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O IMPERADOR DA VILA CRUZEIRO

por Paulo Escobar 


Imaginar de longe a vida na pobreza e aquilo que ela acarreta é uma coisa, assistir a televisão e ser levado a acreditar o que é a favela (com as imagens distorcidas) é julgar sem conhecer. Mas viver a realidade tal qual ela é, dura, viva, crua, mas alegre e feliz é o que Adriano viveu na Vila Cruzeiro.

Adriano viveu das dificuldades que o fizeram um Imperador desde muito pequeno. Sua mãe Dona Rosilda teve que fazer hora extras para pagar seus dias na escolinha do Flamengo, por exemplo. No clube de seus amores, além do futebol, levou os ensinamentos do seu Almir, que o ensinava a ser humilde e humano e de não pagar o mal com mal.

E foi do morro que Didico desceu para a Gávea, de lá para o Maracanã e de lá para as TVs da molecada da Vila Cruzeiro, que tinha seu representante e um dos seus fazendo gols e alegrando os dias de resistência das pessoas lindas que vivem nas favelas. De lá vem um salto a um mundo estranho, na Itália, Inter-Fiorentina-Parma e Inter de novo aonde viria ser o Imperador.

Um mundo estranho aquele vivido fora dos campos, não era a Vila Cruzeiro, era um mundo distante dos seus, a Fama e um mundo que muitas vezes discrimina aqueles que vieram da realidade que Adriano vinha. Mas dentro dos Campos era “Um animal” como descrito pelo Ibra, pois era com essa habilidade misturada com a potência que Adriano balançava as redes e conquistava o território italiano.


Como não ter na mente aquela Copa América que Adriano parecia imparável e imarcavél, como não lembrar dos zagueiros tentando tirar a bola e esbarrando em seu corpo com o qual colocava uma barreira que dificultava de lhe tomar a bola. Nos seus chutes a força de um morro e nos seus gols toda uma comunidade que balançava as redes junto com ele.

A vida o surpreendeu ainda na Itália com a morte de seu melhor amigo, Seu Almir, e foi neste episodio que o chão de Adriano desaba e lá que seu coração sente a falta daquele pelo qual houve um amor que somente ele consegue descrever. Não vou falar de excessos, não vou julgar o que segue, pois todos carregamos dores e cada um sabe como suportá-las, há dores grandes demais e todos temos maneiras de aguentá-las e Adriano teve a sua maneira de lhe dar com ela.

Das fases duras e do fundo das suas dores e tendo que aguentar todo tipo de julgamentos morais, o Imperador precisou ressurgir, e no Maracanã, no clube de seus amores que ele desce da Vila Cruzeiro mais uma vez para ser campeão pelo Flamengo. 

Quantos artilheiros hoje fazem 19 gols num Brasileiro? Quantos jogadores têm a frieza e o gosto pelas redes que Adriano tinha?

Adriano foi julgado por aquilo que os carrascos moralistas do futebol não toleram, foi punido pela Vila Cruzeiro não ter saído dele, as raízes, os aprendizados e favela sempre estiveram presentes na vida do Imperador. Jogou, ganhou, venceu e não foi domesticado, Adriano se negou a negar sua origem, coisa que muitos jogadores fazem, se negou a negar suas amizades.


Não se importou com aquilo que seus amigos são e como a sociedade os olha, Adriano foi amigo e ajudou os seus, ajudou sua família, foi aos churrascos, empinou suas pipas e descalço continuou amando o lugar que o viu crescer. O Imperador da Vila Cruzeiro continua sendo mais um com sua bermuda e jogando as peladas de rua, imaginam o ídolo andando com a molecada num domingo de sol sem seguranças? pois isso é Adriano, mais um na Vila Cruzeiro.

Foi Imperador não do jeito ruim dos imperadores que dominavam seus povos, mas foi Imperador na sua grandeza e humildade de não abandonar suas origens e as pessoas do seu passado para trás, foi Grande no sentido mais humano da palavra. Os Grandes são imperfeitos, são humanos, e nos identificamos com aqueles que são falhos e humildes, pois como dizia Galeano “a perfeição é o chato privilegio dos deuses”.

