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PC Caju

O HERÓI IMAGINÁRIO

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


(Foto: Marcelo Tabach)

Vi Pelé jogar, Garrincha, Cruyff, Maradona e é fácil se fascinar por esses personagens quando somos testemunhas de suas obras-primas. Ninguém te contou, você viu, jogou contra ou a favor, ou assistiu pela tevê ou da arquibancada. Mas o que me encanta de verdade é quando os ídolos são construídos em nossos imaginários baseados em relatos e leituras.  Evaristo de Macedo, o aniversariante de ontem, foi um desses.

Nunca vi Evaristo jogar, mas as histórias sobre ele eram fantásticas. Marinho, meu pai, sempre falava com amigos sobre seus feitos e de quando iniciou a carreira no Madureira. Sob o comando do paraguaio Fleitas Solich, o Flamengo foi tricampeão carioca, 53/54/55, e o nome de Evaristo era o mais comentado nas rodas: “Imaginem esse homem junto de Pelé”. Evaristo fez 103 gols em 190 jogos pelo Flamengo. É gol pra chuchu!!! Realmente seria mágico ver Pelé e Evaristo juntos, mas o Barcelona desfez esse sonho e o contratou.

Na seleção, não jogou muitas vezes e mesmo assim ostenta um recorde: é o único jogador a marcar cinco gols com a camisa da seleção brasileira, em 1957, Brasil 9 x 0 Colômbia. Ver Evaristo e o Rei juntos, na Copa de 58, seria mágico, mas o clube espanhol não o liberou. Também pudera, Evaristo fez chover na Espanha! Conseguiu ser ídolo de Barcelona e Real Madrid, rivais históricos. Pelo Barça, ganhou dois espanhóis e duas Copas da UEFA e está entre os três maiores artilheiros do Barcelona. Pelo Real, três espanhóis seguidos, 63/64/65.

Mas o destino é imprevisível e sabem em quais circunstâncias vi, pela primeira vez, meu “herói imaginário”? Aos 17 anos, em minha estreia como profissional, pelo Botafogo, no Maracanã, contra o América, decisão da Taça Guanabara, de 67. Meu técnico, Zagallo, o do América, Evaristo. Resultado final: Botafogo 3×2, três gols meus. E como imaginar que Zagallo me convocaria para a Copa de 70 e seríamos tricampeões mundiais? A partir desse jogo comecei a acompanhar a carreira de Evaristo como técnico. Por pouco, muito foi pouco, não foi o treinador da seleção brasileira, na Copa de 86. A imprensa paulista batia de frente com ele. Pelo que me lembro, exigiam a convocação de Sócrates e ele resistia. Entrou Telê. Quem garante que Evaristo não seria campeão? Nessa mesma Copa, Evaristo treinou a seleção do Iraque.

Mas foi campeão brasileiro pelo Bahia, em 88, e pelo Grêmio, na Copa do Brasil, em 97. É considerado o maior técnico da história do Santa Cruz, rodou o Brasil, o mundo, papou títulos por onde passou e é um dos grandes contadores de histórias do futebol. Em uma delas barrou Cláudio Adão, no Bahia, que ficou na bronca e prometeu forra. Tempo depois, em Ipanema, Evaristo olha para frente e vê Claudio Adão vindo em sua direção. Mudou de calçada rápido, afinal encarar Cláudio Adão não seria bom negócio, mas tudo terminou em boas gargalhadas.

Uma das grandes felicidades que o futebol me proporcionou foi a de conhecer pessoalmente um  “ herói imaginário” da minha infância, Evaristo de Macedo, uma lenda em carne, osso e um coração gigante. Mudando o assunto, assisti ao jogo do Real Madrid ontem e fui obrigado a ouvir o comentarista falando de “leitura de jogo”. Até quando? Futebol não se lê, se joga!

MEUS IMPROVÁVEIS 71 ANOS

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


O improvável aconteceu. Hoje, terça-feira, 16 de junho de 2020, chego aos 71 anos de idade, lúcido, saudável e com uma vontade incontrolável de calçar minhas chuteiras e retornar aos gramados. De preferência ao Maracanã, que também aniversaria hoje. Mas digo no velho Maraca, no contagiante, arrepiante e eletrizante Maraca, o dos bandeirões, das charangas e da Geral transbordando de torcedores fantasiados. Minha estreia como torcedor não poderia ter sido melhor, final do estadual de 62, Botafogo 3 a 0 no Flamengo, que jogava pelo empate. Fogão bicampeão, com show de Garrincha. Meu pai adotivo, Marinho, era o treinador do Botafogo e eu estava no Setor 4, com meu irmão Fred.

