por Zé Roberto Padilha
Para se ter um novo fenômeno no turfe, atrair o público de volta e o Domingão do Faustão ser interrompido para a transmissão do GP Brasil, uma égua campeã como Queen Desejada, vencedora em 2001, não poderia se reproduzir com um pangaré, sob pena de deixá-la em último, como deixou, na reta oposta aos seus feitos, toda a privilegiada genética lhe concedida. Com todo respeito aos sedutores das baias do Hipódromo da Gávea, entre eles o marrento do Much Better, ela não poderia cruzar com qualquer um. Esportes, como o hipismo, vivem de ídolos. Mais uma temporada chegando em décimo lugar eFelipe Massa enterra de vez o automobilismo no país.
Já fecharam o autódromo do Rio, o Kart sumiu e a F3 ninguém mais ouviu falar. Cielo já fechou o ciclo da natação, Maurren Maggi o salto em distância e a falta de um novo Guga desestimulou a prática do tênis no Brasil. Sem ídolos não há como popularizar qualquer esporte.
Fiquei pensando nisto após assistir Pelé Eterno, o melhor filme de alienígenas que assisti em toda a minha vida. Sempre fui apaixonado por eles, desde “2001, Uma Odisseia no Espaço”. Até nosso glorioso Nacional Kid tinha espaço em nossa galeria. Pelé foi mais ET que aquela criaturinha simpática de Steven Spielberg porque seus poderes extraterrestres eram realizados ao vivo. Não com truques e efeitos especiais. Ele surgiu nos campos de futebol na segunda metade do século 20 e era assustador.
Com uma força, impulsão, um preparo físico sem precedentes, deixava adversários humanos para trás. Pelo alto e pelo chão. Sua meteórica aparição nos gramados do Brasil e do mundo foi capaz de colocar a bola 1.282 vezes dentro gol e se tornar, aos 17 anos, o mais jovem artilheiro do Campeonato Paulista, Brasileiro, campeão de uma Copa do Mundo e o único jogador a ser tricampeão mundial.
Mas na hora de cruzar, perpetuar a espécie, Pelé não escolheu uma do seu planeta. Uma daquelas que atravessou os mares, não os céus, em uma nau, não em uma nave, com uma genética de fibras negras e fortes como as suas. Na hora da reprodução, nosso ET de Três Corações cruzou com a Rosimeri Cholbi, a Assíria e a Márcia Cibele. Destas relações nasceram terráqueos comuns, como o Edinho, que acabou no gol. Em vez de encantar e balançar a rede como o pai, viveu a saltar procurando causar desencantos.
E foi assim com todos os ETs da nossa história. Didi casou com a Guiomar, o único filho de Garrincha foi com uma sueca, e não joga nada, Cláudio Adão casou com a Paula e os raros genes do outro mundo que em nossos gramados habitaram saíram correndo atrás da Xuxa.
E se não tem mais a Queen Desejada na raia, e o Pelé no gramado, ligo a televisão e assisto o Diego, o Luis Lima, o Cícero e o Camilo com a camisa 10 no Brasileirão. O Renato Augusto com a 10 da seleção. Todos brancos. Por aqui, em nossas telinhas, não ficou um só filhote de outro planeta a encantar gerações. Na busca de um embranquecimento da sua raça, nosso ETs acabaram por escurecer as nossas tardes de domingo.
PS: inacreditável, mas após o texto descobri quem ganhou a prova principal do Hipódromo da Gávea: Domingos da Guia, montado por Carlos Lavor. Me desculpem, mas não há como indagar: quem cruzou com quem?