Você não encontrará Didico na FIFA ou nos gabinetes, não achará ele bajulando os ricos ou então beijando os pés dos patrocinadores, não terá declarações chatas e planejadas. No Império da Vila Cruzeiro, o seu Imperador é mais um no meio dos seus, lutando contra os preconceitos que ainda sofre daqueles que o invejam do lado de fora dos morros.


Adriano teve que vencer as dificuldades que a pobreza lhe impôs, teve que lutar contra aqueles que o perseguiam pelo fato dele ser um favelado vencedor, num mundo que não aceita a vitória dos pobres, teve que vencer o moralismo das mídias que bajulam o menino Ney por dançar conforme a música e apedrejam os meninos que nem Adriano que se negaram a serem domesticados e não abandonam suas favelas. 

Sobre aqueles que continuam julgando Adriano por andar descalço na Vila Cruzeiro, lhes digo: “Que Deus perdoe essas pessoas ruins”

COLONIZARAM A LIBERTADORES

por Paulo Escobar


Desde que me lembro por gente que acompanha futebol, tenho lembranças da Libertadores, que na minha opinião era um dos torneios mais loucos e que trazia a diversidade e as mais variadas culturas latinas a campo. Os times, seus estádios, as torcidas a pressão e as festas de cidade para cidade.

O que dizer dos jogos no centenário, na Bombonera, em Nuñes, no Nacional, no Defensores del Chaco, no Cilindro, Lima, La Paz e nos mais variados estádios. Como não lembrar dos jogos quentes e finais incríveis, os mata-matas, os chamados grandes caindo, o torneio que talvez sempre mais custou aos times brasileiros e que sempre trouxe histórias e bastidores inesquecíveis.

Aos poucos foram nos matando, assassinando o futebol latino e a Libertadores, a exemplo do que a América Latina sofreu na colonização, quando os assassinos vinham com seus costumes, deuses e culturas e assim impunham aos índios, do mesmo jeito tem acontecido com o nosso futebol. Não aceitam nossa diversidade, não aceitam nossas paixões, não aceitam nosso jeito diverso de ser, mas querem nos adestrar e nos padronizar e dizer como deve ser nosso futebol.


Aos poucos levam nossos craques, depois tiraram nossos instrumentos e bandeiras, proibiram nossos sinalizadores e fogos de artifícios, colocaram cadeiras e nos disseram como se comportar nos nossos jogos, não permitiram mais ambas as torcidas, tiraram a cerveja e, a exemplo dos colonizadores, nos impuseram seus costumes e nos deixaram um hino, aquela coisa chata que é tocada na entrada de ambos os times juntos.

Mais do que nunca, o que aconteceu domingo teve muitos atores por trás, as federações que historicamente defenderam interesses daqueles que as comandam e não do futebol, os governos que sempre vão culpar as torcidas das desgraças e descuidos históricos deles mesmos, as dirigências dos times envolvidos que sempre abaixaram a cabeça para tudo que lhes é imposto. Tudo o que rolou no domingo com a FIFA por trás e todos seus capachos somente veio fortalecer o argumento de final única em campo neutro.

A final em campo único em países distantes, além dos ingressos caros, exige agora pegar avião para poder acompanhar seus times de coração. Se já é difícil você ir numa final pelos preços absurdos, agora some passagens e gastos de estadia. As finais serão mais um meio de exclusão e imposição de como devemos torcer ou agir de acordo com os padrões impostos de cima para baixo.

Houve interesses de muitos poderosos que se aproveitam do futebol nos incidentes de domingo, se aproveitaram dos fatos para querer nos dizer que não somos civilizados e que o futebol europeu é o antro da ordem e de como se deve torcer, superdimensionam os conflitos nos nossos estádios como se fosse rotina e minimizam os conflitos ocorridos na Europa como se fossem exceções. Vale dizer que grande parte da mídia esportiva foi participante do assassinato da Libertadores e imposições de como se deve ser ou agir.


