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Rubens Lemos

MENINO NEY

por Rubens Lemos

Neymar ameaçado no PSG, Neymar excluído por incompetência e caráter, Neymar indesejável por convívio e postura, Neymar jogado na vala comum dos bonzinhos. A queda do habilidoso e chato menino mimado pelo galvãobuenismo midiático era uma decisão desenhada há anos.

O melhor jogador do mundo é Messi até quando suas pernas em miniatura seguirem exibindo o ilusionismo dos gênios, daqueles que são feitos por Deus e têm a forma jogada fora. Nunca serão imitados ou haverá cópia porque não há a industrialização do beletrismo em campo.

No PSG, manda o francês Mbappé, um fabuloso atacante, de técnica e capacidade ofensiva explosiva, sujeito que, na corrida, consegue driblar curto e derrubar sem confronto físico, qualquer adversário.

Mbappé cansou das frescurites de Neymar e agiu, até com certa perversidade, para fulminar o brasileiro do time onde jogou pouco e rebolou muito.

Neymar começou brigando no PSG com Cavani, excepcional uruguaio dono da artilharia e das cobranças de pênalti. Naquele sorriso campeão mundial (único título universal de Neymar) em que o cínico se alia ao prepotente, Neymar levou um coice de Cavani ao pedir para bater, quando sempre soube, ele, o garoto chato, que no futebol europeu há regras de conduta e de rotina, chutar pênalti, apenas uma delas.

Nunca se entenderá porque Neymar foi brindado com homenagem na Torre Eiffel, símbolo mundial da França. Antes dele, craques do clube foram campeões mundiais e não tiveram direito a centésimos de tamanha bajulação.

Neymar não deveria ter concordado. Boleiro sábio é malandro e, ao chegar, procura se unir, compor, dividir quarto, farra, se colocar à disposição para, depois, buscar o topo da idolatria.

Neymar não é o primeiro caso. O melhor meia-armador do mundo em todos os tempos, o Príncipe Etíope Didi, perdeu-se no Real Madrid ao rivalizar com Di Stéfano, o argentino brilhante que mandava no time e passou a boicotar o brasileiro Míster Futebol. Didi chegou querendo o posto de Di Stéfano que, quando questionado sobre boicote ao rival, desmontava com um argumento irrefutável:

– Didi era manobrado pela mulher (a linda e ciumenta Guiomar) e não se adaptou. Se tivéssemos preconceito, por que Canário brilhou o tempo inteiro?

Canário era um ponta-direita contratado ao América(RJ), modesto, sem história na seleção brasileira, mas obediente ao manual da convivência em que cada um sabe seu lugar e sobrevive respeitando as regras da monarquia de vestiário.

Neymar nunca jogará 0,05% de Didi, que disputou três Copas do Mundo e venceu duas, sendo em 1958 o melhor jogador do campeonato e atuando com Pelé e Garrincha. Neymar tornou-se um nome e um homem gasto, perecível, perdendo a validade.

Nas duas Copas do Mundo em que jogou – 2014 e 2018 -, Neymar teve desempenho de Valdomiro, o limitado ponta-direita do internacional titular (por falta de opções), do limitado time de Zagallo, quarto-lugar em 1974. Valdomiro, na Alemanha, conquistou o idêntico quarto lugar de Neymar (sem jogar), na Copa disputada no Brasil dos 7×1 impostos pela Alemanha.

Neymar deixa claro que é o cara chato da turma, o intolerante, o brincalhão sem humor, o ciumentinho, o que cisma e causa alvoroço no ônibus até o estádio por exigir a cadeira 10 e nenhuma mais, forçando quem nela sentou a sair irritado e humilhado pois todos os caprichos do supercraque de fanfarra devem ser atendidos.

Neymar quis ser Messi. Dançou. Neymar quis ser Cristiano Ronaldo. Ruiu. Neymar quis ser Mbappé, demorou, mas caiu, Neymar ciscou, tentou o drible, desabou. Neymar é colocado impunemente em seleções brasileiras eternas, barrando até Garrincha, o que é um crime de lesa-memória.

Neymar vai terminar querendo ser Ganso, antigo parceiro e um preguiçoso debochado e clássico que, hoje, seria muito mais útil na Copa do Qatar do que o bebê escanteado em algum café parisiense. Insuportável epitáfio: Menino Ney.

