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Vasco da Gama

GOLEIRO NO ALMIRANTE É NÁUFRAGO

Rubens Lemos


Sem melodrama, vascaíno é expectativa de vida de segundo-tenente dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã. Uma, duas, três horas. Otimista, você leitor. Eram 45 segundos o deadline de um jovem quase aspirante no front da guerra sem propósito. Vascaíno, hoje, espera pelo pior e, se combinar cerveja gelada com oração, vem o milagre da exceção.

O último Vasco de que tenho notícia é o de 2000, com Romário, Juninho Paulista, o Pernambucano que imagina ser Zidane e o azogue Euller. Meus times ficaram mesmo pelos anos 1980, Romário de cabeleira brega-quase costeleta, Dinamite e Geovani, o melhor deles.

O Vasco sempre foi uma escola de goleiros. Aprendi com meu celeste pai, vascaíno desde Ademir Mezezes e mortificado de idolatria pelo meia Walter Marciano de 1956 (Carlos Alberto, Paulinho e Bellini; Laerte, Orlando e Coronel; Sabará, Livinho, Vavá, Valter e Pinga). Pinga, um colosso em campo consumido em homônimas doses plurais pelo técnico Martin Francisco.


Segunda-feira pós-frango homérico de Martin Silva é um libelo aos sofridos de baliza do meu clube, hoje um Terceirão (de Série C, mesmo,), de grife capengando no passado. Foram dois erros do uruguaio. Até a Copa do Mundo ele foi tal Barbosa, o grande, crucificado por uma dúvida entre fechar o ângulo e sair para defender um cruzamento na final da Copa em 1950. Barbosa foi absolvido nos 7×1 de 2014. Ou nos 2×1 de galinaceos tomados por Júlio César. Contra o Holanda.

Martin Silva é um goleiro razoável. Ganhasse por defesa feita, compraria, à vista e cash, uma praia em Nassau, nas Bahamas. Goleiro em timeco aparece. Errando, curte o cadafalso da maldita missão. No jogo com o Grêmio, falhou ao assistir a bola voar feito drone pela área até Jael cabecear e, no segundo gol, caiu de joelhos tão ator quanto Al Pacino ou Dom Michael Corleone berrando após a morte hamletiana da fillha Mary em O Poderoso Chefão 3. Trageridículo.


Nem foi o primeiro. Mazarópi, o pequenino, pegou dois pênaltis em 1976 de Zico e Geraldo, dois primores do balé-bola artístico. No ano seguinte, voou e espalmou a cobrança de Tita, imprescindível para o título carioca. Em 1983, cruzamento sobre a área, em voo cego, Mazarópi deixa a bola escapar ao pé esquerdo do flamenguista Júlio César (não o fabuloso driblador, uma imitação limitada). Um toquinho, Vasco desclassificado e o goleiro ágil e de protuberantes sobrancelhas, é banido para ser campeão mundial pelo Grêmio, sete meses depois.

Nem titular Mazarópi era mais. Jogava por conta do dedo quebrado de Acácio, um gigante jogado ao fogo na decisão de 1982 em lance suicida do técnico Antônio Lopes. Acácio pegou tudo, até um balaço à queima-roupa de Zico e pôs-se ídolo. Até 1986. Um erro bisonho, em chute do tal Júlio César estraga-prazer de camisa 1 cruzmaltino, deixou Acácio na desgraça da ingratidão. Nos três anos seguintes, foi bicampeão carioca e brasileiro.


Martin Silva, remake de Helton em 2001. A cobrança de falta de Pet do Flamengo nos improváveis 3×1 da decisão não seria defendida nem se o esguio camisa 1 vascaíno estivesse com esqui e não luva no inútil salto ao impossível. Ao vazio do fracasso silencioso da própria alma.

O frango é a dignidade violada do goleiro. Displicência, arrogância, surpresa, é a sua morte por afogamento na ira da torcida. Honra pisoteada. Marcelo, vascaíno em 1964. Agachou-se a um chute tosco, do volante Carlinhos e a bola passou por entre suas pernas. Marcelo deixou o campo chorando, amparado por jogadores dos dois times e aplaudido por um Maracanã inteiro. Náufrago de si mesmo. Rendeu-se jamais. Mostrou que, do bizarro, a vida extrai o comovente, a dor de tantos contra um só.

