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Marcelo Mendez

ATLÉTICO MINEIRO 1976

por Marcelo Mendez

"Não precisa medo, não
Não precisa da timidez
Todo dia é dia de viver
Eu sou da América do Sul
Eu sei, vocês não vão saber
Mas agora sou cowboy
Sou do ouro, eu sou vocês
Sou do mundo, sou Minas Gerais"

Os anos 70 eram lindos em Minas Gerais.

O Estado crescia, os sonhos eram múltiplos e para além do futebol, o Brasil passou a ouvir umas vozes maravilhosas cantando letras épicas, canções belíssimas compostas por cabeludos talentosos

A rapaziada do Clube da Esquina, formada por Milton Nascimento, os irmãos Lo e Marcio Borges, Beto Guedes, Nelson Angelo, Fernando Brandt, Wagner Tiso, Robertinho Silva, fizeram os ouvidos do Brasil ficar atentos aos sons de Minas. Em campo não podia ser diferente.

Minas Gerais apresentava dois grandes rivais e toda a excelência de craques desfilando com arte em tardes ensolaradas no Mineirão. Porém, algo não estava bem para uma das metades do Estado.


Após ter vencido um Campeonato Brasileiro em 1971, o Atlético amargava uma fila em que seu maior rival, o Cruzeiro, nadava de braçada com um tetracampeonato entre 1972/1975. O técnico Tele Santana, escolhido para começar um trabalho a longo prazo, não contou com a paciência nem da torcida, muito menos da direção e foi demitido.

Na base, pouca atenção era dada e os jovens talentos do Galo eram espalhados para todos os rincões do País, para times como Nacional de Manaus, casos de Toninho Cerezo, Paulo Isidoro e Danival. Mas isso ia mudar.

No final de 1975, o técnico Barbatana assume. Os jogadores emprestados retornam e encontram Marcelo e Reinaldo, Heleno e Angelo. A magia estava pronta:

Surge então o Atlético Mineiro de 1976. Time que estrela hoje na série Esquadrões do Futebol Brasileiro.

"Agora não pergunto mais pra onde vai a estrada
Agora não espero mais aquela madrugada
Vai ser, vai ser, vai ter de ser, vai ser faca amolada
O brilho cego de paixão e fé, faca amolada"

Até 1976, em 11 Campeonatos Mineiros, o Cruzeiro havia vencido nove.

O implacável time de Zé Carlos, Tostão, Piazza, Evaldo, Raul, Nelinho, havia varrido as Minas Gerais com um caminhão de conquistas, entre elas, a Libertadores de 1976 e aquilo estava incomodando demais as Gentes do Galo.

Não dava mais para esperar.

Teria que ser “agora”


O Time da Molecada do Galo, sob comando de Barbatana, chegou invicto para a decisão contra a Raposa. Amassou geral, metendo goleadas implacáveis como o começo da competição; 6×1 no Sete de Setembro, 5×0 Nacional de Muriaé, 5×0 Esab, 5×0 no Guarani MG, 8×0 no Nacional de Uberada.

Eram espetáculos de bola em tardes que jamais seriam esquecidas por quem as viveu no concreto da arquibancada do Mineirão. Um timaço, rápido, habilidoso, inteligente, uns moleques abusadissimos como Heleno, Ziza, Reinaldo, Marcelo, Paulo Isidoro, Marcio e uma campanha primorosa. Mesmo assim, o Cruzeiro era tido como favorito para a decisão.

Mas isso também ia acabar…

"A espera na fila imensa
E o corpo negro se esqueceu
Estava em San Vicente
A cidade e suas luzes
Estava em San Vicente
As mulheres e os homens
Coração americano
Um sabor de vidro e corte"

Em dois jogos com mais de 100 mil pessoas no Mineirão, o Brasil viu a máquina Atleticana amassar o Cruzeiro em duas partidas vencias pelo mesmo placar; 2×0. Nas duas, Reinaldo, o Rei, deitou na zaga cruzeirense, meteu gol, chapéu, caneta, fez o diabo!


