadas sem título – o Brasileiro pelo Grêmio em 1996.

O Museu da Pelada entra de forma forasteira no território sem lei do futebol em plena pandemia e chama o xerife no ‘saloon’ para um bate-papo para a série Vozes da Bola da semana.

Por Marcos Vinicius Cabral

Edição: Fabio Lacerda


No Grêmio, você começou como lateral-direito e mesmo se destacando nas categorias inferiores do tricolor gaúcho de 1971 a 1975, foi pouco aproveitado. Seu Abílio dos Reis – considerado o maior garimpador de talentos do futebol gaúcho – ficou sabendo, e o levou para o Internacional.  Como foi essa história do Grêmio não te valorizar e o Internacional, seu rival, sim?

Eu comecei na escolinha do Grêmio aos 11 anos de idade e fiquei um bom tempo ali. Foi uma experiência muito boa, aproveitei bastante e só tenho a agradecer por essa oportunidade. Comecei como lateral-direito, e aos poucos, fui deixando a extremidade do campo e começando a vir para o miolo da zaga. Quando me transferi para o Internacional já estava atuando como zagueiro. Essa questão é muito difícil de explicar, né? O Grêmio é um time muito organizado, assim como o Internacional. No entanto, naquela época, a filosofia do Internacional era aproveitar mais jogadores da base, enquanto o Grêmio contratava jogadores já formados com 28, 29, 30 anos. Diante deste cenário, eu conversei com meu pai e nos percebemos que as chances de subir ao profissional jogando pelo Internacional eram mais reais. E foi assim que aconteceu. Não houve nada de diferente, e sei que até hoje, tem muitos comentários no Sul sobre esse assunto. Alguns dizem que fui dispensado, outros dizem que fui para o Internacional porque meu pai era torcedor. As histórias são diversas. Mas é bom poder contar o que de fato aconteceu nessa entrevista, pois houve a proposta do Internacional, eu aceitei e acabei indo para o Beira-Rio, exatamente por perceber que ali eu teria mais condições de me profissionalizar, pois eles davam mais atenção para a base. Simplesmente por isso. Basta ver o Falcão, Batista, Jair e eu, que subi aos 17 anos.

Você começou precocemente a mostrar seu futebol na ponta-direita do União dos Onze, time tradicional do bairro. Não era zagueiro, mas um ponta direita que atacava e defendia com a mesma eficiência nos campeonatos no campo da Redenção, no bairro Menino Deus, em Porto Alegre. Ali foi o começo de tudo?

União dos Onze foi o meu primeiro time organizado que eu participei. Era um time de bairro que a camisa era amarela e com listras vermelhas;. Era muito legal. Foi uma experiência muito boa porque eu pude conviver com jogadores mais velhos do que eu e isso me deu experiência. Comecei a jogar com 11 anos no time de 14. Eu sempre procurei jogar com jogadores com mais idade. Isso era uma estratégia minha para poder aprender e também ter condições de melhorar minha performance diante das dificuldades, já que a diferença física nesta faixa etária é muito acentuada. Lembro que comecei realmente a jogar pelo lado direito como um ponta-direita. Eu fazia um ponta falso que vinha para dentro a fim de ajudar o lateral-direito. Desde pequeno eu sempre tive essa preocupação em jogar e também em ajudar na parte defensiva. Então, não podia ser diferente, já que no futebol você realiza as funções de atacar e defender.

Mauro Galvão, você foi um jogador predestinado a quebrar jejum. Foi assim com a conquista da Taça Rio pelo Bangu em 1987, no  Botafogo e na Seleção Brasileira, ambas em 1989, no Grêmio em 1996, e no Vasco em 1997. Na sua opinião, qual destes foi o mais difícil?

Os tabus fazem parte do futebol e a imprensa gosta muito desse tipo de situação e acho que é normal. Eu particularmente, quando jogava defendendo qualquer clube nunca pensava nisso. Claro que tive essas experiências no Bangu, Botafogo, Seleção Brasileira, Grêmio e no Vasco, pelo fato da equipe ficar um tempo sem ganhar. Mas acho que nenhuma foi tão grande quanto a do Botafogo, pois foi muito forte as encarnações das pessoas que eram torcedores rivais e isso deixava a torcida alvinegra bastante chateada. Um exemplo do que estou falando era aquela história de cantar parabéns antes dos jogos e acho que realmente foi a parte mais forte de todos esses clubes em que passei. Os rivais faziam isso como forma de desestabilizar os jogadores e os torcedores do Botafogo. Mas confesso que incomodava um pouco, mas para nós jogadores, o foco nosso era apenas em jogar futebol, ganhar os jogos e tentar o tão esperado título. Vale ressaltar que esse jejum não era nosso, daquele grupo de jogadores em 1989, mas sim o jejum de equipes passadas e do clube em si. Posso te afirmar, sem sombra de dúvidas, que nós não vivemos aquele período de tantos anos sem título e sim daquele período em que estávamos jogando no clube, ou seja, o ano de 1989. Eu tenho a consciência tranquila e nunca me preocupei com isso e agente entrou durante a competição para conquistar o título de campeão Estadual de 1989 e foi o que fizemos, onde procuramos não pensar muito nisso nesse negócio de tabu, jejum, e parabéns para você. Era uma carga muito grande e uma responsabilidade maior ainda, um clube da grandeza do Botafogo ficar anos sem títulos. Mas graças a Deus, conseguimos conquistar um título muito importante e acho mexeu muito com a gente, pela repercussão que teve em função de ser 21 anos e também pelo fato das torcidas adversárias procurarem sempre nos desestabilizar.

No primeiro ano de profissional ganhou logo de cara a primeira ‘Bola de Prata’ da carreira. Que importância teve esse prêmio?

Foi muito importante conquistar o título de Campeão Brasileiro de forma invicta em 1979 com o Internacional, e consequentemente, esse prêmios acabaram surgindo. A Bola de Prata sempre foi um prêmio que se tornou uma referência e o maior prêmio individual que um atleta de futebol pode conquistar. Particularmente, para mim foi muito bom ter conquistado essa Bola de Prata e ser considerado o melhor quarto zagueiro do Brasil em 1979, e o Falcão, o melhor cabeça de área. Inclusive, nessa premiação, fomos juntos na festa que foi no Rio de Janeiro. Encarei isso com uma alegria muito grande e quando você está feliz por ter conquistado um título da relevância de um Brasileiro e ainda recebe o prêmio de melhor da sua posição, isso motiva e ajuda muito para quem está iniciando a carreira como foi o meu caso.

Revelado no Internacional, você conquistou o Brasileiro de 1979 e o tetracampeão gaúcho em 1981/82/83/84. Como foi ser campeão, ainda garoto, num time com Falcão, Batista, Mário Sérgio, Jair, Mauro Pastor e Valdomiro?


Foi uma convivência muito importante. Uma verdadeira escola. Não era apenas jogar com eles, mas conviver e ter a noção de como um profissional tem que se comportar e a importância que tem tudo isso. Foi muito bom para mim. Acho que eu soube aproveitar. Pocurei em todos os momentos extrair o máximo dessa convivência e acabou como se eu estivesse em uma faculdade do futebol. Posso afirmar que todos os grandes jogadores e companheiros que tive como João Carlos, Falcão, Batista, Jair, Mário Sérgio, Benítez, Mauro Pastor, Cláudio Mineiro, Gasperin, que era o goleiro reserva e que faleceu, o Adilson, falecido também infelizmente, Bira, que acabou parando um pouco mais mais cedo, o atacante Chico Spina, que fez gols importantes nas finais, e Valdir Lima, substituto do Falcão, estavam prontos a ajudar sempre. Isso sem falar do nosso treinador Ênio Andrade e do preparador físico Gilberto Tim que foram essenciais e nos proporcionavam um ambiente sensacional com muito profissionalismo e uma leveza boa no vestiário.

Após sete anos a serviço do Internacional, você chegou no Bangu, aceitando o convite de Paulo César Carpegiani para a conquista do Campeonato Brasileiro de 1986. Por que o Bangu não foi bem naquele ano?

