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Os peladeiros

OS PELADEIROS

por Serginho 5Bocas


Para o peladeiro fominha, não tem bola perdida (por Marcos Vinícius Cabral)

Hoje não vou falar de craques do passado, do presente nem tampouco do futuro, vou dar espaço aos quase jogadores, aos peladeiros. São espécies raras que não podem faltar na fauna futebolística dos mais longínquos grotões deste nosso Brasil. 

Aqueles caras que vemos sair de casa com roupa de trabalho, mas por debaixo das calças ou dentro da mochila e em alguns casos, até mesmo na mala do carro, sempre carregam o short, o meião e outros aparatos que compõem a vestimenta dele.

Vou começar a homenagem pelo “café com leite”, aquele que de tão ruim, nem conta, chuta pra qualquer lado que vale, normalmente ele tem uma coordenação motora sofrível, tem idade muito abaixo ou acima da média da galera da pelada, ou então tem irmã gostosa e não deve ser contrariado.

Outro que não pode faltar, é o “bom de grupo”, um cara que não joga pôrra nenhuma, mas é maneiro pra cacete, nunca falha na intera para o tira gosto, limpa os coletes, guarda a bola e tem carro grande, que é muito útil quando tem jogo fora.

Tem também o “papagaio”, que é aquele cara mais chato da pelada, fala pra “karaiu”, só ele que sabe jogar, reclama de todos e de tudo, marca com os olhos, apita o jogo e quase sempre estraga a pelada com seu jeito sem noção, tem alma boa, mas é um mala.

Tem o “enganado”, que é aquele cara que já sai de casa nessa condição (me engana que eu gosto), ou seja, a mãe ou a mulher diz que ele tá lindo, pede um gol pra ele, e escuta das coitadas a pior de todas as frases: diz que ele joga bola, pronto! Formô.


O brigão costuma chegar mais forte nas divididas (por Marcos Vinícius Cabral)

Outro que sempre está presente é o “brigão”, aquele cara normalmente policial ou ex-policial, bombeiro, halterofilista, lutador de arte marcial ou somente um brigão de rua mesmo, da antiga, daquela  época que ser bom de briga – até surgir a AR-15 – era sinônimo de ter um respeitozinho na rua. Esse quer arrumar problema com todo mundo que é amigo, só não costuma ser brabo contra estranhos em jogos fora, ai normalmente nem aparece, é um final de comédia, mas se não der muito papo, status, ele acaba sumindo, graças a deus.

O “caixa” é aquele cara que todo mundo vaza quando o fim do mês se aproxima, se ele puxa o caderninho, linha de impedimento nele, rala peito Mané, que fu…

Tem o “ruim de bola mesmo” que não serve nem pra “agarrá no gol”, sempre chega cedo e tenta tirar o par ou ímpar, pra garantir vaga, porque senão, um abraço meu camarada, senta no meio fio e chora.

Não pode faltar também o “cachaça”, esse nem quer jogo, senta no engradado mesmo e tá bom demais, está sempre com uma gelada ou um copo na mão, zoa todo mundo e está sempre de bem com a vida, a única contra indicação é que alguns deles quando passam da conta (quase sempre), choram, te abraçam, falam que te amam e por ai vai…é flórida!


O atacante Aloisio não esconde de ninguém sua admiração por cerveja

E não existe pelada sem o “bichado”, que é aquele cara que parece a múmia, porque ama ter preso ao corpo uma joelheira, uma atadura, uma tornozeleira ou uma cocheira e em alguns casos mais graves, carrega com muita honra essa pôrra toda que eu falei de uma só vez, mas quando a bola rola ele esquece tudo e joga, o dia seguinte é que é sinistro, dói até a vista, sempre dá ruim pra ele.