Como poderia imaginar que cinco anos depois, em 67, aos 17 anos, eu estaria no mesmo estádio marcando três gols contra o América e ajudando o Botafogo a conquistar mais um título, na minha estreia como profissional, no Maracanã. Com o dinheiro de meu primeiro contrato consegui tirar minha mãe, Sebastiana Lima, de um barraco onde nasci e ela ainda morava. Não conheci meu pai, nem por foto. Na verdade, não tenho qualquer registro fotográfico de minha infância. Sei que meu pai era mestre de obras e morreu de cirrose hepática. Minha mãe era doméstica e consegui convencê-la que aceitasse minha adoção pela família de Fred, meu amigo de futebol de salão, no Flamengo. Devo muito a minha mãe, ao Fred e aos meus pais adotivos, Milta Rodrigues dos Santos e Marinho Rodrigues, o Meiúca. Eles me ensinaram a ter disciplina e a valorizar a estrutura familiar.


E assim cresci e fui vitorioso em minha carreira. Cada vitória, o Leblon explodia em festa! Foi no Maracanã que conquistei o Torneio de Verão, pelo Flamengo, contra o Santos, de Pelé, e o Benfica, de Eusébio e Coluna. E foi em uma festa, no Maracanã, que fui recebido pela torcida tricolor em meu retorno ao Brasil: Flu 1 x 0 Bayern. E também foi no Maraca, que participei de um dos momentos mais lindos de sua história, a vitória de 4×1 sobre a Argentina. Era uma seleção brasileira formada apenas por jogadores cariocas, praticamente todos do Botafogo e Félix, do Fluminense, Brito e Nado, do Vasco. A torcida delirou com o olé nos minutos finais e Nelson Rodrigues escreveu que o Botafogo era a pátria em calções e chuteiras. E por que iniciei o texto dizendo que chegar aos 71 anos era improvável? Porque minha vida foi muito intensa e não segurei a onda ao me imaginar longe dos estádios e da bola.

Desde menino fazia minhas próprias bolas de meia. Enrolava papel de jornal e colocava dentro das meias-calça que minha mãe jogava fora, após usá-las para esticar o cabelo de minha irmã. Depois de ficar bem consistente, dava um nó na ponta e, pronto, a bola estava feita. Era uma relação de amor de anos e a forma encontrada para amenizar essa nova fase da vida foi o álcool e a cocaína, dobradinha mortífera. Após um mês cheirando sem parar, achei que aquele fosse meu último dia. Liguei para uma amiga, Maria da Penha, que chegou rápido e me levou para um hospital, na Barra. Fiquei três dias internado e me perguntei por que estava querendo arruinar toda uma história de conquistas e glórias. E a tal estrutura familiar ensinada pelos saudosos Marinho, Esmeralda e Milta? Hoje são quase 20 anos limpo, pulmão de aço, doido para colocar novamente os argentinos na roda, dar um balãozinho, uma caneta, um drible de pescoço, provocar a galera da Geral, me sentir vivo, cada vez mais vivo.

JÁ FOMOS BAILARINOS, HOJE SOMOS ROBÔS

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


O botafoguense Fábio Damasceno e sua mulher Roberta Agnese conversavam sobre Fórmula 1 e como o avanço tecnológico conseguiu reduzir drasticamente o encanto das competições. Fico pensando como será daqui a 20 anos, pois do jeito que a coisa anda não precisarão mais de motoristas. Qual será o apelo emocional de uma premiação para máquinas? É bem parecido com o que está acontecendo com o futebol. Formam super-homens e se esquecem de que essa modalidade é uma arte. No automobilismo da década de 70 e 80 os pilotos tinham que levar o carro no muque! A emoção era em dobro e não chamem isso de saudosismo.

Lembro que fui vendido para o Olympique de Marseille quando estava treinando com a seleção de 74, na Floresta Negra, região montanhosa da Alemanha. Fizemos dois amistosos na Suíça e recebemos a visita de Emerson Fittipaldi, que morava em Lausanne. Quando a Copa terminou e fui morar na França, ele me convidou para assisti-lo competindo no circuito de Paul Ricard, autódromo construído, em Le Castellet, vizinho de Marseille.

Imaginem minha emoção quando estava conversando com ele no boxe quando começam a surgir Clay Regazzoni, Jackie Stewart, Carlos Reutemann, James Hunt, Patrick Depailler, François Cevert, Jacky Ickx, Ronnie Peterson, Didier Pironi e Gilles Villeneuve. Em determinado momento, um carro parou bem próximo e o piloto pisou no acelerador pedindo que saíssemos da frente. Era Niki Lauda de brincadeira. Muitos deles eram fascinados por futebol e, mais ainda, pela seleção brasileira de 58.