No final da minha passagem pelo Internacional, acabei indo para o Bangu, logo após eu ter ido à Seleção Brasileira na Copa do México em 1986. Acontece que no retorno achei que era o momento de sair e apareceu essa oportunidade de jogar no Bangu. Em seguida falei com Paulo César Carpegiani que formalizou o convite. Naquele momento achei que era interessante para a minha carreira e conversei com Castor de Andrade e acertamos. Acho que foi uma decisão acertada porque eu já estava no final de um ciclo no Internacional e havia aparecido algumas oportunidades, mas como eu tinha um contrato a cumprir, fiquei preso e naquela época só se o atleta fosse vendido ele saía do clube. Quando apareceu o Bangu não pensei duas vezes e fui. Mas essa mudança para o Rio de Janeiro, eu, particularmente, gostei. É lógico que existia uma diferença entre o Internacional e o Bangu, não como clube, mas como torcida, pois não tem como negar a diferença entre elas. No entanto, o time do Bangu naquele momento era uma grande equipe, muito competitiva, e com grandes recursos financeiros para contratar. Foi uma mudança boa que acabou se revelando melhor ainda quando permaneci no Rio de Janeiro.

Em 1988, você, Marinho e Paulinho Criciúma, foram para o Botafogo. Mas quase foram parar no Fluminense, que havia sacramentado a venda do cabeça de área Jandir para o próprio Botafogo, mas a diretoria do Glorioso desistiu do negócio. O que realmente houve ali?

Nós fomos para o Botafogo em 1988, pois em 1987, nos sagramos campeões na Taça Rio com o Bangu, um título que foi muito importante e decidimos contra o próprio Botafogo vencendo por 3 a 1. Posteriomente, a gente acabou sendo contratado pelo Botafogo, e o seu Emil Pinheiro, dirigente naquela época me contratou. Sobre essa questão abordada na sua pergunta sobre o Fluminense, eu não sei de nada, apenas boatos na época, mas como no meio do futebol existe muito boato, a gente nunca sabe se é verdade. O fato é que quando eu sai, em 1987, de férias, conversei com o Castor de Andrade e falei para ele que queria sair e que ele conseguisse uma equipe para minha transferência. Eu queria continuar minha carreira e era importante voltar para um time com uma grande torcida. E foi o que aconteceu com o surgimento do Botafogo.

Recentemente, fez 31 anos da conquista do Campeonato Carioca de 1989, em cima do Flamengo. Como foi quebrar um jejum de 21 anos sem títulos para o Botafogo e o que representou essa conquista para você?

Foi muito importante esse título do Botafogo que marcou a minha carreira. Eram 21 anos sem título e isso era um tabu a ser quebrado por nós, jogadores. A torcida estava muito desconfiada. O time do Botafogo ia, ia, ia e não conseguia chegar, então, claro que nós não tínhamos nada a ver com isso. Naquele Campeonato Estadual de 1989, estávamos ali para fazer o nosso melhor e escrever uma outra história, mas no final das contas a gente acaba entrando nessa descrença dos torcedores. Graças a Deus  nós conseguimos montar uma boa equipe, um grupo bom de atletas e a chegada do Valdir Espinosa, treinador com uma cabeça boa e que procurou sempre dar um sentido tático para aquela equipe. Mas a vida de atleta é essa: conviver sempre com a dúvida se dá ou se não dá para conquistar esse ou aquele título. Isso foi importante para aquele grupo. Mas começamos a acreditar que só seria possível esse título com um trabalho bem feito. E foi o que aconteceu naquela noite do dia 12 de junho. Fizemos a nossa parte e não foi uma conquista fácil, porque para vencer aquele Flamengo, só sendo muito capaz.

Na Copa do Mundo de 1990, a ‘Era Dunga’ no qual você fez parte, sucumbiu para a Argentina nas oitavas de final, e você foi um dos poucos a se salvar naquele time, tanto que o Lugano, da Suíça, te contratou. O que tem a dizer disso?

Tive uma passagem muito boa na Seleção Brasileira em 89 quando conquistamos o título da Copa América (jejum de 40 anos) logo após o título do Carioca pelo Botafogo. Lembro que na sequência nos classificamos nas Eliminatórias para a Copa do Mundo da Itália e quando chegamos lá as coisas mudaram um pouco. Acho que perdemos o foco, acabou acontecendo algumas coisas que tiraram a nossa concentração e isso atrapalhou um pouco o nosso trabalho. Quando você tem um grupo fechado de jogadores é normal que aconteça problemas. Acho que poderíamos ter passado pela Argentina, pois dominamos o jogo, fomos melhores e não seria absurdo algum afirmar que poderíamos ter vencido e vencido bem. Mas acredito que justamente por causa dessa falta de concentração e por não estarmos tão focados. Quando a chance aparece você não está preparado, você acaba não fazendo o gol. Um exemplo do que estou falando aconteceu no lance do gol deles, porque a gente sabia que aquela jogada poderia acontecer. Quando enfrentamos A Argentina na Copa América, nós não deixamos isso acontecer. Não demos chances à seleção argentina que era a campeã mundial de 1986. Mas vale ressaltar a diferença do nível de concentração entre a Copa América e a Copa do Mundo. No jogo contra os argentinos no Maracanã pela Copa América, entramos ligados, e no estádio Delle Alpi, em Turim, nas oitavas de final da Copa do Mundo, parecia que a gente estava com a cabeça no mundo da lua. E aí, não dá! Quando se enfrenta um jogador com a qualidade do Maradona, sem marcação, basta um pequeno espaço para tudo complicar. No entanto, acho que a gente poderia ter ido mais longe na Copa do Mundo de 1990.

Como tem enfrentado esses dias de isolamento social devido ao Coronavírus?

Normal. No isolamento social tenho procurado fazer aquilo que tem sido colocado, e seguindo o que é pedido como evitar aglomerações, lavando as mãos, ficando em casa e saindo no máximo para coisas importantes e necessárias de se fazer. Uso máscara desde o início e sempre utilizando o álcool em gel. Tenho procurado fazer o que que foi colocado pelos órgãos competentes, mas claro, nem sempre aquelas coisas que eu acredito que são certas de se fazer ou são faladas, realmente tem que analisar bem. Mas é uma situação muito importante esse período de pandemia. É uma pena que no Brasil a gente use isso para levar o negócio para o lado da política. Isso é muito triste. Em um momento como este em que, infelizmente, tudo se politiza, uma situação como essa que todos deveriam estar unidos para tentar ajudar e melhorar as coisas, a gente está preocupado em responsabilizar os culpados pelo covid-19. Uma pena.

Foram seis anos na Suíça, e em 1996, aceitou a proposta do seu Grêmio, seu clube de coração. No Olímpico conquistou o Campeonato Brasileiro de 1996 e a Copa do Brasil de 1997. Jogar no tricolor gaúcho, foi um sonho realizado?

Eu fiquei seis anos na Suíça, e foi uma experiência maravilhosa, tanto na parte do futebol quanto na parte familiar. Foi uma época que fiz muitos amigos, além de ter aprendido uma língua, que era o italiano que a gente falava. É um país com uma cultura diferente e a gente teve essa oportunidade de conviver durante seis anos. Foi muita aprendizagem tanto para mim quanto para os suíços. Mas teve uma hora que foi o momento de voltar e como sempre acontece no futebol, acabei aceitando a proposta do Grêmio porque era um time que vinha fazendo um bom trabalho e muito organizado com o Luís Felipe Scolari no comando. Lembro que havia uma proposta do Palmeiras também, mas optei pelo Grêmio pelo desejo de voltar para minha cidade natal que é Porto Alegre e por ter iniciado a carreira lá aos 11 anos. Era um ciclo que se abria e fechava com essa minha volta. Mas graças a Deus, deu certo. Não foi fácil no início e para um cara que jogou no Internacional e ser contratado anos depois pelo Grêmio, a torcida fica na dúvida. Mas com o passar do tempo as coisas foram acontecendo e pude mostrar nos jogos meu profissionalismo e meu primeiro Campeonato Gaúcho pelo Grêmio, em 1996, o Brasileiro do mesmo ano naquele jogo incrível diante da Portuguesa de Desportos que tinha uma bela equipe. Na sequência, em 1997, conquistamos a Copa do Brasil contra o Flamengo, no Maracanã, outro campeonato muito importante e que nos marcou bastante. Foi uma realização pessoal ter retornado e ter fechado um ciclo no Grêmio com títulos. 

