por Jonas Santana
Já não bastava ter um zagueiro por nome de Todo-Duro agora vinha o Saulo Ceroula (era mais fácil gritar Ceroula que Saulo), aquele volante clássico, pequeno, mas firme no desarme e milimétrico nos passes, maquiavélico e preciso na armação das jogadas.
Como cada um naquela equipe, ele também lembrava jogadores épicos, e Ceroula tinha características de craque. Uns diziam que na qualidade do desarme era tal qual Clodoaldo, um dos mais elegantes e altivos líberos (os mais jovens irão perguntar o que é isso), que marcou época no Santos e na seleção brasileira (bons tempos!!!). Outros juravam que era o Batista do Inter ou mesmo o Toninho Cerezo (do Atlético Mineiro) numa versão mais reduzida. O fato é que Saulo era realmente um deslinde na frente da zaga, fosse armando ou frustrando o ataque dos adversários, coisa comum para ele.
Nosso craque tinha lá suas peculiaridades e suas exigências, tais como usar somente chuteiras de trava alta, talvez para dar maior segurança ou, quem sabe, aumentar alguns centímetros em sua altura. Usar gel no cabelo mesmo que fosse dia de chuva era outra. Ou ainda usar a camisa por fora (numa época que isso dava cartão) com os meiões arriados.
Mas nada disso tirava o brilho daquele time nem dos seus craques, inclusive do próprio Saulo, um simpático analista de sistemas durante a semana e um craque nos fins de semana naqueles campos, muitas vezes enlameados, muitas vezes em gramados que mais pareciam tapetes!! E toda a equipe era um espetáculo à parte, alegrando aos torcedores e amantes do futebol.
E foi numa dessas partidas que ocorreu um episódio que marcou nosso atleta e deu origem ao segundo apelido (o primeiro era Saulinho, óbvio!). Foi o seguinte:
Jogo do time do Ceroula contra um combinado do município. Jogo duro, pegado, onde cada dividida voava faísca e onde os melhores estavam em campo.
Dirran, Nerrôda, Zé Rosca, Pedro Preto, entre outros eram os atores daquele jogo catimbado, onde Nego Jordan (que depois seria contratado para fazer a meia cancha com Saulinho) estava acabando com o meio campo adversário, tanto no desarme quanto nos lançamentos, que deixavam quase sempre os atacantes de frente para o grande Quiabo, aterrorizando a de dupla de zaga Lila e Todo Duro que já estavam desesperados. E aconteceu…
Orlando Touro (como sempre, ele) recebe a bola na meiuca (apelido do meio campo, mais precisamente do círculo central), parte para cima de Saulinho (até àquela altura do jogo) e dá uma gingada de corpo que faz com que nosso atleta se desequilibre. Aliado a isso, a trava alta segurou o pé do craque no gramado que, incontinenti, ao ver escapar ali o seu algoz não tem dúvidas e lança mão da seu último recurso: puxar-lhe o calção. Nosso jogador só não contava com o inusitado da situação nem com a força do Touro, que dispara e, sem perceber, deixa o calção rasgado na mão de Saulo, ficando somente de ceroulas, aquelas conhecidas como samba-canção, especificadamente uma azul de cetim, com figurinhas de urso, que além de brilhar com o reflexo do sol, fez com que todo o estádio viesse abaixo num grito uníssono de Ceroula!!!! Ceroula!!!!
Diante de tal episódio restou-lhe o cartão vermelho, e a herança do nosso jogador, que agora era mais conhecido como Saulo Ceroula, epíteto que o acompanhou durante toda sua carreira, encerrada antecipadamente por causa de uma pequena lesão nos joelhos.
Mas mesmo assim nosso craque desfilou por bastante tempo seu talento, sempre ouvindo os gritos da torcida sempre que pegava na pelota. E a fama o perseguia até o pendurar de suas chuteiras.
Dizem que depois de algum tempo, em sociedade com Dirran, montou uma fábrica de peças intimas. Mas a pecha da Ceroula continuou.
Jonas Santana Filho é funcionário público, escritor, gestor esportivo e amante do futebol. O bom futebol.
Jonassan40@gmail.com. Skype jonassan50