Por Serginho5Bocas
Se no futebol existisse um órgão nos moldes do INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial), provavelmente o Brasil seria o líder de patentes. Até que me provem o contrário, foi por essas bandas que se viu pela primeira vez a maioria das jogadas e gols mais espetaculares que o planeta já se encantou.
Para começar a conversa vou falar de uma jogada que é mal vista pelos torcedores, mais teve seu maior executor aqui no Brasil, o “chute de bico”, especialidade do jogador Feitiço, que sabia tanto desta técnica que até o “sem pulo” era dado com esta parte do pé sem nenhum pudor, segundo o mesmo, para pegar mais força e precisão. Não dá para afirmar que ele inventou as duas jogadas, mais ninguém fez mais gols deste tipo do que Feitiço, atacante do Santos.
A famosa “bicicleta”, que alguns dizem ter sido inventada pelo desconhecido jogador brasileiro Petrolino de Brito, foi imortalizada e ganhou fama de verdade nos pés do homem borracha, o Diamante Negro ou Leônidas da Silva, que apresentou a jogada em 1932 ainda pelo Bonsucesso. Mas foi na Copa de 1938 que ele deixou todos espantados ao executar a jogada e ter feito um gol anulado equivocadamente.
Didi, o mestre, o mister futebol, melhor jogador da Copa de 1958, foi outro que se notabilizou pela classe e categoria e é claro pela sua invenção, a “folha seca”. Didi cobrava a falta da entrada da área com um chute em que a bola subia por cima da barreira e caia rapidamente cheia de efeito enganando os goleiros.
Rivelino, o “Reizinho do Parque”, foi o rei do “elástico”, aquela jogada em que ele levava a bola para um lado com a parte externa do pé e quando o adversário se movimentava para o lado indicado, ele trazia a bola de volta com a parte interna, enganando o marcador. Ele mesmo confessa não ter inventado a jogada, mas sim Sergio Echigo, um companheiro de clube. Mas foi Riva, certamente, quem apresentou o lindo drible para o mundo do futebol.
O rei Pelé não ficou famoso por ter inventado uma jogada especificamente, mas sim pelo conjunto da obra, ou seja, porque aperfeiçoou várias delas. A bicicleta do rei era a perfeição, sua cabeçada era primorosa e precisa, desde a subida, depois a testada seca de olho aberto e quase sempre em direção ao chão, dificultando a vida dos goleiros. Entretanto, foi na Copa de 70 que Pelé se superou, exibindo jogadas inéditas, tiradas da cartola, que tiravam o fôlego de quem o via em ação.
Seu quase gol num chute do meio de campo contra a Tchecoslováquia foi fantástico, seu drible sem bola no goleiro do Uruguai foi fenomenal, espetacular e ainda contra o mesmo Uruguai, Mazurcwieviski bate o tiro de meta e sem deixar a bola bater no chão, Pelé devolve de voleio, obrigando o goleiro a uma defesa inesperada. Sem falar da cabeçada de manual que obrigou a Banks fazer a maior defesa da Copa de 1970. Até quando Pelé não fazia o gol era belo, o criador e suas criaturas podem ser vistas no Youtube.
Tivemos ainda a felicidade de ver o surgimento de uma das mais belas jogadas conjuntas do futebol, a “tabelinha”, que teve em Pelé e Coutinho sua mais famosa combinação de todos os tempos. Os dois enfileiravam adversários com suas tabelas em alta velocidade e eram tão parecidos fisicamente e em termos técnicos que confundiam qualquer defesa. Falcão e Escurinho também fizeram uma “tabelinha” histórica na semifinal do brasileiro de 1976 contra o Atlético Mineiro, coisa de almanaque.
Sócrates consagrou a jogada de “calcanhar”, até gol ele marcou desta forma, era uma saída inteligente para as situações mais difíceis. Zico, seu grande parceiro, já no final da carreira fez um gol “escorpião”, uma “chilena” com o corpo paralelo ao solo, pelo Kashima Antles. Lance que seria quase impossível contar para um cego, como bem definiu o uruguaio Eduardo Galeano.
Bater na bola de “três dedos”, de “rosca” ou mesmo de “trivela”, provavelmente foi Nelinho que “patenteou” a jogada de mestre. Imprimia uma qualidade na batida, que misturava força e efeito sem precedentes, enlouquecendo os goleiros pelo mundo afora. Neste quesito, no entanto, tivemos ainda dois vice-reis: Eder e Marcelinho Carioca não deixaram a desejar.
E quem é que não lembra da “lambreta” que Kaneco, o ponta do Santos, imortalizou e é copiada até hoje como um dos mais sensacionais dribles do futebol, que o diga o cracaço Falcão do futebol de salão.
No exterior, para não dizer que não falei das flores, vale citar a “cavadinha” de Panenka da Tchecoslováquia que valeu título na final da EuroCopa de seleções de 1976, bem copiada por Djalminha e Loco Abreu mais recentemente. Destaca-se também a a “carretilha” ou em francês “roulete” de Zidane e o antológico gol “olímpico” feito de uma cobrança de córner direta, que o craque sérvio Petkovic adorava realizar. Dizem que um jogador argentino chamado Cesáreo Onzari fez o gol na celeste uruguaia logo após eles terem conquistado o ouro nas Olimpíadas, daí a fim de ironizar os rivais uruguaios, surgiu o nome de batismo da jogada.
Foram muitas as jogadas inventadas sem que pudéssemos conhecer o autor de cada proeza, belas artes como o famoso “drible da vaca” que pontas e laterais adoravam utilizar pelos flancos dos campinhos de pelada e o que falar então da plasticidade de um belo “lençol” ou da suavidade de uma “caneta”?
Muitas foram as jogadas maravilhosas que fizeram o futebol brasileiro se distinguir no mundo com sua arte peculiar, que encantou as mais exigentes plateias e por este motivo deixou um legado aos fãs do futebol arte em todo o mundo. Mas por incrível que pareça, tem muito brasileiro tentando desvirtuar nossas raízes, mas estou certo que eu e muita gente resiste bravamente, defendendo esta escola maravilhosa e fundamental para a pratica do bom futebol.
Daí o motivo desta singela homenagem a este esporte que sou apaixonado e não canso de admirar, mesmo que em outras praças…