HOJE E 1982

por Rubens Lemos

Faltou coragem para convencer o motorista que me dava carona a parar por cinco minutos. Não mais que cinco minutos. Porque há 40 anos houve uma data mortífera para minha vida de menino prosseguindo nas repetições bastardas sobre aquela quase tarde de 1982.

Gostaria de ter pedido licença ao atual dono do imóvel, Rua Abelardo Calafange, Morro Branco, Natal(RN), onde iria procurar por mim mesmo, sufocado de saudades. Casa ajardinada, com ampla varanda, três quartos arejados, a sala de estar onde a velha TV Telefunken certamente apareceria para mim, como um fantasma eletrônico a martirizar o fragilizado espírito.

Deus, meu Deus, queria tanto que me liberaste a carta de alforria do meu sentimentalismo, combustível dos meus dias desde as primeiras travessuras.

Iria vasculhar a casa, entrar na cozinha, de onde mamãe emitia ordens expressas para tomarmos banho no horário correto e esperar a condução para a escola, pois meu pai raramente almoçava com a gente durante a semana.

Voltaria, meu Deus, à varanda. Lá, meu pai declamava poemas de Drummmond, de Quintana, de Berilo Wanderley, dele próprio, nas farras embaladas pela suavidade do violão de Domilson Damásio, pai dos meus amigos Denílson, Kleber( Klebão) e do mais novo, Zé Bastos.

Domilson dedilhava Lupicínio Rodrigues, Cartola, Ismael Silva, os velhos sambistas evocados e reverenciados por Rubão de bigode nicotinado e, foi dele Deus, que herdei, a emoção exposta na pequena piscina do seu olhar cansado e na sua voz aveludada.

Foi na sala de estar que, dia 5 de julho de 1982, vestindo uma camiseta simplória da Hering com distintivo da Confederação Brasileira de Futebol(CBF), juntei-me a papai e seu cigarro fumegante, à minha irmã, torcedora do Flamengo e ao caçula, de apenas seis anos e, feliz dele, sem entender nada do que a jornada faria com nossas vidas a partir de então.

Estávamos certos, embriagados pela traiçoeira armadilha da presunção, de que o Brasil sairia do Estádio Sarriá, em Barcelona (Espanha), tão glorificado quanto três dias antes, quando humilhou a Argentina campeã mundial com o astro-rei Maradona. A Itália – naquele dia não enxergávamos nada racional – por nós era sentenciada como time medíocre.

A vitória da Azzurra sobre a Argentina por 2×1, tampouco nos alertara, embriagados de soberba que estávamos, diante dos recitais de Zico, Sócrates, Falcão, Júnior, Leandro – que fábula de lateral-direito -, Éder e Oscar impondo-se com o porte dos grandes marechais de retaguarda.

Então, a Itália faz 1×0, cabeçada de Paolo Rossi. A bola viajou pela pequena área e o goleiro Valdir Peres não saiu para afastá-la. Valdir Peres nem na Copa, agora é fácil protestar, deveria estar, Brasil com dois veteranos fantásticos – Leão e Raul -, vítimas da teimosia siderúrgica do técnico Telê Santana.

Zico dribla, dribla não, Zico descadeira Gentile e serve a Sócrates. O Magrão toca entre Zoff e a trave, 1×1, explosão familiar na Abelardo Calafange. Alegria tolhida pelo passe ridículo de Cerezo atravessando a defesa. Como uma cobra cascavel de cantina, Paolo Rossi se antecipa e fulmina Valdir Peres:2×1.

Termina o primeiro tempo, meu pai sai para comprar cervejas e, sem ser convidado, vou com ele, agarrado à sua camisa e perguntando desesperado:

– Pai, vamos empatar? vamos, pai?

– Sim meu filho, acho que sim, mas vá aprendendo a perder, ele ensinou, colecionador de derrotas futebolísticas e, sobretudo pessoais, que machucavam sua alma lírica.

Falcão empata e, pela primeira vez, desabo em prantos em jogo de seleção. Choro muito, ajoelhado e rezando o Santo Anjo. Aí, Cerezo cede o escanteio mais idiota do mundo. Estava com a bola dominada e, nervoso, jogou-a pela linha de fundo. Patético.

