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Pelé

SANTIFICADO

por Rubens Lemos


Felizes eram os meninos santistas, hoje vovôs de suspensório, cheios de netos para ouvir milagres verdadeiros. Como devem ter sido tranquilos os sonos de véspera dos garotos praianos, dos sábados para os domingos de clássicos por longos anos, especialmente entre 1957 e 1974, na era de um rapaz que primeiro chamaram de Bilé, depois Pelé.

O Santos de Pelé é a minha crença eterna de que o futebol e a magia nasceram enamorados. Nada quanto o Santos representou o Brasil de alto astral, os bons tempos de Juscelino na presidência, Bossa Nova se revelando, samba de morro encantando a nobreza, tropicalismo aflorando. Até à ditadura o Santos maravilhoso resistiu.

Aquele Santos que me faz pedir para ser mais velho de papel passado, mais antigo do que a minha alma perdida em algum jogo de ternura do Canal 100, cinco minutos mais importantes para mim do que qualquer filme já assistido em tela dos extintos cinemas Rio Grande, Rex e Nordeste. na Natal antiga.

O Canal 100 transmitia em big close as jogadas dos grandes catedráticos do gramado e arrepiava pela trilha musical Na Cadência do Samba e a emoção do grito aberto do povo e da expressão em delírio ou pranto do torcedor nas sociais, arquibancadas e gerais, tempo de 100, 150 mil pessoas nos principais duelos.

Meu primeiro contato com o Santos. Canal 100 reprisa, em comemoração aos 15 anos do primeiro título Intercontinental (hoje Mundial de Clubes), o filme sobre o massacre de Lisboa. Em pleno Estádio da Luz.

Energia que me encantou, de coração vascaíno firme, mas admirado com as jogadas felinas de um ataque de panteras, formado por cinco, todos em direção ao gol. Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe, apenas um branco, Pepe, um canhão na ponta-esquerda.


Descobri em cinco minutos que era verdade: nunca, enquanto o mundo fosse habitado por seres em carne e osso, pecadores, sensíveis às tentações mundanas e veniais, mortais e sepultáveis, houve ou haveria uma linha atacante igual aquela tropa de cinco malabaristas.

O Benfica de Eusébio, a Pantera Negra, excelente jogador, um dos tantos que sonharam ser melhores que a Sua Majestade de Três Corações, filho de Dondinho e Dona Celeste, foi humilhado numa das maiores exibições de uma equipe desde que iniciada a contagem do tempo após a morte de Jesus Cristo.


Pelé driblando, Pelé bailando, Pelé enfiando duas vezes a bola entre as canetas do marcador, Pelé tabelando na canela dos portugueses, Pelé fazendo gol, oferecendo gol, Coutinho fuzilando o goleiro, Dorval, meio arqueado de ombro, correndo em ziguezague e servindo à maior parceria entre dois homens ofensivos de que se foi noticiada desde a carta de Pero Vaz de Caminha.

Vou alargando parágrafos e me revendo na cadeira do cinema lotado pois era comédia dos Trapalhões em seguida ao Canal 100. O Santos enfiou 5×2 no Benfica e, aos 7 anos de idade em 1977, jurava que futebol era o que estava acostumado a ver no estádio e pela TV. Futebol era. Sobrenatural sagrado era o Santos.

O Santos foi o único time brasileiro que atravessou o tempo com um condutor que não lhe fez perder a graça. O Santos embrião da máquina do final dos anos 1950, com Pelé e Pagão, o grande ídolo de Chico Buarque de Holanda.

O Santos da década de 1960, com Pelé e Coutinho, depois Pelé e Toninho, o Santos de até o título dividido (injustamente) com a Portuguesa de Desportos em 1973, nos pênaltis mal contados pelo árbitro Armando Marques. Ali era o Santos de Pelé e Edu.

Quem nunca foi Santos, um dia gostou de ter sido. No meu caso, no filme Pelé Eterno, mais que uma sentença histórica e perfeita sobre a obviedade de um jogador inigualável, o álbum em movimento de um time espetacular.


O Vasco sofreu muito. Problema não. O Corinthians apanhou muito mais, com requintes de sadismo. O Flamengo chegou a tomar de 8×1 em pleno Maracanã. Em 1958, num sinal extraterreno, Pelé fez 58 gols no Campeonato Paulista.

