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DINAMITE SEMPRE GOL

por Rubens Lemos


Saía no tapa algumas vezes quando o flamenguista xingava Roberto Dinamite na escola. Brigas bestas, de menino em intervalo discutindo a rodada de domingo na chatice de uma segunda-feira. Flamenguista não fica satisfeito apenas em torcer pelo seu time. Gosta de tripudiar, humilhar, debochar do derrotado e nos anos 1980 o Vasco apanhava muito mais do que batia.

O Vasco era Roberto Dinamite, meu ídolo, o cara que ilustrava meu caderno socando o ar em vitórias sofridas. Quando o conheci, no antigo Hotel Ducal, onde ficou hospedada a seleção brasileira na primeira vez em que jogou em Natal, 26 de janeiro de 1982 (3×1 na Alemanha Oriental), tremi da cabeça ao dedão do pé ao receber seu autógrafo e um sorriso comovente pelo cinzento de um olhar simplório e cativante.

Fiquei abalado quando o técnico Telê Santana excluiu Roberto Dinamite da lista dos 22 convocados para a Copa do Mundo de 1982. Uma tremenda perseguição. Roberto Dinamite – que salvara o escrete quatro anos antes marcando o gol da classificação contra a Áustria, fez gol e jogou muito bem, afinado com Zico ao ser convocado pela primeira vez por Telê para um amistoso contra os búlgaros em Porto Alegre: 3×0. Zico e Roberto Dinamite, juntos, nunca perderam uma partida pela seleção.

Na partida de Natal, isolado, o artilheiro do Vasco pouco rendeu. Ninguém jogou absolutamente nada, mesmo com a vitória. Sócrates fez falta, Falcão também não veio e não fosse pela ruindade dos alemães do caduco lado comunista, o Brasil, no máximo teria empatado. Como empatou contra a Tchecoslováquia em 1×1 no Morumbi.


Vaias no Morumbi provocaram ranhuras em gloriosas reputações. Roberto Dinamite não teve paz , como não tiveram, várias vezes, Paulo César Caju, Zico, Bebeto. Tocava na bola e era xingado pela multidão pedindo Serginho Chulapa.

Barrado pelo pavoroso grandalhão Chulapa, à época no São Paulo, perdeu a vaga de reserva para o jovem Careca, do Guarani, habilidoso, ágil e adequado ao estilo de toque de bola da constelação que brincava com a bola.

Careca se machucou já nos primeiros treinos em Cascais, Portugal, onde o Brasil se preparava, e Telê foi obrigado a convocar Roberto Dinamite sem sequer colocá-lo no banco de reservas em nenhuma das cinco partidas.

Enquanto Zico, Sócrates, Falcão, Leandro e Júnior encantavam o planeta bailando em variação de ritmos, do samba ao jazz, Chulapa, destoando da sinfônica, ganhava uma reputação infame: o melhor zagueiro-central da Copa perdida para a Itália. Telê Santana conseguia ser maravilhoso e teimoso.

Roberto Dinamite segurou o Vasco sozinho no tempo de cartolas avarentos. De timecos. Aos 20 anos, comandou o improvável título brasileiro de 1974 superando o Santos de Pelé, o Cruzeiro de Dirceu Lopes e o Internacional de Figueroa e Falcão.

Em 1976, o gol mais bonito do ex-Maracanã, o lençol em Osmar Guarnelli e a patada de voleio vencendo Wendell na virada de 2×1 sobre o Botafogo, no limite do tempo das almas aflitas.


Em 1977, massacrou Flamengo, Botafogo e Fluminense na épica jornada do primeiro título que assisti pela TV. O Carioca de um timaço  com
Mazarópi; Orlando, Abel, Geraldo e Marco Antônio; Zé Mário, Zanata e Dirceu; Wilsinho, Roberto Dinamite e Ramon. Ele batendo o pênalti
final jogando o goleiro Cantarelli para um lado e a bola entrando rasteira no canto direito.

