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FUTEBOL, SUPERSTIÇÃO E RELIGIOSIDADE

por Victor Kingma


Suécia, 1958.  Após uma campanha brilhante, o Brasil chegou à decisão da 6ª Copa do Mundo como grande favorito. Ninguém podia imaginar que a aplicada seleção sueca pudesse fazer frente ao futebol arte de Didi, Garrincha e Pelé, que vinha encantando o mundo. Ainda mais após a exibição de gala nas semifinais, onde tinha goleado por 5 x 2 a poderosa seleção da França, de Kopa e Fontaine.

Entretanto, a dois dias da final, os organizadores tinham um grande problema a resolver: as duas seleções utilizavam o uniforme amarelo.  Normalmente, seguindo as regras do cavalheirismo esportivo, muito comum naquela época, esperava-se que os anfitriões, como gentileza, permitissem que os visitantes utilizassem o seu uniforme oficial. Mas os dirigentes suecos não o fizeram, e a FIFA, sem alternativa para o impasse, marcou um sorteio para decidir quem teria que utilizar camisas de outra cor.

O Brasil, em protesto, não enviou representante para acompanhar. E não deu outra. Perdeu o sorteio, que muitos acreditam tenha sido manipulado. Não poderia, então, jogar com a sua tradicional camisa amarela. Pior: o branco era o outro uniforme disponível para disputar a finalíssima.

Começou então o drama. Supersticiosos, vários jogadores e integrantes da delegação brasileira logo se lembraram da Copa de 1950, onde o Brasil, mais favorito ainda e jogando com camisas  brancas, inexplicavelmente perdera a Copa para o Uruguai em pleno Maracanã,  na maior tragédia da história do nosso futebol. 

Diante do clima de preocupação que  tomou conta de todos, Paulo Machado de Carvalho, o chefe da delegação, resolveu, então, apelar para a superstição e religiosidade dos brasileiros: a seleção  disputaria a final da Copa com a camisa  azul, cor do manto de Nossa Senhora Aparecida.

E ainda lembrou aos jogadores que, nas últimas cinco Copas disputadas, quatro delas foram vencidas por seleções que utilizaram camisas azuis, recordando os feitos da “Azurra” Italiana em 1934 e 1938 e da “Celeste” Uruguaia em 1930 e 1950.

Um uniforme azul foi então comprado às pressas em uma loja de artigos esportivos, em Estocolmo. Mário Américo, o massagista, e Assis, o roupeiro, passaram o sábado, véspera do jogo, costurando os números e os escudos retirados das camisas amarelas. 

No domingo, 29/06/1958, dia da grande final no Estádio de Rasunda, na Suécia, os nossos craques, livres da “maldição” da camisa branca e protegidos pelo manto sagrado da padroeira do Brasil, fizeram prevalecer a sua classe e, ao vencerem a Suécia por 5 x 2, conquistaram a primeira Copa do Mundo para o nosso país.

Esse fato, inclusive, é contado com detalhes por Ruy Castro numa de suas  grandes obras, o excelente livro Estrela Solitária, um brasileiro chamado Garrincha.

Na foto, a Seleção Brasileira, campeã do mundo, em 1958, posando com o uniforme azul improvisado para a final:

Em pé: Djalma Santos,  Zito,  Bellini,  Nilton Santos, Orlando e Gilmar.

Agachados: Garrincha, Didi, Pelé, Vavá ,  Zagallo e o massagista Mário Américo.

O DIA EM QUE O PAPA ENTROU EM CAMPO

por Victor Kingma 


Charge: Eklisleno Ximenes

Pafuncio Parreira, popularmente conhecido como PAPA, era um poderoso cartola do interior. Próspero empresário do ramo de sumos de frutas e cacique político da região, era amado pelos aliados e odiado pelos adversários. Não tinha meio termo. Pré-candidato a prefeito de sua cidade foi denunciado à Justiça Eleitoral por estar fazendo propaganda antes da data permitida, ou seja, distribuindo um sem número de jogos de camisas para os times de várzea do lugar com a inscrição: “O PAPA vem aí”.  

O juiz do lugarejo, em razão disso, concede um mandado de apreensão e as camisas são recolhidas.

Os adversários já cantavam vitória por terem inibido a fraude, quando, no domingo seguinte, todos os times entram em campo com o novo uniforme patrocinado pelo mega cartola. Dessa vez trazendo estampado nas camisas a propaganda de um inusitado “produto”, desenvolvido às pressas pela sua empresa e que em breve chegaria ao mercado:

“Vem aí o SUMO PONTÍFICE!”.

COMO SURGIU O DRIBLE DA VACA?

por Victor Kingma


Charge: Eklisleno Ximenes

O futebol, o esporte mais praticado no mundo, é formado por jogadas espetaculares, fruto da habilidade e criatividade dos jogadores que as executam. Muitas delas acabam sendo batizadas pelos torcedores com nomes criativos e singulares, baseado em situações do cotidiano que se assemelham ao lance executado. 

 

O drible, então, onde o verdadeiro craque demonstra toda sua arte com a bola nos pés, é a jogada que mais recebe adjetivos. Como exemplos podem ser citados o “elástico” criado por Rivellino e a “pedalada”, eternizada por Robinho.  Um outro drible, dos mais inusitados e conhecidos no vocabulário da bola, é o famoso “drible da vaca”.

Mas como surgiu essa jogada sensacional, na qual o jogador joga a bola por um lado do marcador e pega do outro?

Quando Charles Miller trouxe o futebol para o Brasil, em 1894, esse esporte era praticado basicamente nas cidades. Entretanto, logo se tornou uma paixão nacional e campos improvisados foram surgindo nos mais distantes lugares.