A defesa faz a linha burra para deixar a Itália em impedimento. Júnior fica na pequena área. Paolo Rossi, verdugo, faz seu terceiro e decreta a nossa derrota, muito mais que a vitória deles.

A casa virou um cemitério. Perdemos. Eu aprendi que super-heróis eram enganações na acidez da verdade. Dor que me faz odiar aquela casa, aquela esperança, aquele fracasso e a derrota principal: meus pais estão mortos.

MEU PAI E A FINAL DA COPA AMÉRICA

por Rubens Lemos

O Brasil decidiu a Copa América de 1989 contra o Uruguai num domingo, 16 de julho, data fatalista pela perda da Copa de 1950, no Maracanã da mesma decisão 49 anos depois. Bobagem. A Celeste ganhou com justiça. Não errou.

Meu pai, sertanejo nato, vascaíno ultrarradical, tomara antipatia do técnico Sebastião Lazaroni. Achava-o injusto.

Para perseguido político, quem vacila é pior que inimigo ideológico.

Meu pai decifrava, poetizava o Brasil de 1950, exaltava o Expresso da Vitória cruzmaltino da década de 1940. Barbosa, Augusto, Rafanelli; Eli, Danilo, Jorge; Maneca, Jair, Ademir, Ipojucã e Chico. Posso ter errado por um ou dois, não por muitos.

Em 1989, desfiava seu compêndio de palavrões tão logo Lazaroni barrou quem, para Rubens Manoel Lemos representava o romantismo e a imaginação perdidas para a mediocridade: Geovani Silva, meia-armador que chamava de regente, pela capacidade de comandar, alterar, organizar, decifrar e subverter a administração de um jogo baseado na classe que ele acompanhava, criança, em Ipojucã ou Jair.

Geovani era capitão do Vasco e homem de confiança do “Laza”, a quem deu um bicampeonato carioca com Roberto, Romário e Mazinho. Geovani fora o melhor das Olimpíadas de 1988 e, sua ausência na final(suspenso), custou o Ouro. Entrou Neto, Dadá Maravilha sem graça.

Brasil x Uruguai pela TV Manchete. Saem as escalações. João Saldanha reclama a ausência de Geovani. Márcio Guedes, comentarista, ousa chamar o craque de decadente. João Sem-Medo:

– Decadente é você, que nunca esteve no auge, Geovani é o melhor de todos.

O meu pai nem esperou a resposta(que não houve), de Márcio Guedes:

– Viva João Saldanha, Viva Geovani!

Apartamento lotado, claro, cerveja grátis é convite a amigos de ocasião, um deles gracejou, flamenguista que era:

– Rubão, Geovani é apenas um driblador…

Agradeço a Deus meu pai estar desarmado.

– Você sabe quem foi Manoel dos Santos? Sabe?

O sujeito pensou, pesquisou e murmurou, todos tensos na sala:

– Não lembro…

Rubão saltou da rede, acendeu o 30o cigarro e, calmamente, fuzilou:

– Se você não sabe quem foi Garrincha, perdoo pela ignorante inveja de Geovani.

– Não tenho inveja dele, insistiu o penetra.

– Tem e a inveja arrasa a alma, mesmo a de quem não tem, o que é o seu caso.

Ninguém bebia, ninguém fumava, ninguém traçava petisco, só o som da TV.

Chateado também pela ausência do ídolo, disse ao inconveniente:

– Vai esperar meu pai te expulsar no braço?

Ele foi embora, meu pai dormiu 90 minutos, Romário fez o gol do 1×0 final.

No dia seguinte perguntei o que ele achava. Rubão profetizou:

– A Copa América vai matar o Brasil na Copa do Mundo. Não existe time sem criador, lançador, craque. E ninguém pronuncia o nome de Lazaroni nesta casa!

No dia 4 de junho, fez 23 anos que o meu pai morreu. Firme em suas convicções. E não errou. Perdemos em 1990. Com Lazaroni e sem Geovani.

TORCER CONTRA

por Rubens Lemos

Mente elasticamente aquele que, fulminado pelo fracasso do seu time, diz que não torce contra o maior adversário. É exercício sacana e desesperador. Tipo o pusilânime “se a gostosa não é minha, daquele idiota também não vai ser”.