Em 1997, chegou a São Januário para conquistar quatro objetivos: o Brasileiro no mesmo ano, a Libertadores e o Mundial, ambos em 98, ano de centenário do clube, e ser ídolo da exigente torcida. Que balanço você faz desses quatro anos de serviços prestados ao Vasco da Gama?


Eu acabei acertando com o Vasco em 1997 e foi uma grande surpresa a forma como a coisa aconteceu nessa minha vinda para São Januário. Lembro que cheguei na mesma época que o Evair, o Válber, e o Nasa, que se não me engano veio do Madureira, mas o Vasco já tinha uma boa equipe formada. Havia sido vice-campeão Carioca, e em pouco tempo a gente conseguiu o entrosamento com os que já estavam no clube de forma surpreendente. Eu sei que não é fácil entrosar um time, e a gente conseguiu isso em poucos jogos o que nos proporcionou vislumbrar a possibilidade de lutar por títulos. Recordo-me que o time foi ganhando as partidas, encorpando, a confiança aumentando, e na final contra o Palmeiras, entramos com a moral elevada, pois vínhamos de uma goleada de 4 a 1 contra o Flamengo e vencer esse clássico nos deu um gás especial. Mas a final do Campeonato Brasileiro contra o Palmeiras, que era uma grande equipe e com jogadores de qualidade, foi especial e conseguimos levar o Vasco ao terceiro título de campeão do Brasileiro. Mas vale ressaltar que essa conquista acabou nos levando no ano seguinte ao nosso maior objetivo que era disputar e conquistar a Libertadores no ano do centenário do Vasco da Gama. Mas o ano de 1998 foi especial, pois tivemos a primeira conquista do ano, que foi o Estadual, no qual tive a oportunidade de fazer o gol da vitória contra o Bangu, e em seguida, a maior conquista da história do clube, que foi a Libertadores da América. Tivemos um começo muito difícil e crescemos durante a competição. Depois disso tivemos outros títulos como o Rio-São Paulo em 1999, a Copa Mercosul e a Copa João Havelange, ambas em 2000 e, infelizmente, perdemos duas finais, uma contra o Real Madri no Mundial Interclubes e outra contra o Corinthians no Maracanã, pelo Mundial de Clubes da FIFA. Mas acho que minha passagem em São Januário foi sensacional e a equipe transformou esse ciclo em um período muito vitorioso na história do clube.

Quatro anos antes de encerrar a carreira, em 1998, você lançou ‘Mauro Capitão Galvão – Lições de Vida, Lições de Futebol’, pela editora Gryphus. Qual a intenção de lançar uma biografia ainda estando em atividade?

Na verdade apareceu a oportunidade de lançar o livro, e o vascaíno Hélio Ricardo, que é jornalista e tem formação em teatro, acabou me apresentando essa proposta. A gente acabou acertando e fazendo. Não vejo diferença em fazer isso antes, durante ou depois de encerrar a carreira, sendo bem franco. Na verdade, apareceu a oportunidade, foi um período legal para fazer e a gente achou necessário produzir o livro, que acabou se tornando um documento. Vale citar que você tem várias histórias e uma delas aconteceu no próprio Vasco quando eu acabei completando 1000 jogos na carreia e só aconteceu porque houve o evento de divulgação do livro. Do contrário, a gente não teria como saber isso, e são vários fatores que são importantes. Estão contidos na obra e aconteceu na minha carreira. Têm coisas também que são passagens fora do futebol. Foi um momento importante porque fizemos o lançamento na sala de troféus do clube e acho que foi muito bacana e no momento propício. Mas minha passagem em São Januário foi importante para lançar o livro mencionando toda a minha carreira, fazendo um completo raio-x dos anos que passei no clube, as vitórias, títulos, conquistas. É um resumo bem bacana de toda minha carreira com a camisa vascaína.

Em recente entrevista para um famoso veículo esportivo do Rio, você citou cinco jogadores que foram referência para sua carreira: o zagueiro chileno Figueroa, Luis Pereira, ídolo da torcida palmeirense, Falcão, que foi seu companheiro no Internacional em 79, Cruijff, maior nome do futebol holandês e o Rei Pelé. Queria saber em que eles te inspiraram?

É verdade. Citei esses nomes em uma entrevista que eu tinha como referência na minha infância e quando eu comecei a jogar. Eu via muitos jogos na televisão e já gostava de futebol nessa época. Vi muito o meu pai que jogou futebol amador. Lógico que alguns jogadores me chamavam atenção, e normalmente, eram os que tinham uma capacidade técnica acima da média e uma postura boa. Era aquilo que me interessava mais. Um atleta que fosse também um exemplo, porque eu acho que é nossa função dentro do futebol, passar uma boa imagem e mostrar como o profissional deve ser. Eu aprendi isso com esses que você citou na pergunta e com os meus companheiros quando comecei no futebol. Isso para mim valeu muito e acho que a gente tem que fazer a mesma coisa: passar uma boa imagem para os jovens que querem jogar futebol. Nosso papel é mostrar para eles a verdade, e não enganá-los dizendo que se tornar atleta profissional é fácil e que tudo acontece tranquilamente. Não, não é verdade! Muito pelo contrário, é bem difícil e complicado. Para chegar lá, você tem que ser profissional, dedicado e abrir mão de muitas coisas, e só alguns chegam lá em cima e conseguem jogar. Um recado que eu deixo para os que querem fazer do futebol sua profissão.

Quem foi seu melhor treinador?

Tive vários treinadores bons e competentes. Muitos me ajudaram na minha carreira e me ensinaram bastante, mas o principal que eu menciono, até porque foi o meu primeiro treinador no profissional, foi o saudoso Ênio Andrade.

Você retornou ao Grêmio para encerrar a carreira aos 39 anos e jogou até os 41, conquistando o Campeonato Gaúcho e a Copa do Brasil. O que faltou para você como jogador?

Verdade. É uma coisa bem interessante e sempre falo para as pessoas que eu fui contratado pelo Grêmio, uma grande equipe de futebol brasileiro, aos 39 anos. É um negócio incomum isso e para você que é jornalista, acho que vale uma matéria ou uma pesquisa aprofundada para ver se já aconteceu com outros jogadores de futebol em ser contratado com essa idade para jogar em um time grande e disputar competições relevantes como Libertadores e Copa do Brasil. Na verdade, não acho uma coisa muito simples, entretanto, é motivo de satisfação poder falar isso. À torcida gremista, eu afirmo que foi muito boa essa passagem pelo clube em 1996 e 1997, e quando voltei ao Tricolor Gaúcho em 2000 e joguei até os 41 anos, em 2002. Foi super tranquilo, foi bom, ganhamos um Campeonato Gaúcho, uma Copa do Brasil e ficamos na semifinal da Copa Libertadores, em que até hoje a gente fica meio na dúvida sobre aquele jogo no Olímpico contra o Olimpia-PAR, em que na decisão dos pênaltis o juiz mandou voltar uma cobrança que o Eduardo Martini, nosso goleiro, havia defendido. Independente disso, o terceiro lugar eu acho que foi uma boa colocação e uma bela campanha, sem falar dos títulos do Campeonato Gaúcho e da Copa do Brasil contra o Corinthians. Mas a nível de curiosidade, lembro que certa vez um árbitro veio me perguntar antes de começar um jogo do Grêmio, se eu estava com 41 anos mesmo e eu respondi que sim (risos). São lembranças muito boas.


De todos os atacantes que você enfrentou, qual foi o mais difícil de marcar?