O Atlético acabou com a hegemonia do rival e mais que isso; A partir de 1976 tomou conta do futebol mineiro e venceu tudo até 1983, sendo conhecido como o time do Hexa. Nesse período o Galo conquistou o respeito nacional com grandes campanhas no Campeonato Brasileiro, conseguindo dois vices, em 1977 e no controverso 1980.  Fez história.

E quem faz história, entra nessa série. Nossas odes ao Atlético Mineiro de 1976, time que começou uma dinastia e que figura aqui:

Com 31 jogos, 26 vitórias e cinco empates. 81 gols feitos e oito sofridos, o Atlético Mineiro de 1976, ganha seu lugar de honra em Esquadrões do Futebol Brasileiro.

FLAMENGO 1981

por Marcelo Mendez


Foi uma tarde dos anos 80…

Um presente do Pai daqueles que a gente não esquece; Aos 11 anos de idade, conhecer o Maracanã lotado de 160 mil vozes, apaixonadas, munidas de um sentimento que só o futebol pode propiciar e nem sempre explicar.

Lá dentro do Maraca lotado, ainda com o som do Bob Dylan cantando “Homesick Subterranean Blues”, no carro que nos trouxe pela Dutra afora, até a Cidade mais linda do mundo, tudo era “normal” até a hora do placar eletrônico do Maracanã começar escalar o time do Flamengo, número por número, junto com a torcida rubro-negra; 5 – Júnior (EEEEEE!!! Júnior, Júnior, Júnior…) 8 – Adílio (EEEEEE Adílio, Adílio, Adílio) 9 – Nunes (Nunes, Nunes, Nunes) Aí veio a catarse…

De repente, a massa rubro-negra se levantou do concreto do Gigante. Todo mundo de pé, bandeiras tremulando, fogos espocando e o placar eletrônico parado, não punha mais nenhum nome. Apenas o número 10 apareceu no placar. Aí o 10 piscava e o povão entrava em transe. Então veio, letra por letra; Z-I-C-O.

!!!!!


O Maraca veio abaixo! A massa explodiu num coro lindo… “EI, EI EI O GALINHO É NOSSO REI… ZICOOOOO, ZICOOOOO, ZICOOOOOO”

Naquela tarde eu, um menino Paulista com 11 anos de idade, tive a certeza que não tinha errado no ídolo que escolhi. E agora, em Esquadrões do Futebol Brasileiro, vamos contar a história de um time que marcou a vida deste que vos fala, de tantos outros que assim como eu, escolheram o camisa 10 da Gávea como herói:

É a hora do Flamengo de 1981!

O PACTO DO BARRIL 

Dudu Monsanto é Jornalista, Escritor, bom em tudo que faz. Entre todas as ótimas coisas que fez, Dudu escreveu “1981 – Ano Rubro-Negro”, falei com ele para saber de suas impressões sobre um episódio que ajudaria a formar esse time. Antes, uma apresentação:

Tita era um jovem talentoso vindo da base do Flamengo.

Cheio de personalidade, ótimo jogador, na disputa de pênaltis não se fez de rogado; Foi lá bateu e como conseqüência, o barulho seco da luva de Mazzaropi ecoou por todo Maracanã rubro-negro daquela noite de 1977. O Vasco foi campeão após Dinamite converter a última cobrança. Mas o Flamengo tomou uma atitude totalmente diferente.


– Barril 1800 era um bar/churrascaria na praia de Ipanema. Preocupados em consolar o Tita que havia perdido o pênalti na decisão, a galera foi pra se fechar pra conversar, para lavar a roupa suja, para tentar entender como havia se perdido duas vezes nos pênaltis. Foi algo que mudou todo o rumo do clube!. – Dudu está certo:

Ali se formava um dos maiores times de todos os tempos.

1978, 1980 O BRASIL É RUBRO-NEGRO

A equipe toma corpo.

