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Seleção Brasileira

A COPA DO MUNDO DE 1986 SOB A VISÃO DE UM MENINO LOIRINHO

por Marcos Vinicius Cabral


Sentado na última cadeira da primeira fileira do lado contrário da porta na sala de aula, o suor escorria pelo rosto daquele menino loirinho de 13 anos.

Aquele espaço físico de aproximadamente 4m x 3m, sem ventilação e com pequenas janelas encardidas deixavam à mostra algumas folhas secas castigadas pelo tempo e sopradas pelo vento.

Vez ou outra, o som dos pássaros famintos pedindo comida no ninho que estava instalado no peitoral em uma das janelas tornava menos tediosas determinadas aulas.

E era para os alunos da 6ª série do CETHL (Colégio Estadual Técnico Henrique Lage), motivo de contemplação a relação daquelas espécies de aves.

Por mais que aquele menino loirinho fosse aplicado em Matemática do professor Feliciano, equações, raiz quadrada e porcentagem nunca foram seu forte.


Já em Português, da professora Terezinha, sujeito, verbo e predicado faziam com que seu desempenho fosse satisfatório nesta disciplina.

Portanto, nada seria mais natural que a leitura e a busca incessante por informações fizessem que o menino loirinho se tornasse um ávido leitor da Reader’s Digest – revista mensal criada em 1922 por Lila Bell Wallace e DeWitt Wallace em Nova York – conhecida aqui no Brasil como Seleções e das manchetes esportivas, pois era também apaixonado por futebol.

Mas aquele ano de 1986 era ansiedade, ansiedade e ansiedade…

Era ano de Copa do Mundo e tanta ansiedade só seria atenuada à procura de informações quase sempre nas folheadas escondidas do jornaleiro nas páginas do Jornal do Brasil na banca próxima ao colégio.

Enfim, o domingo de estreia do Brasil se aproximava e era contra os espanhóis.

Aliás, os mesmos espanhóis que eram considerados favoritos na Copa de 1950 em solo brasileiro até o confronto pela fase final da competição, quando sofreram uma goleada de 6 a 1 para o escrete canarinho – Ademir da Guia e Zizinho só não fizeram chover naquela tarde no Maracanã – onde os 153 mil pagantes aplaudiram de pé os brasileiros.

Desde então, a Espanha passara a ser chamada de Fúria em virtude do encantamento de seu futebol apresentado naquela Copa.

E para não perder o brilho nos seus olhos, o menino loirinho, aflito, não escondia de ninguém a frustração se viesse a perder algum jogo caso fosse em um dia de aula.


E as partidas eram novamente no México, onde havíamos conquistado o tri com uma linha de produção dos operários da bola como Jairzinho, Gérson, Tostão, Pelé e Rivelino, que com o selo de qualidade, transformou aquele time em um fábrica de bons resultados e se transformou em um dos melhores nas vinte edições de Copas do Mundo.

Mesmo sendo um aluno exemplar, o menino loirinho não hesitaria em matar aula para correr para casa e ver seus heróis em ação.

Com os fantasmas da eliminação da seleção brasileira na Copa da Espanha, em 1982, assombrando e sobrevoando o imaginário dos amantes do bom futebol, havia no povo brasileiro, um misto de certeza e desconfiança.

Ainda mais que alguns acontecimentos infelizes pré-Copa seriam um presságio de coisas ruins.

E teria como não sê-los?

Ei-los:

Parecia mentira o 1° de abril, quando no amistoso contra o Peru, em São Luís (MA), o camisa 11 Éder Aleixo deu um tapa na cara de um adversário na lateral do campo.

Telê não hesitou e cortou o ponteiro que não mais vestiria a camisa amarelinha em jogos oficiais.

Já o outro ponteiro, Renato Gaúcho ficou de fora da lista final dos jogadores selecionados que usariam terno com as iniciais CBF bordadas no bolso do terno para viajar ao México.

O técnico brasileiro não engoliria a fatídica noite na esbórnia dele com o parceiro Leandro, em que chegaram noutro dia na concentração, na Toca da Raposa – que foi o centro de treinamentos utilizada para a preparação da Seleção Brasileira para as Copa do Mundo de 1982 e a de 1986 -, na cidade mineira.

