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victor kingma

O FIM DA PICADA

por Victor Kingma 


O juiz apita! Falta na entrada da área.O avante solta a bomba. A bola sobe e estoura no galho da árvore atrás do gol!

Os moradores da casa ao lado se agitam e invadem o gramado. Começa a confusão: 

O gandula, pernas avermelhadas, grita de dor. O goleiro abandona a meta e corre. 

Os demais jogadores, assim como o trio de arbitragem, com as orelhas em fogo, também saem em disparada. 

A turba de torcedores se esvoaça. À beira do gramado, o cão vira-latas rola na grama.

No estábulo ao lado do campo o touro, anca em brasa, arrebenta a cerca e foge. 

O tropeiro que assistia ao jogo, pica a mula e desaparece. O narrador solta o grito, não de gol, mas de dor.

Pânico geral!

Minutos de terror!


Após a invasão, pouco a pouco os invasores vão voltando pra casa. 

Mas ainda há perigo. Ninguém quer sair do abrigo.

– O que fazer?

Damião, o corajoso massagista, acende a tocha…

Pouco depois a casa de marimbondos fumega no chão.

Alivio geral.  

É O FIM DA PICADA!

Mas será que ainda vai ter jogo?

O ARTILHEIRO PALMEIRENSE QUE SE TORNOU O MAIOR ÍDOLO DO TORCEDOR DO FLAMENGO

por Victor Kingma 


Quando eu morava na fazenda, em Mantiqueira, no início dos anos 60, futebol a gente só ouvia pelo rádio. Até porque, televisão não havia por aquelas bandas.

Na minha casa era muito comum eu, meus irmãos e os amigos nos reunirmos para escutar as partidas, como eu já disse em outro texto, na frequência que o nosso velho e chiador rádio Zenith conseguisse sintonizar primeiro.

Quando não tinha jogo do Flamengo, paixão de toda a família, ficávamos procurando outras partidas para ouvir, principalmente dos Campeonatos Carioca ou Paulista.

Zé da Joaquina, um sujeito boa praça e grande amigo da família, era presença constante nesses dias.

Rubro-negro fanático, de repente assumiu como seu grande ídolo um jogador palmeirense, o atacante Tupãzinho, recém chegado a São Paulo, vindo do Guarany de Bagé.

Isso se deu pelo fato de que toda partida do Palmeiras que o bravo Zé da Joaquina escutava o avante gaúcho sempre marcava seus gols, com seu chute mortal de perna esquerda. Feito exaltado pelos famosos narradores da época.  

Foi o bastante para ele, atacante assíduo das peladas locais, assumisse para si o apelido.

A cada gol que fazia saía correndo e gritando alucinado: Tupãzinho!!! Tupãzinho!!! 

A molecada do lugar às vezes até deixava de fazer os gols e passava a bola para ele, só pra se divertir com as suas malucas comemorações gritando o nome do atacante palmeirense. 

Um dia ele, que dependendo da lua não batia bem das bolas, chegou ao cúmulo de se atirar na lagoa que ficava ao lado do campo para comemorar um gol e quase morreu afogado!

O certo é que fora o Flamengo, time pelo qual era tão fanático que vivia comprando briga com os adversários em dias de derrota rubro-negra, Tupãzinho passou a ser tudo para ele no futebol.

Bem, mais um dia esse amor acabou.

Flamengo e Palmeiras se enfrentavam no Maracanã, pelo torneio Rio-São Paulo, de 1965.

Ouvidos colados no rádio, os flamenguistas, em grande número naquele dia, eram só preocupação com a presença de Zé da Joaquina na torcida. 

Afinal, todo jogo do Palmeiras que ele ouvia Tupãzinho jamais deixou de marcar seus gols. Será que isso vai se repetir? – Indagavam apreensivos.

E não deu outra: mal a partida começa e o avante palmeirense recebe um passe de Ademir da Guia, dribla o goleiro Marcial e estufa as redes rubro-negras.  

No inicio do segundo tempo, o Flamengo, que perdia por 2 x 1, vai todo para o ataque e tenta o empate, mas, num contra-ataque, o artilheiro palmeirense recebe novo passe de Ademir da Guia e arremata:  3 x 1!

Foi demais para os torcedores rubro-negros!  

E mais uma vez o bravo Zé da Joaquina sairia correndo, alucinado. 

Desta vez não para comemorar os gols do seu ídolo, mas para fugir da fúria dos torcedores  do seu próprio time.

