por Elso Venâncio
Faz pouco tempo, tive a chance de rever Jairzinho, único jogador brasileiro a marcar gol em todos os jogos de uma Copa do Mundo. O papo foi na tradicional feijoada, regada a pagode, do ‘Cariocando’, que está de volta no Catete. Este evento é organizado pelo misto de jornalista e promoter Paulo Marinho.
Foram 7 gols em 6 jogos, e usando a camisa 7, número místico. Deus criou o mundo em 7 dias, 7 são os dias da semana, 7 são as notas musicais, 7 são as maravilhas do mundo, 7 era a camisa do Garrincha, do Túlio Maravilha, do Cristiano Ronaldo… e com a 7 às costas Jair Ventura Filho brilhou no México, marcando 7 gols e popularizando o sinal do crucifixo nas comemorações.
O ídolo botafoguense me falou de seu início de carreira. Estava tão à vontade que, ao ser aplaudido, subiu no palco e cantou ‘Jair da Bola’, música do compacto simples que ele próprio gravou nos anos 70:
“Todo jogador quer ser cantor e todo cantor quer ser jogador”, lembrou.
Nascido em Caxias, Jairzinho foi treinar no Flamengo. Walter Miraglia, técnico dos juvenis na época, o observou durante quatro coletivos.
“Eu não vou ficar, seu Walter? Faço gol em todo treino…”
“Depende da diretoria…”, despistava Miraglia.
Isso foi em 1960. O feiticeiro Fleitas Solich tinha voltado ao clube e, a certa altura, chamou Jair ao lado do campo, na Gávea:
“Garoto, você tem quantos anos?”
“15…”
“Leva jeito, hein…”
Dona Dolores, a mãe do atacante, decidiu se mudar para a rua General Severiano. Jair atuava pelo Paulistano, time amador do bairro. Em um dos jogos, para sua surpresa, seria marcado pelo Nilton Santos. Isso mesmo, o consagrado lateral, mesmo tendo jogos profissionais aos fins de semana, também jogava as suas peladas.
Nilton teve trabalho e, ao final, perguntou se o jovem queria treinar no Botafogo. Jair parecia relutar:
“Só tem craque lá. E tem o Garrincha…”
Em outro jogo, marcado por Rildo, viu que o lateral se irritava ao ver tanta força e correria:
“Vai para o outro lado, sai daqui, menino! Senão te meto a porrada.”
Desprezado pelo Flamengo, virou gandula e resolveu treinar mesmo no Glorioso:
“Me destaquei no juvenil, onde fui tricampeão carioca no início dos anos 60. Logo passei a treinar com os profissionais.”
Foi o próprio Rildo, que se tornou um dos seus melhores amigos, quem insistiu com os treinadores e a diretoria, alertando que Jair, aos 17 anos, tinha mais é que subir.
Nos primeiros treinos, sempre se destacava, marcando gols. Depois, corria para casa, feliz da vida:
“Mamãe, mamãe… meti dois gols!”
Órfão de pai aos 2 anos, ele só tinha Dona Dolores, que não compreendia a empolgação do filho único. Sempre no dia seguinte após os treinos, acordava cedo e comprava o ‘Jornal dos Sports’. Certa vez, leu a manchete do ‘Cor de Rosa’:
“SURGE UM NOVO GARRINCHA”
Dona Dolores começou a se dar conta de que a relação entre Jair e a bola era um caso sério.
O Botafogo de Garrincha, Nilton Santos, Didi, Amarildo, Manga, Quarentinha, Zagallo & Cia. treinava sempre à tarde. De repente, Mestre Didi falou:
“O bagaço, o bagaceiro…”
Meio sem jeito, o garoto olhou de lado, como quem perguntava a si próprio, “Será que ele está falando comigo?”
“Você mesmo! Você vai treinar entre os titulares. Quando eu estiver com a bola, se mexe que te coloco na cara do gol.”
Jairzinho barrou Quarentinha. O ataque titular do Alvinegro virou Garrincha, Didi, Jairzinho, Amarildo e Zagallo.
No período em que jogou três Copas, entre 1966 e 1974, chegou a ser considerado por muitos, em algumas temporadas, como o maior atacante do planeta.
Jair Ventura Filho, 77 anos, é um ídolo eterno do futebol brasileiro!