Talvez o lateral Leandro, que surpreendeu a todos ao refutar sua segunda Copa do Mundo em solidariedade ao ponteiro gremista, tenha sido a ausência mais sentida por Telê.

Pouco tempo depois, o treinador dizia em entrevistas que precisava apenas de 40% de seu futebol, independente do estado de seus joelhos.

Mas Leandro não retrocedeu, manteve-se firme em não ir ao México e surgia Josimar, camisa 2 do Botafogo como seu substituto.

Na lateral esquerda, surgia um impressionante Branco – que sagrava-se tricampeão carioca pelo Fluminense –  que obrigaria o técnico a deslocar Júnior para o meio de campo, formando com Elzo, Alemão e Sócrates, os pensadores da equipe.

Com experiência comprovada na magia de um futebol envolvente como foi em 1982 na Espanha, Telê preferiu reservar três lugares cativos no banco: um para Cerezo, outro para Falcão e mais um para Zico.

Os dois primeiros estavam por deficiência técnica, enquanto nosso camisa 10, tentava se recuperar de uma grave contusão em seu joelho.


Era muita coisa negativa para uma seleção que buscava o Tetracampeonato Mundial.

Se o pernambucano Gagliano Neto foi o primeiro locutor brasileiro a transmitir um jogo de Copa do Mundo – na França em 1938 -, Galvão Bueno, Luciano do Valle e Osmar Santos tentaram fazer com que a torcida brasileira acreditasse no título de uma seleção pragmática com suas respectivas narrações, que vinham recheadas de emoção e de uma inquietude jamais escutada pelos ouvidos daquele menino loirinho.

A bola ia rolar…

Em 1° de julho, no gramado do estádio Jalisco em Guadalajara, brasileiros e espanhóis se perfilaram para o ritual dos jogos em Copas do Mundo.

Coisa normal, aparentemente.

Bastou tocar o Hino à Bandeira e não o Hino Nacional, que o sorriso sem graça de Sócrates e o balançar negativamente de sua cabeça, demonstraram o que seria o futebol brasileiro naquela décima segunda edição de Copa do Mundo.


O sonho acalentado há quatro anos, quando sucumbimos para a Itália, ali, naquele momento foi determinante: o Brasil não ganharia aquele Mundial.

Se o menino José Carlos Vilella Júnior, então com 10 anos, estampou a capa do Jornal da Tarde chorando lágrimas torrenciais, dando ao fotógrafo Reginaldo Manente seu terceiro prêmio Esso de Jornalismo – considerado o Oscar para a imprensa – na derrota para a Itália, em 1982, aquele menino loirinho chorava silenciosamente, sentado no chão acimentado situado à Rua Dr. March, 70, no Barreto em Niterói.

Ali, rodeado por alguns vizinhos, ele é milhares de torcedores viram o Brasil vencer a Espanha por 1 a 0, graças ao árbitro australiano Christopher Bambridge, que invalidou um gol legítimo do espanhol Michel.

O Brasil venceu mas não convenceu.

No segundo jogo contra a Irlanda, um pobre futebol e o mesmo placar da estreia – 1 a 0 – e o pessimismo cada vez mais presente àquela seleção.

No terceiro jogo, com dois golaços de Josimar e uma vitória por 3 a 0 contra os irlandeses, o caminho ia se tornando firme com os passos dado pela equipe de Telê Santana.


No jogo seguinte, contra a envelhecida Polônia do craque Zbigniew Boniek – que já não era o mesmo de quatro anos antes – um 4 a 0 trouxe um serenismo à torcida e um euforia contagiante.

Contagiante sim e perigosa também!

A próxima fase seria um desafio ainda maior já que os três jogos iniciais não serviriam de parâmetro àquela altura do campeonato.

E chegava enfim, às quartas de final da Copa do Mundo.

De um lado a seleção brasileira de Edinho, Sócrates, Júnior e Careca enfrentaria a seleção francesa de Platini, Tigana, Giresse e Amoros, para ir à semifinal.

Naquele 21 de junho, completava-se 16 anos da conquista do Tricampeonato Mundial do Brasil em 1970 e era o aniversário de 31 anos de Michel Platini, o maior jogador francês da história até o surgimento de outro maravilhoso camisa 10: Zinedine Zidane!