No final daquele ano, Emerson Fittipaldi sagrou-se bicampeão mundial. Eu e Jairzinho, meu companheiro de Olympique, comemoramos como um gol! Depois a Fórmula 1 ainda viu Alain Prost, Ayrton Senna e Nelson Piquet, que era meu vizinho, na Praia de Geribá, em Búzios. Encontrei José Carlos em uma festa, no Barcelona. Acho que ele era palmeirense. São gigantes da Fórmula 1, pilotos consagrados, que nos faziam acordar de madrugada para vê-los correr.

A ausência desses ídolos faz despencar a audiência. Isso, claro, em qualquer competição. O futebol brasileiro atual carece de verdadeiros ídolos. Não adianta a mídia querer inventá-los se eles não existem. Neymar está chegando aos 30 e não vê ninguém pelo retrovisor. A referência do britânico Lewis Hamilton, seis vezes campeão do mundo de automobilismo, é Ayrton Senna. Seremos referências até quando?

Quem veio depois de Guga, no tênis, por exemplo? Vi Emerson correr em Monaco algumas vezes, circuito raiz, nas ruas da cidade de Montecarlo. Imagino que talvez alguns circuitos desapareçam ou sejam remodelados como aconteceu com nossos estádios, tudo em nome da modernidade. E assim caminha a humanidade, com máquinas e superatletas substituindo os artistas.

É como sempre digo e jamais cansarei de repetir, já fomos bailarinos, hoje somos robôs.

POR QUE OS NOSSOS ‘GEORGE FLOYDS’ DIÁRIOS NÃO CAUSAM TANTA COMOÇÃO?

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


Não faz muito tempo um negro morreu por asfixia dentro de um supermercado carioca. O assassino também era um segurança branco, que também não atendeu ao apelo de pessoas ao seu redor. Qual a diferença dessa morte para a de George Floyd, em Minneapolis, nos Estados Unidos, que dura sete dias e já mobilizou 25 estados americanos? A do negro brasileiro também foi filmada e viralizou nas redes sociais.

De lá para cá vários outros negros morreram por motivos fúteis e ninguém foi para as ruas protestar. Os negros são discriminados e morrem diariamente no mundo todo, muitos de fome, como na África. O problema é quando se aproveitam dessas mortes por alguma motivação política e essa é uma especialidade dos brasileiros.

Se elas acontecem perto das eleições presidenciais, melhor ainda para os ativistas de plantão, os oportunistas de sempre, os políticos de esquerda, de direita e do centro, movidos por pesquisas que os orientam a como se comportar. Sempre odiei esse termo “raça” porque as cores não nos diferenciam.

Minha mãe sofreu racismo e senti na pele, literalmente, quando em uma excursão com o Botafogo, pelo Sul do país, liderada pelo vice-presidente do clube, João Citro, vi na porta do Country Clube de Bagé, onde seríamos homenageados, um cartaz avisando que era proibida a entrada de negros. Dói na alma. Mas, nesse dia, os jogadores brancos foram os que mais reclamaram e apoiaram os negros do grupo. Ou seja, o racismo não contaminou a humanidade inteira.

Em uma viagem aos Estados Unidos, também com o Botafogo, conheci os Panteras Negras, que defendiam a resistência armada contra a opressão dos negros, conheci a filósofa Angela Davies, famosa por sua militância pelos direitos das mulheres e contra a discriminação racial e social, e fiquei encantado com o trabalho de Malcolm X, um dos maiores defensores do nacionalismo negro dos Estados Unidos.

Antes de voltar ao Brasil, entrei em um salão de cabeleireiro e pintei meu black power de caju. Também comprei calças bocas de sino. Só não aderi aos cordões grossos que os Panteras usavam. Nunca fui influenciado integralmente pelo pensamento deles, mas todos foram muito importantes na minha formação e talvez, por isso, nunca tenha sido um “nego, sim senhor”.


Sempre contestei meus treinadores e até dirigentes, mesmo em plena ditadura militar. Hoje, me impressiona como os negros brasileiros ainda estão longe da politização dos americanos, principalmente os que tem o poder da comunicação nas mãos, como intelectuais, empresários e esportistas. Não lembro de ter visto algum jogador negro, principalmente os que atuam na Europa, se posicionar sobre esse tema de forma contundente. Há tempos os negros americanos vêm clamando por liberdade e respeito, e a morte de George Floyd foi o estopim que faltava. Vinte e cinco estados participam das manifestações e o desfecho está longe do fim.

