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Marcos Vinicius Cabral

ARÃO

por Marcos Vinicius Cabral


“Arão era o Patinho Feio e hoje é um ídolo”, disse o treinador rubro-negro Jorge Jesus após a apoteótica exibição do volante e da equipe na vitória por 3 a 1 contra o Atlético-MG, em pleno Maracanã, na última quinta-feira.

Perseguições, vaias, questionamentos e uma vontade grande de mudar o quadro de sua história.

Tanta vontade de mudar que mesmo estando numa grande vitrine como é o Flamengo, nunca se arriscou a bater faltas em uma partida sequer, desde sua chegada em 2016.

Porém, vem treinando no CT Ninho do Urubu, com aproveitamento convincente.

Bem-humorado, desconversa quando alguém o elogia: “Isso aí a gente deixa pra surpresa. Deixa quieto, a gente vai trabalhando quietinho. Se tiver oportunidade, vou tentar bater ali, mas deixa quieto”, afirmou sacudindo a vasta cabeleira que se tornou sua marca registrada.

E não será surpresa mesmo que numa bola dessas da vida em uma partida, ele bata e converta.

Poderia ser contra o Grêmio ou talvez contra o River ou Boca…vai saber!

O futebol tem muito disso e com Willian Arão não seria diferente.

Titular mas com ressalvas por quase todos os treinadores que trabalharam no Flamengo, ele usou a camisa 5 sem muito brilho desde quando saiu brigado do Botafogo.

Nascido em São Paulo, no terceiro mês do ano – o mesmo em que Zico, Uri Geller e Leandro deram seus primeiros choros em vida – o predestinado Bola de Prata do Campeonato Brasileiro de 2016 vem sendo um trunfo para o esquema de Jorge Jesus.

Cresceu no momento certo junto com a chegada do português e, vestindo a 5, pode fazer história.

Já vestiu a faixa de Campeão Carioca neste ano, pode vestir em dezembro a de Brasileiro e se vencer a Libertadores, pode – e por que não? – reencarnar o futebol produtivo do paraibano Leovegildo Lins Gama Júnior, na reedição da final contra o Liverpool 38 anos depois.

E com esse peso às costas, tem a responsabilidade de vestir um número que no panteão do futebol mundial diz muita coisa.

Sim, estamos lembrando de Zidane e Falcão também.

Tecnicamente ele não chega perto desses figurões da bola, mas com sua intensidade e vontade de superar seus limites, pode ir mais além do que qualquer cético ousaria apostar.

Arão pode surpreender os que nele não confiavam mas pode também – e deve para o bem do futebol – mostrar que nem todo camisa 5 tem apenas a obrigação de marcar.

Arão é uma espécie em extinção no atual cenário do futebol.

BROWN

por Marcos Vinicius


Na Comunidade da Cruzada de São Sebastião, um pé negro era destaque no cimento áspero daquele lugar pobre em recursos físicos mas rico em material humano: Adílio.

Garimpado pela insurgência da vida e revelado por seu Dominguinhos – ex-atacante do Flamengo na década de 1950 que jogou com Carlinhos Violino e Gérson -, jogar futebol era uma arte que poucos como ele sabiam fazer.

Não satisfeito, O Neguinho Bom de Bola – como seria chamado pelo radialista Waldir Amaral anos mais tarde – batia uma bolinha de vez em quando na Favela da Praia do Pinto, onde travava duelos inesquecíveis com um tal Júlio César, antes da bola rolar um anjo e com ela rolando se transformava em Lúcifer personificado em seus dribles.

Adílio chegou à Gávea em 1967 e, por ter um talento sobrenatural, fez história com a camisa rubro-negra.

Pelo Clube de Regatas do Flamengo, estreou em 1975 e ganhou absolutamente tudo.

Foi visto, vejam vocês, 615 vezes dentro de campo e seu brilho foi facilmente notado pelo jeito estoico de jogar.

Muitas das vezes, foi ação com a bola nos pés e produziu reação nos adversários, onde subentendemos que a famosa frase “toda ação gera uma reação” viesse daí.

Em algumas partidas, foi transpiração nas vitórias pelo mundo afora, empunhando a bandeira vermelha e preta nos territórios de grama verde mais inóspitos, onde todos eram sucessivamente sendo vencidos.