E o Brasil fez, sem sombra de dúvidas, sua melhor exibição.

Não era a sombra do espetáculo que produziu quatro anos antes na Copa do Mundo da Espanha, mas era uma equipe com uma tática bem definida.

Era um clássico histórico, dramático e inesquecível!

Se o camisa 10 deles esbanjava talento nos gramados mexicanos, o nosso estava no banco e sem ritmo de jogo, entrando no decorrer das partidas.


Entrou no segundo tempo e aos 26 minutos na primeira bola que recebeu no meio campo, enfiou na diagonal para a entrada do lateral Branco que tocado pelo goleiro francês (até então um desconhecido), dentro da área, cometeu pênalti.

Os olhos do menino loirinho brilharam como nunca naquele momento.

Enquanto Branco com os punhos cerrados recebia o abraço forte do meio campista Alemão fazendo-o desabar no gramado e olhando o céu mexicano, o menino loirinho abraçava todo mundo, inclusive Carlinhos, um morador de rua que assistia a partida e era famoso no bairro.

Na hora da cobrança, Edinho pega a bola e dá ao Zico como se dissesse: “Toma. É sua. Só você sabe o que passou para chegar até aqui”.

O árbitro autoriza o Galinho, que bate mal e o camisa 1 da equipe francesa voa e defende.


Nesse instante os olhos do menino loirinho começam a ser uma nascente de lágrimas de diferentes sentimentos.

Elas escorrem pelo seu rosto inocente e incrédulo com o que havia acontecido, ele olha para o céu e busca resposta para sua pergunta: “Deus, por que o SENHOR deixou isso acontecer?”.

O silêncio toma conta dos quase 100 torcedores, que aglomerados naquele chão recém acimentado fazem daquele instante um momento doloroso e inesquecível.

O jogo terminaria empatado e o Brasil perderia na decisão dos pênaltis – Sócrates e Júlio César desperdiçariam suas cobranças e Platini também – por 4 a 3.


Fim de um sonho.

Se o goleiro italiano Zoff foi o vilão da história em 1982, o que dizer de Bats, que não deixou a geração de Zico e Cia. ir além naquele Mundial?

O amor irrestrito no coraçãozinho daquele menino loirinho pelas cores verde e amarelo se transformaria em ódio mortal pelas cores da França até bem pouco tempo atrás.

Aquele menino loirinho acreditou cegamente que o Brasil de Telê Santana na Copa do México seria campeão exatamente no melhor jogo que fizera naquela competição: contra os franceses!

Vem aí, a vigésima primeira edição de Copa do Mundo, a da Rússia, em junho.

Que não tenham mais meninos loirinhos chorando em silêncio e sendo desacreditados por aquilo que há de mais precioso no futebol: a magia da inocência de se acreditar!

Passados quase 32 anos daquela Copa do Mundo, aquele menino loirinho se lamenta até hoje e vive sonhando que o pênalti perdido pelo Zico foi tudo uma brincadeira de mau gosto dos deuses que dominam e cometem injustiças nesse esporte chamado futebol.

Em tempo: O menino loirinho se chama Marcos Vinicius Cabral, tem 44 anos, é escritor – lançou dois livros e está terminando o terceiro – é jornalista, chargista, taxista, pintor de quadros, colaborador do Museu da Pelada, coordenador do jornal niteroiense on-line A Metropole e craque da camisa 23 – numa clara alusão ao dia do nascimento de sua única filha Gabrielle Cabral – do Grêmio Recreativo e Esportivo Barabá, no Porto Velho em São Gonçalo.

QUE ISMAILY FOI ESSE?

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


(Foto: Nana Moraes)

Tenho ouvido repetidas vezes a expressão “tá ruim, mas pode piorar!”. Muito por conta da violência e do descontentamento com os políticos. Tanto os bandidos como os governantes se superam a cada dia. Mas, olha, os “professores” do futebol não ficam atrás!

Ou vocês não acham que a convocação do Ismaily beirou o desrespeito? Ou é apenas mais uma estratégia de marketing para agradar aos russos? Hoje, a fábrica de negociar jogadores agrada russos, espanhóis, italianos, franceses, menos brasileiros. Convocar um jogador que 90% dos brasileiros não conhecem é dar de ombros para quem vai aos estádios, compra camisas e bandeiras.