Com Claudio Coutinho no Banco, Zico, Adílio, Carpegiani, Julio César, Claudio Adão, Rondinelli na zaga, Toninho Baiano e Junior nas laterais, mais a chegada do goleiro Raul, o Flamengo vence o Carioca de 1978 e vai para uma final épica contra o Atlético Mineiro no Maracanã.


No que pese todas as controvérsias daquela decisão, o Flamengo vence por 3×2 com um gol de Nunes na segunda etapa e marca seu nome em nível Nacional pela primeira vez.

Mais do que a Festa, o título inédito credencia o Flamengo para algo grande, algo inédito até então. O Rubro-Negro iria tentar conquistar a América. 

VEM PRO BANCO, PC!

O ano de 1981 não começou fácil para o Flamengo.

Teve eliminação do Campeonato Brasileiro, desconfiança e uma mudança de técnico pouco usual para a época:

Paulo César Carpegiani sai do meio campo para o banco de reservas. Ele foi o escolhido para substituir Dino Sani, que já havia substituído o Capitão Coutinho. Uma nova fase se inicia na Gávea e a Libertadores da América é a meta.

RUBRO-AMÉRICA!

 – O Flamengo passou até que de maneira tranquila na primeira fase. Após a batalha do Serra Dourada, pegou um grupo com Deportivo Cali e Jorge Wilsterman, evitando os confrontos com os Argentinos. Dalí saiu para a final” – relembra Dudu Monsanto

Dudu lembra dos jogos chatos em Cochabamba, em Cali, mas ressalta que os problemas do Flamengo não estavam ali. Viria pela frente em seguida, vestido de laranja e com ares desérticos…

COBRELOA

Aos 11 anos de idade eu não fazia a menor ideia do que se tratava a coisa.

Muito menos havia ouvido falar de Calama, deserto de sei lá o que, minas, todas as essas coisas. Mas o time do Cobreloa vinha de lá e para chegar até a decisão fez grandes estragos pela Copa. Dessa forma, chegava ao Maracanã credenciadíssimos:

– Não chegaram à toa não. Era um time bastante interessante com bons jogadores, como o goleiro  Óscar Wirth, titular do Chile na Copa de 1982, o zagueiro Mario Soto. Fizeram muito boa campanha e daria trabalho ao Flamengo – conta, Dudu Monsanto. De fato era um time interessante. Mas que ficou conhecido por outras características, bem menos nobres.


A BATALHA DE SANTIAGO E A GLÓRIA EM MONTEVIDEO

A segunda partida seria no Estádio Nacional de Santiago e da ditadura de Pinochet que o fez de masmorra oito anos antes. O clima não poderia ser pior.

– Chegamos e vimos um corredor polonês formado por guardas de escudos e cassetetes. Ao entrarmos, eles estreitaram o corredor e ali mesmo já tomamos uns dois ou três pescoções cada um – relataria Adílio, em entrevista para o Globo Esporte, anos depois.

A partida em Santiago foi um inferno de pancadaria, pressão e o escambau. O placar final de 1×0 fez com que a decisão fosse para o terceiro jogo em campo neutro e ali não teve jeito, porrada nenhuma parou o Flamengo.

Em uma das melhores partidas da vida de Zico, o Flamengo mete 2×0 no Cobreloa, volta com o título, mas não tem muito tempo de comemorar. Faz as malas e vai embora atravessar céus e mares.

Faltava o Mundo…

ESSE TAL DE LIVERPOOL

É preciso que se entenda o mundo em 1981.

Para um moleque de 11 anos do ABC Paulista, Palmeirense, sofredor pra danar, ver um time Brasileiro ir até o Japão enfrentar um outro time, mas europeu, era algo pomposo demais.

E que time!


O Liverpool de 1981 era um timaço, que tinha em suas linhas jogadores como Kenny Dauglish, Ian Rush, o goleiro Ray Clemence e toda a pompa de ser o campeão da Europa. Chegou no Japão todo montado em ternos, gravatas, narizes em pé e outras coisas muito comuns para uma época em que o intercâmbio era nenhum.