O Santos cedeu jogadores simbólicos para o tricampeonato mundial do Brasil. Pelé 1958, Pelé 1962 (show interrompido), Pelé 1970 (ingresso à mitologia). Zito, o termômetro discreto e eficiente do bicampeonato.


Mauro, capitão na classe e no grito. Mengálvio, em pleno auge, o reserva conformado de Didi. Carlos Alberto e Clodoaldo, emblemáticos na final contra a Itália em 1970, até os sombreros mexicanos pedindo autógrafos no Estádio Azteca.

Aquele Santos está acima do racional, do lógico. Suas camisas brancas assombraram e maravilharam o mundo, pararam guerras, expulsaram juízes. O Santos, tão singular, se alguém pesquisar, vem do Primeiro Testamento.

O DIA EM QUE UM JORNAL FRANCÊS DECRETOU: PELÉ É O REI DOS REIS

por André Felipe de Lima


Aquela manhã do dia 12 de julho de 1980 seria definitiva para o esporte mundial. Nas bancas parisienses de jornais e revistas a manchete do tradicional periódico L’Equipe encerrava qualquer discussão sobre quem era o maior atleta do século XX. Em sete páginas, o jornal publicara o resultado da ampla pesquisa: deu o nosso Pelé na cabeça. O “campeão do século”, como os jornalistas franceses grifaram, em gritante vermelho, no jornal.

Pelé, é verdade, não teve vida fácil na eleição. Recebeu 178 votos. Apenas nove a mais que o extraordinário Jesse Owens, o mesmo que humilhou os nazistas na Olimpíada de 1936, em Berlim. Outro inquestionável gigante na história do esporte. Mas Pelé era (e sempre será!) imbatível.

O ídolo só receberia o troféu no ano seguinte, no dia 15 de maio, nos instantes que antecederam ao jogo amistoso entre Brasil e França, no estádio Parc des Princes, em Paris, que terminaria com a vitória de 3 a 1 do escrete brasileiro.

Foi um dia inesquecível. Eu, menino, diante da TV, fiquei encantado com toda a reverência ao Pelé naquela tarde. “Obrigado por tudo, eu adoro vocês”, agradeceu o gênio. Nós, humildes mortais, é que devemos todas as honras ao maior dentre os maiores. Ao Rei dos Reis do esporte. Ao Edson que é Pelé. Ao Pelé que é Edson… ao atleta do século XX, XXI, XXIII… ao Pelé eterno.

 

DA JANELA DO HOTEL NOVO MUNDO, PELÉ SE DELICIAVA COM PELADAS NO ATERRO

por André Felipe de Lima


(Foto: Reprodução)

Em outubro de 1969, o Brasil vivia a ansiedade por estar a meses do começo da Copa do Mundo, para a qual a seleção brasileira, ainda sob o comando do João Saldanha, preparava-se exaustivamente. Paralelamente a essa expectativa pelo “tri”, o carioca experimentava a deliciosa mobilização em torno do campeonato de pelada promovido pelo Jornal dos Sports. O Rio era uma festa. Ou melhor, o Aterro do Flamengo. Pelé, uma das “feras” do João “Sem medo”, também mostrava empolgação com o torneio de peladeiros e chegou a confessar ao repórter do saudoso JS a paixão pela pelada.

No dia 12 de julho, aniversário da eleição de Pelé como “Atleta do Século”, publicamos uma recordação bacana do maior camisa 10 de todos os tempos. Uma lembrança da época em que jogou peladas em Bauru e de quando se deliciava com as improvisadas peladas do Aterro bem antes de o JS institucionalizá-las. Com a palavra, o Rei:

“Quando o Santos se hospedou no Hotel Novo Mundo (no Flamengo) eu tive oportunidade de olhar da janela do apartamento algumas peladas jogadas no Parque do Flamengo. Mas eram peladas improvisadas na hora, alguns sem camisas, outros de camisetas, uns de camisas de clubes. Alguns usavam calções, mas outros arregaçavam as calças e entravam de qualquer maneira. Havia até quem entrasse de sapato e tudo. A fome de bola falava alto. A pelada é um negócio muito bacana. Às vezes me dá saudade daquele tempo que jogava nas ruas de Bauru, depois de tirar os costumeiros par ou ímpar para escolher o time (…) Não me lembro bem, mas tinha sete ou oito anos quando jogava no Sete de Setembro, um time infantil da rua Sete de Setembro, esquina da rua Rubens Arruda, em Bauru. Nas peladas, jogavam até 15 ou 16 de cada lado. Joguei também no Radium, atrás do campo do Noroeste, e só não disputei campeonato por este clube porque não tinha chuteira. Só mais tarde é que ganhei uma, com um bico de ferro na frente (…) Lá em Santos tem também um campeonato de pelada, na areia, que às vezes a TV transmite. Alguns jogos são muito bons.”

