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Pelé

QUANDO PELÉ PAROU

por Centro de Memória do Santos


O jogo com a Ponte Preta, no finalzinho do primeiro turno do Campeonato Paulista de 1974, valia mais para o time de Campinas do que para o Santos. Só o campeão do turno se classificaria para a final e o Santos estava atrás da Ponte na classificação. Enfim, era para ser um daqueles jogos de Vila Belmiro quase vazia. Porém, um público superior a 20 mil pessoas foi ao estádio. Mais para ver Pelé, é verdade, do que o Santos.

Naquela noite de quarta-feira, 2 de outubro, o Rei se despediria do futebol. E quem não gostaria de guardar na memória as jogadas de Pelé no campo em que ele marcou 288 gols, entre eles três gols na goleada de 5 a 1 sobre o Bahia, em 27 de dezembro de 1961, que deu ao Alvinegro o seu primeiro título brasileiro?

Na Vila sempre pareceu muito fácil para Pelé marcar gols. Só em um sábado de 1964 ele fez oito na goleada de 11 a 0 sobre o Botafogo de Ribeirão Preto, recorde paulista até hoje.

Mas na noite de despedida, por mais que tentasse, ele não conseguir superar o goleiro Carlos, que anos depois seria o titular da Seleção Brasileira. Pelé chegou a acertar uma boa cabeçada, mas Carlos defendeu. O Menino da Vila Cláudio Adão, aos 44 minutos do primeiro tempo, e Geraldo, contra, aos 10 da segunda etapa marcaram os gols que deram a vitória ao Santos por 2 a 0.

Quando Pelé se ajoelhou no gramado, voltando-se para todos os lados do estádio, agradecendo aos torcedores dali do Urbano Caldeira, e de todo o mundo, os jogadores da Ponte Preta foram os primeiros a cumprimentá-lo. A noite se tornou triste e o futebol brasileiro nunca mais foi o mesmo.


Santos 2 x 0 Ponte Preta
Primeiro turno do Campeonato Paulista de 1974
Vila Belmiro, 2 de outubro de 1974 (quarta-feira)
Público: 20 258 pessoas. Renda: Cr$ 219.371,00
Santos: Cejas, Wilson Campos, Vicente, Bianchi e Zé Carlos; Leo Oliveira e Brecha; Da Silva, Cláudio Adão, Pelé (depois Gilson) e Edu. Técnico; Tim.
Ponte Preta: Carlos, Geraldo, Oscar, Zé Luis e Valter; Serelepe e Serginho; Adilson, Valtinho (Brasinha), Valdomiro e Tuta. Técnico Lilo.
Gols: Claudio Adão aos 44 minutos do primeiro tempo e Geraldo, contra, aos 10 do segundo.
Árbitro: Emídio Marques Mesquita.

HÁ 64 ANOS PELÉ ESTREAVA NO SANTOS

por Gabriel Pierin, do Centro de Memória do Santos


Na tarde de 7 de setembro de 1822, o Príncipe Regente Dom Pedro I, primeiro Imperador do Brasil, declarou o País independente. Nesse mesmo dia, no ano de 1956, o menino Pelé, futuro Rei do Futebol, estreava pelo Santos e marcava o primeiro gol do seu reinado.

O garoto veloz, habilidoso e atrevido tinha chegado de Bauru há um mês e meio, mas, apesar de impressionar nos treinos, ainda não estreara no time principal. Provavelmente o técnico Lula ainda o considerasse franzino, nos seus 16 anos incompletos. Finalmente, no amistoso de 7 de setembro de 1956, uma sexta-feira, contra o Corinthians de Santo André, surgiu a oportunidade tão esperada.

O Santos era o campeão paulista e figurava na ponta da tabela do Torneio de Classificação para a fase final do Campeonato Paulista de 1956. Apesar disso, as últimas exibições deixaram a desejar e a equipe vinha de três resultados ruins: dois empates de 2 a 2, na Vila Belmiro, contra XV de Jaú e Nacional, e derrota para o Flamengo, no Maracanã, por 2 a 1, no confronto entre os campeões paulista e carioca do ano anterior. O amistoso tinha sido marcado em boa hora para melhorar o ânimo do time.

O jogo foi oferecido pela Prefeitura de Santo André e a disputa valeu o alusivo Troféu Independência, por ocasião da data comemorativa. Disputado no Estádio Américo Guazzelli, o Santos, recebido com honras, foi escalado pelo técnico Lula com Manga, Hélvio e Ivan (depois Cássio); Ramiro (Fioti), Urubatão e Zito (Feijó); Alfredinho (Dorval), Álvaro (Raimundinho), Del Vecchio (Pelé), Jair Rosa Pinto e Tite.