No Brasil, essas mortes sempre são usadas politicamente e os veículos de comunicação surfam na mesma onda. Passamos por isso em plena covid-19 com um grupo de políticos nos mandando ficar em casa e o outro sugerindo que saíssemos. Quem realmente estava preocupado conosco? No Brasil, criamos campanhas modinhas, vendemos muitas camisetas com frases de efeito, mas tudo é nuvem passageira, papo de bar.

Precisamos afastar esses joelhos de nossas gargantas e nos livrar, definitivamente, dessa tentativa de asfixia, principalmente dessa desigualdade educacional, afinal quase sessenta anos depois de ser barrado em um clube por ser negro, ainda sigo, sem ar, escrevendo sobre esse tema em busca de uma solução, de um basta.

HOMENAGEM AO TIMES DE SP

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


Sempre bati de frente com a imprensa paulista e isso não é segredo para ninguém. Bastava descer no Aeroporto de Congonhas para ser vaiado, mas como nunca fui de ouvir calado durante as entrevistas dizia que jamais moraria em São Paulo, um lugar poluído e com cheiro de podre do Rio Tietê. Acabei quebrando a cara porque morei anos nessa cidade, que adoro e fiz muitos amigos. E como nas últimas duas colunas fiz um teste de memória para lembrar alguns craques dos times cariocas, entre os anos 60 e 70, nada mais justo do que fazer o mesmo com os de São Paulo. E sem consultar o Google!

Adorava os torneios Rio-São Paulo, com seis clubes de cada estado! Vou começar pelo São Paulo, onde Gerson Canhotinha de Ouro foi campeão. Mas vou lembrar de um São Paulo um pouco mais antigo, quando eu era apenas um menino, da década de 50. Reforço que não estou consultando nenhuma fonte de pesquisa e pode ter algum erro. Me consertem! Poy, De Sordi, Mauro, Bauer, Noronha, Maurinho, Gino…..um time espetacular! Mas lembro de vários outros craques do tricolor, como Leônidas, Zizinho, Friaça, Jair da Rosa Pinto, que vi fazer dois gols no Manga, Dino Sani e Canhoteiro. E quando penso na Portuguesa a dó que me dá…. como foram deixar que chegasse a esse ponto. Olha só, os que saíram de lá, que me lembro sem pensar muito: Djalma Santos, Servílio, Sílvio, Ivair, Leivinha, Félix, Ditão, Zé Maria, Marinho Peres, Enéas, Basílio, Badeco e anos depois o diamante Dener. O Juventus, dos artilheiros Wilson Buzzone e Ataliba.

E o Santos? Aí teria que ter uma coluna só para esse time espetacular: Pelé, Pepe, Mengálvio, Edu, Coutinho, Djalma Dias, Dalmo, Calvé, Álvaro, Rildo, Ramiro Geraldino, Pagão, Dorval, Toninho Guerreiro, Tite, Abel, Lima, Ramos Delgado, Joel, Oberdan e tantas outros nomes que fizeram o futebol ser mais lindo! E o Palmeiras, a grande Academia: Valdir de Moraes, Leão, Baldocchi, Dudu, Ademir da Guia, Julinho Botelho, Chinesinho, Tupãzinho, Vavá, Ademar Pantera, Rinaldo, entre outros. Na década de 70, lembro de ter jogado contra um timaço da Ponte, com Carlos, Jair Picerni, Oscar, Polozzi, Odirlei, Marco Aurélio, Vanderlei Paiva, Dicá, Lúcio, Manfrini e Tuta, irmão do Zé Maria. O Guarani começa a montar aquele time que encantaria o Brasil, com Zenon, Renato, Careca, Capitão, Bozó, Zé Carlos, Mauro e Wanderley.

E pouca gente sabe, mas tive uma passagem curta pelo Corinthians, assinei contrato e tudo, mas com a morte de minha irmã, devolvi o cheque para o presidente Waldemar Pires e fui para França. Era época da Democracia Corinthiana. Mas, sem dúvida não seria fácil jogar porque metade da torcida era contra a minha contratação. De qualquer forma joguei algumas poucas partidas e até um torneio no México e posso dizer que joguei no time de Gilmar, Claudio, Luizinho, Balthazar, Ado, Olavo, Oreco, Tales, Sócrates, Vladimir e Rivellino e Luiz Carlos. A lista de grandes jogadores é interminável e é uma prova incontestável de como o nível de nosso futebol despencou.

Acho que passei em mais esse teste de memória, mas me surgiu uma dúvida. Como não lembro da escalação do meu Botafogo do ano passado e listo praticamente todo o time da Ponte Preta de 40 anos atrás? Melhor deixar quieto… Em tempo, ouvi ontem no Campeonato Alemão um narrador falar que a estratégia do time era dar a bola para o adversário! Alguém consegue entender? Sem contar com “consistência de jogo”, “orelha da bola” e muito mais!