Final do jogo: Palmeiras 4 x 1 Flamengo. Numa das melhores partidas do atacante com a camisa alviverde do Parque Antarctica.

Foi o traumático fim da idolatria do torcedor rubro-negro pelo astro palmeirense e também da carreira do artilheiro Tupãzinho nas peladas do lugar!  

 

Victor Kingma

O PASTOR PITBULL E O FAIR PLAY

por Victor Kingma


Neco Pitbull era um truculento técnico do interior mineiro. Ex-zagueiro dos times de várzea locais, era daqueles que mordiam até na própria sombra, o que, aliás, lhe rendeu o apelido.

Depois que virou treinador, seguiu a mesma linha e exigia dos seus jogadores jogo pegado, com marcação forte e entradas duras.

Seu slogan era: “a bola e o adversário juntos não podem passar! Um dos dois tem que ficar!”. 

Só que, após entrar para a igreja e se tornar o Pastor Manoel, mudou completamente de postura. 

Agora, em suas preleções, misturava instruções táticas com orações e preces e  exaltava a necessidade do fair play e o respeito aos “irmãos” de profissão. 

Foi assim que seu time chegou à decisão. E o título parecia barbada. Além de jogar em casa, a equipe do pastor tinha uma grande vantagem: podia perder até por dois gols de diferença que ainda assim seria a campeã. 

Tranqüilo à beira do gramado, suas instruções pareciam refletir o novo comportamento: num contra ataque adversário, ao ver que seu zagueirão de 1,90m partia com cara de poucos amigos contra o atacante, grita:

– Na bola, só na bola, sem falta! 

Pronto! O avante se livra do limitado beque e estufa as redes: 1×0. Reduzida a diferença.

Já no segundo tempo, em nova investida do ataque rival, o ponta direita fica no mano a mano com o seu lateral. O técnico pastor, pregando literalmente o fair play, mais uma vez orienta em tom paternal:

– Sem falta, rouba a bola meu filho, jogo limpo e na paz! 

O ponta, então, passa com facilidade pelo marcador e faz 2×0. 

A torcida entra em desespero. Mais um gol dos visitantes seria o desastre. 

O final fica dramático para o time do Pastor. 

E o pior estava por vir: no último lance do jogo, quando o juiz já se preparava para encerrar a partida, o arisco pontinha adversário mais uma vez avança velozmente pela direita, finta o lateral e parte em direção ao gol. Tragédia à vista. 

O atabalhoado beque central sai na cobertura.  Aí o técnico “Pastor”, destemperado e prevendo a catástrofe, incorpora o Pitbull dos velhos tempos, esquece o fair play e, endemoniado, esbraveja:

– Chega junto! Pega! Mata a jogada! 

Desce o sarrafo, pelo AMOR DE DEUS! Senão a gente perde a desgraça desse título!!!  

VESTIR A CAMISA DO AMÉRICA, O SONHO DE UM RUBRO-NEGRO QUE NUNCA SE REALIZOU

por Victor Kingma


Meus maiores ídolos no futebol sempre foram Almir, o Pernambuquinho, e Zico. Fato já relatados em alguns textos e até em um de meus livros. 

Entretanto, em relação à camisa dos clubes, sempre tive um fascínio pela camisa do América. Desde quando a vi pela primeira vez na capa da Revista do Esporte, que trazia os meios campistas Amaro e João Carlos, lá no início dos anos 60. 

Mais tarde, como meia-direita de boa técnica no time do São Mateus, que tinha o mesmo nome do bairro onde eu morava, em Juiz de Fora, sonhava um dia vestir aquela camisa vermelha cor de sangue. Isso embora a minha paixão rubro-negra jamais deixou de existir.

O sonho nunca se realizou. Não por falta de talento, mas devido ao abismo que havia naqueles tempos entre o futebol do interior e os grandes times da capital.

Joguei em vários times amadores de Minas Gerais, mas nenhum deles tinha a camisa vermelha, para, pelo menos, satisfazer aquele meu desejo de boleiro. 

Bem, mas de repente surgiu a oportunidade: um novo clube foi fundado no vizinho bairro do Altos dos Passos. O nome: América Futebol Clube. Logo veio o convite para eu mudar de ares. 

Não hesitei, aceitei na hora. Finalmente ia realizar o meu sonho de vestir a camisa encarnada.

Fiz apenas uma exigência: queria usar a número 10, do grande ídolo Edu, irmão do menino Zico, que começava a despontar como ídolo na Gávea.

