por Péris Ribeiro
Quando um emocionado Diego Maradona chegou junto ao balcão da Casa Rosada para, ao lado do presidente Raúl Alfonsín, erguer a Copa do Mundo à multidão em delírio, não havia questionamento que fosse sobre quem era a típica figura de um deus encarnado vivo para o povo argentino. Nem mesmo no mais venturoso dos sonhos.
Corria o ano de 1986, e Dieguito, naquele instante, era maior até que Gardel – ou Perón. E até ousaria dizer mais: nem Evita Peron, a santa redentora dos humildes, a eterna madona dos descamisados, seria capaz de vencê-lo num duelo em termos de idolatria popular.
Era a Maradomania, que se instalava de vez no coração de um povo profundamente apaixonado. E, convenhamos, havia motivo de sobra para tal. Tanto assim que a Argentina acabava de se sagrar campeã mundial pela segunda vez, em gramados mexicanos. E quem, senão Don Diego Armando Maradona, havia tornado aquilo possível?
Hoje, bem sei, os caminhos por ele trilhados acabaram sendo outros. Cada vez mais tortuosos. E é com infinito pesar, que me vejo descrer de vez da ilusão. Tão somente por chegar à conclusão de que, nunca mais, verei pelos campos a arte fulgurante de um jogador de sonhos. Capaz, só ele, de repetir o fenômeno Garrincha de 1962. Os dois dando uma Copa, praticamente sozinhos, aos seus respectivos países – Brasil e Argentina.
Porém, o que anda a me entristecer ainda mais é que, com esse futebol de negociatas escusas, e mais pobre ainda de craques – que dirá de gênios! -, teremos lá pelos gramados do Catar uma Copa de brilho duvidoso.
Mbappé? De Bruyne? Messi? Modric? Cristiano Ronaldo? Lewandowski? Neymar? Benzema? Harry Kane? Nenhum deles – asseguro-lhes – irá dar mostras da centelha de genialidade que, um dia, emanou da canhota mágica do rebelde Dieguito. E ainda irei mais longe. Em que pese o brilho de um Zico, um Platini, um Falcão, um Boniek, um Rummenigge, não houve termos de comparação entre eles e o iluminado Maradona, na maior parte dos Anos 80. Era ele, sim, Don Diego, o maior de todos naqueles tempos dourados!
Campeão pelo Barcelona, pelo Napoli e pelo Boca Juniors do seu coração, aquele irrequieto baixinho de cabelos encaracolados, nada mais fez que proporcionar a alegria das grandes conquistas às torcidas mais desafortunadas. Uma gente sofrida, carente anos a fio. Sempre vivendo tão longe, da doce comemoração de um título de campeão.
Aliás, ao erguer aquela Copa, ao lado do presidente Alfonsín – bem me lembro das imagens-, Dieguito vivia, muito mais que a emoção, o infinito orgulho de ser portenho. Tanto que dizia, sorriso aberto, lágrimas nos olhos:
– Essa é uma conquista definitiva, para engrandecer de vez o nosso país. É uma homenagem nossa, a todo o povo argentino. E também aos velhos craques do passado, heróis como, Stábile, Labruna, Di Stefano, Sívori…
Só que, maior que essas históricas legendas – e maior, ainda, que Pedernera, Nestor Rossi, Moreno, Rattin… -, será sempre ele, Maradona.
Sobre quem a mais feliz definição que encontro é a de, ao imaginá-lo bola atrelada ao mágico pé esquerdo, ver-lhe no gesto a grandeza do mais comovente dos poemas de Borges. Ou o frenesi desenfreado, do mais passional dos tangos de Gardel.