É cívico torcer por time ruim. Cívico e masoquista. Desde sempre vascaíno, nem torço com fervor pelo meu ex-clube, há 22 anos, caricatura de uma linda história de craques e postura, a maior delas, a de ser o primeiro a aceitar negros jogando futebol no Brasil. O Vasco fez história libertária.

Na formação tipificada do vascaíno, há, em primeiro plano, o anti-flamenguista. É uma célula radical e equitativa ao sentimento de idolatria ao cruzmaltino. A repulsa ao Flamengo é um movimento crescente, pelo derrotismo intrínseco do Vasco e a piora gradual do comportamento dos rubro-negros.

Se você é Vasco, Botafogo ou o campeão carioca Fluminense, não pode tolerar as chateações urubulinas. Algumas que marcam uma vida como é o meu exemplo. A gozação flamenguista deriva para o mau gosto, o cinismo e o ódio.

Deixe-me contar o meu caso específico: em 1994, o Vasco foi tricampeão carioca pela primeira e última vez. Um belo time e uma conquista mórbida.

O craque chamava-se Dener Augusto de Souza. Um gênio do drible, 23 anos, comparado sem motivo a Pelé, mas o cara que teria sido o Rei de sua geração. Fazia da bola, prostituta obediente.

Dener costurava defesas em velocidade e habilidade que Neymar nunca sonharia em imitar parecido. Em busca da vitória. Era poético ao dizer que “o drible era mais bonito que o gol”.

Em sua estreia, contra o Newell’s Old Boys da Argentina, deixou boquiaberto Diego Armando Maradona, que bateu palmas para ele.

Dener costurou a zaga portenha aos gingados, fazendo marcador bater cabeça. E um dos lances mais acessados do Youtube. Lindo, lindo, lindo. Dener era extraordinário.

Depois de dar um show de bola contra o Fluminense, entortando o lateral-esquerdo Branco da seleção brasileira, Dener viajou a São Paulo para tratar da venda de seu passe ao futebol alemão. Saiu do Maracanã, jantou na capital paulista e voltou de madrugada num possante – para a época – Mitsubishi Eclipse.

A dor lancinante – a maior que senti como torcedor do Vasco – veio de manhãzinha da segunda-feira, 19 de abril. Dener morre asfixiado pelo cinto de segurança dormindo no banco do carona.

O motorista, que tinha envolvimento com traficantes de drogas e seria assassinado -, perdeu o controle do carro. Ainda hoje tenho saldo de lágrimas pelo choro convulsivo na morte de Dener.

O que fazem os flamenguistas? O imperdoável. No primeiro domingo sem Dener, Vasco x Flamengo com 98.027 pagantes no Ex-Maracanã, aquele das gerais, dos pobres desdentados formando um painel de classes sociais desenhando a democracia (perdida) no futebol.

Os dois times em campo (taí a foto acima). Antes do apito inicial, eis a deslealdade da massa rubro-negra, parodiando trechos do clássico carnavalesco Jardineira. Foi um ato asqueroso: “Ô vascaíno, por que estas tão triste/ Mas o que foi que te aconteceu/ Foi o Dener que bateu no carro/ Quebrou o pescoço e depois morreu”.

A punhalada cafajeste mexeu com os jogadores do Vasco, que perderam a única partida (1×2) da brilhante campanha na conquista inédita. O Vasco daria o troco com o baixinho William, canhoto sensacional em lugar de Dener, derrotando o Fluminense. Mas aquele coro covarde, nunca será perdoado.

Tenho inúmeros amigos flamenguistas, minha mãe era flamenguista, mas não dá para aguentar flamenguista de caráter apodrecido. O tal do Gabigol é o típico exemplar do jeito Flamengo de pisotear vencido. Provoca, exibe faixas, mexe com a torcida do rival.

Age o centroavante banal como se sua bola apenas razoável lhe desse o direito de compartilhar o espírito de porco que carrega sob a pele. Ou acima dela. A grandeza está no saber vencer e o Flamengo não sabe.

Daí me flagrar em êxtase, em qualquer olé sobre o Flamengo seja em decisão carioca, seja em jogo banal ou de baralho. O som da frase: Flamengo perdeu me faz bem. Nem quando uma namorada me deu o fora e descobri que tinha caspa , fiquei tão feliz.