O Corinthians local jogou com Antoninho (depois Zaluar), Bugre e Chicão (Itamar); Mendes, Zico e Chanca; Vilmar, Cica, Teleco (Baiano), Rubens e Dore. Arbitrou a partida Emilio Ramos.

O Santos dominou toda a partida, mas só marcou seu primeiro gol aos 33 minutos, por meio do ponta-direita Alfredinho. Dois minutos depois, Del Vecchio ampliou para 2 a 0. Antes de terminar o primeiro tempo, Álvaro, aos 36, e Alfredinho, aos 44 minutos elevaram o marcador para 4 a 0.

Del Vecchio voltou a marcar aos 16 minutos da segunda etapa e foi então que Lula resolveu descansar o artilheiro do Campeonato Paulista de 1955 e fazer entrar o garoto que os mais velhos apelidaram “Gasolina”, pela rapidez com que corria atrás da bola nos jogos entre titulares e reservas.

O estreante se colocava sempre como uma boa opção para o passe. E o gol veio aos 37 minutos, quando o ponta-esquerda Tite alcançou a linha de fundo e cruzou para trás. O garoto dominou e bateu para fazer o primeiro dos seus 1282 gols na carreira.

O goleiro Zaluar, que também entrara no segundo tempo, se orgulharia de ter sido o primeiro a levar um gol do Rei do Futebol. Seu cartão de visitas passaria a ter a inscrição: Zaluar – Gol Rei Pelé – 001.

Aos 39 minutos, Vilmar marcou o único gol dos locais e, aos 44, Jair Rosa Pinto definiu o resultado de 7 a 1 para o Santos, iniciando uma série de 13 jogos invictos da equipe que se tornaria bicampeã estadual ao vencer o jogo-desempate com o São Paulo por 4 a 2, em 3 de janeiro de 1957.

O jogo em Santo André marcou seus personagens e histórias. A cidade do apóstolo recebeu o time de Todos os Santos. Da nação independente ao país do futebol, do príncipe regente ao Rei, uma identidade e um destino.

Um Rei ainda anônimo

Pelé ainda era pouco mais de um desconhecido quando estreou no Santos, há 64 anos. Prova disso é que na escalação do time os jornais grafaram seu nome como “Telé”. O Estado de São Paulo fez o seguinte registro sobre o jogo:

Santo André, 7 (ASP) – Surgiu, hoje, nesta cidade, a esperada reabilitação do Santos F.C., que, apesar de figurar na ponta da tabela do Torneio de Classificação da F.P.F., vinha, ultimamente, apresentando fracas exibições. Coube ao Corinthians, local, proporcionar essa reabilitação, uma vez que foi batido por 7 a 1, no jogo que ambos travaram hoje à tarde. O resultado por si só diz o que foi o espetáculo.

A fama não veio imediatamente. Reserva de um meia-esquerda excepcional, como Vasconcelos, Pelé certamente teria sido emprestado para outros clubes, a fim de ganhar experiência, caso uma fratura de fêmur, em dezembro, não afastasse Vasconcelos dos gramados por um longo tempo. Mesmo assim, o futuro Rei do Futebol só se firmaria no ataque santista no início de 1957, durante uma excursão ao Sul do País.

HIPNOSE

por Rubens Lemos 


A imagem que hipnotiza é a redundante perfeição de Pelé, majestade e preparo de guerreiro ao ataque. Pintado, o quadro jamais sairia tão fiel. A multidão de súditos (plateia dobrando os cotovelos pela arquibancada), espera a arrancada de uma pantera humana rumo ao gol adversário.

Pelé estava pleno aos 25 anos. Bicampeão mundial pelo Brasil. Bicampeão pelo Santos. Era 1966, Copa do Mundo que parece ferida sem cicatriz na alma brasileira (eliminação na primeira fase), o Rei sublime na fixação do corpo à grama. Braços equilibrados como asas a permitindo o voar baixo, pé de apoio pronto ao chute ou ao passe, canhota agasalhando a bola como que a protegê-la de inimigos poderosos. 