JOGOS INESQUECÍVEIS

por Mateus Ribeiro


São Paulo x Corinthians (Semifinal do Campeonato Brasileiro 1999).

Clássicos são emocionantes na maioria das vezes. Se o clássico em questão valer algo grande, a tendência é que a emoção alcance níveis estratosféricos. E foi isso que aconteceu no dia 28 de novembro de 1999.

São Paulo e Corinthians se enfrentaram pela primeira partida da semifinal do Campeonato Brasileiro de 1999. De um lado, um São Paulo que vinha de uma década fantástica, com títulos nacionais, continentais e mundiais. Do outro, o Corinthians, que naqueles dias, vivia a melhor fase de sua história. Como se isso não bastasse, grandes nomes do futebol como França, Marcelinho, Rogério Ceni, Rincón, Ricardinho, Raí, Edílson, Jorginho, Dida e muitos outros estavam em campo. Não se poderia esperar algo diferente de um grande jogo.

A partida foi um lá e cá sem fim, do primeiro ao último minuto. Os treinadores deram uma bica na tal da cautela, e ambos os times atacavam sem medo de ser feliz.

O Corinthians saiu na frente, com gol do zagueiro Nenê. Alguns minutos depois, Raí, acostumado a ser carrasco do Corinthians, acertou um chute que nem dois Didas seriam capazes de defender. Eu, que já havia ficado muito chateado pelo tanto que Raí judiou do meu time do coração (acho que já deu pra perceber que torço para o Corinthians) em 1991 e 1998, senti um filme passando pela minha cabeça. Estava prevendo o pior.


Para a minha sorte, dois minutos depois, Ricardinho aproveitou um lançamento e colocou o Corinthians na frente de novo. Meu coração estava um pouco mais aliviado, e eu conseguia respirar. Até que Edmílson tratou de empatar a partida, e jogar um banho de água fria na torcida do Corinthians. O frenético e insano primeiro tempo terminou empatado em dois gols, e com muitas alternativas para ambos os lados. Eu tinha certeza que o segundo tempo seria uma loucura. E realmente foi.

Logo no início, Edílson deixou Wilson na saudade, e caiu dentro da área. Pênalti para o Corinthians. Na batida, o jogador que eu mais amei odiar na minha vida inteira: Marcelinho. Bola de um lado, goleiro do outro, e o Corinthians estava novamente em vantagem.

Alguns minutos depois, pênalti para o São Paulo. De um lado, um dos maiores jogadores da história do São Paulo. Do outro, um goleiro gigantesco, que estava pegando até pensamento em 1999. O Resultado? Nas palavras de Cléber Machado, “…Dida, o rei dos pênaltis, pega mais um…”.

Naquelas alturas, eu já estava quase tendo uma parada cardíaca. Teve bola na trave, bola tirada em cima da linha, e tudo mais que os deuses do futebol poderiam preparar para fazer meu coração parar.


Até que quando o jogo estava se aproximando do fim, mais uma surpresa. Desagradável, é lógico. Mais um pênalti para o São Paulo. Eu já achava que aquilo fosse perseguição. Meu coração, desde sempre, nunca foi de aguentar fortes emoções. Tanto que no segundo pênalti, fiquei de costa para a tevê, sabe se lá o motivo, com meu chinelo na mão. E o chinelo foi um personagem importante, já que o monstruoso Dida defendeu o pênalti do gigante Raí mais uma vez, e eu arremessei meu calçado na árvore de Natal, e destruí o adorno que enfeitava a sala da minha casa.

Antes do apito final, Maurício (que substituiu Dida) ainda fez uma grande defesa, garantindo a vantagem para o jogo de volta.

Um jogo emocionante, que consagrou Dida, e de certa forma, foi uma espécie de vingança minha contra Raí, que em muitas oportunidades me fez chorar. Vale ressaltar que o craque são paulino é o rival que eu mais admirei durante minha vida.

A vitória me deixou feliz, é claro. Porém, além dos três pontos e da vantagem para o jogo da volta, quase uma década depois, o que me deixa feliz (e triste) é ver que naqueles dias as torcidas dividiam o estádio, os times se enfrentavam em pé de igualdade, e os craques ainda passeavam pelos gramados.

Um dos dias mais emocionantes e insanos da minha vida. Agradeço aos grandes jogadores que me fazem lembrar daquele domingo como se fosse ontem. Agradeço também, você que leu até aqui, e dividiu essas lembranças comigo.