O Flamengo foi a campo com a sua formação clássica: Raul, Leandro, Marinho, Mozer e Junior/ Andrade, Adílio e Zico/ Tita, Nunes e Lico.

Foi um baile de bola!

Com dois gols de Nunes e um de Adílio, o Flamengo mete 3×0 no Liverpool em 20 minutos de jogo. O segundo tempo, foi só pra rolar a bola, meter na roda e já pensar na festa. Flamengo, Campeão do Mundo!

Mas ainda num ia dar pra fazer a festa.


O Flamengo precisava resolver um problema em casa.

O RIO TAMBÉM É FLAMENGO

Entretido em meio a tantas decisões, o Flamengo que precisava de um empate em três partidas com o Vasco, perdeu as suas primeiras partidas. Mas na terceira a coisa foi diferente.

Com o 2×1 no placar, um show de Adílio, o Flamengo termina o ano de 1981 com três títulos enormes e uma página maravilhosa em sua história. O time do Flamengo era o maior time do mundo e hoje, fica fácil apontá-lo como o maior time da história do clube, um dos maiores do futebol mundial. Mas tudo isso, se resume em uma frase do amigo Dudu Monsanto, quando ele comenta a motivação de fazer o livro sobre esses anos:

– Sabe aquele seu avô, que todo mundo fala muito bem dele, mas que você não pode conviver? Pois bem, pesquisar, estudar e falar desse Flamengo foi isso. Eu consegui viver uma época que não vivi, que não pude acompanhar. O Flamengo de 1981 foi como resgatar o meu avô!

E sem mais, depois de Dudu, me despeço com todas as odes a esse time.

Flamengo de 1981, um dos maiores Esquadrões do Futebol Brasileiro

ESQUADRÕES DO FUTEBOL BRASILEIRO

VASCO 1977

por Marcelo Mendez


Na nova série para o Museu da Pelada, decidi por algo que sempre me chamou atenção, que sempre me aguçou os sentidos em se tratando de futebol. Decidi por falar dos grandes clubes do futebol do Brasileiro, mas não apenas isso. 

Quero falar de máquinas de sonhos, de artilharias pesadas, de estufamento pleno de todas as redes.

Quero falar dos maiores Esquadrões do Futebol Brasileiro.

Para começar, vou falar de algo afetivo, de um grande time que marcou, mas não apenas por títulos e vitórias. Do ponto de vista lúdico, sob o olhar de um menino de apenas sete anos de idade, que passava a descobrir as ondas do rádio e o futebol, essa equipe foi fundamental para eu entender do ludismo do futebol

A série Esquadrões Do Futebol Brasileiro, pega carona na máquina do tempo e vai para 1977 para falar do Vasco, o Vascão 77.

Vamo lá…

ERA UM MUNDO LEGAL EM 1977

A ligação afetiva de quem vê futebol aos 7 anos de idade é algo que te marca para o resto da vida. Morava em Santo André. O Parque Novo Oratório ainda era algo bucólico, as marcas de asfalto eram poucas, a pressa não havia e a vida era quase que contemplativa.

Nasci num quintal cheio de primos, na casa da Avenida das Nações, até 1975, quando mudamos para nossa casa. Todavia, a ligação com os primos e primas era muita para deixar de haver de um dia para outro. Então, eu, menino de 7 anos vivia no quintal da Tia Leoni, onde uma das casas era nossa.


Ali tinha os primos, Zé Carlos e Tine, todos mais velhos, as primas, Lourdes, Miriam, Silmara, Marlene, Mirian e Angela. E meu Tio João. Foi com ele que descobri o “Futebol Compacto” da Tv Cultura de domingo à noite. Era o VT da rodada do Campeonato Carioca que passava pra gente às 20h do domingo.