Só que no dia da estreia, veio a surpresa quando o técnico distribuiu as camisas verde e preta do América Mineiro, paixão do fundador do time.

Fiz a estreia, até marcando um gol com o número da camisa de Jair Bala, craque do time mineiro.  Mas ficou uma certa  frustração.

Anos depois, já como meio campo do time do Guarany, de Mantiqueira, onde eu era o craque e capitão do time, veio outra oportunidade de vestir a camisa vermelha.


As cores do nosso time combinavam o vermelho e o branco, mas, naquele ano, a diretoria resolveu inovar. Mandou confeccionar um uniforme com camisas totalmente vermelhas, idênticas às do América. Acho que até por influência minha, pois eu vivia falando da beleza da camisa americana.  

Entretanto, no dia da estreia, nova frustração: já estávamos no aquecimento, eu com a reluzente camisa 10, do astro Edu Coimbra, quando chega a notícia: o uniforme do time visitante também era vermelho e eles não tinham camisas reservas.   

Como anfitriões, tivemos que trocar de camisas e entramos em campo com a camisa branca com listras vermelhas.

Foi, acredito, a minha última partida oficial como jogador de futebol. 

Pouco tempo depois, comecei a minha a vida profissional em Volta Redonda.

E a minha jornada dentro do campo ficou para trás. 

Para matar a saudade dos gramados restaram os rachas com os inesquecíveis amigos de trabalho na CSN.

O futebol sempre será a minha paixão, agora como torcedor e escriba.

Dos tempos de jogador, além das belas lembranças, ficou a frustração por jamais ter disputado uma partida sequer com a cor da camisa que acho a mais bonita.

Depois da rubro-negra, é claro!

O INUSITADO DUELO DOVAL X CAFURINGA E A REVANCHE NO FLA X FLU QUE JAMAIS ACONTECEU

por Victor Kingma


Na minha infância eu gostava muito de jogar botão. Entretanto, jamais utilizei os tradicionais times comprados nas lojas de brinquedos.

Gostava eu mesmo de confeccioná-los usando casca de coco ou conseguindo tampas descartadas de relógios Lanco, na relojoaria do bairro, em Juiz de Fora, onde eu morava na época. 

Eu era um bom praticante, sem nunca ter conseguido ser um craque no jogo, como tantos amigos do bairro.  

Certa vez, recém casado, lá pelos anos 70, fui desafiado por um primo da minha esposa, então com quatorze anos, para uma partida.

Missão ingrata, pois o moleque jogava demais! Tinha sido inclusive o campeão da modalidade no seu colégio. Eu, flamenguista histórico, e ele tricolor fanático. Claro que nossos botões representavam esses times.

Iniciada a partida logo vi que a disputa era indigesta mesmo. Logo o Fluminense fez 1 x 0. Gol de Flávio, avante tricolor.

A partir daí, confiante, ele passou a me zoar, tocando a bola de um lado para outro do estádio “Estrelão”. Sabia que podia fazer gols a qualquer momento.

Entretanto, quase no final do jogo empatei a partida: golaço de Doval, do meio de campo. 


Comecei a zoá-lo, falando que a minha experiência faria a diferença. 

Ele partiu ferozmente para o ataque e, por três vezes, esteve para desempatar. Todas através do ponteiro Cafuringa. Duas bolas (na verdade dadinhos), bateram na trave e uma passou por cima do gol.

Aí eu catimbava ainda mais dizendo que Cafuringa não fazia gols nem no time profissional, como iria fazer em jogo de botões.

No finalzinho da partida, outra chance para o Fluminense. 

Era questão de honra para ele que o gol fosse de Cafuringa.

Mas ele desperdiçou de novo: o arisco e excelente ponta tricolor, que era juiz-forano, não era mesmo de balançar as redes adversárias e mais uma vez errou o alvo.

Era evidente o nervosismo do meu forte adversário.

Na saída de bola, pimba! Desempatei! Novamente com Doval, o cabeludo atacante argentino, ídolo da torcida rubro-negra.


E o Fla x Flu terminou 2 x 1 para o meu Flamengo.

A revanche tão reclamada por ele jamais aconteceu, claro.

Não correria o risco. Até porque, certamente, ele usaria como finalizador o gaúcho Flávio, o Minuano, terrível artilheiro tricolor daqueles tempos.  

Hoje, passados mais de quarenta anos daquela emocionante partida, finalmente estou pensando em conceder a revanche ao meu querido amigo Evandro Rossi. 

Quem sabe com Fred e Gabigol como protagonistas.

Depois conto o resultado!