Um abraço, e até a próxima!

 

 

 

PEDE PARA SAIR, 01!

por Fabio Lacerda


Era questão de tempo depois do primeiro equívoco – a negação para trabalhar no mundo árabe – até pedir o boné na derrota para o Botafogo, em São Januário, pela oitava rodada do Brasileiro. Zé Ricardo, outrora visto como “salvador da pátria”, recolheu seu material da Colina e meteu o pé! 

Independente das relações políticas extra-campo, pois ninguém tira da minha cabeça que essa peculiar ciência tão importante na vida humana, e ao mesmo tempo tão desprezada pelo interesse do cidadão, tenha refletido nas quatro linhas. Alguém conseguiria explicar-me, a escolha do Bruno Silva, não aquele ex-Botafogo, e sim, ex-Ferroviária de Araraquara, como titular em dois jogos cruciais na Libertadores quando o moço estava apenas há 30 dias no clube? 

Zé Ricardo, sujeito pacato à beira do campo, de pouca vibração, de pouco incentivo e modesta demonstração de gana, começou a sua saga de erros técnicos no decisivo jogo do Campeonato Carioca no Maracanã quando o Vasco debruçava-se sobre a vantagem do empate. 


O Vasco jogou por um gol. A escalação deflagrou uma das maiores catástrofes táticas vistas no Maracanã. Escolheu uma equipe com quatro laterais, recuando o Pikachu, jogador este autor de dois gols no primeiro jogo da decisão. E dois zagueiros, nada mais natural numa formação defensiva. Ao término do jogo, Zé Ricardo fechou a partida com dois laterais e quatro zagueiros. Sem falar que deveria ter lançado o Paulo Victor para correr na direção da bola rechaçada da defesa cruz-maltina nos últimos 15 minutos de jogo, quando o Botafogo já adiantava seus zagueiros na intermediária do Vasco em busca do gol que saiu dos pés do zagueiro Joel Carli. E obviamente finalizou a obra escalando muito mal os cobradores de pênaltis. 

Por falar em zagueiros, miolo de zaga, Zé Ricardo também “inovou” nas suas escolhas repetidas em algumas oportunidades: uma dupla de zagueiro canhotos. Eu nunca vi um zagueiro canhoto jogar pelo lado direito do campo! E além disso, o escolhido pelo ex-técnico do Vasco chama-se Erazo, um defensor que nega-se a dar chutão e coloca o sistema defensivo em apuros sempre que escorrega a bola pelo gramado. Quando escuto o Luis Roberto classificar o equatoriano como “El elegante”, eu não sei se rio ou choro! E você, Paulo Cezar Caju, chora ou desespera-se? 

A partir daí, os erros permaneceram nas escalações durante os jogos da Libertadores. É bem verdade que o plantel muito mutilado, com vários atletas contundidos, reduziu as chances de colocar em campo uma equipe mais confiável, ou melhor, contendo os melhores jogadores. Durante a principal competição Interclubes da América, Zé Ricardo recuou, sem mais nem menos, o jogador mais efetivo no ataque. Yago Pikachu já havia sido bagunçado na partida contra o Jorge Wilstermann, na Bolívia, quando o brasileiro Serginho deitou os cabelos sobre o jogador que homenageia um dos Pokemóns. 


Um rodízio para formar a dupla de ataque começou a acontecer. E também no meio-de-campo. Por conseguinte, não foi capaz de definir uma equipe titular. Suas últimas convicções na titularidade do jovem Caio Monteiro é um flagrante do quão perdido esteve no meio de um plantel de nível técnico medíocre. Mas como o futebol é jogado com a cabeça, nem quero referir-me ao intelecto do time. Deixa para lá! 

Chega o Brasileiro, e com ele a Copa do Brasil e a inexplicável vitória sobre a Universidad de Chile pelo placar mínimo que permitiu o Vasco manter-se na América por segurar a corda da Sul-Americana. Até a derrota para o Vitória, em casa, o Vasco deu a falsa impressão que as angústias e agonias na luta pelos salvadores 46 pontos seria motivo de sátira junto aos torcedores rivais. Mas antes de fechar dez rodadas, o Vasco já apresenta um rendimento abaixo de 50%. Creio que as luzes amarelas de São Januário já estão ligadas há 30 rodadas para o final de mais uma edição de Campeonato Brasileiro. As duas derrotas sofridas para o Bahia, pelo mesmo placar, nas duas competições nacionais reforçam meu apontamento para a eliminação do Vasco para o Tricolor da Boa Terra na Copa do Brasil. 