Numa noitada daquelas, descobri um dos narradores que mais gosto, de nome José Cunha, um cara de voz rouca, cheio de onda, narrador carioquissimo que não gritava gol quando o sujeito estufava as redes; “Isso é televisão, o cara tá vendo que foi gol. Pra que vou dizer isso?” – Dizia. Foi com o Zé, não gritando gol, mas gritando “Roberrrrtôôôôôô”, que descobri que no Rio de Janeiro de 1977, havia um camisa 10 que dinamitava todas as defesas de lá e que o time que ele jogava, era um timaço.

BLACK RIO!

O Rio de Janeiro era um barato em 1977!

Nos subúrbios a black music fervia os bailes com Tim Maia, Cassiano, Carlos Dafé, com as equipes de baile e as orquestras como a Banda Black Rio. Uma lindeza! No maracá, o show ficava por conta do Vascão.

Um timaço que desde o começo, dava cara de ser um baita time, como conta Zé Mário, o volante, Gerente da meiuca daquele time:

– Desde as primeiras trocas, desde o principio de tudo, deu pra perceber que o time tinha potencial. Chegaram Geraldo e Orlando Lelé do América, Marco Antonio veio do Fluminense, Dirceu… O time foi tomando forma, com o Orlando Fantoni no comando.”


Na meiuca, além de Zé Mário, tinha Zanata e Fumanchu. O Ataque era avassalador; Ramon, Roberto Dinamite e Wilsinho Xodó da Vovó. Uma máquina que varreu com todo mundo em goleadas homéricas, como 6×0 no Bangu, 7×1 no Madureira, Passeio no Fluminense, Flamengo, Botafogo, em Geral toda. O Vasco venceu os dois turnos, para ser campeão do Cariocão.

Depois disso, o Vasco demorou a ser feliz. A chegada de uma nova geração, formaria um outro esquadrão, esse, eu vi jogar muito, mas muito.

Mas essa história fica pra outra hora.

Por hora, vamos cantar de coração; O Vascão 77 foi um puta dum timão!

O DIA DE LAVAR A ALMA DE VERDE E A NOITE MAIS LINDA DO MUNDO

por Marcelo Mendez

Era um dia frio em São Paulo.

Aos meus 23 anos de idade, já sem muita inocência, nada de pueril em mim, um homem que é santo sem abrir mão de seus pequenos pecados, de suas tantas heresias, de suas paixões avassaladoras que tantas madrugadas lhe custava.

Esse era eu, naquele 12 de junho de 1993. Um sábado pela manhã que acordei triste, mas que por conta de uma trajetória de fé, de vida toda, precisei trocá-la por uma ansiedade. Coisas da vida. Eu tinha um namoro capengante com Cecília, por culpa de todas as minhas cagadas, uma relação que beijou o vento do precipício, um domingo antes, no dia 06 de junho.


Pela primeira partida da final do Paulistão de 93 o Palmeiras perdeu para o Corinthians por 1×0, gol do Viola. Na comemoração, ele abaixou, imitou um porco, tirou sua onda e novamente os fantasmas todos na cuca, novamente a volta do trio, Eu, Meu Pai, Tio Bida, tristes, solitários nas emoções, sem ter o que fazer da vida.

Pedi pro Tio me deixar na casa dela. Cheguei, entrei, ele ouvia uma musica de uma banda inglesa, daquelas que num tinha saco pra ouvir; Inspiral Carpets. Entrei acabado e ela falou:

– Sério mesmo? Você tá assim por conta dessa porcaria desse jogo? Você, cara culto, bem informado, sujeito inteligente… Por causa de um jogo??

Foi o fim:

– O que? O que você tá me falando? Cê tá comigo há um ano e meio, sabe de mim, da minha história, do que eu sinto, do que eu sei… Porra; Olha pra minha cara, caralho! Você acha que se fosse só isso aí que você está dizendo, eu estaria assim, desse jeito?

A discussão foi grande demais para o relato. Basta saber que saí de lá com dois discos do Lou Reed, um livro do Paul Verlaine fui pra casa lamber minhas feridas.