O bichado é aquele jogador que se machuca constantemente

O “cagão” é aquele cara que de tão ruim, só mesmo a bola batendo nele de raiva ou por pura piedade é que ele faz gol. Acontece que ele é aquele mais genuíno exemplo do raio que cai duas, digo, uma porrada de vezes no mesmo lugar, vai cagar assim lá no raio que o parta! Mas diga-se de passagem, que na maioria dos casos é bom ter um desses no seu time, vai que…

Quem nunca conheceu um “fominha”? Aquele que de tão esganado, até dorme com a redonda, mas seu forte mesmo é não passar a bola pra ninguém. Pode estar mal colocado que sempre tenta o chute ao invés de passar para um companheiro melhor colocado e tem sempre uma desculpa na ponta da língua para não dar a bola. É clichê dizer que deveria ter uma bola só pra ele…

E o “sem sangue”? Ah, esse irrita de verdade. É aquele cara que não corre de jeito nenhum, não ajuda quando ataca, muito menos quando o time se defende. O cara é preguiçoso de doer, parece um gato de armazém, mas geralmente fica pra segunda pelada, se o critério for par ou ímpar.

Já ia esquecendo do “fedorento”, que como a alcunha já entrega é um solitário, um verdadeiro Robson Crusoé das peladas, ninguém quer abraça-lo após um gol, pegar seu colete suado? Nem pensar. É que o cara não lava o meião, guarda o tênis abafado dentro da bolsa na mala do carro fechado e tem mal hálito e um cêcê da pôrra, dorme com esse barulho. É complicado ajuda-lo, mas é um boa praça, também se fosse antipático, apanharia ou levava um tiro.


O baixinho Romário fazia sucesso dentro e fora das quatro linhas

Outro que não pode faltar é o “pegador” de mulheres. O cara é um espetáculo, só anda cheiroso e é um exímio contador de histórias. Diz que sempre dá 3 antes do jogo, que se não comer ninguém não joga bem e o escambau, mas realmente ele sai com muitas mulheres ou seres humanos se assim for politicamente correto chamar as criaturas, porque se juntar todas elas e bater no liquidificador com neston e duas bananas para engrossar o caldo, fica faltando um olho, 2 joelhos e uma perna…fala sério matador!

E tem também o “dono da bola”, que em geral é assim desde moleque, pois nunca jogou porra nenhuma, então comprava a bola, o uniforme e tudo que for preciso para garantir uma vaga na pelada. Quando cresce, acostumado com este estilo de vida, costuma se dar muito bem na política, ou em alguma confederação de futebol, pois terá desenvolvido um enorme o “expertise” de corromper os colegas e ai fica fácil com os homens.


O dono da bola geralmente estraga as peladas

Não podemos esquecer da fera da pelada, o “boleiro”, que é o cara que joga muita bola, que quase jogou em clube, às vezes foi federado e na maioria dos casos, apenas peladeiro e todo mundo diz que era pra ter sido jogador, que com essa turma que joga hoje ele brincaria no meio de campo mole e o escambau. No fundo, no fundo, ele agradece, mas sabe que alguma coisa não saiu como deveria. Teve que ajudar nas despesas de casa, os estudos falaram mais alto entre outras infinitas possibilidades que nos mostra como é tênue a linha que sempre separa os homens dos meninos, pois o Jogo é bruto companheiro.

E pra fechar os trabalhos não poderia ficar sem falar do “ex-peladeiro”. Ele não consegue levantar a bola com os pés, ele não faz 3 embaixadinhas sem deixar a bola cair no chão e nem é bom pedir para dar um chute na bola, porque ou ele fura a bola com a unha grande e a falta de jeito ou pode furar o chute e ai, se ele cair no chão, não vai levantar mais. Mas vive contando causos que ninguém é capaz de achar algum contemporâneo para confirmar. Vive repetindo que jogou com Zizinho, Danilo Alvim e Dino Sani, que seu vizinho “zezinho” era o melhor deles todos na rua, mas não tem um recorte de jornal ou revista da época de glórias para ser lembrado. É uma grande figura dos campos de pelada e é um dos meus personagens favoritos, pois mantém acesa a chama da pelada de verdade.

Todos os peladeiros apresentam algumas características em comum, amam a bola do jogo, amam o futebol, amam ver futebol, amam jogar uma pelada, pagam por tudo que falei neste parágrafo e todos tem pelo menos uma historia de glória para contar, senão, nunca foram peladeiros de verdade.

Ah, e antes que eu me esqueça, não tem essa de “vim” pra brincar, esse papo é a mais genuína conversa fiada. Peladeiro fominha que se preza, pode perder o sono, a namorada, o cinema e até o parto do filho, mas de jeito nenhum ele tolera perder o jogo, nem mesmo o par ou ímpar. Brincadeira de tu é rola, valeu?