Nada que três vitórias consecutivas não coloquem o Vasco na parte de cima da tabela, mas essa resposta, essa reabilitação, já deveria começar na próxima rodada, no Mineirão, contra o Cruzeiro. Mas é assustadora a média de gols sofridas por jogo do atual Vasco da Gama. É o time mais vazado do futebol brasileiro. E, hoje em dia, não tem um ataque que faça um gol a mais que os sofridos, como acontecia com o time de 1997, que virava todos os jogos em São Januário ao levar gol antes dos de primeiros minutos de jogo.

Por fim, nas ultimas rodadas do Brasileiro preferiu improvisar um zagueiro que não joga desde a Taça Guanabara na lateral-direita a colocar um jogador da posição, mesmo que promovido do sub-20. A passagem de Zé Ricardo pelo Vasco assemelha-se com sua estada no Flamengo! Jogador das categorias de base não tem prioridade. E devemos lembrar que foi a categoria de base sub-20 do Flamengo que o ascendeu ao profissional após a conquista da Copa São Paulo de Juniores. 


Zé Ricardo, quem tem medo de evacuar, não come! Suas equivocadas escalações, com sucessíveis mudanças, sobretudo no meio-de-campo, setor que determina se você vai atacar ou ser atacado no decorrer de uma partida de futebol, e algumas escolhas sem pé nem cabeça, eu posso deduzir que seu trabalho sofreu interferências. Ainda mais no clube que não dá chance à harmonização política e social pelos rincões da sede. A conturbada e nociva política do Vasco promete novas páginas para os próximos meses. É esse cataclismo existente e interminável no clube que forçou o técnico a pedir sua demissão. O comandante das quatro linhas e seu temperamento tibetano não fez o Vasco pulsar. O novo técnico não precisa comportar-se como um Lord. Precisa, ao menos, ter gogó para “cantar” o jogo durante os 90 minutos e mais os tempos de acréscimos. Um técnico sem vibração, que não cerra os pulsos explodindo as veias dos antebraços para pedir garra e hombridade ao time, sempre vai deixar devendo. Então, pega a viola, coloca na sacola e zarpa. Pede para sair, 01! 

SEUS PÉS E A BOLA: UMA COMBINAÇÃO MORTAL

por Marcos Vinicius Cabral


Naquele olhar frágil e na ausência do sorriso, haviam motivos para qualquer coisa, menos desistir do sonho.

Ser jogador de futebol é o que todo garoto de subúrbio espera ser.

E com o pequeno Calu (como era chamado no bairro de São Bento) não seria diferente.

Mas com um grave tumor na perna no qual ficou entrevado numa cama por três meses, o menino sofria pela distância da sua grande paixão: a bola!

As dores só eram amenizadas com a presença de sua mãe, dona Neusa, que ao lado de sua cama permanecia por todo tempo enxugando suas lágrimas.

— Não chore meu filho, tudo vai acabar bem — dizia a matriarca dos Oliveiras enquanto alisava os cabelos encaracolados do filho caçula.

Se o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade (1902/1987) dizia no poema “Definitivo” que “a dor é inevitável mas o sofrimento opcional”, por amor à bola o menino Calu não teve opção: era necessário passar por aquilo!

Se naquele ano de 1962, o menino então com 8 anos enfrentava um adversário implacável, a vida lhe reservaria bons motivos para ir adiante.

– Foi um milagre. Milagre porque eu, com sete para oito anos, fiquei praticamente três meses de cama, tive que fazer uma cirurgia de um tumor na coxa e coloquei gesso na perna esquerda toda, na cintura e na outra perna, e aquele tradicional cabo de vassoura no meio. Fiquei três meses na cama sendo assistido pela minha mãe e era muito magrinho. Uma criança que até os sete teve muitos problemas, aos sete tive um problema sério na perna esquerda, com 12 anos um problema também na perna esquerda. Acredito que a gente vem nesse mundo com uma missão, nós podemos melhorar ou não, e acho que fui um privilegiado – contou Roberto Dinamite, em entrevista ao SporTV em 12 de abril de 2014.