Assim o fiz a semana toda, a pior semana para ser Palmeirense. Muita tiração, muita onda dos outros times, muita duvida. A semana de 06 até 12 de Junho de 1993 parece ter durado 20 séculos. Mas passou.

A manhã se inicia em 12 de junho. Naquelas primeiras horas, tudo era tão somente, incerto…


Sábado, 07h30min da manhã:

Meu pai me acordou com umas batidas na porta.

Sábado, 07h30min da manhã:

Meu pai me acordou com umas batidas na porta.

Sábado, 07h30min da manhã:

Meu pai me acordou com umas batidas na porta.

Na noite anterior, eu enchi a cara de campary, de dor de amor e de tudo para ver se conseguia dormir. Desmaiei. Mas quando o Velho me acordou eu nem tive tempo de ter ressaca:

– Toma (Me falou esticando meu ingresso em minha direção) Dessa vez a gente não vai junto.

– Como assim, Pai? Ta maluco? Vamo como sempre fomos já falei com Tio Bida…

– Não. Olha, filho, você me conhece, sabe que num acredito nessas coisas, mas não é possível, deve ser a gente. Dessa vez, vamos separados para não dar azar!

– Mas, Pai, isso é ridículo!

– Vindo o título, que seja assim ridículo!

Sem muito poder argumentar, meio que topei a coisa. Peguei meu ingresso da numerada inferior, com a promessa de por lá, não ver o jogo ao lado de meu Pai e meu Tio. Era uma agonia enorme, de um dia que não passava, de um tormento que insistia em existir. Mas mudaria.

Dessa vez, seria diferente.

Foda-se a Combinação!

Eu não quis sofrer com a espera do jogo.

Meti o fone de ouvido do Walkman, com uma fita cassete do Lou Reed no ouvido e entrei num transe que acabou quando a bola rolou. Que acabou quando o Antonio Carlos ganhou uma dividida com o Neto, que quase gritou gol numa jogada de fundo que o Edmundo não concluiu bem. Que viu o paraíso…

Quando a perna direita do canhotíssimo Zinho meteu a bola para o fundo das redes, eu fui feliz como poucas vezes na vida. Era um peso que saía das costas, uma perspectiva de felicidade no caminho, que carreguei ao longo do jogo que acabou 3×0.

Faltava apenas um empate na prorrogação para o Palmeiras ser campeão.

Ser campeão…

Edmundo sofreu um pênalti que ele não queria sofrer. Tentou ficar de pé de todas as formas, mas não deu. O zagueiro Ricardo o levou ao chão. Agora era vez e Evair, o nosso matador Evair fazer o que ele sempre fez muito bem. Na hora, pensei:

– Vai dar errado!

Sim. Eu era do Palmeiras que perdia para o Bragantino, Pra Inter de Limeira, pro Xv de Jaú, pra Ferroviária. Eu era parte daquele Palmeiras que nasceu para não dar certo. Tudo aquilo de bom não era pra mim. Abaixei a cabeça e sentei. Eu não queria ver, num queria sofrer de novo, até que no meio daquilo tudo, senti alguém me batendo no ombro. Levantei a cabeça e vi:

– Pai!


– Pênalti pra nós, filho!

– Mas a gente num tinha combinado…

– Foda-se a combinação! Agora é hora da gente ser feliz!

– Tá, mas eu num quero ver…

– O que? Depois de tudo que a gente passou, depois das tantas vezes que saímos daqui tristes, você não vai querer ver o Palmeiras ser campeão?

– Vai bater!!!

Era meu Tio Bida que também havia chegado, avisando a gente.

Naquele momento, Evair começou a corrida em direção a bola a impressão que tínhamos é que aquela corrida havia começado em 1976 e que ao chegar na bola, aí sim, em 1993.

“GOOOOOOOOOOOOOOOLLLLL” o barulho em uníssono de uma torcida que cantava e vibrava pra valer. Um grito que eu não ajudei, não participei.

