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O FUTEBOL É OLÍMPICO

por Idel Halfen


O título do artigo, ainda que contenha certo grau de sarcasmo, tem como intuito provocar uma reflexão sobre os pontos que fazem o futebol se diferir das demais modalidades.

O fato de haver restrições sobre a idade máxima – cada seleção pode levar no máximo três jogadores com idade acima de 23 anos – já deixa o futebol masculino diferente dos outros esportes olímpicos. Tal situação tem como justificativa o receio por parte da FIFA de que o torneio se transforme numa espécie de Copa do Mundo, receio esse que não existe em nenhuma outra federação internacional.

Além dessa “diferença”, há o poderio financeiro da modalidade, o qual tem sido responsável por acontecimentos que extrapolam o razoável, e aqui trazemos como ilustração a cerimônia de premiação, onde a seleção brasileira, vencedora da competição nos Jogos de Tokyo, subiu ao pódio com a camisa de jogo que trazia a logo da Nike, patrocinadora da Confederação Brasileira de Futebol, contrariando a determinação do Comitê Olímpico Brasileiro de usar o uniforme da Peak, fornecedora da entidade.

A hipótese de a Nike estar por trás da iniciativa não parece crível, contudo, mesmo sem a participação da marca é clara a situação de ambush marketing – marketing de emboscada – afinal, obteve exposição em um espaço que não pagou para estar. A alegação de que ela é patrocinadora da CBF, e como tal investe verbas altíssimas, não se sustenta, pois as marcas têm plena consciência dos seus direitos e deveres, não se cogitando sequer eventuais negligências ou esquecimentos sobre os Jogos Olímpicos. Nesse caso é até provável que a marca norte-americana esteja incomodada com a situação, visto que as suspeitas de estar por trás da vergonhosa atitude pode se refletir em rejeição à marca e impactar negativamente as vendas das camisas da seleção brasileira. Para piorar, qualquer declaração que venha a fazer sobre o caso trará constrangimento à CBF, uma das suas principais patrocinadas.

A CBF, por sua vez, se coloca perante o mercado – aqui consideramos patrocinadores atuais e potenciais – como uma organização pouco confiável, o que, aliás, é péssimo para uma instituição já desgastada com escândalos. Não surpreenderia saber que alguns patrocinadores estejam avaliando o quão saudável é estar associado a quem se sobrepõe à ética e acordos.

Já a Peak, apesar de ter reagido ao incidente de forma irônica e bem-humorada comunicando nas redes sociais que a Nike não faz parte do seu portfólio de marcas e ter aumentado seu awareness (reconhecimento), foi bastante prejudicada, pois, além de perder exposição, corre o risco de ter sua imagem arranhada no que tange à qualidade de seus produtos, afinal, em tese, esses foram rejeitados pelos campeões.

Todavia, nada se compara ao prejuízo que o esporte sofreu ao ser submetido a uma situação que nada tem a ver com os princípios que os regem, dentre os quais está o respeito às regras.

COCA? NÃO, EU QUERO ÁGUA

por Idel Halfen


Uma cena chamou a atenção na coletiva de imprensa do jogador Cristiano Ronaldo na Eurocopa: seu gesto afastando duas garrafas de Coca-Cola e trazendo uma de água, a qual também não ficou à sua frente na entrevista, embora o nome do líquido tenha sido proferido em português.

Diante do ocorrido, a imprensa e as redes sociais despejaram dezenas de notícias conclusivas e comentários sobre o ocorrido, deixando evidente o baixo conhecimento dos “autores” acerca de gestão, além da péssima escolha de fontes.

A notícia mais “lacradora” talvez tenha sido a que responsabilizou o ato pela queda no valor da empresa, conclusão tirada sem sequer consultar analistas de mercado para entender como vinha sendo o comportamento das ações da empresa. Informo que no dia da coletiva, a ação da Coca-Cola fechou no valor de US$ 55,41, porém, um mês antes o valor era US$ 54,64, tendo chegado a US$ 54,17 em 19 de maio. Será que o mercado nesse dia previu que o craque português teria tal atitude quase um mês depois? Evidente que não, até porque no dia 20 a ação subiu.

Dentro do festival de “conclusões imediatas”, estiveram as que decretaram que o marketing sofreu um sério prejuízo com o incidente, certamente baseados na possibilidade de atos similares voltarem a acontecer, o que, sem dúvida, seria péssimo para a atração e retenção de patrocinadores. Contudo, deveriam ler os contratos de patrocínio na Eurocopa, para entender se a propriedade “objetos sobre a bancada da mesa de entrevistas” existe e como foi comercializada.

Não surpreenderia saber que a colocação das garrafas foi uma espécie de “ativação” do patrocínio, tal suposição tem como causa a infinidade de produtos que aparecem nesse tipo de evento – arroz, cimento, chuteira, etc. – em total dissonância com o que se espera do marketing, que é posicionar os produtos e serviços como algo atrativo.