FASCINAÇÃO DE REI

por Rubens Lemos


Ponha a sinonímia na reserva e a imagem acima dispensa variações: é fascinação, aquele encanto fulminante que penetra a alma em forma de paixão amorosa, atração física, tesão selvagem. Pelé, menino de 17 anos está simplesmente hipnotizado pelo tesouro que quase todos lhe garantiram impossível de ser conquistado.

É a Taça Jules Rimet ganha pelo Brasil em 1958, quando deixamos de ser vira-latas para latir em forma de sedução boleira nos campos da Suécia, onde caíram, castelo de cartas, Áustria, União Soviética, País de Gales, França e Suécia. Empatamos com os ingleses porque o teimoso, dorminhoco e bonachão técnico Vicente Feola demorou uma rodada para por um general de cinco estrelas, Zito e duas maravilhas da natureza em campo: Pelé e Garrincha que destruíram a União Soviética.

Fascinação é eclética. Criança, saía do bairro do Tirol, na provinciana Natal dos anos 1970, sem um tostão no bolso, nem para o refrigerante, apenas para usufruir de um prazer juvenil: subir e descer as escadas rolantes das Lojas Brasileiras, na Avenida Rio Branco, hoje fantasma do que um dia foi, a maior casa de departamentos da cidade.

Como poderia uma escada ir e vir, mecanicamente, transportando consumidores ou pobres iguais a mim, satisfeitíssimos em receber a dádiva de passar a tarde indo e voltando pela geringonça, uma modernidade no tempo da calça boca de sino e do sapato Cavalo de Aço.

Minha fascinação era modesta, porque meus caminhos sempre foram de espinhos em lugar das pedras. Os impedimentos moldaram minhas dificuldades a ponto de, até hoje, ser um conformista automático. Tudo bem, não deu, ok, a resposta é não, tudo certo, vamos adiante. Minha fascinação duelava com a estima baixa.

Fosse eu um garoto negro e humilde, de canelas de sabiá e um talento de Deus, passaria semestres sentado olhando a taça. Pelé começou resgatando a memória do pai, que viu chorando ao escutar a decisão de 1950, o Maracanazzo, a vitória do Uruguai sobre 200 mil pessoas comprimidas e prontas para celebrar a Copa no maior estádio do mundo. Seu Dondinho ficou perplexo quando ouviu a frase, que não transcrevo literalmente: “Pai, eu vou te dar um titulo de campeão do mundo.”

Pelé tinha contas a acertas com seu irmão imediatamente mais novo, Zoca, que o surrava nas mesas de futebol de botão e voltava para casa humilhado, com os dribles e lances paranormais do outro em revanche. Pele ganhou a Copa do Mundo e disse a Zoca: “Ganhei para nós dois. Você não conseguiu ir, eu fui e a medalha é dos dois”.

Acertado com violência pelo zagueiro do Corinthians Ari Clemente, antes da viagem para os jogos preparatórios à Copa da Suécia, Pelé por muito pouco não ficou no Brasil. O médico Hilton Gosling e a Velha Guarda em campo: Nilton Santos, Didi e Zito bancaram a ida do neguinho à terra das loiras, que por ele se encantavam nos passeios durante o intervalo do Mundial.

Pelé olha para a taça e deve estar imaginando quando foi mais espetacular. Se contra a União Soviética, contra o País de Gales, a França ou a Suécia. Fico com o gol abençoado sobre País de Gales(1×0). Ali, foi o jogo decisivo. Se o Brasil empata, tem prorrogação, se perde, teria voltado com as lágrimas covardes outra vez.

Pelé olha a Taça que ele ganharia – jogando uma partida e meia em 1962 e assombrando o planeta do tricampeonato de 1970, a perfeição do atleta e do homem decidido a trazer a Jules Rimet de uma vez ao Brasil. Fascinação da humidade sobre o seu soberano que causava impacto, perplexidade, incredulidade em quem o assistia.

Eis a diferença dele para Garrincha que fazia o público rir, se deliciar. Pelé, arregalava os olhos da assistência. A Jules Rimet foi roubada 25 anos depois da epopeia sueca e derretida. A fascinação de Pelé, nem o fogo feroz mancharia o ato que vem da felicidade indescritível. Como na canção de Elis Regina.