Depois de ter ficado engessado por alguns meses, foi proibido por sua mãe de jogar futebol e via pela janela de sua casa, situada à rua José Pinto, a tristeza contrastar com a alegria dos seus colegas de infância que jogavam.

O tempo passou e as feridas do passado ficaram para trás.


O menino triste deu lugar a um habilidoso e notável jogador do São Bento, clube tradicional de Duque de Caxias, onde seu pai, seu José Maia, havia sido goleiro.

Já a mãe, dona Neusa, era torcedora do Parque Lafayette, seu arquirrival.

Muito querido no bairro – nascer em Duque de Caxias tem lá suas vantagens –  Carlos Roberto de Oliveira foi o terceiro e último a nascer.

Porém, dentro das quatro linhas ia fazendo seus gols e inspirado por Jairzinho, Furacão da Copa de 1970, aos poucos mostrava que bola na rede era o seu forte.

Se o destino havia lhe tirado o sorriso quando ficou de cama por alguns meses, dessa vez o destino lhe compensou e colocou no seu caminho Francisco de Souza Ferreira, seu Gradim, olheiro do Vasco da Gama, que se encantou com o moleque.

Com 16 anos, aprovado na peneira no campo do São Bento em 1969, o apelido Calu era esquecido e em São Januário passou a ser chamado apenas por Roberto.


Se desenvolveu, ganhou cerca de 15kg de massa muscular e fama com seus 46 gols marcados logo em seu primeiro ano de juvenil.

Sendo destaque nos treinos, era questão de tempo que uma oportunidade aparecesse.

E foi no Campeonato Brasileiro de 1971, que o técnico Admildo Chirol colocou a jovem promessa em campo, contra o Bahia.

Não fez gol e passou em branco.

Depois disso, contra o Atlético-MG foi titular pela primeira vez e diante de tanta expectativa criada em torno dele, o menino de sorriso marcante não foi bem na derrota por 2 a 1, fora de casa.

Com isso, acabou substituído.

Mas o destinou tratou de entrar em ação mais uma vez e aquele começo difícil seria brevemente esquecido.

Contudo, se o sueco Alfred Nobel – falecido em dezembro de 1896 – por algum milagre, pudesse voltar à vida e, na sua qualidade de químico e inventor da dinamite, fosse indicado para receber o prêmio que leva o seu nome, ficaria, na certa, profundamente lisonjeado.

Motivos não lhe faltariam para colher os resultados de sua invenção.

Pois ela atravessou séculos, irrompeu mares, explodiu como bolas de fogo nos céus existentes do universo e foi, anos mais tarde, visto como grande feito naquele 25 de novembro de 1971, na estreia do “garoto dinamite” contra o Internacional, em pleno Maracanã.


Surgia enfim, um artefato à base  de nitroglicerina dos pés daquele jovem de apenas 17 anos, que destruía defesas e fazia com que seus marcadores entrassem em conflito numa guerra declarada por cada gol explodido, como o seu primeiro na carreira contra a equipe Colorada.

A palavra dinamite nunca havia sido tão bem aplicada para descrever a ação de um ser humano de carne e osso, que aplicava força nos chutes.

E foi graça aos repórteres Aparício Pires e Eliomário Valente do Jornal dos Sports – que cobriam os treinos dos juvenis do Vasco na época – que o apelido pegou.

Enquanto vestiu a camisa do Club de Regatas Vasco da Gama – foi sem demérito algum para os outros ídolos de São Januário – o maior explosivo utilizado pelo clube.

Assim era esse simples Roberto.

Não, não um Roberto tão simples assim.

Era Roberto Dinamite!

Esse mesmo Roberto que devemos incluir o “Dinamite” sempre e torná-lo um nome composto.

Esse sobrenatural centroavante que conquistou as Bolas de Prata da revista Placar, em 1979, 1981 e 1984.


Esse desbravador de marcadores que foi artilheiro dos Campeonatos Brasileiros de 1974 e de 1984, ambos com 16 gols.

Esse extraordinário atacante que foi artilheiro do Campeonato Carioca de 1978 com 19 gols, de 1981 com 31 gols e de 1985 com 12 gols.

Esse destruidor de esquemas táticos que foi artilheiro da Copa América de 1983 com 3 gols.

Esse jogador diferenciado que foi artilheiro do Vasco em todas as temporadas de 1973 até 1985.