Poderia também ser discutido – o que não foi feito – se o ato não se constituiu em um ambush marketing(marketing de emboscada), na medida em que a garrafa de água ganhou destaque em detrimento ao refrigerante. A possível alegação de que não era possível identificar a marca da água perde força quando entendemos que, em termos de categoria de produtos, elas são concorrentes, mesmo a Coca-Cola tendo água em seu portfólio.

Pelo histórico do jogador, não parece razoável, tampouco coerente, a hipótese de “rebeldia” contra uma marca que não estaria lhe remunerando para aparecer próxima a ele, afinal isso acontece costumeiramente no esporte, vide os backdrops e placas ao redor do campo, por exemplo.

O chamado “marketing de causa”, no caso uma manifestação de alerta sobre os eventuais malefícios dos refrigerantes, foi provavelmente a motivação do ocorrido, não cabendo aqui julgar a veracidade dessa convicção. No entanto, para que algo tenha o cunho de “marketing” é mandatório que se contemple um planejamento, no qual a ocasião, o local, a forma e o sequenciamento, entre outros, sejam contemplados, o que, definitivamente não aconteceu no caso relatado.

DESCULPE, PREFIRO NÃO APARECER

por Idel Halfen


Com a confirmação da Copa América no Brasil, um forte movimento se colocou contra o evento tendo como principais alegações: a pandemia e a insegurança em relação a novas ondas de contaminação.

Discutir se deveria haver o evento ou não, poderia derivar para discussões políticas, as quais certamente embasadas por fake news de ambos os lados, ou pior, por comparações rasas com outras competições que estão ocorrendo no país, ignorando variáveis como planejamento e valores envolvidos.

Assim, preferimos não fugir do objeto do blog, que é discutir marketing e gestão, e analisar a decisão de alguns patrocinadores que optaram por não terem suas marcas na competição, sem que isso interfira nos valores contratados.

Trata-se de uma decisão que deve ter deixado felizes todos os gestores de marketing, ou melhor, todos os gestores que efetivamente sabem o que é marketing e não compreendem o patrocínio como uma mera iniciativa de exposição de sua marca. Ao perceberem que esse tipo de operação visa também a associação entre as marcas, os responsáveis pela Mastercard, Ambev e Diageo, entenderam que não seria benéfico estar junto a um evento tão discutido, ainda mais em uma época em que o mercado encara os consumidores como seres humanos plenos, com mente, coração e espírito.

Antes que acusem os gestores das citadas empresas de “comunistas”, como virou praxe entre os que defendem incondicionalmente o presidente da república, convém elucidar que corporações deste porte baseiam suas decisões em pesquisas e estudos, ou seja, muito provavelmente avaliaram o cenário em termos de repercussão nas redes sociais e concluíram que o dano à imagem seria maior do que o prejuízo de pagar por algo que não irão usufruir, no caso, a aparição nas peças da competição.


É importante mais uma vez frisar que, por mais que um gestor tenha posicionamento ou preferência política, sua posição executiva não permite que as mesmas influenciem suas tomadas de decisões.

Pelo lado dos patrocinados, o prejuízo, como já foi dito, não se dá no âmbito financeiro de curto prazo, porém, há que se considerar que a ausência de marcas tão fortes pode gerar uma reação em cadeia dos outros patrocinadores, além de enfraquecer o conceito do co-branding, onde a marca agrega valor por estar associada à outra, isto sem falar de uma eventual não renovação de patrocínio.

O lamentável disso tudo é ver o esporte sofrer as consequências da política, o que faz com que a opinião quanto à realização ou não da competição fique restrita ao que o seu político preferido apoia, ao invés de se analisar a viabilidade de se executar algo sem o devido planejamento.

Outra opção dos “especialistas em tudo” seria não emitir opinião definitiva sobre algo que não dominam

TRADIÇÃO OU PRAGMATISMO?

por Idel Halfen


Tradição ou pragmatismo? Quem prontamente escolher alguma destas opções estará correndo um sério risco de estar errado, visto que a resposta depende da conjuntura em que se estabeleça o questionamento, além do que, o ponto de equilíbrio é sempre condição imprescindível para tudo na vida.

Essa breve introdução tem por intuito discutir alguns modelos de camisas de times de futebol a serem lançadas pela Puma, nas quais não haverá a presença dos escudos, que serão substituídos pelo nome do time em maior proporção.

Os mais tradicionalistas que tiveram acesso às supostas imagens de alguns uniformes já manifestaram insatisfação, achando um absurdo a supressão dos escudos, ainda que estes evoluam ao longo do tempo e que a associação do nome com o time fique mais direta, eliminando aquela costumeira pergunta: “de quem é essa camisa?”

Pragmaticamente falando, as chances de uma maior demanda – guardadas as condições básicas de distribuição, precificação e estética – tendem a ser bem maiores. Contudo, antes que os defensores da iniciativa a justifiquem com o tolo cálculo feito por alguns “especialistas do marketing esportivo” que multiplicam a estimativa de vendas pelo preço de venda ao consumidor, adianto que a conta correta contempla a venda multiplicada pelos royalties que cabe ao clube, o qual é apurado após a subtração dos impostos e das margens. Portanto, ainda que qualquer “dinheiro” seja útil, o ganho intangível com a popularização da marca pode ser o mais significativo no longo prazo.