Bem mais do que admiração, Roberto Dinamite transpirava ternura, uma singeleza quixotesca. Formou duplas sensacionais com Ramon, Jorge Mendonça, César, Cláudio Adão, Elói, Arthurzinho e Romário, seu sucessor e melhor atacante de todos os tempos.

Na transição do adolescente para adulto, quando se assume o mundo sem que se combine com quem quer que seja, passei a ver o Vasco na classe superior do maestro Geovani, companheiro de Roberto Dinamite nos títulos de 1982, 1987, 1988 e 1992.

É a grande área o seu memorial. É a zona do agrião, seu pedaço a merecer gratidão. Foi um mal cartola? E daí? . Roberto Dinamite faz 64 anos e no sentimento vascaíno de granadeiro bigodudo, ele será sempre o artilheiro, o herói solitário a nos salvar no minuto final, na esperança renascida em gol de desabafo explosivo.

DINAMITE EXEMPLAR

por Joaquim Ferreira dos Santos


Num dia perdido dos anos 1970 eu marquei uma entrevista com o Roberto Dinamite após o treino do Vasco em São Januário. Na hora aprazada, na contramão dos jogadores que iam saindo de campo, eu entrei no gramado para me apresentar ao craque e convocá-lo para o papo.

Roberto tinha acabado de fazer o gol mais bonito de sua carreira. Aquele em que mata a bola no peito, dá um chapéu no zagueiro dentro da área do Botafogo, e, antes que o balão de couro quique no chão, tudo isso num espaço mínimo, cercado de adversários por todos os lados, ele enche o pé. Pergunte ao Juca Kfouri, ao PVC, ao Sérgio Pugliese e eles me confirmarão. É um dos momentos sublimes do futebol.                        

Roberto me cumprimentou afável, mas pediu que eu esperasse mais alguns minutos. O treino-coletivo tinha acabado, todos os outros jogadores haviam se dispensado. Ele ia treinar faltas.

Durante uma hora, já noite escura, os refletores ligados apenas naquele setor de campo, eu vi Roberto Dinamite solitário treinando faltas de todas as posições em torno de uma área. Chutava por baixo, por cima, de trivela, de bico, com maneiras diferenciadas de tocar a bola e de acordo com o lugar em que ele próprio, não havia mais funcionários em campo, colocava a barreira de bonecos. Para cada desenho da dificuldade, uma solução.


Da arquibancada, enquanto assistia àquele duro ensaio de aperfeiçoamento de um ofício, eu me lembrei da história contada por Rubem Braga. Um escritor em crise via, toda tarde, pela janela do escritório, na pedreira em frente, um operário enfrentando uma pedra. O homem dá uma marretada, dez marretadas, no imenso pedregulho aparentemente invencível – e que só irá se desfazer lá pela nonagésima nona marretada. O operário, e também o escritor que observa todo o esforço, sabe que a vitória chegou não pela força da última, mas pelo acúmulo de energia na série de marretadas.          

Eu vi Roberto Dinamite treinando faltas por uma hora, uma centena de chutes ao gol. Acertava a curva, calibrava a força a se colocar nos pés. Aceitava com humildade que para colocar a bola ali onde a coruja dorme é preciso muita marretada e dedicação.

Desde então, em todo computador que abro, coloco a frase como descanso de tela: “Escrever é treinar cobrança de faltas” – e me submeto humilde ao enfrentamento das vírgulas, das concordâncias e da clareza de pensamento. Bolas e palavras são a mesma coisa. Precisam ser dominadas. No meu campo, escrevo, reescrevo, deleto tudo e recomeço pelo avesso, chutando as palavrinhas pelo outro lado da barreira. Nem sempre sai gol, às vezes bate na trave. Não importa. É preciso trabalhar para, na hora do jogo, na hora do texto final, dar a impressão de que é fácil.

Roberto Dinamite me ajudou a escrever melhor.

PARABÉNS, ADÃO!!


Vascaíno confesso, o craque Cláudio Adão comemora 61 anos de idade hoje! Alguém duvida que essa dupla de goleadores cairia bem no lugar de Thalles e Leandrão?

Cláudio Adão no Bar da Eva:https://www.youtube.com/watch?v=ZMZAzI_ZwyU