Marquei vários atacantes importante no futebol brasileiro e que foram grandes jogadores, que tinham qualidade, velocidade e imposição física. Mas aquele que realmente me deu mais trabalho, foi o Reinaldo do Atlético-MG logo no início da minha carreira. Reinaldo foi um jogador muito inteligente, habilidoso e com uma arrancada e velocidade impressionantes. Não bastasse isso, jogava em um grande time que contava com Luizinho, Toninho Cerezo, Paulo Isidoro, Éder, enfim, uma equipe muito forte. Sem dúvida, Reinaldo foi o atacante que me deu mais trabalho de todos que eu enfrentei.

Você chegou a ser diretor-executivo em alguns clubes, como o Grêmio, o Vitória e o Avaí. Na sua opinião, por que grandes jogadores no passado não conseguem se destacar como dirigente?

Primeiro lugar quero deixar claro que foi uma enorme satisfação ter trabalhado nesses times. No Grêmio, em 2009, no Vitória em 2010 e no Avaí em 2011. Em relação a essa questão de jogadores que não se destacam na função de executivo, o importante é você fazer o seu trabalho. Você é pago para realizar o seu trabalho e ali você não é mais jogador que tem que ficar aparecendo ou chamando a atenção. Não, não é! Nessa função, você deve fazer o seu trabalho e foi o que eu fiz nesses três clubes em que passei. Infelizmente ou felizmente, essa função não é para sempre e a todo momento é trocado conforme são trocadas as direções nos clubes. O mais importante de tudo isso é que os clubes em que passei como diretor, eles não têm nada para falar sobre a minha conduta profissional e sobre a minha pessoa. Podem perguntar: o Mauro Galvão deixou de desempenhar suas funções aqui ou deixou algum problema para vocês? Não vão achar nada. Isso para mim é o mais importante e nessa função é o cargo que mais acontece coisas estranhas. Não vou falar aqui, pois não é o caso, mas quem tem um mínimo de inteligência sabe o que que estou falando. O que mais me interessa em te responder é dizer que eu trabalhei, fiz o que eu pude e dentro das minhas possibilidades no clube, ajudei a trazer jogadores e membros da comissão técnica e os resultados conquistados. Para de ter uma ideia, no Grêmio, tivemos uma fase muito boa e chegamos a ficar em primeiro na fase de grupos. Já no Vitória, fomos campeões baianos e vice-campeão da Copa do Brasil com orçamento de R$ 500 mil ou até menos. Aonde você vai com isso aí? Em qual clube você vai conseguir resultados com um orçamento desses aí? Chegar numa final de Copa do Brasil com um orçamento desse? É complicado, né? Mas isso aí ninguém fala, até porque não interessa falar, mas nem eu quero que fale também. Depois no Avaí, chegamos às semifinais da Copa do Brasil também da mesma forma, com um orçamento bem baixo e contratamos jogadores com custo que ia de acordo com a realidade do clube. Então, revelo para vocês do Museu da Pelada que estou muito satisfeito com o trabalho que fiz nesses clubes.

Defina Mauro Galvão em uma única palavra?

Acho que essa pergunta não cabe a mim ainda mais em uma única palavra ou frase. Eu sou um cara simples, transparente e sou aquilo que eu sou dentro e fora de campo, ou seja, sou um só. Não existe diferença nenhuma do Mauro Galvão dentro de campo e do Mauro Galvão fora dele. Já ouvi falar algumas coisas de outros jogadores que eram uma coisa dentro de campo e fora dele eram totalmente diferentes. Nada disso, eu sou o Mauro Galvão dentro de campo, fora de campo, aqui, ali, ou em qualquer outro lugar. Sou o mesmo. Não tenho duas caras, duas personalidades, e sou uma coisa só, um cara simples e bem fácil de reconhecer quem eu sou.

VOZES DA BOLA: ENTREVISTA TATO


Acontece que Carlos Alberto Araújo Prestes nasceu em Curitiba.

E, naquele 17 de março de 1961, ao lhe exporem à vida, levou o primeiro tapa na bunda, e chorou.

Uns dizem que as lágrimas eram Coloradas e Tricolores.

Mas naquele instante do seu nascimento o sistema falava como um esforçado lateral-direito: “Bem vindo ao meu mundo, menino talentoso. Aqui quem manda sou eu”.

Mundo insensível esse que expôs às vísceras naquele seu choro.

Foi naquele dia que começou a sua diferença com ele.

O fato é que o tempo foi passando e o menino Carlinhos foi crescendo e quase tudo já estava pronto, menos o seu destino.

Virou Tato, um dos cinco sentidos, mas, diferentemente dos outros quatro, ele não é encontrado em uma região específica do corpo, e sim em todas as regiões da pele.

Sua pele já ia se revestindo de três cores, as mesmas que traduzem tradição.

Mas antes, muito antes, numa infância e adolescência analógicas, haviam no máximo, o controle remoto da televisão, ver seu pai jogar era raro, mas gostava de ouvir os elogios que seu velho recebia.

Mas os seus sonhos eram reais.

Mesmo com essa impossibilidade, era a dificuldade lá e ele cá.

Quando ele e a dificuldade se esbarravam no jogo da vida, o duelo prometia.

E foi assim a carreira toda.

Nada foi fácil para Tato, que driblou diversas vezes as dificuldades na trajetória e mesmo assim elas continuavam lhe dando porradas, chegando em cima, fungando no cangote ou acertando o tornozelo.

Elas lhe faziam desistir, e o troco era sua insistência.

A derrota para ele era iminente mas saber que nenhuma força maior seria capaz de pará-lo, prosseguiu.

Tato era inadministrável, imarcável, imparável.

Contudo, Tato foi o resultado do insulto daquele tapa na bunda (des)necessário, desferido no dia em que eu nasceu.

Começou no Internacional em 79, passou pelo Goiânia antes de chegar no Fluminense onde fez história com a camisa 11, passou no Vasco, Sport e o Santos.

Embora tenha vivido um excelente momento no Fluminense nos anos 80, Tato não conseguiu ter muitas oportunidades de vestir a camisa da Seleção Brasileira.

Se não fossem os olhares argutos de Edu Coimbra e Telê Santana, teria passado em branco com a amarelinha.

Mas Tato jogou, convenceu, venceu e se tornou inesquecível para os amantes da bola, principalmente os Tricolores que conjugam em prosa e verso o time tricampeão carioca em 83/84/85 e Brasileiro de 84.

Mas tudo isso que este belíssimo ponta-esquerda do futebol brasileiro viveu foi por causa de um simples tapa na bunda.

O Museu da Pelada chegou junto, marcou em cima e fez uma entrevista com o ensaboado Tato para a série Vozes da Bola da semana.

Por Marcos Vinicius Cabral

Queria que nos contasse como foi o seu início de carreira?

Faz tempo, viu! Foi no século passado, lá em 1979, quando fui revelado na base do Internacional, clube em que fiquei uns 3 ou 4 anos mais ou menos e logo em seguida fui emprestado para o Goiânia ainda como juvenil e depois, finalmente cheguei no Fluminense.

Como veio parar no Fluminense?

Fui indicado na época pelo Jandir, que jogou comigo na base do Internacional e que estava no Fluminense fazendo um certo sucesso, e também pelo Machado, que hoje é empresário de futebol.

Quem foi o melhor treinador com quem você trabalhou?

Carlos Alberto Parreira. Foi sem dúvida alguma o melhor treinador que eu tive e que passou no Fluminense. Foi ele que conseguiu ajustar o time de uma forma que se tornasse super competitivo a ponto de conquistar o que foi conquistado naquela época, que foi o Brasileiro de 1984, até então, antes de ser homologado os outros títulos lá de trás nunca tinha sido campeão, no Rio só o Vasco em 74 e o Flamengo em 80. Nós conquistamos o título do Brasileiro de 84, graças e muito ao professor Parreira.

Você enfrentou grandes laterais no futebol carioca como Leandro e Jorginho, ambos do Flamengo, Josimar do Botafogo e Paulo Roberto do Vasco, e que eram bons marcadores também. Qual deles era osso duro de roer?

Desses laterais que você citou na pergunta, todos foram grandiosos jogadores e a nível de seleção brasileira. O Leandro foi o melhor lateral-direito que o Brasil já teve e um dos maiores do mundo, já Jorginho, tetracampeão em 94, outro craque, Paulo Roberto, um excelente jogador, mas o mais encardido para enfrentar era o Josimar, muito complicado mesmo.

