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Manga

MANGA – O MAIOR GOLEIRO DA HISTÓRIA DO BOTAFOGO

por Elso Venâncio

Nos anos 60, o Botafogo era o mais temido rival do Flamengo. Os rubro-negros antigos têm bronca até hoje do clube da Estrela Solitária.

O Botafogo formava grandes esquadrões. O time bicampeão carioca de 1961/62 é considerado um dos maiores da História: Manga, Joel, Zé Maria, Nilton Santos e Rildo; Ayrton e Didi; Garrincha, Quarentinha, Amarildo e Zagallo. Na final, 3 a 0 no Flamengo, com o Maracanã presenciando uma das maiores atuações do “Gênio das Pernas Tortas”, Mané Garrincha, o “Charles Chaplin” do Futebol.

Manga, maior goleiro da história do clube, era uma atração à parte. Um gigante, de 1,86m, com mãos enormes e que atuava, acredite, sem luvas!

Recordo que, na minha infância, fui a General Severiano somente para ver o Manga. Sim, ele. E não Garrincha, nem os muitos bicampeões do mundo. Treino técnico, comandado por Marinho Rodrigues, pai adotivo do Paulo César Caju e do Fred. Várias bolas na entrada da área e uma fila de craques ensandecidos, ávidos por chutar a gol. A pequena área era careca. Arquibancada lotada, parecia jogo. Manga, num repente, grita:

– Aqui é comigo!

Garrincha, Didi, Zagallo, Amarildo, Quarentinha e por aí vai… todos preparados, ansiosos para queimar a gol.

Zagallo, no entanto, preferiu bater colocado.

– Chute de merda! – reagiu o goleiro.

Caso levasse um gol – o que, convenhamos, demorava a acontecer – entrava outro na posição.

Adalberto, Amauri e Ernâni, os reservas, observavam com atenção ao lado da baliza.

– Aqui é o Manguinha… a bola não entra!

Quarentinha solta um canhão no ângulo. Manga se espicha todo e espalma, ralando o braço na terra batida. Levanta, cospe nos dedos, esfrega as mãos e clama:

– Mais um!

Surge Didi, com sua “Folha Seca”. Atrás do gol, um garoto de 12 anos fazia a reposição das bolas. Ele, que se tornaria um dos maiores do futebol, Paulo Cezar Lima, ganharia o apelido de Caju.

Aliás, tempos mais tarde, o ídolo Paulo Cezar me contou uma história bastante curiosa. Era o ano de 1968 e o Botafogo foi disputar um torneio no México. Estreou vencendo o América por 2 a 0, no Estádio Azteca. O jornal local ‘El As’ abriu a seguinte manchete:

“Cao te hace olvidar Manga” (tradução: ‘Cao faz esquecer Manga’)

No dia seguinte, Manga, que tinha operado o joelho, chamou o Dr. Lídio Toledo e determinou:

– Tira os pontos, que eu vou jogar.

De imediato, foi avisar seu reserva, o novato Cao:

– Ô, juvenil, vem cá… Juvenil, você tá fora. Não entra mais!

E nos dias que antecediam clássicos contra o Flamengo?

– Nega Velha, vamos para a feira na Álvaro Ramos gastar o bicho!

O ‘Jornal dos Sports’ estampava na primeira página:

“Manga diz que contra o Flamengo o bicho é certo”

Hailton Corrêa de Arruda, nome completo de Manga, não gostava de formar barreira:

– Abre! Abre! Eu sou a barreira!

Hoje Manga tem 85 anos e, não sei se você sabe, mas o Dia do Goleiro no Brasil é comemorado em sua homenagem em todo 26 de abril, ou seja, no aniversário dele.

Manga, pernambucano que começou no Sport Recife, foi ídolo em vários clubes do Brasil e também no exterior. Vive hoje ao lado da esposa, no Retiro dos Artistas, em Jacarepaguá. Vida longa à lenda!

