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A QUEBRA DO RECORDE E O MUSTANG COR DE SANGUE

por Victor Kingma


No final dos anos 60, logo após a inauguração do Mineirão, ocorrida em 1965, o Cruzeiro montou um dos maiores times da história do futebol brasileiro. Durante alguns anos desfilaram pelos gramados com a camisa azul craques consagrados como Zé Carlos, Piazza, Natal, Dirceu Lopes e Tostão.

Os saudosistas do futebol não se esquecem das partidas memoráveis do time mineiro contra o poderoso Santos de Pelé, quando se encontravam pela antiga Taça Brasil. No âmbito regional, então, a superioridade era tanta que o time chegou a ficar 70 partidas sem perder, entre os campeonatos de 1967 e 1970.

Outro fato marcante protagonizado pelo Cruzeiro daquela época foi a incrível façanha do goleiro Raul, que em 1969 ficou mais de 1000 minutos sem levar gol, um recorde nunca alcançado, até então. 

Nos jornais e programas esportivos das emissoras de rádio e TV da época, o fato era tratado com destaque e a cada novo jogo criava-se uma grande expectativa sobre qual jogador quebraria a invencibilidade do goleiro cruzeirense.  

Um programa esportivo da TV Itacolomi de Belo Horizonte chegou a instituir um prêmio: o jogador que marcasse o gol histórico ganharia um Mustang “cor de sangue”, o carro da moda na época, que virou até sucesso musical na interpretação de Wilson Simonal para a composição de Marcos e Paulo Sérgio Valle.

Finalmente, em 18 de maio daquele ano, aos 42 minutos do segundo tempo, no jogo Cruzeiro 3 x 1 Democrata-SL, no Mineirão, a série foi interrompida.

Após 1011 minutos, o goleiro, que ficou famoso por atuar com a vistosa camisa amarela, foi vencido pelo atacante Ivany, destaque do time de Sete Lagoas. 


Para comprovar a força da defesa do Cruzeiro, o último gol que Raul havia sofrido tinha sido um gol contra do zagueiro Fontana, aos 21 minutos do segundo tempo, numa partida contra o Uberaba, no primeiro turno do campeonato.

Ivany, o Ny, natural de Santos Dumont, Minas Gerais, foi um grande talento que teve a carreira abreviada por uma séria contusão no joelho.

Iniciou sua carreira no Social, de sua cidade, tendo atuado pela Seleção da Liga de Juiz de Fora, Atlético Mineiro, Democrata-SL e Vila Nova, de Goiás. Enfrentou, em diversas ocasiões, craques consagrados do futebol brasileiro.


O carro, o Mustang cor de sangue, evidentemente, nunca ganhou. Segundo dizem, na promoção, que era uma jogada de marketing, os organizadores esperavam que o gol fosse marcado por um famoso atacante do futebol brasileiro, de preferência Dario, ídolo do Atlético Mineiro, o grande rival do Cruzeiro.

Para sua decepção, Ny, o autor da façanha, recebeu como prêmio uma réplica do carro, um Mustang vermelho, de controle remoto. O fato é inclusive confirmado pelo próprio goleiro Raul.

Hoje, aposentado, nas conversas e bate papos na sua cidade, o ex-craque sempre tem que contar sobre seu gol histórico, motivo de orgulho, não só para ele, mas, também para todos seus amigos e conterrâneos.

 

BANDEIRINHA GAGO

por Victor Kingma


No início da década de 60, o  Palmeiras, que na época possuía um dos maiores times do Brasil, foi fazer um amistoso no interior de São Paulo. O juiz, por exigência da equipe esmeraldina, veio da capital, mas os auxiliares eram locais, com destaque para o bandeirinha João Gaguinho. Olho de lince, não perdia um lance. O problema era que possuía uma gagueira incontrolável, principalmente quando ficava nervoso.

Antes da partida festiva ocorreram todas aquelas solenidades de praxe, com discursos de autoridades e troca de flâmulas, costumes muito comuns na época. Entretanto, bastou a bola rolar para o clima amistoso do jogo acabar,  e várias jogadas violentas iam se sucedendo de ambos os lados.