As revoltas e conflitos são fatos sociais além do futebol, e que devem ser observados como fenômenos sociais além do esporte. O que acontece com as pessoas dentro dos estádios são reflexos daquilo que se vive nas sociedades que vivemos, e nossas diversidades e particularidade dentro dos estádios devem ser preservadas, nossa forma de manifestar nossa paixão respeitada e não assassinadas como vem sendo feito ao longo dos anos.

Nossa forma de torcer e manifestar nossas paixões são motivos de incômodo para os de fora, não respeitam nossa diversidade e nos punem por sermos diferentes. As entidades querem nos colonizar e impor o que para eles é futebol e nos colocar como devemos agir e ser dentro e fora dos estádios.

O que foi acontecendo na Libertadores ao longo destes anos nos mostra que foram nos matando aos poucos, com requintes de crueldade, foram nos assassinando de maneira lenta. Nos mutilaram aos poucos e hoje falecemos junto com a morte da Libertadores do jeito que a amávamos e conhecíamos.


O simbolismo de levar a final a Madrid mostra o ponto final deste processo colonizador, a exemplo das invasões e imposições que sofremos ao longo dos séculos vimos no futebol. Nos roubaram tudo inclusive a final da Liberadores, nos saquearam e levaram até nossas finais do jeito que as conhecíamos embora.

Não será a mesma coisa a final em Madrid, muitos dos torcedores que poderiam ir a uma final em seus estádios não poderão ir a Espanha, ali será uma final para aqueles que podem pagar e alguns que terão que se endividar para poder acompanhar seus times.

O que nos resta é o que sempre aconteceu nos processos colonizadores ao longo da história, a resistência daqueles que amamos o futebol, dos torcedores que não aceitem estas imposições. Que algo que nos dê um sinal de esperança aconteça daqui até o dia 9, e que o futebol nos surpreenda de alguma forma.

Pois diante do colonizador sempre houve resistência, tomara que com o futebol não seja diferente.

UM TANGO INACABADO

por Paulo Escobar


No primeiro texto que escrevi sobre aquele jogo inesquecível da primeira final, terminei dessa forma: “Até depois do dia 24 para falarmos mais disto que é mais que um clássico. Até…”

Gostaria de ter escrito hoje sobre um jogo épico como o primeiro, de ter falado de uma partida elétrica ou ter citado uma final inesquecível. Mas não foi o que vimos.

River e Boca costuma ser um clássico cheio de história e rivalidade, de muitas confusões, de todo tipo de loucura possível, do inimaginável tanto dentro como fora de campo. Se esperávamos ver um grande jogo no sábado, nos enganamos. Depois das pedradas da torcida do River no ônibus Xeneize, vimos jogadores feridos e uma final jogada para domingo de novo.

E depois de mais um tango, cheio de dramas e reviravoltas, chegamos ao grande dia e a diferença daquele jogo adiado na Bombonera é que em Nuñes não tivemos o jogo tão esperado. O Boca se recusou a jogar com jogadores feridos e disse que com a diferença de condições esportivas em relação ao River não jogará.


River e Boca mexe com questões além do jogo, mexe com as classes sociais, mexe com a história, as derrotas viram hinos e são marcas profundas. Pra quem já foi a Boca ou passou por Nuñes sabe o que significa perder um jogo comum num superclássico. O que se viu foi não querer perder aquela que tem sido dita como a última final em dois jogos da história da Liberta, pois ano que vem seremos uma cópia europeia.

Tevez lembra aquela eliminação que o Boca sofreu quando a torcida Xeneize jogou gás de pimenta nos jogadores do River. O que se pede é a anulação do jogo e a diretoria do Boca pede os pontos da partida no tribunal.

A torcida do River, na saída do jogo deste domingo, cantava “Bocagón” insinuando que os Xeneizes não queriam entrar no jogo por medo do confronto. E mais uma vez os torcedores que estavam neste domingo no estádio sofreram com a desorganização da Conmebol, que tirou o corpo fora dos incidentes.