A fotografia de Pelé mostra a face do homem transfigurando-se em fera na tarde inglesa da estreia da seleção contra a Bulgária, vitória de 2×0, dois gols de falta, um Dele e outro do que havia sido Mané Garrincha, àquela altura espectro do passado recente na cronologia, longe da figura derrotada pelo vício e pela crueldade de quem lhe entupiu de  remédios para ele jogar e encher os cofres do Botafogo. 

O Goddison Park, em Liverpool, recebeu, exatos, 47.308 pagantes. Modesta assistência para cortejar o Rei da Bola e a sua compleição irretocável, seu pique de caçador querendo a rede balançando de amor e fúria. Em Liverpool, terra dos Beatles, Pelé cantou no primeiro jogo. 

Tomou uma pancada do meio-campista Jechev, que lhe custaria a ausência no jogo seguinte contra a Hungria (derrota de 1×3) e uma participação decorativa de tanto apanhar contra Portugal de Eusébio, que os patrícios petulantes ousaram compará-lo ao menino de Três Corações (MG). Outro revés de 3×1.  

“É de carne e osso! É um fantasma negro! É preciso tocá-lo para saber se existe mesmo! É a perfeição da raça humana!”. Na arquibancada bem pertinho do campo, homens, mulheres, meninos e meninas tentavam decifrar o espetacular em festival de exclamações. A energia de Pelé, só conhece e testemunha quem por ele passou perto.  

O drible em curva invadindo a área, a cabeçada acima da altitude boliviana, o petardo quando se esperava o toque sutil, a classe quando o goleiro aguardava, resignado, a bomba atômica em chuteiras. Pelé foi o maior e a fotografia comprova. Sim, nunca, desde as Caravelas, alguém foi tão imponente.  

A seriedade valia contra a Bulgária ou o Votaporunguense do interior paulista. Pelé e Pagão, Pelé e Coutinho, Pelé e Toninho, duplas em que o segundo sempre será coadjuvante radioso. Conformados e fascinados. Os três estão no céu.

Certa vez, contra o Bangu, o zagueiro Mário Tito aplicou um beliscão no braço da sumidade. Pelé sorriu como se tivesse recebido um ramalhete de flores. Após levar 6×1 no Maracanã, Mário Tito pôs-se a berrar: “É doutro mundo, esse Crioulo não é da terra”. Certíssimo. Pelé é extraterreno, de carne é Edson Arantes, que lhe empresta o corpo.

Pelé anormal, Pelé profissional, Pelé colossal, Pelé imarcável, Pelé insaciável pelo gol. A aparente cena do jamais-crime aponta para um Pelé sozinho, dominando a gorducha na meia-esquerda até correr em linha reta, costurando zagueiros sem piedade. 

É a premonição da sequência misteriosa. Das  profundezas de Pelé, imitado, copiado, invejado, igual a ninguém. Superior a si mesmo na arquitetura de jogadas, uma mais bela que a outra. A fotografia expõe traços de estátua, de desenho delicado em contradição ao furor a saltar do papel aos olhos assustados de maravilhosa sensação.  

Pelé eterno, Pelé momento. Pelé sentimento. Nos livros, filmes, tratados, dossiês, enciclopédias, coletâneas, saltos, cabeçadas, cobranças de falta e pênalti, fintas seriais, Pelé se multiplica na fantasia de quem não o assistiu ao vivo.  

Pelé se fecha no próprio enigma. Pelé se revela mito no instante infinito da fotografia de Liverpool. E que o mundo parasse ali, na performance do dono do futebol. Michelângelo cuidaria da escultura. Os Beatles, da canção: The Beautiful King.

PELÉ NO VELHO TESTAMENTO

por André Felipe de Lima


Há fatos que surpreendem pelo simples, vá lá, fato de serem quase inverossímeis, e, por incrível que possa parecer isso, acontece muito com personagens memoráveis da história. Pelé, obviamente, está entre elas. Logo após marcar seu milésimo gol, o Rei viu seu feito ganhar o planeta. No mundo inteiro não se falava em outra coisa senão do gol de número mil do Pelé. Das histórias que ouvi ou li sobre Pelé naquela época em que bateu o vascaíno Andrada no Maracanã, a mais impressionante pesquei em uma edição do Jornal do Brasil e partiu de um rabino chamado Herz Torenheim, que se encantou com o apelo que o rei fez ao mundo para que cuidassem das crianças desamparadas. O religioso sugeriu, inclusive, que se criasse um fundo internacional nesse sentido e tendo Pelé como sigla e nome. Torenheim devia gostar muito de futebol e, claro, do Rei. A ponto de simplesmente descobrir (preparados?) Pelé citado no Velho Testamento. “O milésimo gol do Pelé repercutiu mais que o voo dos cosmonautas à Lua”, dizia o empolgado rabino, que revelou à humanidade o fato: Pelé, escrito em hebraico de trás para frente, significa “apelo” e o seu anagrama é “mil”. Vejam: o Pelé chegou ao seu milésimo gol e, em seguida, fez um apelo que ecoou intensamente no mundo inteiro a ponto de o rabino pescar essa memorável história no Velho Testamento. Pelé não é (sempre será) apenas o maior e melhor jogador de futebol em todos os tempos. Pelé é transcendental. Pelé em sua tradução na cosmogênese que explica o planeta bola só pode ser mesmo um deus mágico. E assim falou Torenheim.