Numa jogada envolvendo vários jogadores, o zagueiro do time local foi atingido por uma  cotovelada e o árbitro não viu. João Gaguinho, que como sempre acompanhava o lance de perto, levantou a bandeira.

Enquanto o atleta local era atendido, o juiz, alertado pelos demais jogadores, se dirigiu ao bandeirinha.


–  Quem foi o agressor?

–  Foi  o   Va…vá! ,    o Va… vá!,   o  Va… vá!

Incontinente, o árbitro expulsa de campo Vavá, o leão das Copas de 58 e  62.

Enquanto o jogador palmeirense, sem entender nada, deixa rapidamente o campo, João Gaguinho, muito nervoso e agitando sem parar a bandeira, invade a cancha correndo em direção ao  juiz:

–   Nâââ… não    fo… foi   o  Va vá!    Nãâã…não    fo…foi  o Va vá!

– Quem foi então?

–  O  Vá… vá ,   o Va…. vá ,   o  Va… vá…

 O Va….  Val… de… mar…. Caara… bi..na !

 (Valdemar Carabina, vigoroso lateral do Palmeiras)

Tarde demais…

NÃO JOGA NAS ONZE

por Victor Kingma

Essa é para lembrar de um grande artista da bola, o Garrincha da ponta esquerda.

No final dos anos 50 um combinado paulista foi se apresentar no interior do estado. Aqueles amistosos em época de férias.

Embora o clima na cidade fosse de festa, o técnico do time do lugar há tempos vinha passando por uma situação constrangedora nos jogos da liga regional: estava sendo pressionado pelo prefeito a escalar o seu filho, Baguinho, recém chegado da capital. Só que otime estava certinho e o filho do político não jogava lá essas coisas.

E não tinha argumento que pudesse aliviar a pressão. Sempre que o técnico questionava sobre qual posição escalá-lo, o prefeito dizia:

– Escala em qualquer posição. O menino é fera, joga nas onze!

Na semana do jogo histórico e de grande festividade na cidade, a pressão aumentou mais ainda.  

 Como o filho do manda chuva da política local ia ficar de fora de uma partida tão importante? Ainda mais com o palanque cheio de autoridades.


No dia do jogo, em meio a grande foguetório e com o pequeno estádio totalmente lotado, o time local aparece no gramado com o empolgado Baguinho na lateral direita, camisa 2. 

Finalmente o veterano treinador tinha fraquejado às pressões.

Pouco depois entra em campo o combinado paulista. Na ponta esquerda, Canhoteiro, do São Paulo, um dos maiores dribladores que o futebol brasileiro já teve.

O final trágico todos podem imaginar. 

Com trinta minutos de jogo, Baguinho, o esforçado rebento do prefeito, extenuado, pede pra sair após levar um baile memorável.


Charge: Eklisleno Ximenes

No final do jogo, dando de ombros para a fúria do prefeito por ter colocado o seu “craque”  polivalente naquela roubada, o veterano treinador, raposa astuta do futebol do interior, com sorriso irônico se defendia de qualquer indagação:

–  Ué, mas não joga nas onze?

Veja mais em: www.causosdabola.com.br

ANOS DOURADOS

por Victor Kingma

Na segunda metade da década de 50, o Brasil vivia uma fase de euforia. O projeto desenvolvimentista do presidente Juscelino Kubitschek prometia crescimento de cinqüenta anos em cinco. A era JK foi uma fase áurea de desenvolvimento do país. Naquele período, entre tantas outras realizações, podemos destacar a expansão da malha rodoviária, a construção de hidrelétricas e a implantação da indústria automobilística e naval no país. Além da construção de Brasília, a nova capital.


No rastro do otimismo que o Brasil vivia naquele tempo, movimentos artísticos e culturais apareciam nos quatro cantos do país. 

Vivíamos os famosos “Anos Dourados.”

Em Copacabana, no Rio de Janeiro, a então capital do Brasil, um grupo de músicos e compositores, entre os quais Ronaldo Bôscoli, Roberto Menescal, Antonio Carlos Jobim e Vinícius de Moraes, costumavam se reunir na casa dos pais da cantora Nara Leão, preocupados em criar um novo ritmo, que melhor combinasse com seus estilos de vida e formação musical. Sonhavam unir a alegria da música e do samba brasileiro com a harmonia do Jazz americano.