Sinceramente, os torcedores brasileiros deveriam trocar a bandeira por nariz de palhaço. Será que nenhum outro lateral que atue no Brasil poderia ter uma chance? Até para melhorar nossa autoestima? Aí alguém vai me perguntar: “Mas quem, PC?”. Qualquer um. Ou o Ismaily é melhor do que todos que atuam por aqui? “Tem experiência internacional, PC!”, provocarão alguns. E minha resposta será Kkkkkkkkkkk!!!!! Virou piada, palhaçada, falta de vergonha! Perderam a vergonha faz tempo, mas conseguem se superar!


A camisa brasileira se desvaloriza a cada atitude como essa. Como a torcida vai criar identidade com a seleção, como pode dar liga? Que Ismaily foi esse???? Não sei, perguntem para a Jojô Todynho! Só sei que, certamente, os empresários devem estar brindando agora, tirando onda com a nossa cara. Ismaily começou no Ivinhema, depois Desportivo Brasil, São Bento, Estoril, Olhanense, Braga, Shakhtar Donetsk e seleção brasileira. Me respondam, jogou em alguma categoria de base da seleção ou tem bom empresário? Quantas casinhas foi avançando por conta de um empresário bem relacionado? Torçam vocês porque vocação para Bozo eu não tenho.

O TITÊS

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


Juro que adoraria que nossos novos heróis fossem jogadores, craques, aos montes, surgidos das várzeas, favelas, peladas de rua, do interior. Mas, não, nossos novos heróis são um jovem mimado e um palestrante.

Ou o Tite não é um palestrante, que passa horas e horas “gastando” seu vocabulário próprio, o Titês? Nas coletivas, então, sente-se nas nuvens, cercado de jornalistas de queixos caídos.

“Talisca tem finalização de média distância, bola aérea, imposição física que pode emprestar virtude contra defesas com linha de cinco ou quatro…”.

Óóóóó!!!!

“Willian José fez duas grandes temporadas, no Real Sociedad, desenvolvimento grande como atleta, com jogo combinado…”.

Óóóóó!!!!

Peraí, gente, o futebol já está chatíssimo e agora ainda temos que aturar os discursos desses “gestores de pessoas” que nunca chutaram uma bola, mas passam horas em salas de treinamento, com fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas, estilistas e cabeleireiros.


Peraí, Tite não é o novo Jesus Cristo e não trouxe nada de novo ao futebol. Ah, é bom de grupo? Vai trabalhar no RH. Jair Pereira também era bom de grupo, jogou muita bola e está desempregado. O futebol não começou a partir de nossa classificação, nessas eliminatórias.

Quem garante que o Dunga também não classificaria a seleção? Ah, mas o Dunga não é bom de grupo…tudo balela. Quando o grupo é bom, os jogadores resolvem em campo, sem muita conversa mole e discurso para inglês ver.


Graças aos céus existe o Messi que despachou o retranqueiro do Conti. Ah, o chato do Mourinho também foi mandado embora pelo Sevilla, do novato Vincenzo Montella, que se propôs a jogar futebol.

Chega de blábláblá!!!

Quem gosta de discurso é político e pastor. E o futebol, agora, não é mais para ser visto, mas ouvido. Está no ar, a Escolinha do Professor Tite! Estamos lascados…

PS: O amigo Bebeto de Freitas nos deixou. Para a banda boa do futebol é um grande desfalque.

MÁRIO SÉRGIO

por Rubens Lemos


Sua perna-esquerda transformava a mentira em uma delícia. Um espetáculo de classe em campo. Mário Sérgio Pontes de Paiva enganava seus perseguidores com o olhar cínico do seus toques. Fingia mandar a bola para um lado e a lançava para o outro, numa perfeição ilusionista. O Vesgo, seu apelido inspirado pela petulância refinada, jamais foi a uma Copa do Mundo.

Em meio a devaneios frequentes sobre injustiçados de nosso tempo, eu e um amigo praticávamos saudosismo vendo um jogo antigo do Internacional de Porto Alegre e lamentávamos a birra de Telê Santana com Mário Sérgio. Ele acabara, na tela da TV, de driblar dois zagueiros num jogo de corpo, parar, esperar o goleiro cair e empurrar a bola para as redes num peteleco, biquinho de chuteira. Cracaço.

