por Zé Roberto Padilha
Era uma vez um país do futebol. Nele, a maioria das crianças ganhava de presente uma bola de meia. Que virava de plástico na medida em que cresciam, depois no Natal a dente-de-leite, até alcançarem a maciez de uma toda revestida de couro. E a levavam para jogar com amigos em terrenos baldios próximo de casa. Felizes toda vida, cortavam bambus, erguiam traves e demarcavam o alvo da cobiça. Quem conseguisse colocá-la no fundo das redes que as avós costuravam, esse era o segredo, tinha até um goleiro à sua frente para dificultar, dariam um grito de gol. Do orgasmo pleno com que passaram a infância e a adolescência jogando futebol.
Neste país, um menino atrevido, de Três Corações, foi coroado Rei porque alcançou o orgasmo 1.286 vezes. O gol, neste país encantado, era o grande momento, a sublime relação de um menino, um campo e uma bola de futebol.
Mas como todo conto de fadas a estragar e a envenenar a maçã, tinha um garoto mau. Que chutava de canela, sempre esteve na reserva e jamais sentiu o prazer de colocar uma bola no fundo de uma rede. Por vingança, virou cartola. Tão ruim e determinado, alcançou a presidência da FIFA. E não sossegou enquanto não inventou uma camisinha suíça para revestir a bola. E a batizou de VAR.
Antes, para sentir o sublime prazer, bastava um olhar furtivo pro bandeirinha e sair a dar um soco no ar. Agora, com o freio de mão puxado, a espera que sua relação seja revista pelos país, avós e tias monitorando o ato em uma sala fria e calculista, nem o Gabigol goza mais quando marca.
O menino mau, que nunca gozou mas fala inglês arranhado e sabe fazer chocolate suíço, acabou com o prazer de um país de amar e jogar futebol.