Os protótipos publicados – não de forma oficial – permitem também considerar que as camisas passem a ser demandadas por consumidores que se importam com o lado fashion, aumentando assim o espectro anteriormente restrito a fãs do time e/ou de algum dos seus ídolos.

Terminando os argumentos em prol do “pragmatismo”, lembramos que as camisas da NBA não trazem os escudos das franquias.
Por mais que todas as alegações anteriores pareçam conduzir o texto para o lado do pragmatismo, não é essa a conclusão almejada, visto ser essencial um trabalho de pesquisas e testes de mercado para avaliar a real aceitação do produto.

O tal equilíbrio preconizado no primeiro parágrafo deve ser sempre buscado, pontuando, no entanto, que a tradição – atributo primordial para a identidade de qualquer organização – nem sempre é inquestionável, e que o pragmatismo imposto pela busca de receitas e valorização, não deve ignorar a cultura e a história daquela organização.

Partindo da premissa de que todos os clubes buscam “internacionalizar” suas marcas, pois dessa forma aumentam o potencial de faturamento através de oportunidades fora de seus domínios territoriais, cabe aqui um questionamento: quais escudos são efetivamente conhecidos externamente?

Pois bem, é provável que a grande maioria não seja reconhecida, o que, talvez, indique que uma solução intermediária que comunique o nome possa ser necessária até que haja uma popularidade maior dos escudos.

POLÍTICA DE PATROCÍNIO

por Idel Halfen


Uma das poucas certezas que o marketing nos brinda é a de que as marcas não devem ter um rosto, principalmente se for o de um ser humano, naturalmente suscetível a falhas, o que pode de alguma forma contaminar a marca. Daí a recomendação para que as empresas não restrinjam apenas a uma única pessoa a posição de “embaixador” ou de “endossador”.

Tal afirmação não significa que marcas e empresas não devam ter identidade, o que é completamente diferente, pois esta está relacionada ao posicionamento e à proposta de valor, variáveis imprescindíveis em qualquer mercado.

Esclarecimentos feitos, passemos para o tema que suscitou interessantes debates na última semana: o patrocínio da Havan ao rubro-negro carioca.

Enquanto alguns criticaram a iniciativa pelo fato de o dono da empresa ser um apoiador ferrenho do presidente da república e de suas falas, outros a defendiam sob o argumento de que o que importa é o valor que o clube receberá, algo mais ou menos na linha de que os fins justificam os meios.

Pois bem, inicialmente deve ser registrado que é inconcebível que as pessoas sejam julgadas por possuírem algum posicionamento político – seja de esquerda ou de direita -, aliás, qualquer tipo de generalização a respeito de preferências estritamente ideológicas denota o quão imbecil é o sujeito que a faz.

Contudo, não é salutar que marcas/empresas tenham posicionamento político, cabendo a elas no que tange ao relacionamento com a sociedade focar suas ações nas causas sociais, o que, inclusive, contribui para fortalecer a imagem de uma empresa preocupada com a humanidade.

Embasa tal afirmação o fato de que o patrocínio deve buscar, além da exposição e ativação da marca, a associação dos valores do patrocinado com o do patrocinador, para assim criar uma espécie de simbiose. Neste contexto, o clube passa a usufruir dos atributos do patrocinador, sendo a recíproca verdadeira.

Por isso é tão importante o trabalho de análise das possíveis parcerias sob o prisma do branding, mesmo porque, uma eventual contaminação pode implicar na fuga de outros patrocinadores (efeito co-branding) no caso do clube, ou de clientes no caso da empresa.

Voltando ao caso específico, a Havan pode vir a se tornar um problema para o clube em função do que foi citado no início do nosso artigo: a empresa tem a cara do dono, o qual, pouco se importa em se posicionar politicamente. Aliás, a pouca preocupação com a imagem da empresa já levou seu dono a se manifestar publicamente contra medidas voltadas à inclusão de deficientes em suas lojas.

Por mais que tais atitudes possam ser minimizadas com argumentos de que elas agradam e atraem clientes que comungam das mesmas convicções, não se pode esquecer que a concorrência, ao não tomar partido, agrada e atrai a todos, isto é, não tem rejeição.

Vale ainda relatar que esse problema, embora pareça inédito já ocorreu outras vezes, vide, por exemplo, o caso do Werder Bremen da Alemanha que foi alvo de protestos quando anunciou que a Wiesenhof – empresa de alimentos acusada de maus tratos a animais – seria sua patrocinadora.

Tais situações provavelmente estarão cada vez mais presentes no cotidiano dos clubes, o que faz com que fique evidente a necessidade de modernização do estatuto com cláusulas de compliance que estabeleçam restrições a empresas que possuam envolvimento político e que adotem práticas não-sustentáveis.