Não vou fazer análises daquelas que colocam torcedores como bandidos e nem juízos morais, pois entendo que o futebol faz até o mais calmo dos seres humanos perder a noção. Vale lembrar que pela paixão ao futebol já se fez de tudo neste mundo, e entendemos também que a revolta social é uma questão um pouco mais ampla e que está bem além do futebol. Também não vou cair naquele “punitivismo” que faz com que se proíba de tudo nos estádios.


Fiquei triste por querer ver esse jogo, e se é pra apontar culpados jogo na conta das federações, pois entre AFA, CONMEBOL e CBF não se tem muita diferença.

Lembremos que aqui já tivemos uma final que começou em 2000 e terminou em 2001 ou times que subiram da terceira pra primeira ou títulos reconhecidos por interesses políticos estranhos, ou VAR que funciona para alguns e para outros não.

As federações, entre elas a FIFA, são as grandes culpadas pelo pior que vemos no futebol e sempre movidas por interesses financeiros que fazem do esporte um simples instrumento para o lucro das pessoas por trás destas entidades. Quem num Boca e River joga o ônibus Xeneize para passar no meio da torcida dos Millionarios?

Gostaria de deixar algumas dúvidas no ar:

A quem interessa este tumulto na última final ida e volta? Será que não se quer fortalecer a ideia de campo neutro e jogo único?

A quem interessa esticar mais o jogo e as incertezas?

A quem interessa criminalizar e generalizar as torcidas como bandidos?

Há problemas estruturais e profundos no futebol mundial, movido por interesses políticos e financeiros de empresas, algumas pessoas e instituições por trás e nos bastidores que se mantêm ocultos.


Gostaríamos de ter visto um jogo épico no monumental, queria poder escrever aqui sobre o futebol e a paixão que nos move e faz viver isto que é muito mais que um esporte. Mas ainda nas incertezas mal sabemos o que virá pela frente e o que acontecerá pode ser qualquer coisa. Até a decisão sair não diga que já viu de tudo, pois há coisas que você ainda verá e duvidará.

Terça feira, dia 27, às 10h, assistiremos o que a CONMEBOL decidirá, e posso lhes garantir que tudo pode acontecer. E infelizmente este tango de tanto drama não foi cantado por inteiro, mas nós, os amantes do futebol, esperamos que tudo se resolva dentro de campo e não nos bastidores do futebol, que ali sim é onde moram os bandidos e os sujos que estragam nossa paixão.

Espero poder escrever o desfecho com a bola no campo e um jogo épico, mas lembre-se que tudo pode acontecer…

A PRIMEIRA PARTE DO TANGO FOI TOCADA

por Paulo Escobar


O que dizer de um Boca x River mesmo num jogo normal de um campeonato qualquer? Não são jogos fáceis e sempre disputados, difícil me lembrar de um superclássico frio e sem emoções e confusões. Desde muito cedo, no final dos anos 80, me lembro de jogos eletrizantes entre Boca e River.

Final dos 80, nos anos 90 e 2000 para frente, vi o River do Príncipe Francecoli, de Ramón Dias na lateral de campo comandando, do matador Salas, do Diabo Monserrat, do boneco Gallardo (hoje técnico), do burrito Ortega e de tantos outros fazerem jogos contra o Boca de Maradona, Caniggia, Roman, do chicho Serna, do carnaval Palermo, Marcico, o manteca Martinez, do mítico técnico Caballito Bianchi,el Patrón Bermudez e tantos outros.

E numa decisão para fechar os ida e volta em finais, pois ano que vem começa aquela imitação europeizada de final única estragando um pouco mais a nossa Liberta, o que vimos neste domingo foi sem dúvidas a final prometida. Que jogo de futebol! Ao vermos a chatice dos clássicos do Brasileirão um dia antes, os deuses do futebol nos presentearam com este puta jogo.


E como um bom tango, teve drama, teve amores, teve agonia e teve a dança da torcida do Boca na Bombonera lotada como sempre, pulsando mais uma vez o mítico estádio do bairro Xeneize.

