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Futebol de Botão

JOGO DE BOTÃO

por Ricardo Dias


(Foto: Marcelo Tabach)

Assisti aqui no site ao sensacional embate no futebol de botão entre Luiz Penido e Edson Mauro. A roubalheira de um e outro me lembrou os tempos de garoto, campeonatos de rua, botões que misteriosamente desapareciam nos bolsos uns dos outros (não eram roubados; o verbo utilizado, sabe Deus por quê, era “tarrar”). Pensando bem, o jogo de botão tem uma história de crimes…

Comecei nessa nobre arte jogando com meu pai, no chão de casa. Eu com meus botões de plástico e um dadinho como bola, ele com botões de roupa e papel prateado em formato bem redondinho; um absurdo, ele usava bolas esféricas! Todo mundo sabe que o certo é dadinho, quadrado… Se bem que havia uns tarados que usavam um negócio que parecia um comprimido, um horror.

Mas o time do meu pai era a sensação da rua. Tinha um goleiro feito de caixa de fósforos, como convém, dois beques de galalite, uma enorme novidade na época dele, e todos os outros botões de verdade.

Mas não era qualquer botão. Para virar atleta, o indivíduo precisava ter uma curvinha específica, de modo a pegar por baixo da bola. A melhor descrição era “formato de capacete inglês da primeira guerra mundial”. Sugiro uma googlada, caso você não seja doido e não saiba como é o tal capacete. E esses eram mortais, um chute seco e de curva. Dois tinham nomes: um, de cor diferente, era o Zequinha; outro, com uma manchinha, o Orlando Pingo de Ouro. Há suspeitas que esse tenha sido roubado de meu tio. Conhecendo meu pai, provavelmente verdadeiras. E, claro, papai era – e é – tricolor (e meu centroavante era o Manfrini).


Adquirir esses botões não era simples. Década de 40, Brasil do pós-guerra (a segunda, não a primeira do tal capacete), criança não tem dinheiro, mesada, nada disso. Loja de brinquedo, coisa de luxo, natal e olhe lá. Então, a solução era o furto. A caixa de costuras da mãe (mães costuravam) era a primeira fonte. Esgotada esta, os paletós do pai. Normalmente já haveria o suficiente para um time, mas faltavam os craques: os botões de batina de padre. Ali os jogadores de botão mostravam a que vinham: arriscavam a danação eterna, roubando de um sacerdote, para poder jogar com prazer. Várias maneiras existiam, mas a mais certa era uma criança distrair o padre com perguntas sem fim, enquanto o outro tentava, com uma gilete, cortar o botão desejado, ou pior: a invasão da sacristia, geralmente com a conivência do sacristão, também jogador inveterado.

Bendito esporte, nascido no crime e absolvido pela paixão.

1ª TAÇA MIRIM “LE BOUTON”



Neste sábado, o francês Marc Regnier vai resgatar uma brincadeira que marcou a infância de muitos boleiros! O craque está organizando um torneio de futebol de mesa, o futebol de botão, para a garotada de 7 a 14 anos, na Praça São Salvador, no Rio de Janeiro! A bola começa a rolar às 10h e as inscrições são gratuitas e podem ser feitas até 15 minutos antes.

A rapaziada que não possui botão não precisa se preocupar, terão times de sobra para serem emprestados durante o torneio. Aqueles que têm, no entanto, precisam prestar atenção no diâmetro dos “jogadores”, visto que o máximo permitido é de 42mm.

Vale destacar que três mesas serão disponibilizadas para a brincadeira e os três primeiros colocados serão premiados com troféu e medalhas! A regra é a dadinho simplificada!

Boa sorte, garotada!

“See me feel me touch me… Heal me”

por Daniel Lessa

Bom, você deve estar se perguntando o porquê de alguém começar um texto sobre um time de botão com uma letra do The Who. Hmmm, talvez você também esteja questionando que raios é The Who (um grupo inglês de rock, formado na década de 60) e o que é um time de botão. Mas calma, tudo vai fazer sentido. Ou não, mas é sobre sentidos que quero falar.