 

HÁ 60 ANOS, A PRIMEIRA VEZ DO PELÉ

por André Felipe de Lima


Há 60 anos, exatamente no dia 7 de julho de 1957, Pelé vestia a camisa da seleção brasileira pela primeira vez. Isso aconteceu em um jogo contra a Argentina, no Maracanã, valendo a primeira partida da disputa da Copa Roca entre brasileiros e argentinos. Perdemos a peleja pelo placar de 2 a 1, mas Pelé, que entrou no lugar de Del Vecchio, logo na estreia, deixou a sua marca de goleador implacável e assinalou o único tento canarinho.

Pelé foi tão bem no jogo que acabou titular na partida seguinte, realizada no Pacaembu três dias depois da estreia. Com um gol do nosso eterno camisa 10 e do atacante Mazzola vencemos a Argentina por 2 a 0 e levamos a taça.

Infelizmente, não conseguimos o registro de áudio da estreia do Pelé, mas o do jogo do dia 10 de julho de 1957, o do título, sim, nas vozes de Edson Leite, como narrador, e Fiori Gigliotti, como repórter.

FICHA TÉCNICA DOS DOIS JOGOS DA COPA ROCA DE 57

07/07/1957 (16h)
BRASIL 1 x 2 ARGENTINA
Local: Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro (Brasil). Público: 80.000 espectadores.
Árbitro: Erwin Hieger (Áustria). Assistentes: Guálter Gama de Castro (Brasil), José Monteiro (Brasil).
Gols: Labruna, aos 30; Pelé, aos 76; Juárez, aos 77.
BRASIL: Castilho, Paulinho de Almeida, Bellini, Jadir e Oreco; Zito (Urubatão, aos 70) e Luisinho; Maurinho, Mazzola (Moacir, aos 46), Del Vecchio (Pelé, aos 46) e Tite. Treinador: Sylvio Pirillo.
ARGENTINA: Carrizo, Pizarro e Vairo; Gianserra, Rossi (Guidi, aos 77) e Urriolabeitia; Oreste Corbatta, Herrera (Antonio, aos 70), Juárez (Blanco, aos 41), Labruna e Moyano. Treinador: Guillermo Stábile.

10/07/1957 (20h45)
BRASIL 2 x 0 ARGENTINA
Local: Estádio do Pacaembu, em São Paulo (Brasil). Público: 38.441 espectadores.
Árbitro: John Husband (Inglaterra). Assistentes: Antonio Musitano (Brasil), Catão Montes Júnior (Brasil).
Gols: Pelé, aos 20; Mazzola, aos 57.
BRASIL: Gilmar, Djalma Santos, Bellini, Jadir e Oreco; Zito e Luisinho; Maurinho, Mazzola (Del Vecchio, aos 61), Pelé e Pepe. Treinador: Sylvio Pirillo.
ARGENTINA: Carrizo (Musimessi, aos 69), Biaggioli e Vairo; Gianserra, Rossi (Guidi, aos 87) e Urriolabeitia; Oreste Corbatta, Juárez, Herrera (Antonio, aos 46), Labruna e Sesti. Treinador: Guillermo Stábile.

NAQUELE TEMPO ERA ASSIM…

por Victor Kingma


Victor Kingma

1969 – O homem na Lua e o milésimo gol de Pelé

Certos acontecimentos marcantes, ocorridos em determinada época, são constantemente relembrados devido à sua importância histórica. E quando o assunto é futebol, então, os boleiros nunca se esquecem. Mas nem sempre as pessoas se lembram de outros fatos importantes acontecidos na mesma ocasião.

Esse texto volta ao tempo e relembra alguns fatos relevantes que aconteceram em 1969, um ano marcado por acontecimentos extraordinários. É uma oportunidade para os contemporâneos recordarem e os mais jovens tomarem conhecimento sobre como era a vida, os costumes e o que de importante acontecia, há quase cinco décadas.