Sendo curitibano, você fez história no Fluminense. Qual é o sentimento, em saber que você é incontestável ídolo tricolor?

Bom, sem duvida alguma, ser ídolo tricolor é uma coisa que me enche de orgulho, que traz muita satisfação em minha vida e ficar marcado para torcida, como fiquei no Fluminense, isso é um motivo de alegria não só para mim, mas para os meus familiares, meus filhos, amigos, e esse reconhecimento é uma coisa que eu vou levar para o resto da minha vida.

No dia 19 de julho foi comemorado o Dia Nacional do Futebol. O que o esporte representou para o Tato?

O esporte sempre esteve marcado em minha vida desde criança, então, representa muita coisa. Ele me trouxe prazer, me proporcionou alegrias, além de ser importante para todas as pessoas que praticam pensando em bem estar e saúde. No meu caso o futebol foi mais importante ainda já que fui atleta profissional e tive a alegria imensa de poder, por meio dessa modalidade esportiva, de ser viitorioso.


Esse ano o Maracanã completou 70 anos. Quais são as suas primeiras lembranças como jogador no estádio?

Sem dúvida, ainda mais para alguém que sempre sonhou em ser jogador de futebol e querer jogar em estádios cheios, o Maracanã foi o templo do futebol brasileiro e mundial. Para mim desde criança sempre foi um sonho poder atuar no Maracanã e eu tive a felicidade de ter ido jogar no Fluminense e tudo a oportunidade de jogar por inúmeras partidas com o estádio lotado com mais de 150 mil pessoas e às vezes, o que era raro, vazio. No entanto, sem dúvida alguma, foi marcante para mim ter fotos, vídeos jogando naquele maravilhoso lugar que na época era considerado o maior do mundo.

Seu pai foi zagueiro do Internacional e depois teve uma pequena passagem pelo Fluminense. Você seguiu o mesmo caminho, passou no Colorado e chegou no Tricolor. Seu irmão, o lateral Paulo Roberto Prestes, marcou o Atlético Mineiro. De uma família de craques, quem foi o melhor?

Difícil te responder isso. Meu pai foi um excelente zagueiro, muito técnico e com muitas qualidades. Te confesso que vi pouco ele jogando, no entanto, as pessoas comentam que na época dele foi um grande jogador, já o meu irmão foi um excelente lateral-esquerdo e ficou muitos anos no Atlético Mineiro, chegando a ser até capitão da equipe, e eu na ponta-esquerda no Fluminense, acredito ter feito história no clube com conquistas, títulos, atuações… enfim, eu acho que cada um na sua posição e daquilo que jogou, teve seus méritos e desempenharam muito bem o papel de jogador de futebol.

Por falar em pandemia, como tem enfrentado esses dias de isolamento social devido ao Coronavírus?

Trabalhando. Trabalho em um grupo da Unimed todo dia e tomando as precauções devidas que são o afastamento social, usando máscara, evitando aglomerações e essas coisas todas recomendadas. No mais, esperamos que isso passe logo não só para mim mas para toda a humanidade, já que estamos vivendo um momento difícil em que eu nunca pensei que ia passar por um momento desse em minha vida. Mas vamos lá, com fé em Deus, que a gente vai superar tudo isso em breve.

Recentemente você disse numa entrevista concedida à FluTV, que uma das principais virtudes daquele time tricampeão carioca em 83/84/85 e campeão brasileiro em 1984, era a lealdade na briga pela titularidade. Como era essa ‘briga’ entre vocês?

Normal. A briga pela titularidade sempre foi normal em qualquer grande equipe e naquela época não era diferente. Mas todos se respeitavam e procuravam dentro dos treinamentos e dos jogos fazer o melhor para se manter como titular, mas o importante daquele grupo era a união, tanto titulares quanto reservas, a gente se dava muito bem e isso que fez com que a gente conseguisse conquistar o que foi conquistado com a camisa do Fluminense.

O Fluminense, multicampeão, era um grande time e barato, se compararmos ao Flamengo, por exemplo. Quem custou um pouco mais foi Assis e Washington, o saudoso Casal 20 e Romerito. Seja sincero: havia como aquele time dar errado?

Realmente se for comparar aquele time com hoje em dia, foi muito barato mesmo. Por exemplo, eu fui para o Fluminense praticamente de graça, o Jandir idem, o Ricardo Gomes saiu da base e o Branco também, o Aldo e Duílio já estavam no clube e chegou o Romerito, e  como você mesmo falou o Assis e o Washington que vieram do Athletico Paranaense que não era o clube que é hoje. Mas sinceramente, tinha tudo para dar certo porque além de serem grandes jogadores a cumplicidade e a vontade de vencer eram enormes e nas mãos certas, acabou a coisa seguindo em frente e conquistamos os títulos que ficaram marcados no clube.

Você chegou no Fluminense e encontrou Paulinho Carioca, também hábil e talentoso ponta esquerda como você. Nessa disputa pela camisa 11, quem ganhou e quem perdeu?

O Paulinho foi um grande jogador, um ponta rápido, extremamente habilidoso que ia para o confronto mesmo e levava para cima. Falar do Paulinho é relembrar da nossa convivência, que aliás era muito boa, e ele acabou sendo importante na minha carreira, pois eu tinha que jogar bola, do contrário, ele poderia tomar meu lugar no time. Mas sou amigo dele até hoje e de vez em quando conversamos pelo Facebook, no entanto, o mais importante é que quem ganhou com tudo isso fui eu, foi o Paulinho, e principalmente o Fluminense.

Mesmo sendo um jogador habilidoso com a perna esquerda, o gol mais importante que fez na carreira foi com pé direito, na vitória por 2 a 0, contra o Corinthians de Carlos, Wladimir, Biro-Biro, Sócrates, Zenon e Casagrande, no primeiro jogo das semifinais do Brasileiro de 1984, no Morumbi. Como foi esse gol?

É, são coisas da vida, né? Sendo canhoto e usando a perna direita apenas para subir em ônibus, acabei fazendo o gol mais importante da minha carreira com o pé direito. Mas foi a única forma que eu tinha ali porque se eu fosse com o pé esquerdo eu não conseguiria fazer o gol. No entanto, aquela grande vitória contra o Corinthians no Morumbi com 100 mil pessoas, que era um grande time e vinha de uma goleada contra o Flamengo por 4 a 1, se não me engano, nos deu uma moral, força e confiança, atributos importantes que um time tem que levar para uma final para enfrentar o Vasco, que era um equipe muito boa. Mas graças a Deus, felizmente, a coisa acabou dando certo.

Quando você fecha os olhos sente muitas saudades da torcida do Fluminense?

Toda hora. Penso em tudo que a gente viveu nas Laranjeiras, pois foi um período vitorioso em seis anos, no qual conviví com os meus companheiros e que se tornaram uma grande família. A saudade bate e lembro de todos, acho que a grande coisa que ficou marcada daquela equipe do Fluminense em qual eu participei foi o legado que a gente deixou com títulos para a grande e imensa torcida tricolor.

Poucos se lembram, mas você teve uma passagem pelo Vasco da Gama, em 1989, onde participou da vitoriosa campanha no Campeonato Brasileiro, ainda que nunca tenha conseguido se firmar como titular em uma super equipe e que contava com inúmeros jogadores de Seleção Brasileira como Acácio, Bebeto, Mazinho, Bismarck, Andrade, Luiz Carlos Winck, entre outros. Como foi essa sua ida para o Gigante da Colina e como lidou com a reserva?

Naquele time do Vasco de 1989, realmente era uma seleção, pois se você pegar todos os jogadores, praticamente jogavam ou jogaram na seleção brasileira. Então é como hoje em dia, você pega aí times que têm um grande elenco e de repente você vê um grande jogador no banco de reservas, como o Flamengo de hoje em dia com o Diego Ribas na reserva, o Everton Ribeiro de vez em quando sai, o Arrascaeta não entra, coisas normais. Assim, é normal você estar no meio de um plantel com grandes jogadores, não pesa tanto, mas claro que você quer jogar, como  aconteceu muitas vezes de eu ser titular naquele time do Vasco. Mas o mais importante, eu acho, que fica marcado é ter participado de um grupo como aquele e ter sido campeão, é claro!

