por Rodrigo Ancillotti
Ser botafoguense nunca foi tarefa fácil!! Ok, pode parecer exagero se levarmos em conta a Gloriosa História (assim mesmo, em maiúsculas) do Botafogo de Futebol e Regatas, mesmo com nosso eterno pessimismo e vocação para a tragédia, como dizia Nelson Rodrigues.
Mas a década de 1980… Ah, os anos 80…
Flamengo multicampeão com o esquadrão de Adílio, Nunes, Zico, Tita e Lico; o Vasco de Roberto Dinamite, único time capaz de fazer frente àquele Flamengo no começo da década; o Fluminense construindo o time que seria tricampeão estadual e campeão brasileiro; o Bangu de Marinho e “seo” Castor de Andrade sempre se destacando, assim como América, Campeão dos Campeões; e o Botafogo…
Mas e o Botafogo??
Pagava uma severa conta de administrações terríveis de gente do naipe de Charles Borer, delegado da repressão militar que entendia tanto de futebol quando de democracia. Estava exilado no distante bairro de Marechal Hermes após perder a sede de General Severiano, e parecia a cada ano mais “apequenado” que nunca. Vivia uma seca de títulos que já durava desde 1968 (que só terminaria no Ano da Graça de 1989, mas isso é tema de outro texto…), e sua Gloriosa Torcida, cada vez mais sofrida e achincalhada, precisava aturar, ano após ano, os adversários cantarem um constrangedor “Parabéns pra Você” a cada jogo.
Mas ano após ano, a centelha de esperança surgia, e a Gloriosa Torcida sempre buscava um “salvador”, aquele que reconduziria o clube às glórias, e não era diferente naquele ano de 1983. A esperança tinha nome incomum e futebol de “gente grande”: ao amazonense Ninimbergue dos Santos Guerra, ou simplesmente Berg.
Berg chegou ao Botafogo após o Brasileirão de 1983, onde se destacou pelo Rio Negro de Manaus. 20 anos recém-completos, mirrado (1,71m de altura) e cabelos loiros encaracolados característicos, era habilidoso, rápido e bom finalizador, e podia jogar tanto como autêntico ponta-de-lança, armador ou ponta-esquerda. Chegava para suprir a ausência de Mendonça, que saíra meses antes pra Portuguesa de Desportos após anos liderando times que chegavam perto, mas morriam na praia.
Não seria mesmo em 1983 que a maldita fila terminaria. Apesar de bom jogador e ter companheiros como Josimar, Alemão, Nunes e Geraldo ao seu lado, aquele era o Botafogo que fazia brilhantes clássicos no domingo e perdia contra adversários minúsculos na quarta-feira. Mas foi num desses clássicos que um menino de seis anos (o narrador que vos fala) foi conquistado pela Estrela Solitária.
Dia 14 de agosto de 1983, domingo Dia dos Pais, Botafogo x Flamengo no Maracanã. Flamengo já sem Zico (que partira pra Udinese pouco antes) e ainda brigando pelo título da Taça GB contra um Botafogo já fora da parada. E foi nesse dia que Berg caiu nas graças a Gloriosa Torcida: uma assistência para Geraldo marcar o segundo gol, e um chutaço no canto de Raul pra fechar o placar naquele improvável 3×0 para o Botafogo. Nascia mais um ídolo improvável.
Os anos foram passando, a fila aumentando, e o futebol de Berg se sobressaindo em elencos medíocres que sempre ficavam pelo caminho. Mas foi justamente quando atingiu o seu auge técnico que a tragédia o abateu duramente.
Para variar, o Botafogo ficou longe do título da Copa União de 1987 (terminou em nono lugar entre 16 clubes), mas Berg jogou como nunca num time que tinha jogadores mais badalados como Maurício, Éder Aleixo e Vágner Bacharel. Jogando o fino, conquistou a Bola de Prata da Placar como melhor ponta-esquerda do Brasil, desbancando jogadores como Zinho, Edivaldo, dentre outros. Parecia que 1988 seria em que Berg lideraria o Glorioso rumo ao sonhado título.
Mas o destino pregou uma de suas peças mais injustas…
Durante as férias, numa pelada de Showball na Europa, Berg arrebenta os ligamentos do joelho e fica praticamente dois anos afastado dos campos. Fica fora do time justamente naquele que seria o Ano da Redenção Alvinegra: praticamente não jogou durante o campeonato de 1989, e assistiu Maurício se eternizar marcando o gol do título contra o mesmo Flamengo que o consagrou em 1983.
Berg jogou algumas partidas na campanha do bicampeonato de 1990, mas a barração na finalíssima contra o Vasco marcou sua saída do Botafogo que tanto amava após sete anos. Rodou por Cerro Porteño (PAR), Atlético Paranaense, Americano de Campos, uma volta relâmpago ao Glorioso em 1993, e América (SP), até falecer de infarto durante uma pelada nas férias (outra pelada nas férias!!!) em julho de 1996. Tinha apenas 33 anos.
Mas a imagem que ficou naquele garoto de seis anos que insistia em dizer que “gostava de Zico” é do moleque loiro calando a torcida do Flamengo naquele agosto de 1983.