E Mário Sérgio ficou sem Copa. Estava jogando o fino em 1982, titularíssimo do time e, de repente, foi escanteado como os laterais que fintava, trocado pelo decadente Dirceuzinho, operário, corredor e sem charme, de ridículos 45 minutos deslocado de ponta-direita na estreia brasileira contra a União Soviética.


A seleção brasileira de 1982 tinha defeitos, meninos quarentões. É que ninguém gosta de lembrar, numa reverência boba ao mestre Telê Santana, senhor da ofensividade e da teimosia.  

Telê Santana mostrou ao mundo um futebol maravilhoso, mas errou e era humano. Mário Sérgio ficou em casa e Dirceu viajou. Mário Sérgio, o Vesgo, está entre os 100 maiores jogadores brasileiros de todos os tempos, dos 30 maiores que assisti, não me resta a dúvida.

Era um rebelde, um presunçoso. Tão habilidoso que mexia em vespeiros. Certa vez, num treino do Fluminense, desafiou o gênio Didi, técnico da famosa Máquina Tricolor. O time chutava com bolas e gigantes de fortalecimento muscular, utilizadas habitualmente nos anos 1970. Mário Sérgio, depois de fazer 10 embaixadinhas sem qualquer problema, mandou um bico em direção ao maduro e espigado Míster Futebol, maior meia-armador do da história futebolística.

Didi conversava com auxiliares e foi alertado pelo grito do seu ponta-esquerda: “Segura essa que eu quero ver, seu Didi!”. O verdadeiro balão de couro, enorme e disforme, subiu e, antes de chegar ao peito do chefe, ele esticou a ponta do sapato, fez um movimento de adestrador. O balão foi amaciado e desceu obediente. “Você ainda tem muito o que aprender barbudo!”, respondeu Didi sob aplausos gerais.

A provocação não tirou Mário Sérgio da escalação titular, formada no meio-campo por Zé Mário, Rivelino e Paulo Cézar Caju e no ataque por ele fechando o trio com Gil na ponta-direita e Manfrini bem improvisado na ponta-direita.


Bicampeão pelo Fluminense, Mário Sérgio seguiu para o Botafogo onde jogou com Marinho Chagas formando uma ala respeitável pela esquerda. Tanto jogavam quanto aprontavam, a ponto de o time ser chamado de Camburão Futebol Clube. Mário Sérgio usava um revólver calibre 38 na cintura, em suas folgas.

De ponta-esquerda legítimo, daqueles de ir à linha de fundo, desmoralizar o lateral-direito e cruzar direto na cabeça do centroavante, atingiu a plenitude como quarto-homem de meio-campo, reencontrando Marinho Chagas no São Paulo em 1981, quando foi convocado pela primeira vez, aos 31 anos.

Estreou contra os búlgaros, deu um show de bola em Porto Alegre, entrosado com Cerezo, Sócrates e Zico e ainda enfiando passes para dois gols, o do jovem lateral-direito também iniciante, Leandro, do Flamengo, e de Roberto Dinamite, que voltava ao escrete após dois anos de ausência.

Convocado sempre na prorrogação, na marca do prazo final, para as Copas de 1974 e 1978, o esforçado e combativo Dirceuzinho, falecido em acidente de carro em 1995, agia como bom assessor de imprensa de si mesmo. Dirceuzinho nunca foi mal jogador, claro, mas havia outros bem melhores.

Mandava recortes de jornais espanhóis e italianos sobre suas atuações às redações e para a Comissão Técnica da seleção, cortejava jornalistas e enviava cartões natalinos aos treinadores. Assim foi convocado em 1982 e só não disputou, quase ex-jogador, a Copa de 1986 no México por conta de uma distensão muscular.

Arredio, barbudo e indiferente, Mário Sérgio jamais faria papel igual. Certa vez, no Inter(RS), baixou as calças e mostrou a bunda ao sisudo técnico Ênio Andrade, que lhe dera uma instrução considerada incorreta. Com Telê Santana, começou a morrer em Natal.