Mesmo sendo um ponta muito habilidoso e tendo vivido uma excelente fase no Fluminense, na sua opinião, por que você teve poucas oportunidades na Seleção?

Sinceramente, não sei, pois isso vai de treinador para treinador e se eu fosse contar toda minha história ia demorar para caramba. Mas naquela época no país, poucos jogadores iam para fora do país, então, a competição era enorme. Para se ter uma ideia, a Seleção Brasileira podia ser formada por duas, três grandes equipes, dependendo do treinador. Atualmente cada um tem sua preferência, mas o mais importante é que eu cheguei lá, vesti a camisa e joguei na Seleção e isso fica marcado na minha história e na minha vida.

Quem foi seu ídolo no futebol?

Tive vários ídolos que quando eu era adolescente eu gostava de ver jogar. Me lembro do Rivellino, do Mário Sérgio, todos canhotos como eu e do nosso Rei Pelé, que nem se fala, né? Mas o meu grande ídolo, sem dúvida alguma foi meu pai, pelo grande jogador que foi, o grande ser humano, grande chefe de família e que que inspirou muito, me deu forças no começo da minha carreira, me incentivou a continuar e a não desistir e seguir em frente.

Como vê o Fluminense atualmente?


Com bons olhos, pois o Fluminense tem um bom time, bem treinado, um bom elenco e vem numa luta grande para conquistar algo nesse Campeonato Brasileiro. Eu estou torcendo muito para que tudo dê certo e o nosso Tricolor consiga fazer uma grande campanha.

Defina Tato em uma única palavra?

Em uma única palavra? Do bem. Tato é uma pessoa do bem. 

A imensa torcida tricolor quer saber: O que o Tato tem feito da vida? Continua trabalhando com futebol?

Não, eu não trabalho com futebol. Eu trabalho com o grupo Vital, que é Unimed, que é um grupo de saúde e estou muito feliz com o que faço, com as pessoas com quem convivo lá na empresa, e isso é motivo de alegria, de felicidade, de sonhos e esperanças e sem dúvida alguma, realizações. Desde já, um forte abraço a todos do Museu da Pelada e a grande torcida tricolor do nosso querido Fluminense, um abraço!

VOZES DA BOLA: ENTREVISTA ALEMÃO


Muito antes de receber o apelido de ‘Alemão’ e se consagrar no futebol mundial, o menino Ricardo Rogério de Brito, veio ao mundo naquele 22 de novembro de 1961, para lutar bravamente pela sobrevivência.

De família humilde e quase beirando a pobreza, dividia o casebre com mais quatros irmãos, que se viravam como podiam para ajudar o pai nas despesas de casa.

Muito antes de ser exímio marcador no meio de campo com as camisas do Botafogo, Atlético de Madrid, Napoli e São Paulo, o tradicional ‘carregador de pianos’ foi ajudante de pintor, e explorado, buscou pintar em cores as paredes de um mundo em preto e branco no qual vivia.

A vida era dura mas o pequeno Ricardo não era mole.

Virou engraxate e por muitas vezes chegava em casa com o dinheirinho do pão com o suor de seu rosto.

Resiliente, passou uma fase da vida sendo garçom e servindo em bandeja bebidas e comidas que matavam a fome e a sede de muita gente.

Eram muitos em um e seu destino seria outro quando arrumou suas coisas e partiu.

“Minha mãe, estou indo para o Rio de Janeiro jogar bola, ganhar dinheiro e comprar uma casa para a senhora”, disse ao pegar suas coisas e ir tentar a sorte no Botafogo já como Alemão, apelidado dado pelo pai.

A bola, ah, sempre ela, seria a tentativa para aquele sujeitinho de fala mansa chegar a Marechal Hermes e ficar por lá durante quinze dias treinando.

Era hora de pôr em prática tudo o que aprendera na cidade de Lavras, em Minas Gerais, ou seja, fazer jogadas consideradas pinturas, dar um brilho na bola como fazia nas ruas da cidade mineira em vários sapatos dos lavrenses e servindo como garçom com passes para os atacantes saciarem a fome e a sede por gols.

Se viveu os infortúnios no Botafogo antes da profissionalização, a glória maior foi estrear em 1981 em um amistoso contra o Fluminense de Feira de Santana, substituindo o habilidoso Mendonça, estrela maior da constelação que levava no peito uma estrela, a Estrela Solitária.

Com um futebol eficiente e produtivo, se tornou o preferido de um conterrâneo exigente e não menos famoso chamado Telê Santana (1931-2006), com quem jogou a Copa do Mundo em 1986, no México e no São Paulo, em 1994.

Evangélico, há 26 anos, mantém em sua terra natal um trabalho social importante chamado ‘Casa de Transformação Betânia’, que atende dependentes químicos em seu sítio.

O Museu da Pelada entrevistou Alemão, nosso personagem da semana na série Vozes da Bola.

Por Marcos Vinicius Cabral

Pobres, você e seus quatro irmãos, ajudavam a família da forma que podiam. Você, por exemplo, foi engraxate, garçom, além de pintor. Como surgiu o futebol na sua vida?

O futebol entrou na minha vida por acaso. Eu não sonhava em ser um jogador de futebol, porque eu não pensava que isso poderia acontecer. Eu jogava em um time que na época ainda era amador, chamado Fabril Esporte Clube e não almejava realmente ter essa carreira no futebol. Mas acabou que aconteceu, foi um convite de um amigo que jogava no Botafogo nessa época e ele era conhecido aqui em Lavras-MG, pelo apelido de Mulato. Já no Botafogo, ele era chamado de Alemão, porque era namorado de uma menina suíça e em virtude disso era chamado por esse apelido. Coincidentemente, eu já tinha esse apelido também e assim ele me convidou e eu fui fazer um teste de vinte dias. Foi dessa forma que o futebol entrou e a partir desse teste, fez parte da minha vida.

Você foi revelado pelo Fabril, time de Lavras, em Minas Gerais, sua cidade natal. Como foi esse começo de carreira?

Muito complicado. Eu nunca havia saído da minha cidade para tão longe. E numa quinta-feira após o carnaval, acabei indo e conheci um Rio de Janeiro muito legal com aquela festa toda. Mas na segunda-feira me apresentei em Marechal Hermes, onde já dava início aos treinamentos para poder ser aprovado nesse teste. Dedicado, lembro que foram quinze dias de muitas lutas, muitas dificuldades e não existia uma boa estrutura naquela época no Botafogo. Então, posso afirmar que a fase de juniores foi uma das melhores que vivi no clube, sem dúvida nenhuma.

De onde vem o apelido Alemão?

Esse apelido foi colocado por meu pai quando eu tinha 5 anos de idade. Ele era ferroviário e vieram uns alemães e montaram algumas máquinas aqui na cidade de Lavras-MG e eles tinham o cabelo bem loiro, assim como o meu quando criança. E certo dia, meu pai chegou em casa e me chamou de Alemão, aí o apelido ficou e poucas pessoas hoje me chamam pelo meu verdadeiro nome.

Você foi tesoureiro dos Atletas de Cristo, grupo de jogadores evangélicos que fez sucesso no Brasil durante a década de 1980 e 1990. Como foi essa fase?

Essa informação de tesoureiro não procede, pois eu apenas fazia parte do grupo dos Atletas de Cristo, já que eu tive um encontro com o Senhor e a partir desse momento, passei a frequentar o grupo dos atletas cristãos.

Na sua passagem pelo Botafogo, faltou título. O que você atribui a isso?

Nessa época o Botafogo vivia um momento financeiro muito difícil. Havia perdido os direitos de continuar em General Severiano e estava se transferindo para Marechal Hermes e as coisas eram complicadas. A questão do título está ligada à questão econômica, e acho que o Botafogo tentava montar grandes times, porém, faltavam recursos para isso. Mas naquela época, o Rio de Janeiro tinha o melhor futebol do país com Flamengo, Vasco e Fluminense, em evidência, enquanto o Botafogo vinha em quarto lutando para sobreviver. Mas não foi uma fase fácil, foi uma período onde a gente enfrentava excelentes times com grandes jogadores e vencê-los era difícil.