Na hora que Evair balançou a rede do goleiro Wilson, ao invés de gritar gol, eu abracei meu pai. Abracei Seu Mauro com força, com um choro que veio da alma, pra descarregar tudo aquilo que tava me doendo desde sempre. Tio Bida abraçou a gente e assim a gente comemorou aquele gol.

Depois dele, eu só chorei. Chorei até o fim do jogo, mas um choro de emoção pura, alegre, feliz.

O Palmeiras é campeão!

Como era gostoso gritar aquilo! Como foi boa aquela noite. Posso dizer seguramente que uma das maiores alegrias da minha vida.

Ao longo dos tempos tive outras, tantas outras. Mas peço licença a estas outras pra eleger o 12 de junho de 1993 como a noite mais importante da minha vida. Por conta de tudo, e por conta de algo que faltava:

Tendo a Lua…

Madrugada alta, 04h40min e eu bêbado na frente da casa da Cecilia:

– Ceciliaaaaaaa!!! – a luz se acendeu, a mãe dela me chamou pra dentro, mas não quis. Eu queria a rua e mundo todo para mim. Cecilia entendeu e saiu:

– Oi, Marcelo, que foi? – perguntou com um riso na cara:

– Cecília, olha só. Eu te amo. Não mais que o Palmeiras, claro. Mas te amo. Então cê me perdoa e fica comigo? Prometo nunca mais fazer merda!

– Marcelo, você ta bêbado…

– Claro que sim, caralho, o Palmeiras foi campeão! Que mundo cê vive?

– Um outro, bem diferente desse seu.

– Então deixa eu ser o ET da sua vida!

Ela gargalhou nessa hora e eu aproveitei:

– Para de brigar comigo e me amaaa. Beija eu, Ceciliaaaaaaaa!

Ela me abraçou rindo.

Bom, o que aconteceu depois disso importa sim, mas não pra esse momento. Não nos casamos, não ficamos juntos, somos grandes amigos até hoje, mas nada disso importa como falei.

Abraçados entramos na casa da Cecília. Assim ficamos. Os Paralamas do Sucesso cantavam “Tendo a Lua” no cd player e pronto.

A maior noite da minha vida em 1993…

DEZ VEZES VERDES E UM PORRE REDENTOR

por Marcelo Mendez


De tudo que posso lembrar-me do domingo, a última coisa que disse antes de entrar em estado delicioso de torpor etílico foi: “Deyverson, eu te amo”.

Assim como tantas outras vezes eu disse que o odeio, que o detesto, que não joga nada, que é maluco, que é grosso e caneleiro. Mas daí vem o titulo do Palmeiras do Brasileirão em 2018 e nada do que foi dito importa.

Só vale então o que se sente.

Um titulo do Palmeiras para mim tem o gosto do picolé da Yopa que meu pai comprava para mim na frente do Parque Antártica, lá pelos anos 70. Tem o cheiro daquela chapa de pernil, pronta pra preparar os mais deliciosos lanches que já comi. Tem a velocidade do carro do meu saudoso Tio Bida, a nos levar para embates épicos pelas arquibancadas de São Paulo ao longo da vida.


Vale muito.

Vale minha busca intrínseca pelo riso do rosto de vocês, meus iguais Palmeirenses, vale pelo meu ofício de cronista, de procurar a mínima centelha de faísca para através dela, incendiar o coração de vocês, para criar uma labareda de encantos, em meio a esse mundo duro e frio que insiste em se fazer presente.

As melhores vezes que consegui isso foram através do Palmeiras.


Portanto agora, as 05h27min da manhã da segunda, vestido de verde e tomando café numa padaria do Parque Novo Oratório, eu saúdo a todos vocês que assim como eu, deram um tempo na chatice da razão critica, da razão pura e simples e de todas as lógicas que se impõe no dia a dia nosso.

Já, já a gente volta às responsabilidades.

Agora comemora Palmeirense.

Comemora que a gente merece.