Não havia uma fórmula para vencer aquele Flamengo.

Havia sim, custe o que custar, a necessidade em parar alguns jogadores, o camisa 8 era um deles.

Fosse na bola – o que convenhamos, era difícil – ou na violência, como na pedrada desferida covardemente pelo zagueiro Mário Soto, que tirou sangue de seu rosto suado e áspero de quem queria apenas ser reconhecido como o maior das Américas, na decisão da Libertadores de 1981, no estádio Santiago, no Chile.

Vestir a camisa do Flamengo requer sacrifícios e Adílio deu seu sangue para que o triunfo fosse alcançado.

E conseguiu.


Atuou no Flamengo na primeira metade dos anos 1970 – quando imitava James Brown no versos de “Get up (get on up), Get up (get on up), Stay on the scene (get on up), Like a sex machine (get on up)”, e na coreografia presenciada às gargalhadas por Júnior, Luxemburgo, Geraldo, Manguito, Andrade, Zico e outros na concentração – a 1987, quando foi jogar no Coritiba, entregando sua camisa 8 para o jovem Aílton, que sagraria-se Campeão da Copa União.

Depois disso, não foi o mesmo, mas bastava, pois já havia escrito as seis letras de seu nome na história do clube.

Viu sua história de vida ser transformada em Adilio: Camisa 8 Da Naçao, livro escrito em 2013 por Renato Zanata e lançado no ano seguinte.

Sucesso, mas era pouco.

Se tornou o primeiro atleta que por mais tempo serviu ao Flamengo e não à toa é considerado um dos maiores camisas 8 do futebol brasileiro.

Para os flamenguistas, os saudosistas como eu, Adílio foi único.

Mas mesmo assim, era necessário mais.

Então, o semovente Sandro Rilho, responsável pelo “Projeto Bustos”, contratou o escultor Edu Santos, o mesmo que fez a estátua do inesquecível Maestro Junior, craque que mais vezes vestiu o Manto Sagrado.

Em seguida, foi a vez do inigualável Leandro, que só vestiu uma única camisa em sua vida profissional: a Rubro-Negra.

E agora o inquestionável Adílio, que inaugurou seu busto na sexta-feira, 26, na Gávea, numa merecida homenagem.

Adílio é funcionário do Flamengo e viaja o país com o Fla Master, onde continua encantador com a bola nos pés.

Viva a arte do futebol e seus verdadeiros artistas.

10VALORIZADO

por Marcos Vinicius Cabral


Diego chegou ao Flamengo em 2016, após a vergonhosa eliminação para o Fortaleza na segunda fase da Copa do Brasil.

Com status de craque e não como bom jogador que era, caiu nas graças da torcida.

Boa pinta, virou “sex symbol” entre as torcedoras que se aglomeravam nas arquibancadas dos treinos para vê-lo.

Acostumado a vestir a 10, o meia não pôde vesti-la quando chegou por já pertencer a Éderson e preferiu a 35 – em alusão às idades de Matteo e Davi, seus filhos – que foi um sucesso de vendas.

Dois dias após o anúncio da contratação, assinatura de contrato e apresentação, a foto do jogador já com o Manto teve mais de 100 mil acessos, ficando nos “Trending Topics” do Twitter – que são os assuntos mais comentados na rede social em todo o mundo – durante todo o dia.

Passou a vestir, então, a 10 de Zico, Deus Rubro-Negro, e segundo o portal Globoesporte, o seu número é a segunda camisa mais vendida, perdendo atualmente apenas para a 9 do atacante Gabriel, o Gabigol.

Diego – que entrou para a história do futebol apenas com o primeiro nome, mas hoje carrega o Ribas no sobrenome – foi Campeão Brasileiro de 2002, aos 16 anos, ao lado de Robinho.

Capitão e camisa 10, virou símbolo de um Flamengo claudicante.


Tirando o estadual, obrigação pela grandeza do Flamengo, o meia teve exibições decepcionantes em momentos decisivos do Brasileirão, Libertadores, mas principalmente na Copa do Brasi, onde ficou marcado.