O DIA EM QUE PELÉ MANDOU UM JUIZ PARA O CHUVEIRO

por André Felipe de Lima


Não. Definitivamente, não. Nunca um jogador foi capaz de expulsar um juiz de um campo de futebol. A situação seria, no mínimo, completa e totalmente inverossímil. Surreal. Inimaginável. Lembro que em um jogo do Botafogo, em novembro de 2008, contra não sei quem o zagueiro André Luiz, um camarada alto, forte e sempre com cara de poucos amigos, tomou o cartão vermelho da mão do pobre do árbitro e o ergueu. “Fora!”, deve o beque ter gritado de supetão. Mas ficou nisso. André Luiz não tinha nome nem cacife para expulsar um juiz e acabou ele mesmo indo para o chuveiro após baixar a bola. Mas será que houve um dia em que algum maluco como André Luiz tentou (e conseguiu) botar para fora um árbitro? Sim, e somente um camarada com suas devidas idiossincrasias e capaz de mandar mais que a própria bola de futebol no contexto de uma peleja, seria capaz de chegar a esse extremo, e isso aconteceu no dia 17 de julho de 1968, dois anos antes do “tri” no México. O juiz em questão chamava-se Guillermo “el chato” Velásquez, que já não está mais aqui para contar a história; quanto ao seu “algoz” tem nome, sobrenome e um apelido, o mais famoso do mundo, por sinal: Pelé.


A história, uma das mais inusitadas na história do futebol, aconteceu durante um jogo do Santos contra a seleção olímpica da Colômbia. Um simples e (em tese) inofensivo amistoso, cujas cotas eram gordas para o clube paulista pelo simples fato de Pelé estar no gramado. Mas o rei teria aplicado um “chega-pra-lá” em uma dividida mais ríspida com o zagueiro Luís Eduardo Soto. Houve confusão entre os jogadores do Santos e os colombianos. Dirigindo-se ao juiz, Pelé teria proferido um sonoro “Vá se f., seu filho de uma p.”. Velásquez ouviu e viu muito bem o que gritara Pelé. A expulsão (na época ainda não havia cartão amarelo ou vermelho) era o remédio para a situação. Todo mundo se empurrando e ao juiz (coitado), que emenda: “Pelé, ‘con permiso’ fora!”. O Edson sempre negou ter participado da confusão ou mesmo xingado Velásquez, mas o Pelé nunca negou isso, e saiu de campo. Pelé caminhando e a torcida gritando: “¡Vuelve, Pelé, vuelve!”. Os santistas em cima do pobre do árbitro. Empurra dali, empurra daqui; torcedores ensandecidos, que só foram ao estádio por causa do Pelé. A tragédia era iminente. Alguém tinha de fazer algo imediatamente ou nem mesmo Pelé sairia vivo daquele estádio onde o caos se instaurara. Um cara soprou no ouvido do bandeirinha Omar Delgado, e deve ter dito mais ou menos assim: “Ve allí y saca al árbitro loco del césped”. Delgado acatou a ordem e mandou o recado para Velásquez, que, obviamente pasmo, ouviu a decisão contra ele. Velásquez estava expulso. Pelé, que sequer saiu de campo, permaneceu. No fim das contas, o jogo continuou, e deu Santos. Quatro a dois, com um gol dele, Pelé. Velásquez e Pelé estiveram dois anos depois, no México. Mas não se esbarraram. Nunca mais um cruzaria o caminho do outro. Para Pelé, a glória. Para o pobre do “El chato” Velásquez, bem… sobraram um olho roxo e o chuveiro do vestiário.

CONFIRA O VIDEO DAQUELE JOGO QUE ENTROU PARA A HISTÓRIA DO FUTEBOL