Entre tantas histórias, teve a da segurança mudando o dia do jogo para sábado, depois a chuva que nos deixou mais agoniados esperando mais um dia, a rodada de domingo na Argentina cancelada e a história do joga ou não joga. Polícia Federal revistando o vestiário do River, Gallardo suspenso não podia nem pisar na Bombonera e assistiu ao jogo em Nuñes, campo do River.

Mas finalmente chegamos ao domingo e podemos dizer que vimos um baita jogo, do começo ao fim, com fortes emoções e pegado como devem ser os Boca x River. O goleiro Rossi, do Boca, fechando o gol em lances claros do River, um Boca meio nervoso no começo, mas que depois se solta e em duas pancadas de Ábila em cima do goleiro Armani do River, na primeira dá rebote e no rebote Ábila abre o placar para fazer a Bombonera quase vir abaixo.

Mas não durou muito, não. Lucas Pratto estava lá para empatar menos de um minuto depois num chute cruzado, e não podemos dizer para calar a Bombonera, pois ali se canta perdendo ou ganhando. A partir dali, vimos um jogo ainda mais quente, e perto do fim do primeiro tempo tínhamos mais uma emoção: o gol de cabeça de Benedetto de frente pra doze que cai comemorando em cima do alambrado e assim se foram aos vestiários.


Segundo tempo começa com o River correndo atrás do gol e, numa bola parada alçada na área, Izquierdoz faz contra, para desespero da mesma doze atrás do gol que não deixa de cantar.

No banco, Guillermo Schelotto, que jogou muita bola também naquele meio campo com Riquelme, chama o Apache Tevez que entra para colocar mais temperos nesse jogo e numa jogada de mestre deixa Benedetto na cara do gol, mas Armani fecha e faz, talvez, a defesa do jogo impedindo o 3×2. O mesmo Tevez que ao fim do jogo vai lá na saída do campo dar ânimo a Izquierdoz lembrando que ainda a tango a ser dançado.

Numa semana em que a Argentina parou e, gostem ou não os mais pachecos, o Brasil e o resto da América Latina também, não deixaram nada a desejar aos clássicos europeus ou de qualquer canto do mundo. Vimos um jogo de futebol, assistimos emocionados e aposto que muitos torcendo pra um ou pra outro. Me arrisco a dizer que neste ano, independente do clássico em qualquer lugar do mundo, talvez este sim foi o do fim do mundo como disseram os argentinos.


Dia 24 deste mês de novembro teremos a volta e eu torcendo pra um dos dois, sofrendo como sofri, esperando que o céu se tinja de azul e ouro, mas sabendo que o River jogou muito e que nenhum dos dois entregará facilmente essa Liberta. Sabemos que este empate levará os dois times a procurar o jogo e ir pra cima, e sabemos que nestes clássicos, assim como no de hoje, vai rolar de tudo, e esperamos pra emoção nossa que role de tudo mesmo.

A primeira parte do tango foi tocada depois de uma longa espera neste domingo, e até dia 24 esperaremos a segunda parte do tango a ser tocado em Nuñes. E até lá a ansiedade e a emoção nos fará imaginar mil possibilidades.

Até depois do dia 24 para falarmos mais disto que é mais que um clássico. Até…

OS VENTOS DO ÓDIO DENTRO DOS CAMPOS

por Paulo Escobar


Não é de hoje que se percebe o ódio nas pessoas, e não é de hoje que os preconceitos contra as ditas minorias (em direitos), mas maioria em quantidades, se faz presente. Podemos dizer que nos dias atuais somente tem se colocado mais para fora os ódios internos guardados, e no mundo do futebol não é diferente.

Em alguns países são toleradas atitudes totalmente desumanas e cruéis, opiniões que podem custar a vida de pessoas por conta de serem diversas, e jogadores que vêm de meios de pobrezas apoiando opressões e falas racistas, homofóbicas, xenófobas e estúpidas dentro e fora dos gramados.

Quando um jogador de futebol se manifesta a favor da intolerância e de posturas cruéis, ele reproduz ódios e frases que são escutadas em rede sociais ou televisão aonde crianças ouvem e imitam estas ideias e alimentam na cabeça de quem assiste os preconceitos defendidos, correndo o risco de tornar ódios como coisas normais e tudo em nome da tal democracia e liberdade de expressão.