No meio rural muitos desses campos eram construídos ou improvisados à beira dos pastos ou currais das fazendas.  Por isso era comum durante os jogos o campo ser invadido por vacas furiosas, estimuladas pelas camisas multicoloridas dos jogadores.

Os atletas mais habilidosos (ou corajosos) para não perder a bola e também para se livrar das vacas que vinham em sua direção, jogavam a bola por um lado e a pegavam do outro.  E era uma festa para quem assistia.

A “jogada”, então, foi se popularizando e acabou chegando aos jogos oficiais. Assim, quando o jogador se livra do marcador utilizando esse mesmo artifício está aplicando, na linguagem do futebol, o inusitado e divertido “drible da vaca”.

 

BERICO, O NOVO PELÉ

por Victor Kingma 


No início dos anos 60, os jogos transmitidos pela TV eram raros, principalmente envolvendo os times do interior, o que dificultava a observação dos novos talentos que surgiam fora dos grandes centros. Desde o início de 1964, entretanto, os noticiários esportivos, principalmente das rádios de São Paulo,  passaram a chamar a atenção dos torcedores para uma nova sensação que despontava no Guarani de Campinas: o jovem atacante Berico, que os mais eufóricos chegavam a chamar de o novo Pelé.

O menino prodígio, então, passou a ser cobiçado por quase todos os grandes clubes do futebol brasileiro. Mais ágil nas negociações, o Flamengo logo se acertou com os dirigentes campineiros e contratou a nova promessa do futebol brasileiro por 50 milhões de cruzeiros, valor expressivo na época.

A transação causou tanta revolta e consternação juntos aos torcedores do Guarani que o jogador teve que sair às escondidas da cidade.

A empolgação dos torcedores flamenguistas com o novo astro veio logo no jogo de estreia contra o Olaria pelo Campeonato Carioca, no dia 10 de outubro daquele ano. Berico teve uma atuação espetacular: marcou dois gols e participou do outro, na vitória dos rubro-negros por 3 x 0.  E encantou os torcedores com sua velocidade, toques rápidos e cabeçadas certeiras. Parecia que o Flamengo tinha mesmo descoberto uma joia rara. 


As manchetes dos jornais que já vinham dando destaque para a aguardada estreia do jovem avante, nos dias seguintes, então, destacavam em letras garrafais a grande atuação e a biografia da nova estrela que surgia no futebol brasileiro. Os programas esportivos não falavam em outra coisa. Eu, que assisti ao jogo pela TV, me lembro bem que um comentarista, mais empolgado, chegou a dizer que Berico tinha todas as características de Pelé, com a vantagem de cabecear melhor.  

Mas a nova estrela só brilhou na estreia. Depois se apagou. O menino não suportou tanta pressão e expectativa. Nas partidas seguintes, com todos os holofotes voltados em sua direção, corria, se esforçava, mas não conseguiu marcar um gol sequer até o final do campeonato. E foi barrado pelo técnico Flávio Costa. 

Depois de 22 jogos no Flamengo e apenas cinco gols marcados, dois deles contra São Paulo e Corinthians, pelo Torneio Rio-São Paulo de 1965, os dirigentes o venderam para o futebol mexicano. No México, livre da pressão da torcida e da imprensa, pode finalmente mostrar seu talento. Virou ídolo e brilhou por 10 anos seguidos defendendo o Club Deportivo Oro, de Jalisco, e o Pumas. Já veterano ainda atuou no futebol americano, onde encerrou a carreira, em 1978.  


José de Oliveira Filho, o Berico, nasceu na cidade de Sertãozinho, em 10 de abril de 1942 e faleceu em Sacramento, Estados Unidos, em 2016. Seu prestigio no México era tanto que os clubes pelos quais atuou lhe prestaram várias homenagens quando de sua morte.

Foi um desses talentos que, se os torcedores do Flamengo tivessem um pouco mais de paciência com ele, poderia, guardadas as devidas proporções, ter se tornado mesmo um grande ídolo na história do time rubro-negro.

 www.historiasdofutebol.com.br

O TÉCNICO MOTIVADOR

por Victor Kingma


O treinador Tico Santana era um folclórico técnico do interior mineiro. Se o apelido vinha da infância, o sobrenome ele herdou da idolatria que tinha por Joel Santana. Imitava o Papai Joel em tudo, desde a prancheta até o jeito paternal epeculiar de motivar seus atletas. 

Certa vez, numa decisão da liga local, parecia que Tico Santana ia colocar mais um título em seu extenso currículo. Prancheta debaixo do braço e aos gritos à beira do campo, motivava o time que, retrancado, segurava o 0 x 0 que lhe daria o campeonato.

De repente, faltando cinco minutos para o final do jogo, acontece o imprevisto: o goleiro paraguaio Paredes, que pegava tudo, sofre séria contusão e tem que ser substituído. O problema é que seu substituto, o reserva Rebote, como o próprio nome sugeria, não era nada confiável para agarrar as bolas. 


Suando em bicas mas tentando manter a fleuma, o velho Santana tenta motivar seu limitado guarda metas com palavras de ordem: 

– Vai lá, campeão! O título agora está em suas mãos! Eu confio em você! 

– O senhor acha que estou preparado, professor? – Indaga o assustado Rebote. 

– Preparadíssimo, meu filho! Vai lá que o título é nosso! 

Assim que o jogo reinicia, contudo, o bravo Tico Santana se vira para seus jogadores, descontrolado, joga a prancheta pro alto, e, aos berros, com as mãos na cabeça, grita: 

– Pelo amor de Deus, não deixem chutar no gol de jeito nenhum!!!