MANGA, OBRIGADO POR TORNAR O BOTAFOGO IMORTAL

por Marcos Vinicius Cabral


Estive com a equipe do Museu da Pelada no Retiro dos Artistas em Jacarepaguá, Zona Oeste, para fazer com o ex-goleiro Manga, a primeira entrevista presencial para o quadro Vozes da Bola.

Contador de histórias e com o semblante tranquilo que nos lembrou da época em que fechava o gol quando se tornou campeão em todos os clubes que atuou e recordista brasileiro em participações na Libertadores da América.

Ser humano inclassificável, seu Haílton Correa de Arruda, de 83 anos, contou muitas histórias nos poucos mais de 60 minutos de papo.

Se o goleiraço, que entre 1968 e 1972 foi bicampeão carioca pelo Botafogo, campeão da Libertadores de 1971 pelo Nacional-URU e tetracampeão uruguaio elevou seu nome no cenário esportivo, mostrou ser bom de papo.

Ora, como deixar de fora o episódio com João Saldanha, que resultou numa briga com direito a tiro? E da famosa história da feira antes dos jogos contra o Flamengo? Do amor ao Glorioso, não titubeou: “Sou apaixonado pelo Botafogo”, quando questionado por Sergio Pugliese.

Obrigado, Senhor, por realizarmos a primeira (de muitas, se Deus quiser) entrevista para o Vozes da Bola, quadro criado em parceria com Fabio Amaro de Lacerda.

Que venham outras e outras e outras…

Mas o camisa 1 do Sport, Botafogo, Nacional-URU, Internacional, Operário-MS, Coritiba, Grêmio e Barcelona de Guayaquil, merece nosso carinho e nosso respeito. Sempre!

Vida longa ao Manga, o goleiro que não usava luvas e tinha o dedo anelar e o mínino das mãos tortos em decorrência das bolas defendidas por ele.

MEU AMIGO MANGA

:::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::


O Brasileirão está em sua reta final e meu Botafogo já garantiu sua vaga na Segunda Divisão. O Vasco deve seguir o mesmo caminho e alguns torcedores, irados, apedrejaram a entrada social de São Januário. O VAR continua gerando dúvida e os estádios não tem previsão de serem abertos ao público. A polêmica da vez foi uma falha no sistema no jogo entre Vasco x Internacional! Os comentaristas continuam me irritando e até quando teremos Leonardo Gaciba como diretor de arbitragem?

O próximo campeão desse campeonato medonho não terá nada de novo para nos apresentar, assim como o campeão da Libertadores não teve. Continuo na torcida por Guardiola, que há anos vem remando contra a maré. Mas não estou com ânimo para falar sobre esse futebol atual, ainda mais depois do sábado especialíssimo que vivi ao reencontrar o lendário goleiro Manga, o maior que vi em toda a minha carreira. Está no Retiro dos Artistas acompanhado de sua mulher, a equatoriana Maria Cecília.

É difícil explicar às novas gerações quem foi Haílton Corrêa de Arruda, o Manga, e todo aquele grupo espetacular do Botafogo, na década de 60, do qual depois, orgulhosamente, fiz parte: Paulistinha, Zé Maria, Nilton Santos, Ayrton Povil, Rildo, Garrincha, Didi, Amarildo, Quarentinha e Zagallo. Meu pai treinou esse timaço. Não quero desmerecer o Botafogo de hoje, mas me entristece demais ver toda essa história soterrada, manchada, tratada com desleixo. Ali, sentado, ouvi Manga reviver várias histórias que nem lembrava mais. Não usava luvas e chegou a jogar com dedos quebrados, cabeça rachada e diversos problemas físicos.

Não me peçam para comentar a vitória do Flamengo, me deixem mirar os dedos retorcidos de Manga e ouvi-lo contar sobre o dia que defendeu um chutaço de Nelinho com apenas uma das mãos. Manga foi campeão no Sport, Botafogo, Nacional, do Uruguai, Internacional, Coritiba, Grêmio e Barcelona, do Equador. É ídolo do Operário, de Mato Grosso. Me deixem pensar em Manga porque ele não dá para ser explicado. História linda, mas pouco reconhecida, o que não é de se admirar no Brasil.