Em 1985, a Bola de Prata, prêmio concedido pela revista Placar, foi parar em suas mãos como o melhor volante do Campeonato Brasileiro daquele ano. Qual foi a emoção em receber um prêmio como esse?

Olha, na verdade, foi um dos momentos mais inesquecíveis e emocionantes da minha carreira. Ganhar uma Bola de Prata no futebol carioca, jogando pelo Botafogo, que estava passando por dificuldades financeiras como falei anteriormente, naquela época e sem conquistar um título há muito tempo, não era tão simples assim. Tínhamos grandes jogadores na posição, tanto no Fluminense, no Vasco e no Flamengo, e eu fui premiado com a Bola de Prata. Até hoje eu tenho ela aqui em casa e é uma recordação muito especial para mim.


Qual derrota em Copas do Mundo doeu mais no Alemão: a de 1986, para a França de Michael Platini ou a de 1990 para a Argentina de Diego Maradona?

Sem dúvidas, que a derrota mais dolorida foi na Copa do Mundo do México em 1986, nos pênaltis contra a França. E o motivo é simples: em 1990, nós éramos uma seleção totalmente desorganizada, bagunçada, sem nenhum tipo de recurso e uma falta de liderança absurda! Então, em 1990, nós lutávamos para chegar longe naquela Copa do Mundo, mas era tanta confusão, tanto problema, que aquilo para quem jogava há um bom tempo, e no meu caso, eu já havia disputado um Mundial, e vi como foi bacana essa experiência. Mas na verdade, nada daquilo estava acontecendo lá em 1990, e mais cedo ou mais tarde, aconteceria a eliminação. Eu acho que a organização faz parte de um planejamento para se conquistar um título e se você não for organizado ou preparado, suas chances diminuem. E foi o que aconteceu conosco!

No Atlético de Madrid, da Espanha, você fez uma temporada de estreia tão boa que ganhou o prêmio Don Balón de melhor estrangeiro do campeonato e ainda convenceu os colchoneros a contratarem seu compatriota Baltazar, ex-parceiro no Botafogo, que vinha se destacando pelo Celta de Vigo. Mesmo com moral, por que não renovaram com você?

Como você mesmo disse na pergunta, no Atlético de Madrid, da Espanha, talvez tenha sido o melhor momento da minha carreira, tecnicamente falando. Ganhei o prêmio de melhor estrangeiro realmente, algo sensacional, mas o clube vivia um momento político conturbado. Para se ter uma ideia, o presidente eleito na época, não queria nenhum estrangeiro e não me queria por esse motivo, não foi nada pessoal. No entanto, ele teve bastante dificuldade para me vender, pois mesmo ele tendo contratado Paulo Futre, a maior transferência do futebol português à época, eu fui o melhor jogador estrangeiro e isso dificultava me vender. Todavia, o Napoli apareceu e a gente decidiu em conjunto, que era a hora de sair. Eu entendo que era uma opção política dele, tanto que depois disso estivemos juntos e nos encontramos algumas vezes e mantivemos um bom relacionamento. Na verdade, foi bom também, porque eu acabei indo para um grande clube e o Baltazar veio para o meu lugar como estrangeiro.

Em 1988, você foi contratado pelo ambicioso Napoli-ITA do presidente Corrado Ferlaino e do diretor geral Luciano Moggi. Foi o maior desafio na sua vida como atleta profissional?

É verdade, foi o maior desafio, porque eu estava indo para um clube que almejava realmente conquistar títulos importantes e jogar com o maior jogador do mundo, no caso o Maradona, eu teria que manter um nível de excelência que não seria fácil. E, para complicar mais ainda, logo na minha chegada, eu peguei uma hepatite B, no qual acabei ficando cinco meses parado. Em virtude dessa doença, as coisas ficaram difíceis, perdi 10 kg e para recuperar não foi fácil, no entanto, com muita luta e força de vontade, recuperei em 30 dias e voltei em uma Copa UEFA, fazendo grandes partidas e podendo dar continuidade nesse desafio.

E o gol na final da Copa Uefa de 1989, contra o Stuttgart-ALE. Quais são suas recordações daquele jogo no belíssimo Estádio de  Niedersachsenstadion, em Hannover, na Alemanha, tomado por 67 mil pessoas?

Realmente, esse jogo foi marcante na minha carreira, porque era um título muito importante para mim. Lembro que eu tinha acabado de me lesionar alguns minutos, tipo um ou dois minutos antes, e aquela jogada foi o último esforço que eu poderia fazer na partida. Então, foi naquela arrancada que acabei chegando até o gol, bati na bola, ela pegou um efeito, bateu no goleiro e acabou entrando. Posso afirmar que foi um gol importante no qual nós acabamos saindo na frente e isso aumentou consideravelmente a chance de vitória. Esse gol na verdade foi muito, mas muito importante mesmo.


Como foi jogar com Careca e Maradona? Eram realmente jogadores diferenciados?

Sem dúvida. Tive a felicidade de jogar com dois fenômenos do futebol mundial: Maradona e Careca. A velocidade de raciocínio dos dois era uma coisa absurda e para nós, que jogávamos atrás, era divertido vê-los trocando passes, fazendo jogadas maravilhosas e gols espetaculares. Foi um privilégio enorme para mim e ter jogado com eles foi algo sensacional. Mas era uma época de grandíssimos jogadores, como Van Basten, atacante do Milan-ITA e que era um fenômeno também.

Em quatro anos pelo Napoli, você fez 93 jogos e 9 gols pela Série A, e entrou para a história com a conquista do segundo campeonato italiano azzurro (1990). Foi a melhor fase que você viveu em quinze anos como jogador?

Foi sim. Foi uma fase de realizações, onde estava realizando o sonho de conquistar campeonatos e jogar num nível muito alto, jogando na Champions League e Copa UEFA, por exemplo. Realmente foi uma fase maravilhosa e acho que qualquer jogador que não jogou ou conquistou tais competições, gostaria de ter vivido tudo isso aí que eu vivi.

Maradona foi um divisor de águas na sua carreira: com ele, você conheceu o céu em títulos conquistados no Napoli-ITA e viu o inferno de perto ao ser considerado um dos principais culpados da derrota brasileira para a Argentina, na Copa do Mundo de 1990. O que tem a dizer sobre isso?

Na verdade, eu não me sinto nem um pouco culpado pela derrota da seleção. Quem assistiu aquele jogo e que seja uma pessoa séria e sensata, vai fazer a mesma análise que eu faço, que é dizer que eu tomei o drible do Maradona no meio de campo e depois disso ele passou por mais quatro ou cinco jogadores, ou seja, são jogadas normais de um gênio que conquistou um espaço e acabou na finalização do Caniggia. Aquela Copa do Mundo, na verdade, estava complicada, porém, antes daquele jogo, já estava comprometida e ali, naquele lance específico, foi uma gota d’água em um oceano de problemas a seleção. Mas vale frisar, que me sinto honrado em ter participado daquele mundial, porque foram duas Copas do Mundo no qual fui agraciado por Deus, não é simples e nem para qualquer um, jogar duas Copas do Mundo como titular. Na verdade, é um feito bem difícil.

Ainda sobre 1990, sua última partida pela Seleção Brasileira foi na Copa do Mundo da Itália, no qual a Argentina venceu por 1 a 0, gol de Caniggia. Você fez parte de um time que ficou marcado como a ‘Era Dunga’. Alguns deram a volta por cima em 1994, sendo campeões mundiais, como Taffarel, Jorginho, Branco, Muller e o próprio Dunga. Por que o Alemão não fez parte do time tetracampeão?