Na música, três grandes sucessos estouravam nas paradas de sucesso: “As Curvas da Estrada de Santos”, de Roberto Carlos, “Aquele Abraço”, de Gilberto Gil e “País Tropical”, de Jorge Ben, na interpretação marcante de Wilson Simonal. 

No cenário da música internacional o destaque foi a realização, em agosto, do Festival de Woodstock, para muitos o maior evento de rock and roll de todos os tempos. Realizado em uma fazenda em Bethel, New York, o evento reuniu quase 400 mil pessoas e contou com a presença de astros consagrados como Janis Joplin, Santana e Jimi Hendrix.

O grande sucesso na televisão brasileira era a novela Beto Rockfeller, na TV Tupi. Escrita por Bráulio Pedroso e estrelada pelo ator Luiz Gustavo, a trama representou uma revolução na teledramaturgia, pois pela primeira vez em uma novela foram abordadas gírias e situações do cotidiano, em substituição aos dramalhões tão comuns na época.  

Na política vivíamos os anos de chumbo e um acontecimento marcante, que ganhou manchete no mundo todo, foi o seqüestro do embaixador americano Charles Elbrick, em 04 de setembro, numa ação idealizada pelo Movimento Revolucionário 8 de Outubro – MR8.  O embaixador foi libertado dias depois, trocado por 15 presos políticos, entre os quais Wladimir Palmeira e o ex-ministro José Dirceu.  


O fato de de maior repercussão mundial, no ano de 1969, aconteceu no dia 20 de julho quando os astronautas americanos Edwin Aldrin, Michel Collins e Neil Armstrong pousaram na lua. Armstrong, o comandante da nave espacial Apollo 11, entrou para a história como o primeiro terrestre a pisar o solo lunar.

E no futebol?

No futebol, todas as atenções estavam voltadas para a partida disputada entre Santos e Vasco, pelo torneio Roberto Gomes Pedrosa, em 19 de novembro daquele ano. Pela primeira vez na história um jogador estava prestes a marcar mil gols em sua carreira. E esse feito extraordinário foi reservado pelos deuses do futebol exatamente para o maior de todos os tempos, que futuramente seria escolhido o atleta do século.

65.157 pagantes estavam no Maracanã naquela noite de quarta feira e milhões de telespectadores de todo o Brasil acompanhavam em frente aos aparelhos de TV, assistindo a transmissão em preto e branco. Aliás, as cores das camisas dos times envolvidos.

O jogo, empatado em 1 x 1, caminhava para o final quando, aos 33 minutos do segundo tempo, o zagueiro Fernando, do Vasco, comete pênalti. Pelé pega a bola e a coloca na marca. Atrás do gol uma multidão de repórteres e fotógrafos aguardam a conclusão do lance para eternizarem o momento.

Embaixo das traves o goleiro argentino Andrada, que estava tendo uma exibição de gala, aguardava, imóvel e confiante, a cobrança. Ele havia prometido a si próprio que não entraria para a história como o goleiro que tinha levado o milésimo gol.

Pelé, o maior artilheiro que o futebol já viu, corre vagarosamente e toca a bola no canto esquerdo do goleiro que voa como um felino, chega a tocar na pelota mas não evita o gol. O relógio marca 23h17 daquela noite histórica.

Enquanto Andrada, desolado, socava o chão por não conseguir fazer a defesa, Pelé, emocionado, era carregado nos braços, entre microfones e flashes,  após realizar o feito inédito.

O rei do futebol, que ainda viveria o ápice de sua carreira no ano seguinte, ao conquistar o tri-campeonato mundial, no México, como protagonista de uma seleção de sonhos, marcaria em toda a sua carreira 1283 gols.


(Foto: Reprodução)

O mais bonito deles, segundo seu próprio relato, foi assinalado contra o Juventus, na Rua Javari, pelo Campeonato Paulista de 1959, após dar três chapéus consecutivos nos zagueiros Julinho, Homero e Clóvis e o quarto no goleiro Mão de Onça. Entretanto, aquele gol de pênalti, assinalado no Maracanã, naquela noite de quarta feira, 19 de novembro de 1969 foi, com certeza, o mais difícil e inesquecível de toda a sua consagrada e inigualável carreira.