Esse exuberante profissional que continua sendo o maior artilheiro da história do Campeonato Brasileiro nos 328 jogos disputados e nas 190 explosões de gols.

Esse Deus vascaíno que é o maior artilheiro da história do Campeonato Carioca com 284 gols.

Esse magnânimo atleta que é o maior artilheiro da história do Vasco da Gama com 702 gols.

Esse jogador de talento esporádico que é considerado o maior artilheiro da história do estádio de São Januário com 184 gols.

Esse gênio da bola que é o atleta que mais vestiu a camisa do Vasco da Gama em sua rica história com 1110 jogos.

Esse artilheiro dos artilheiros que é ao lado de Pelé e Rogério Ceni, os três jogadores brasileiros com mais de 1000 jogos por um único clube.

Esse exímio cobrador de faltas que foi eleito para o time dos sonhos do Vasco da Gama pela revista Placar em 2006.


Enfim, o camisa 10 de São Januário era um explosivo diferente, que não causava dano material algum mas fazia vítimas por onde passava.

Para o clube da Cruz de Malta essa explosão suscitava em seus torcedores uma enorme alegria e a certeza que com ele em campo, não havia placar em branco.

Já para os adversários nem tanto, pois causava uma tristeza nem sempre efêmera que machucava o peito, causava um mal-estar e afetava o coração.

Mas o gênio Roberto Dinamite era assim… ele explodia gols!

De todos os jeitos, de diversas formas e de diferentes tipos.

Muitos, centenas, milhares… e por mais de duas décadas, ecoou em estádios de vários cantos do Brasil e até do mundo, o barulho retumbante de gols, muitos gols.

De tanto ter seus gols amplificados pelos estádios de futebol mundo afora acabou chegando na Espanha e aos ouvidos do técnico espanhol Joaquim Rifé que pediu sua contratação.

Com 26 anos, nove temporadas no cruzmaltino e sendo assediado por clubes europeus o Vasco não pôde evitar a transferência de seu melhor atleta para o Barcelona, que desembolsou 56 milhões de pesetas – moeda utilizada na Espanha entre 1869 a 2002 – e o tirou da Cidade Maravilhosa.

— Eu voltarei — diria sem imaginar que 5 anos depois a frase se tornaria famosa mundialmente no cinema na voz do então desconhecido ator austríaco Arnold Schwarzenegger, no filme “O Exterminador do Futuro.

Em sua estreia no clube catalão, marcou logo dois gols e alçou voos maiores.


Entretanto, o técnico que havia pedido sua contratação foi demitido três rodadas depois, sendo substituído pelo argentino Helenio Herrera, que cortou suas asas ao não utilizá -lo.

Nos três meses em que esteve vestindo as cores do Barça, o desejo de voltar a jogar era grande.

Com o pensamento em voltar ao Brasil, recebeu Márcio Braga – então presidente do Flamengo – e Eurico Miranda – a mando do presidente Alberto Pires – que queriam a qualquer custo trazê-lo de volta ao Rio de Janeiro.

Nessa queda de braço a paixão falou mais alto e sobretudo quando se ama o clube: Roberto Dinamite estava de volta a São Januário!

Em 5 de maio de 1980, a reestreia era contra o Corinthians, no Maracanã.

O resultado foi uma goleada acachapante de 5 a 2, no qual o camisa 10 fez todos os gols da equipe vascaína.

Foi a volta triunfal do maior ídolo do clube, acompanhada inclusive por um repórter de Barcelona, que relataria o jogo para um jornal local com os dizeres: “Esto, sí, es lo verdadero Dinamita”, (os espanhóis nunca souberam pronunciar Di-na-mi-te)!

Mas ele havia voltado!

E como o ex-governador da Califórnia, a missão de Roberto Dinamite era exterminar seja quem fosse.

E nessa sua volta, havia o desejo de resgatar a ovação de uma torcida infinita em êxtase.

Ou ainda, quem sabe, torcedores regozijavam como dois jovens apaixonados que descobrem no sexo a forma plural do prazer. 

Carlos Roberto de Oliveira foi “Dinamite” em estado puro na magia de um futebol aprazível.

Foi titular na Copa do Mundo de 1978, na Argentina e faltou pouco para ser campeão com a camisa 20 amarelinha.

