por Leandro Ginane
Com oito anos você me fez presenciar nos ombros do meu pai um dos momentos mais marcantes da minha vida. Zico bateu o escanteio e Rondinelli marcou de cabeça o gol que fez do Flamengo campeão carioca e criou uma das maiores hegemonias do futebol brasileiro.
Cresci tendo você como a minha maior diversão. Aos domingos, em dia de jogo e céu azul com pipas colorindo, desde cedo um clima diferente rondava meu bairro. O papo nos botecos e nas esquinas era o grande clássico que aconteceria logo mais no Maior do Mundo.
Acordava cedo, meu coração infantil batia acelerado, as mãos pequenas e frias separavam cuidadosamente aquela camisa especial. O nó na garganta não deixava o almoço descer e as horas pareciam se arrastar. Ansioso, esperava o momento do meu pai nos levar para te encontrar. O caminho até lá era uma farra. Trem abarrotado, alegria que poucas vezes via meu pai sentir.
Ele levava a molecada da vizinhança, éramos nove crianças que se davam as mãos suadas. A tradição de levar os filhos até você passava de pai pra filho. Suas histórias eram contadas como alguém que fala do melhor amigo. Muitos vizinhos presenciaram o que você passou na final da Copa de 50, outros estavam no jogo do Brasil contra o Uruguai nas eliminatórias de 94, as histórias que ouvia só aumentavam o meu fascínio por você.
Talvez por isso, cresci com aquele sonho típico de todos que gostam de futebol aqui na rua: ter um filho e leva-lo para te conhecer. Quando tinha vinte e dois anos, nasceu o meu primeiro, batizado Arthur em homenagem ao maior jogador que vi jogar e quando fez dois anos levei o moleque e o avô para ver o segundo jogo da final do Campeonato Brasileiro de 92. Como um ciclo que se repete, os filhos se tornam pais dos seus pais e nessa época era eu quem o levava aos jogos.
Com mais de cento e vinte mil pessoas, minutos antes de a bola rolar você não resistiu a tanta gente amontoada e seu abraço, cedeu. Alguns torcedores caíram, três pessoas morreram e entre elas um amigo de infância. Com um gesto de companheirismo, torcedores amarraram uma faixa de tecido para servir como proteção para os que ficaram. Neto e avô se assustaram e queriam te deixar. Mas logo em seguida, o Mais Querido entrou no seu palco preferido e a festa começou. Neste dia, você foi novamente responsável por mais um momento marcante na minha vida, dessa vez ao lado do meu filho e do meu pai. Obrigado.
Sua velhice acompanha a do meu velho e as várias mudanças que te foram impostas nos últimos anos nos deixou apreensivos se um dia ainda poderíamos te ver até que veio a última e derradeira mudança. Te transformaram em arena. Sua magnitude sucumbiu junto com seu colossal tamanho. O que fizeram com você, querido Maraca, foi um golpe fatal em todos nós que crescemos ouvindo suas histórias.
Desde então, Arthur e eu não conseguimos mais te encontrar. Meu pai já bem velho dizia que não voltaria a te ver e ele tinha razão. Fico em paz que o velho Juca não esteja mais entre nós para ver o que aconteceu com o seu velho amigo, que em dia de jogo inundava as ruas cariocas e abraçava carinhosamente a nação.
Espero que a tradição se mantenha viva e que junto com Arthur e agora meu neto Junior, ainda possa desfrutar de mais domingos de festa com você. Aquele coração infantil ainda bate acelerado enquanto escrevo essas palavras no mês em que você completa setenta anos.
Parabéns, querido amigo.