Saí do Retiro com a alma aliviada e fui com os amigos Rodrigues e Leo Russo para o Bar do Helinho, ali perto. Helinho, esse mesmo, ponta ensaboado de Botafogo e Vasco. Pelo celular, falei com Edson, outro ponta do Botafogo. Daqueles que quando pegava a bola a torcida levantava. Por favor, não me peçam para falar do futebol atual, me deem uma trégua e me deixem sonhar.

A LIGAÇÃO DE MANGA

por Paulo Escobar


Em dezembro de 2019 estava pegando um ônibus na avenida Millán em Montevidéu, cidade do meu segundo nascimento, estava a caminho de encontrar uma lenda, um ídolo, que até aquele momento estava em algum lugar. Esquecido pelos clubes por onde passou e encontrado por torcedores no Uruguai que o ajudaram.

Ao descer no ponto próximo aquela vendinha, com o prédio em cima, entro e subo com minha câmera e tripé, para encontrar Manga.

Ao abrir a porta com um misto de espanhol e português na língua, aperto aquelas mãos marcadas pelo futebol. Aquele futebol sem luvas, aquele que não tinha tempo ruim, das lendas, dos ídolos, dos bairros, das terras.

Sentamos pra conversar sobre a vida, sobre a bola, sobre o futebol. Aquele jogos tão cheios de amores e dores, tão parecido com a vida e por vezes tão carregado de injustiça.

Ali naquela entrevista (para o Museu da Pelada), Manga me fala que o último sonho que ele tinha antes de partir, seria pisar em um jogo do Botafogo de novo. De entrar no Maracanã de pisar o Rio de Janeiro.

Saí dali com o coração pesado e com lágrimas nos olhos, pensando em como este país é ingrato com muitos ex jogadores e ídolos, que ficaram relegados muitas vezes ao esquecimento.


Peguei o celular e comecei a ir atrás de contatos, mandando o vídeo pensando em como ajudar.

Ali apareceu Marcelo Gomes e Helvidio Mattos, com a ideia de ir atrás dele e trazê-lo de novo a um jogo no Rio de Janeiro. E assim foi o resto da história.

Manga no Rio de novo num jogo do Botafogo sentindo o carinho da torcida e realizando um último desejo talvez. E o outro sonho que ele nem sabia que viria a rolar, graças a uma correria do Gomes, era um canto para ele morar com sua companheira.

Na semana passada, ele ligou do Retiro dos Artistas, com um sorriso para me perguntar se eu estou bem e como estão as coisas. Me conta que está feliz, que hoje ele tem seu canto, me convida para ir visitá-lo, que ele está me esperando.

Disse a ele que quando isso passar irei vê-lo e que fiquei feliz que aquilo que começou em Montevidéu tenha terminado bem. Falei que me sentia feliz com ele e sua companheira felizes.

E assim em dias de dores, Manga me deixou feliz com sua ligação e ao desligar com uma lágrima no rosto agradeci ao futebol.

A APOSTA

por Valdir Appel


O campeonato paranaense de 1978 poderia ser decidido nos pênaltis e Manga apostou com Evangelino da Costa Neves, presidente do Coritiba, seu clube, 100 dólares para cada pênalti que ele defendesse contra o arqui-rival Atlético Paranaense. E, realmente, a decisão foi para as cobranças de penalidades.

Enquanto os técnicos decidiam quem iria bater os pênaltis, Manga sentou-se ao lado da baliza e pediu ao massagista aplicação de gelo num dos joelhos, que aparentemente estava machucado. Após enfaixá-lo, foi para o gol. Talvez, seduzidos pelo joelho envolto num pano, os jogadores do Furacão insistiram em cobrar daquele lado e erraram três cobranças. Duas, Manga defendeu; e uma foi para fora.

No dia seguinte, o presidente entregou 200 dólares ao goleiro, que reclamou:


– Son trecentos, pressidente!

– Como trezentos, se você defendeu dois?!

– Pressidente, mira acá! Manguita non defendió porque la pelota se fue para fuera. Son trecentas platitas!