por Pedro Trengrouse
Todo o arranjo produtivo do esporte nacional precisa assumir a responsabilidade de fazer tudo o que estiver ao seu alcance para melhorar concretamente a vida dos brasileiros.
Enquanto o Brasil se recupera da última Copa do Mundo, preparando-se para receber os próximos Jogos Olímpicos, a bacia hidrográfica mais importante da Região Sudeste é vítima da maior tragédia ambiental da história do país. Milhões de pessoas que vivem às margens do Rio Doce sofrem a falta d’água e sua contaminação por metais pesados pode gerar efeitos nocivos imprevisíveis. A queda da atividade econômica em mais de 230 municípios, muitos deles iminentemente agrícolas, tende a acentuar bastante a atual tendência de desemprego no país.
Competições esportivas transformaram-se em eventos de entretenimento, com cada vez mais recursos e enorme capacidade de comunicação. Todo arranjo produtivo do esporte nacional precisa assumir a responsabilidade de fazer tudo o que estiver ao seu alcance para melhorar concretamente a vida dos brasileiros.
A Organização das Nações Unidas (ONU) há algum tempo preconiza que o esporte é um poderoso instrumento para o desenvolvimento humano, econômico e social. Desde 1994, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) reconhece o potencial de atletas como embaixadores de causas ambientais e defende que o esporte tem o poder de mobilizar pessoas em torno de objetivos comuns em prol do meio ambiente. O Brasil tem a responsabilidade de cuidar de 12% da água doce e da maior biodiversidade do planeta, com 20% de todas as espécies da Terra espalhadas por biomas como, por exemplo, a Mata Atlântica, o Cerrado, a Floresta Amazônica (a maior floresta tropical do mundo) e o Pantanal, a maior planície inundável. Deveria ser impossível imaginar eventos esportivos no país dissociados de questões ambientais.
Em 2006, na Alemanha, houve um programa na Copa chamado Gol Verde, para compensar seu impacto ambiental, promovendo o uso responsável de recursos hídricos, o reaproveitamento e a reciclagem de materiais, o transporte favorável ao meio ambiente e o uso eficiente de energia. Em 2014, no Brasil, como pensar no meio ambiente se nem as obras prometidas ficaram prontas? Em 2000, um ícone dos Jogos Olímpicos de Sydney foi a recuperação de Homebush Bay, uma área de depósito de lixo tóxico que foi restaurada para ser o Parque Olímpico. Por aqui, os Jogos Olímpicos de 2016 sequer cumpriram a promessa de despoluição da Baía de Guanabara.
O meio ambiente não pode mais ficar em segundo plano. O esporte tem tudo para ser decisivo na consciência ambiental e na promoção de ações comunitárias. Por que não começar por ações em favor de vítimas desta tragédia e estímulo constante a iniciativas de recuperação das bacias hidrográficas, como a que vem sendo implementada pelo Instituto Terra há tempo no próprio Rio Doce?
Enquanto nada for feito, esportistas podem ser comparados a Maria Antonieta, achando que a fome do povo se resolve com brioches, e os Jogos Olímpicos de 2016, ao Baile da Ilha Fiscal, financiado com dinheiro que deveria socorrer flagelados da seca.