Tommy é personagem e nome da ópera-rock mais famosa do universo. Ele era era cego, surdo e mudo e, ainda assim, campeão mundial de pinball… O que é pinball? O Google ensina, avancemos. Ah, time de botão era o equivalente, até os anos 80, ao que são FIFA e PES no PlayStation… Um quadrado de madeira no gol, dez botões, um campo de compensado, duas balizas e uma bola (muitas vezes um pequeno dado, um cubo minúsculo).

Eu tinha uns dez anos… talvez 12. E meu pai era o Tommy do futebol de botão. Ele não era cego, surdo ou mudo… Mas como jogava. E parecia surdo-mudo, pois raramente falava durante a partida. Normalmente dizia apenas o “prepara” que antecedia o arremate, geralmente fatal. E como enxergava… Posicionava o goleiro de forma que me parecia impossível chegar às redes.

Sempre foi assim. Jamais venci o coroa no botão. Aliás, nem lembro de ter feito gols nele… Não havia tática que funcionasse. Eu sempre perdia. Eram 10 minutos de partida e a derrota garantida. Ele posicionava seu time sempre da melhor forma. E dificilmente errava uma jogada. E batia sempre colocado, irretocável…

Um dia, compreendi. Eram os botões. Meu pai tinha botões magníficos. Eram verdadeiras preciosidades – e ele conferia um tratamento especial a seus craques. Ele tinha uma flanela costurada com lugar para cada um deles. E com numeração na flanela… Ele passava talco em seus jogadores. 

Ele não falava, mas com certeza tinha nome para cada um… Certamente, ídolos do seu amado Fluminense. Havia um botão que, tenho certeza, cadenciava como o Didi. Acho que tinha também o Telê Santana, pau para toda obra… E Pintinho, Rivelino, Escurinho, Castilho, Waldo.

Era fato que ele tinha ciúme de seu time. Não nos emprestava – tenho mais dois irmãos, fregueses também do velho. Um dia, cheguei à conclusão de que, para encará-lo, precisava de jogadores tão bons quanto aqueles. Eram botões realmente especiais, da década de 60 – provavelmente a era de ouro dos botões, lindos exemplares de galalite.

O coroa teve compaixão e me emprestou alguns de seus reservas. “See me… feel me… Touch me”. Levei outra sova. E tinha isso. Meu pai era o maior gente boa. Mas era cego, surdo e mudo ao jogar botão: atuava com seriedade e sem dar margem a possíveis jogos de compadre – ou de pai para filho mesmo. E era campeão mundial também… Pelo menos lá na Visconde de Itamarati, no bairro do Maracanã. Invencível.

Os anos se passaram e a mesa, que achava enorme, foi ficando pequena. Meu time foi aposentado. Troquei a palheta dos botões por uma de baixo… Jamais aprendi a tocar direito o instrumento, provavelmente fui melhor jogando botão do que tocando contrabaixo… E olha que o coroa me incentivou a tocar.

Mas um dia, o velho, que na verdade era novo, ficou doente. Ele tinha 43 anos quando se foi. Eu sei lá o motivo, mas na partilha informal das coisas que nada valem, fiz o artilheiro. Oportunista, me antecipei e catei os botões dele. A razão eu mesmo nunca entendi… Jamais joguei botão nesses 19 anos sem ele. Não que eu me lembre.

Mas, por várias vezes, me peguei orgulhoso olhando sua coleção. As balizas sumiram, o campo foi pro lixo… Mas, agora, pensando cá com meus botões, é óbvio que quis guardar um pedaço da minha infância comigo… Quis guardar um pedaço do meu pai. E ainda que eu, assim como ele, não acredite em nada que não sejam os 90 minutos regulamentares que temos aqui nessa Terra, quem há de saber se ainda não terei mais uma chance naquele campeonato chamado eternidade… Mais prudente guardar os nossos times. Pois tudo que mais queria era poder ouvir pelo menos mais uma vez aquele “prepara…”

See Me
Feel Me
Touch Me
Heal Me
See Me
Feel Me
Touch Me
Heal Me
Listening to you, I get the music
Gazing at you, I get the heat
Following you, I climb the mountain
I get excitement at your feet
Right behind you, I see the millions
On you, I see the glory
From you, I get opinion
From you, I get the story
Listening to you, I get the music
Gazing at you, I get the heat
Following you, I climb the mountain
I get excitement at your feet
Right behind you, I see the millions
On you, I see the glory
From you, I get opinion
From you, I get the story