Atravessou a década de 80 sendo mortal como sempre, foi injustiçado na Copa da Espanha em 1982 (foi reserva de Serginho Chulapa), jogou na Associação Portuguesa de Desportos e disputou grandes jogos contra o Flamengo.

— Enfrentei o Roberto em muitos e muitos jogos, um cracaço, um exemplo de profissional, muita dedicação, era ele no Vasco e o Zico no Flamengo, símbolos de seus clubes. Nós tínhamos muito respeito por ele e quando nos enfrentrávamos, eu falava para o Mozer: Não bate no velhinho não, pô! Na verdade ele não estava velho mas a gente inventava essas coisas para irritá-lo (risos). Mas o Roberto era um perigo e se a gente não ficasse de olho… ainda mais quando depois que ele recuou e com a entrada do Romário foi uma confusão danada para a gente — conta o ex-lateral rubro-negro Leandro, que jogando na zaga teve que marcar o camisa 10 vascaíno.

E completa: — O Roberto era um centroavante perigossíssimo, artilheiro nato, bom de cabeceio, pênalti, falta, cortava bem tanto para dentro quanto para fora e batia com qualquer perna, era um perigo constante. Mas era bom enfrentá-lo, porque se eu fui um grande zagueiro foi exatamente por ter enfrentado um jogador como ele.

Entretanto, Roberto é assim no meio futebolístico onde poucos merecem tamanha deferência, e sem sombra de dúvidas, o “Dinamite” é um deles.

Ainda deu tempo de jogar no Campo Grande Atlético Clube em 1993, um pouco antes de se aposentar.

Enveredou na política em 1992 elegendo-se vereador da cidade do Rio de Janeiro pelo PSDB e dois anos depois, elegeu-se deputado estadual, cargo este onde se reelegeria em 1998, 2002, 2006 e 2010.


Foi presidente do clube que tanto ama mas não teve o sucesso que teve nos gramados.

Logo em seu primeiro ano de mandato, levou o clube ao seu primeiro rebaixamento na história, subindo com o título da segunda divisão no ano seguinte.

Em 2010, o Vasco seria apenas décimo primeiro na tabela do Brasileirão, enquanto 2011 foi um ano sublime de “Dinamite” à frente do clube, onde foi Campeão da Copa do Brasil e vice brasileiro, com vaga garantida para a Libertadores de 2012.

Na competição, foi eliminado nas quartas de final para o Corinthians (quem não se lembra do gol perdido por Diego Souza?), e, no mesmo ano, foi quinto colocado na tabela do Campeonato Brasileiro.

Era o ensaio de uma volta do clube aos seus bons tempos, porém, em 2013, uma tragédia: o Vasco fez um ano terrível e caiu novamente para a Série B, acabando de vez com a possibilidade de reeleição para um terceiro mandato, nas eleições do ano seguinte – que foram vencidas por Eurico Miranda, que voltaria ao clube.

No ano de 2013, a VascoTV produziu um documentário de 30 minutos, chamado “Dinamite 40 anos – A História de um Ídolo”, sobre a carreira do maior jogador do clube.

Saiu de cena do cenário político e dos bastidores do futebol e hoje participa do programa esportivo Os Donos da Bola na TV Bandeirantes.

Portanto, hoje, 13 de abril o Rei de São Januário completa mais um ano de vida com o sentimento de dever cumprido.

E muitos de seus séquitos, como Bismarck, William, Bebeto, Geovani, Sorato, Mauricinho, Edmundo, Felipe, Juninho e Romário, foram rasos (com todo respeito às suas histórias) diante da profundidade que o eterno camisa 10 do Vasco representa nesses quase 120 anos.

Viva “Dinamite” e muitas explosões de coisas boas para você.

DE ‘CALU’ A DINAMITE, CONSTRUIU-SE A VOCAÇÃO DO GOL

No dia 13 de abril, Roberto Dinamite faz anos. O menino tímido superou duas complicadas cirurgias na infância e fez, na década de 1970, muitos meninos (como este pequenino jornalista) a se apaixonarem pelo Clube de Regatas Vasco da Gama… para sempre.