Certo dia, em 1957, Menescal recebeu a visita de um rapaz que não conhecia e que se apresentou como João Gilberto. Esse pediu um violão e disse que precisava mostrar uma nova batida que havia criado. Um jeito totalmente novo de tocar violão.

Impressionado, Roberto Menescal foi imediatamente mostrar a novidade aos amigos. E a batida diferente do violão de João Gilberto era exatamente o que faltava para ser criado o estilo musical que tornaria a música brasileira conhecida internacionalmente. Assim surgiu a Bossa Nova.

Em diversos esportes tivemos um período de glórias com o surgimento de estrelas como Maria Ester Bueno, no tênis, e Éder Jofre, “o Galo de Ouro”, no boxe – que acabaria conquistando o cinturão da categoria em 1960, numa épica luta contra o mexicano Eloy Sanches.


 No basquete o Brasil conquistaria o inédito título de campeão mundial, em 1959, no Chile, com uma histórica seleção, onde se destacavam os astros Wlamir e Amaury.

E no futebol?

No futebol, o Brasil vinha de duas grandes frustrações nas Copas anteriores: a tragédia da derrota de 2 a 1 para o Uruguai em 1950, em pleno Maracanã, diante de 199.854 torcedores, o maior público das história do futebol, e a queda por 4 a 2 nas quartas de final em 1954, na Suíça, diante da histórica seleção húngara, de Puskas.

Mas, no rastro das energias dos “Anos Dourados”, o Brasil, finalmente, se tornaria campeão mundial pela primeira vez, em 1958, na Suécia.


Além da inédita conquista, com uma das maiores seleções da história, o futebol brasileiro assombrou o mundo ao apresentar  um menino de 17 anos, que se tornaria o maior jogador de todos os tempos, o rei do futebol,  que seria eleito futuramente o atleta do século XX.

Ao lado do menino Pelé, entre tantos craques consagrados como Didi, Nilton Santos, Zito, Bellini e Gilmar, o mundo do futebol conheceu também Garrincha, “o anjo da pernas tortas”, o maior ponta direita e o maior driblador que já passou pelos gramados.

E a magia daquele time tinha uma incontestável explicação: jamais uma seleção conseguiria escalar no mesmo time dois craques tão espetaculares como Garrincha e Pelé. A prova disso é que sempre que atuaram  juntos, em 40 partidas e sempre pela seleção brasileira, eles nunca foram derrotados.

Os deuses do futebol foram generosos com os gênios da bola.

Naquele tempo era assim…

O AGITO DA DONA XICA

texto: Victor Kingma | charge: Eklisleno Ximenes


Naquela cidadezinha mineira o fascínio pelo futebol era geral. Aos domingos era de lei assistir aos jogos do Expressinho, nome dado em homenagem ao Expresso da Vitória, time inesquecível do Vasco e paixão do seu fundador.

Farmacêutico aposentado, seu Miranda era o técnico, médico e psicólogo do time, conhecido na região pela capacidade de reverter resultados aparentemente impossíveis. Várias eram as histórias contadas sobre viradas inesquecíveis, após suas preleções no intervalo.

Dona Xica, sua mãe, aos 85 anos, era a torcedora símbolo do time. Não perdia um jogo e, bandeira na mão, tinha até lugar cativo à beira do gramado.

Naquele domingo, com sol de 40 graus, a coisa não estava indo bem para o Expressinho. Terminado o primeiro tempo, o placar apontava 2 a 0 para os visitantes.

Portas fechadas no vestiário, o técnico se reunia com seus atletas, tentando mais uma heroica façanha. De repente, um alvoroço. É o massagista, batendo à porta:

–  Que tumulto é este?

– É dona Xica, seu Miranda! Está correndo feito louca, dando volta olímpica no campo com a camisa na cabeça, como o Rivaldo…

– Mas, o que houve?

– Ela estava com muito calor e eu fui ao vestiário e dei a ela um copo de suco. Daquele que o senhor costuma dar pros jogadores…

– Nossa Senhora! Mamãe está dopada!