Bom lembrar que muitos destes jogadores, através do futebol, saíram e saem de meios extremamente pobres e sofreram preconceitos dos mais variados, sentindo na pele a exclusão social por conta da condição financeira. Seria honesto talvez não esquecer do lugar de onde saíram, e começar a enxergar que o fato de terem dinheiro não apaga o lugar de onde vieram. Querer hoje defender ideias desumanas por estarem longe do meio que os viu crescer, das favelas ou quebradas, chega a ser bizarro tendo em vista que os seus amigos deixados para trás continuam sofrendo o peso da exclusão e preconceitos que eles sofreram um dia, e que ao que tudo indica serão as primeiras vítimas diante do massacre que estes discursos de ódio trarão consigo.

Como bem observou Angel Cappa, ex-jogador de futebol argentino:

“Eles são postos diante de uma armadilha. São levados a viver a ilusão de uma ascensão social, quando na realidade não é assim. São retirados de sua classe social e deixados no ar, são conscientemente apartados da realidade. Eles não se esquecem de onde vêm, mas se alienam. Adotam os costumes, o modo de falar, os restaurantes, os perfumes, a roupa do opressor. Ou digamos que de outra classe social, para não ser tão extremos. E ficam deslocados, perdidos, porque jamais são admitidos na elite à qual ilusoriamente são levados a acreditar que pertencem. As pessoas só se aproximam deles por causa da fama, e depois de seus quinze minutos eles ficam novamente no ar, não são nem do local de onde vieram nem da alta sociedade.”

Jogadores e ex-jogadores negros apoiando discursos de racismo, jogadores que têm companheiros gays apoiando discursos homofóbicos, jogadores ditos cristãos apoiando a apologia a tortura, jogadores que já tiveram problemas com vícios e que talvez estiveram nas bocas atrás de suas drogas apoiando o extermínio de pessoas com vícios chega a ser de uma desumanidade e hipocrisia sem tamanho.


Não podemos esquecer também que a estrutura que são submetidos pelos clubes, assessores e confederações também os colocam numa cegueira social, afastamento até intencional diria na qual são distanciados da realidade tal qual ela é. Como não enxergar que muitos dos torcedores que os acompanham nos jogos e que consomem o futebol e que são seus clientes, por assim dizer, são pessoas diversas em todos os sentidos.

O futebol que é um meio de socialização, de integração e até que dentro dos estádios muitas vezes juntou as diferenças não pode ser utilizado como meio de cultivo de ódio às diferenças ou reprodutor de atitudes injustas e cruéis como já foi no passado aonde serviu de ocultação de realidades duras e do desaparecimento de pessoas apoiando regimes nefastos (seja de direita ou esquerda).

Quando vejo um jogador defendendo o ódio, penso no poder que aquela atitude tem e como isso se multiplica, penso em como pessoas que torcem pelos times que eles mesmos defendem irão sofrer as consequências deste ódio e crueldade. E vejo uma desonestidade com o passado e sofrimento que muitos passaram até chegarem a ter uma vida mais estável economicamente falando.

Em alguns times pelo mundo jogadores de futebol que manifestaram apoio a discursos de ódio contra as diferenças foram apagados da história de seus clubes, e alguns até convidados a se retirarem em caso de continuidade destas atitudes. Aqui no Brasil muitos clubes se isentam de posicionamento e em nome da “democracia” manifestam que todos têm direito a manifestação mesmo que este ato seja uma reprodução de ódio e crueldade, o direito a expressão não quer dizer direito a ser desumano com o outro.


E pra finalizar não voto desde que nasci, acredito numa política construída no dia a dia com as pessoas mais prejudicadas e sofridas, na sobrevivência, no futebol como símbolo de alegria e de alivio daqueles que mais sofrem. Aos jogadores e ex-jogadores por favor sejam mais coerentes com suas histórias de lutas e vidas e com aquilo que o futebol é, um instrumento de alegria e socialização e não de ódio.

Diante do ódio o papel do futebol é resistir.