Em 2017, desperdiçou a sua cobrança na final perdida para o Cruzeiro, esteve apagado na derrota da semifinal para o Corinthians no ano passado e, nesta quarta-feira, 17, escreveu o seu pior capítulo no livro dessa (sabe-se lá quando?) passagem pelo Rubro-Negro contra o Athletico-PR, nas quartas de final.

Foi um pênalti.

Mas não um pênalti qualquer, cobrado com força ou colocado, bem ou mal batido, mas displicente, tão sem vontade, que significou falta de respeito às cores do clube, à camisa, à história, aos companheiros de time, e à torcida, personificada em quase 70 mil no Maracanã e os milhões à frente da TV.

Um pedido de desculpas por parte do jogador seria o mínimo, não porque atenuaria a culpabilidade única e exclusivamente sua (Vitinho e Éverton perderam também suas cobranças), mas a Nação, que sustenta tudo isso, merece uma satisfação.

M DE MARADONA, DE MESSI E DE MORDILLO

por Marcos Vinicius Cabral


“As pessoas às vezes me perguntam como surgem as ideias. Para mim, está claro: elas são como borboletas, que voam de uma forma fugaz e eu tento capturá-las”, disse numa ocasião, Guillermo Mordillo, cartunista argentino e falecido no último sábado (29), aos 86 anos.

Argentino de Buenos Aires, onde nasceu, em 1932, Mordillo foi catapultado para o sucesso em Paris, no comecinho de 1963.

Por não ser fluente em francês, a ausência de legenda nos cartuns foi introduzida no seu traço firme e visualmente marcante no humor gráfico, tornando este estilo a marca registrada que acompanhou toda sua carreira.

Seus personagens de nariz grande arredondado ou a inserção de animais, especialmente a girafa em seus desenhos, não eram tão notados quanto à sua mensagem.

Toda uma geração de cartunistas foi privilegiada em ter podido ver na infância, muitos de seus maravilhosos trabalhos.

Beber desta fonte inesgotável e imitá-lo, não seria de se estranhar como muitos deles fizeram.

Assim como os conterrâneos Maradona e Messi, Mordillo foi nos campos de futebol, o camisa 10 de uma geração de cartunistas mundo afora.

Cracaço na acepção da palavra, sua genialidade não era nas jogadas, ou dribles desconcertantes, ou ainda gols inesquecíveis, mas sim em fazer o leitor ver, pensar e entender seu desenho.

E ele comemorava com uma ironia silenciosa.

Acreditamos que todos nós cartunistas, estamos sempre sozinhos e a criatividade é a única forma de nos fazermos menos isolados.

Portanto, Mordillo, com sua arte, dominou toda a extensão do gramado e fez a sua criatividade brilhar dentro das quatro linhas.

Não chutava uma bola mas a desenhava com riqueza incomum nos detalhes.

Neste esporte coletivo, chamado futebol, que continua com o poder de alcançar multidões, seu trabalhou alcançou o mundo.

E talvez tenha sido sua última vitória, em um país que produz extrasséries com a letra M de Maradona, de Messi e de Mordillo.

* Marcos Vinicius Cabral é jornalista, chargista, cartunista, caricaturista e artista plástico.

APLAUDIDO POR 40 MILHÕES

por Marcos Vinicius Cabral 


Em novembro do ano passado, um busto rubro-negro do imortal camisa 5 – que atualmente faz parte do staff de comentaristas da Rede Globo de Televisão – foi inaugurado no Centro de Treinamento George Helal, em Vargem Grande, Zona Oeste do Rio de Janeiro. 

– Muito obrigado a todos que ajudaram a realizar o sonho em ter uma estátua no lugar onde nascerão muitos craques  – disse na ocasião com o neto João no colo.

Idealizado pelo semovente Sandro Rilho e o Fla-Nação, a escultura do artista Luiz Eduardo dos Santos, ficou à altura da representatividade do Capacete para o clube e casou perfeitamente com o texto assinado por Bruno Lucena. 

Mas sobre o busto, mostra um Júnior estilo “Black Power” anos 1970 e 1980, que as gerações tiveram o privilégio de ver e ser locupletados com as conquistas da Libertadores e do Mundial, bem diferente do “Maestro” de 1992 com cabelos prateados que outras gerações seguintes viram na conquista do Campeonato Brasileiro daquele ano.