No amistoso contra a Alemanha Oriental, (3×1 para o Brasil) o técnico reclamou publicamente que o Vesgo havia abusado do individualismo. Já estava pensando em Dirceu, mais obediente e menos problemático. E Mário Sérgio respondeu cofiando bigode aos microfones e lentes: “É assim que jogo desde quando comecei e só fui convocado porque jogo assim”.

Mineiro, do tipo que lambe a vingança para comê-la em prato gelado, Telê Santana esperou outra Alemanha, a Ocidental, no Maracanã, para substituí-lo no intervalo e lhe dar adeus. Éder assumiu a posição com Dirceu chamado entre os 22.

Mário Sérgio não ligou. Seguiu jogando e um ano depois conseguia o que a seleção perdera: o título mundial, armando o Grêmio para as arrancadas e os gols de Renato Gaúcho. Levantou de euforia o público japonês ao aplicar dribles de calcanhar nos alemães do Hamburgo. Cansou de enfiar canetas nos grandalhões sem molejo.

Ainda seria convocado para a seleção brasileira por Evaristo de Macedo em 1985 para uma série de amistosos fracassados antes das Eliminatórias. Evaristo caiu e Mário Sérgio foi cortado, de novo, por Telê Santana ao reassumir. 

Mário Sérgio terminou barrado da Copa de 1982. Dirceuzinho foi. Indesculpável. Mário Sérgio ludibriava com estilo e efeito na batida de bola, era um jogador que valia o preço de camarote no estádio. Vesgo de olhar de lince. Uma ginga do destino fintando a fatalidade mudaria o rumo do avião da Chapecoense que caiu em 2016 e matou Mário Sérgio, sua virtude, demasiada visão.

QUANDO O GÊNIO CANTA DE GALO

por Luis Filipe Chateaubriand


Em 1985, Telê Santana estava de volta ao comando técnico da seleção brasileira de futebol. Seu desafio era classificar o Brasil para a Copa do Mundo de 1986, passando, nas eliminatórias, por Bolívia e Paraguai.

No primeiro jogo, com a Bolívia em Santa Cruz de la Sierra, o Brasil havia vencido de 2 x 0, dois gols de Casagrande.

Foi o escrete canarinho, então, a Assunção, para enfrentar os alvi colorados.

Jogo difícil, disputado, Casagrande faz 1 x 0 para o Brasil ainda no primeiro tempo.

Na segunda etapa, os paraguaios pressionam, mas uma jogada genial, de um brasileiro genial, selaria o destino da partida.

A bola está com Leandro, na intermediária direita do campo de ataque. Percebe Zico desmarcado um pouco atrás da meia lua. Faz o passe diagonal, com a perfeição habitual.

No entanto, devido ao campo irregular, a bola chega atrás de Zico, levantando-se suavemente.

O jogador convencional precisaria se virar de costas para o gol, e de frente para a bola, para dominá-la. Mas Zico, o Galo, decididamente não é um jogador convencional…

Mesmo com a bola ficando atrás dele e tendo quicado no campo, faz uso do inusitado: puxa a bola de calcanhar para a frente, ela sobe pelo seu lado direito até a altura de seu pubis, mas sem tocar nela, decai e, antes de chegar ao chão, Zico emenda de primeira, ainda atrás da meia lua.

A bola segue baixa, mas não rasante, quica de leve no campo já na pequena área, e vai morrer no fundo do gol, no canto esquerdo do impotente goleiro guarani.

Fica claro que o Galo concebeu o gol, sabendo o que faria antes da bola chegar. Gênio!

Um gol sensacional, que determina o 2 x 0, placar definitivo do cotejo, deixando bem encaminhada a classificação brasileira à Copa do Mundo de 1986.

Anos mais tarde, Zico faria o lindíssimo “gol escorpião”. Mas, já então, fez o “passe meio escorpião lançando para si próprio”, que culminou em gol.

Toda a lógica mostrava que o jogador qualquer teria que se virar para a bola, dominá-la, girar o corpo em direção ao gol e, quando fosse chutar, já estaria bloqueado pelos adversários. Zico simplificou as coisas. A genialidade está na simplicidade, como o Galo nos ensinou em mais de 20 anos de carreira do maior jogador brasileiro do Pós Pelé.