por André Felipe de Lima


“Apresenta uma morfologia ideal para ser o que é: ponta-de-lança nato. Forte e resistente, chega a parecer tão leve por causa da altura. DE qualquer maneira, é um jogador que se equilibra muito bem sobre as duas pernas e para derrubá-lo é preciso que o marcador ganhe impulso ou dificulte seu pé de apoio. Se desvantagem às vezes leva, é quando perde a noção do lugar favorito (direito). A sua força assenta na soma da massa física com velocidade (grandes passadas para atingir o gol), mas o melhor proveito vem do trabalho constante, do permanente castigo que representa para os zagueiros adversários, com aquele empenho infatigável e constante, nas boas e nas más, nas limpas e nas divididas. Golpeando sempre o mesmo ponto, Roberto é capaz de minar a resistência de qualquer um”. Jamais li, vi ou ouvi definição tão perfeita como essa escrita pelo incomparável repórter Geraldo Romualdo da Silva para o que representou nos gramados o cidadão Carlos Roberto de Oliveira, o inesquecível Roberto Dinamite, o maior artilheiro da história do Clube de Regatas Vasco da Gama.

“Vim do infantil de Caxias, gosto de música pop, soltar pipa, ler e garanto que o que aprendi não foi nada na escola, mas na luta pela sobrevivência, sofrendo e esperando: a pelada é que ensina o melhor e o pior”, disse o então garoto “Dinamite” ao repórter Geraldo Romualdo, em 1975, um ano após da primeira grande conquista nacional do Vasco.


Roberto era ainda menino. A infância e adolescência vividas no humilde bairro de São Bento, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, onde nasceu na madrugada de 13 de abril de 1954, não foi fácil. De família pobre, com mais um irmão (José Antônio) e uma irmã (Ana Lúcia), o caçula Dinamite foi galgando degrau por degrau até chegar ao topo. E esse topo tem marca: Vasco.

O menino Calu, apelido que guarda desde a meninice, foi a alegria do batalhador Maia, seu pai, que tanto duro dava em uma repartição pública para sustentar a casa, mas que realizou no filho pródigo o sonho de um dia ser jogador de futebol. Sonho deste cronista e de muitos leitores dessas despretensiosas linhas biográficas. Maia disputava peladas como goleiro nas peladas empoeiradas e lamacentas de Caxias. Foi num daqueles campinhos de trave sem rede que Roberto começou a nascer.

Maia distraía-se sempre que uma moça bonita pintasse na linha lateral. Foi uma delas que o fez daquela pelada do Maia a mais memorável de todas. Foi, talvez, o pior desempenho dele em um jogo de futebol, mas certamente o mais sensacional gol que marcou com o seu coração. Do olhar maroto para a beira do campo, veio a carinhosa conversa fiada com moça Neuza. O romance começou, e como escreveu Paulo César Pinto, biógrafo de Dinamite, “tinha Calu outro caminho que não o futebol?”.


O garoto logo na infância começou a compreender o que uma bola de futebol poderia fazer na vida de um menino humilde. Sonhava acordado com arquibancadas, bandeiras e o grito eloquente da torcida entoando seu nome: “Calu! Calu! Calu!”. O pequeno Roberto mal sabia que uma explosão de felicidade e amor o aguardaria anos depois, num campo mágico, histórico e mítico de São Cristóvão.

Nem mesmo as preocupantes cirurgias que fez aos oito (tumor na coxa esquerda) e aos 12 anos (princípio de osteomielite decorrente de uma pelada na rua) impediram que o jovem Calu consumasse o seu destino: o futebol transformaria o rapaz tímido e de poucas palavras no maior goleador que os cruz-maltinos conheceram.


Quem foi buscá-lo no modesto São Bento, time de peladas do bairro em que morava, foi o célebre treinador Gradim, olheiro da melhor estirpe e sabedor como poucos das coisas da bola. Gradim perambulava de pelada em pelada para pescar futuros craques. Pescou um graúdo. Em novembro de 1969, o magrelo Calu, com 15 anos, chegou à São Januário. Foi aprovado no teste e em um mês deixou a escolinha do clube para integrar o time juvenil sob o comando do velho Célio de Souza. Dali em diante só mesmo a definição do saudoso locutor Waldir Amaral para resumir o que representaria Roberto para a história do futebol: “A vocação do gol”.

Assim, nós, vascaínos, fomos aprendendo a gostar de futebol. A amar o Vasco. Graças às centenas de vezes que gritamos gol. Gol do nosso Calu. Gol do nosso menino explosão, amado e tão bem protegido pela querida Jurema. Gol de um gigante chamado Roberto Dinamite.