O registro fotográfico que acompanha esse artigo, em si, já dispensa comentários ou palavras para expressar o quão grande foi esse atleta.

Tão grandioso que se tornou um grande exemplo ao lado do saudoso Carlinhos (1937-2015), dando luz própria e brilho intenso às carreiras de Rogério, Júnior Baiano, Djalminha, Marcelinho, Piá, Nélio, Marquinhos, Paulo Nunes e Zinho, todos campeões nacionais ao seu lado em 1992.

Júnior não chegou à Gávea craque em 1973, mas foi sendo preparado para sê-lo.

Ao ingressar no clube à beira da lagoa, adentrou bruto pelos portões imponentes e teve a sorte de ter bons lapidários dentro e fora das quatro linhas: Modesto Bria, Jayme Valente, Pavão e Carlinhos, apenas para citar alguns.


Foi ganhando forma, se aperfeiçoando com tamanha habilidade, fascinando com sua elegância – ainda que precocemente – e como um diamante, foi desnudado e teve seu brilho mostrado nos gramados.

Deu a sorte – e que mal há nisso? -, pois ela caminha junto com quem é merecedor e trabalhador.

Vaidoso com a aparência ao extremo, fez o seu jogo se transformar em agradável aos olhos daqueles que torciam o nariz ao saber que com o nome de Leovegildo, poderia ser qualquer coisa, menos jogador de futebol.

Mas foi!

E foi também os poucos aprendendo a desvendar os mistérios da bola ao se arriscar, como aves marinhas costeiras ou oceânicas – essas que mergulham em alto mar à procura de alimento para sobrevivência e emergem com o peixe agonizando em seus bicos.

Sua maneira de sobreviver num esporte tão inóspito, foi através da dedicação, do amor e dos treinos exaustivos até o escurecer, onde apenas a lua e as estrelas presenciavam todo seu esforço.

Se privou de muita coisa enquanto suor e lágrima eram confundidos no rosto áspero daquele paraibano que ainda não tinha o famoso bigode, sua marca registrada – além do número 5, é lógico – até hoje.

Foi nas areias das praias cariocas, sua fiel companheira – além é claro, de dona Helô, mandatária do seu coração há 36 anos – que ia se reabastecendo para enfrentar os desafios.

Porquanto a praia foi local de hibernação do Leovegildo nas folgas, o campo, redenção de quem queria que o Júnior se transformasse em alguém na vida.

Batalhou, lutou, conquistou e se tornou verbo obrigatório terminados em “ar” de amar, que todos flamenguistas, conjugam em uma só voz: nós te amamos, senhor Leovegildo Lins Gama Júnior!

E não há de esquecer que Deus escreveu cada capítulo especial nas páginas de sua vida profissional dentro do Flamengo.

Exemplo?

Como explicar ele  lateral-direito em começo de carreira (lembram do gol contra o América/RJ na final do Carioca em 1974 do meio campo?), não ter que disputar posição com Leandro, recém chegado de Cabo Frio (e aprovado) em 1978 como lateral-esquerdo por Américo Faria?


“Obrigado, Senhor”, diriam os torcedores mais torcedores de todos os torcedores, por não vê-los disputar posição no mesmo Flamengo que ganhou tudo a partir de 1980.

E convenhamos, tanto Leandro como Júnior, foram monstros em sua pluralidade como jogadores.

Sobretudo enquanto um foi fazer sua independência financeira na Itália, por onde encantou os italianos do Torino e Pescara em cinco temporadas – daí vem o apelido de “Maestro” -, o outro permaneceu aqui desfilando sua elegância vestindo as camisas 2 e 3 e assombrando com suas pernas tortas e joelhos deteriorados.

Não obstante a isso, as homenagens nada mais são do que merecidas de quem foi e continuará sendo ao lado de Zico e Leandro – ambos reconhecidamente em estátuas também – a divina trindade rubro-negra nesses quase 124 anos.

O Museu da Pelada dedica um feliz aniversário para você Júnior, que completa hoje 65 anos de vida.