Aquela Copa do Mundo de 1990, na Itália, foi um mundial que marcou a vida de muita gente, inclusive a minha. Disputar um torneio da relevância de uma Copa do Mundo é o auge na carreira de qualquer atleta de futebol e comigo não seria diferente, já que eu estava esperando muito por aquela Copa e ela acabou sendo desorganizada e complicada para nós. Digo isso em todos os sentidos e obviamente, o final da seleção não poderia ser diferente, ou seja, nós saímos da maneira que saímos, jogando um futebol muito melhor que a Argentina e perdendo de 1 a 0, numa partida que merecíamos ganhar de 3 ou 4. Infelizmente, foi uma decepção para todo mundo e a CBF deveria fazer mudanças, que pediam atitude, liderança e foi o que ela fez trazendo Carlos Alberto Parreira como técnico e escolhendo outros jogadores para poder fazer parte do mundial seguinte, o de 1994. Ali, seria a grande mudança no futebol brasileiro, seria a reviravolta de tudo de errado, pois há mais de 20 anos que o Brasil não ganhava. Eu acho inclusive, de verdade, que o ciclo do Alemão terminou em 1990, confesso que houve desgaste, já que eu mesmo tive um pequeno problema com o presidente da CBF, e enfim, não dava mesmo para prosseguir. Acho que assim como eu, outros jogadores tinham condições de estar em 1994 nos Estados Unidos e não foram chamados, no entanto, acho que foi uma experiência bacana ter jogado duas Copas do Mundo.Sem demagogia, sou muito feliz por isso.

Em 1992, você foi vendido ao Atalanta-ITA, na qual jogou por dois anos. Por qual razão o Napoli-ITA te vendeu?

O meu contrato havia terminado e eu acabei sendo contratado pelo Atalanta-ITA, no qual passei dois anos bem diferentes da experiência em Nápoles em tudo, cidade, torcedor, time, e joguei em uma equipe bem modesta. Hoje é uma equipe com uma força incrível, mas na época, não era assim. Mas foram dois anos de experiência e mesmo sem títulos, foi importante na carreira.

No meio do ano foi comemorado o Dia Nacional do Futebol. O que esse esporte representou para o Alemão?

Na minha vida profissional o futebol representou absolutamente tudo. Foi um esporte que me levou a um lugar que eu jamais chegaria se não tivesse sido jogador. Foi sacrificante? Claro que foi, pois nada é fácil na vida, mas o sacrifício valeu a pena, porque eu joguei em lugares especiais na carreira, como no Fabril, Botafogo, Atlético de Madrid, Seleção Brasileira, Napoli, Atalanta, São Paulo e Volta Redonda, onde todos os jogadores gostariam de ter jogado. Então, eu acho que o futebol foi realmente muito importante na minha vida.

Você voltou ao Brasil em 1994, então com 33 anos, e passou duas temporadas pelo São Paulo, que tinha Telê Santana como técnico. Por que o São Paulo e por que Telê Santana?

Sempre tive um excelente relacionamento com Tele Santana. Na Copa do Mundo de 1986, ele optou por mim, como titular, dez dias antes de começar o mundial, já que eu vinha fazendo uma pré-temporada excelente, tanto na questão física como na tática e do esquema que ele queria implantar na seleção. A gente estabeleceu ali, naquela competição, um relacionamento de profissionalismo que foi muito bom e criamos um laço de amizade. Quando eu estava para voltar ao Brasil, ele era treinador no São Paulo, acabei sendo convidado para jogar no time comandado por ele. Foi uma experiência muito boa, em um time organizado, com profissionais do mais alto gabarito.

Quem foi seu ídolo do futebol?


Difícil responder essa pergunta e mais difícil ainda é falar de um ídolo apenas. Muito difícil. Eu joguei com jogadores que passaram a ser meus ídolos devido as experiências que tivemos juntos, devido ao tempo que vivemos juntos, mas o que eu presenciei tanto como caráter e como jogador foi o Zico. Ele foi um um ídolo incomparável, sem dúvida! Mas antes dele, eu conheci o Mendonça, que também foi um cara sensacional e um cracaço de bola. Ah, não posso deixar de falar de outros, que foram o Júnior na seleção brasileira, o Maradona e Careca, ambos no Napoli, e o Platini. Então, não dá para falar de um apenas. Talvez o Zico seria ao lado de Maradona, os meus maiores ídolos, porque eu me relacionei com eles e conheci o Zico, um cara que aprendi a gostar não só pelo jogador que foi mas pelo caráter, pelo homem, pelo ser humano e amigo de todos, uma pessoa séria e um profissional dedicado. Falar dele é difícil, pois era uma pessoa de bem e a gente se tornou amigos e hoje posso te assegurar que fui privilegiado em ter o Zico, Júnior, Maradona, Platini e Careca, como amigos. São esses que marcaram minha carreira e se tornaram meus ídolos de verdade.

Como tem enfrentado esses dias de isolamento social devido ao Coronavírus?

Eu moro na cidade de Lavras, em Minas Gerais, que tem uma população estimada em 110 mil habitantes, onde tenho um trabalho social em um sítio a 7 km próximo do Centro da cidade. Ultimamente minha vida tem sido de casa para o trabalho e do trabalho para casa e é claro, saio para fazer algumas coisas, mas com o devido controle. Mas graças a Deus eu tenho muito cuidado e não tem sido fácil enfrentar essa pandemia que não é agradável. Mas ter que ficar a maior parte do tempo em casa não é muito agradável, mas é um momento e a gente vai superar isso. Acredito que vamos sair dessa e se Deus quiser, em breve vai sair essa vacina.

Você pendurou as chuteiras em 1996, pelo modesto Volta  Redonda, não foi?

O término da minha carreira aconteceu inesperadamente. Lembro que eu havia terminado um contrato com São Paulo, na verdade nem terminou, pois a gente rescindiu antes e eu fiquei aguardando o contato por parte de alguns clubes, pois a intenção era poder jogar um ou dois anos. Mas esse clube não apareceu e surgiu na minha vida a oportunidade de conhecer o ex-prefeito Neto, à época, ligado ao futebol do Volta Redonda. Fui convidado para jogar o campeonato carioca de 1996, aceitei e foi uma experiência maravilhosa, no qual conheci amigos maravilhosos e uma cidade encantadora.

Defina Alemão em uma única palavra?

O Alemão é uma pessoa que procura viver uma vida simples, tranquila e não tem ligação com a fama. Confesso, que nunca me relacionei bem com essa questão de ser um cara conhecido e procuro viver dentro das minhas raízes. Valorizo pessoas que são meus amigos de infância, as que conheço desde pequeno e sei quem são. Gosto de assistir futebol, apesar de ter pouco tempo para ver, jogo um tênis de vez em quando, e tenho alguns objetivos e um deles é esse trabalho que venho fazendo há 26 anos, que é tentar ajudar pessoas com problemas de dependência química. É isso, sou uma pessoa bem normal e isso me define, acho eu, bem.

Que legal! Nos conte um pouco desse seu trabalho social. Onde funciona e qual o propósito dele?

Esse trabalho social existe há 26 anos e foi iniciado quando eu jogava no São Paulo, em 1994. Na verdade, começou nas marquises debaixo dos viadutos da cidade paulista e foi estendido para Lavras, em Minas Gerais, onde eu tinha um sítio que recebia pessoas para serem cuidadas com a finalidade de deixarem o vício da dependência química. Desde então, são 26 anos em que trabalhamos na vida das pessoas pregando a palavra do Senhor para que eles possam ter um encontro pessoal e verdadeiro com Deus, libertando-os desse vício terrível da dependência química. Eu tenho um prazer enorme em fazer isso, é uma coisa que eu gosto muito, me envolve bastante e dedico a maior parte do meu tempo fazendo esse trabalho. Na ‘Casa de Transformação Betânia’, eu conto com pessoas maravilhosas que me ajudam, como a Socorro, que é a minha parceira desde a época da fundação, assim como os outros parceiros como o Dr. Ranieli, que é o cirurgião dentista que nos dá uma mão muito grande, o Dr. Acácio, Dr. Rubens e o Dr. Sebastião, outros que nos dão uma força enorme e se juntam a nós, para ajudar pessoas necessitadas de apoio e que estão próximas da morte. Vale ressaltar que a gente passa o dia praticamente todo lá, conversando, aconselhando, orando e pregando, para que eles possam ter essa chance de mudar.