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Elso Venâncio

DOIS ÍDOLOS, DUAS ESTÁTUAS E QUASE 2 MIL GOLS

por Elso Venâncio


Romário me disse, quando deixou o Barcelona para jogar no Flamengo, que era muito grato a Roberto Dinamite:

– Esse cara me ajudou muito. Quando subi para os profissionais, ganhei confiança para marcar gols graças aos lançamentos dele.

O ex-zagueiro rubro-negro Mozer gosta de lembrar:

– Eu marcava duramente o Roberto, não dava espaços para ele, até que certa vez ele me provocou: ‘Tá metendo a porrada, né? Vai ver agora… Olha bem pra esse garoto” – disse Roberto, apontando para o Baixinho com o dedo indicador.

Na lateral do campo estava Romário, que tinha acabado de assinar a súmula e se aquecia para entrar, aos 20 minutos do segundo tempo.

Romário foi para o campo a mil. Em pouco tempo, recebeu ótimo passe de Roberto e marcou o gol da vitória.

Quando jogou com Romário, o ídolo Roberto já tinha mais de 30 anos. Passou a atuar mais recuado, metendo toda hora na cara do gol o garoto que surgia feito um furacão, saindo como um raio em diagonal da esquerda para o meio.

Acompanhei os dois de perto durante o bicampeonato carioca que o Vasco conquistou entre 1987 e 1988. O time que levou o primeiro dos dois títulos era surreal: Acácio, Paulo Roberto, Donato, Fernando e Mazinho; Dunga, Geovani e Tita; Mauricinho, Roberto e Romário. A equipe que entrou em campo no jogo do bi também deixa saudades: Acácio, Paulo Roberto, Donato, Fernando e Mazinho; Zé do Carmo, Henrique e Geovani; Vivinho (Cocada), Bismarck e Romário.

Nessa final, o treinador Sebastião Lazaroni resolveu colocar Cocada no lugar de Vivinho. O lateral entrou aos 41 minutos do segundo tempo, fez o golaço da vitória por 1 a 0 aos 44 e, logo em seguida, foi expulso, aos 45, por debochar do treinador rubro-negro Carlinhos, que o preteriu na Gávea. O Vasco tinha vencido o Flamengo por 2 a 1 no primeiro jogo e precisava apenas empatar. Acabou ganhando, sendo que o Flamengo era o atual campeão brasileiro. O gol que consagrou Cocada é um dos mais marcantes da história do clube.

Na comemoração do título, numa boate em Copacabana – naquela época, os craques e a imprensa conviviam bem de perto –, o “Tremendão” Erasmo Carlos pegou o microfone e, no meio de jogadores, dirigentes e torcedores, cantou com entusiasmo e repetidas vezes, o hino vascaíno.

Essa viagem no tempo, que não espera ninguém e corre cada vez mais veloz, me leva à cidade capixaba de Nova Venécia. Foi lá, no estádio Zenor Pedrosa Rocha, que testemunhei, do gramado, a estreia de Romário pelos profissionais.

Isso faz quase 37 anos. Era agosto de 1985 e a delegação carioca se hospedou no Hotel Hádria, de apenas dois andares e cuja arquitetura era colonial. Pela Rádio Globo, do Rio de Janeiro, eu, como repórter, e os saudosos Antônio Porto – locutor que criou o bordão “Bola pro mato que o jogo é de Campeonato” – e Alberto Rodrigues nos comentários. A população, imagino, não chegava a 40 mil habitantes, sendo que pelo menos metade era formada por gente simples da zona rural.

Foi o técnico Antônio Lopes quem lançou Romário. Ex-delegado, ele tinha moral e coragem para colocar jovens e mudar a equipe na hora que bem entendesse. Maior exemplo disso é o título estadual de 1982, conquistado em cima do Flamengo campeão do mundo. Lopes fez cinco alterações às vésperas da final e faturou o caneco graças a um gol de Marquinhos, um dos titulares barrados, que só entrou no segundo tempo.

Romário, por sua vez, fez logo dois, em sua estreia. O primeiro, aos 38 do segundo tempo – ou seja, com 18 minutos em campo. Outro, dois minutos mais tarde. O Vasco goleou: 6 a 0 no acanhado estádio de gramado irregular. Surgia ali um gênio da bola, um baixinho gigante que se tornaria o melhor jogador do mundo após o tetra que a seleção buscou em gramados norte-americanos, na Copa de 1994.

Curiosamente, Roberto, contundido, não jogou nem a final de 1988, nem a estreia de Romário. Mas isso é o de menos. O que vale é que Roberto Dinamite enfim terá sua estátua inaugurada, atrás do gol à esquerda da tribuna de honra de São Januário. Do outro lado, no gol da capela, eternizado pelo gol 1.000, marcado sobre o Sport em 2007, no mesmo estádio, já está a de Romário.

Os dois ídolos somam a impressionante marca de quase 2 mil gols marcados em suas carreiras. E agora, para a felicidade de toda a imensa torcida bem feliz, ambos os craques estarão novamente juntos, imortalizados na Colina histórica.

JOHN TEXTOR: “TEMOS DINHEIRO”

por Elso Venâncio


O megainvestidor John Textor vem empolgando os botafoguenses, que voltaram a lotar o Estádio Nilton Santos.

Personagem simples, carismático, que aparece sorridente nos jogos com uma latinha de cerveja na mão e é sempre atencioso com os torcedores, o norte-americano promete sacudir o futebol brasileiro na janela do meio do ano. Sem demonstrar arrogância, Textor avisa:

– Temos dinheiro… O Barcelona não tem.

O uruguaio Cavani não vai renovar com o Manchester United, da Inglaterra. O artilheiro fica livre agora em julho. Eran Zahavi, do PSV Eindhoven, da Holanda, é outro cotado. Na ‘Era Textor’, já foram investidos R$ 65 milhões em mais de dez contratações. Dois “Evertons” – o “Cebolinha”, do Benfica, e o Ribeiro, meia do Flamengo – foram sondados.

O dirigente conversa com a Nike para fornecer o material. A Reebok, comprada recentemente pela Adidas, também está em pauta.

No fim dos anos 80, o cofre estava cheio no clube graças ao poderoso bicheiro Emil Pinheiro. Carlos Alberto Dias e Fernando Macaé desviaram seus destinos. Trocaram, de forma surpreendente, a Gávea por Marechal Hermes (General Severiano só retornaria ao clube em 1995, na gestão Montenegro).

Mauro Galvão e Paulinho Criciúma foram liberados por Castor de Andrade, outro magnata do jogo do bicho. Chegou, logo depois, o técnico Valdir Espinosa, e com ele o tão esperado título estadual de 1989, que quebrou um longo jejum de 21 anos.

Voltando ao momento atual, há o desejo de se construir um novo estádio de 25 mil lugares, já que no Nilton Santos o torcedor fica distante do campo. O modelo seria o Crystal Palace, que possui o Selhurst Park Stadium.

Outra medida que o dirigente coloca em pauta: encontrar uma fórmula para aproximar as categorias de base dos profissionais:

  • – Eles tem que o interagir. Estão distantes hoje em dia.

Roberto Palli é um botafoguense apaixonado, que até já trabalhou no seu clube do coração como preparador físico. Ele me disse que um amigo seu estava com a esposa num pub londrino quando um rapaz se aproximou perguntando:

  • – Vocês falaram ‘Botafogo’? São brasileiros?

Ele se apresentou como filho do bilionário e ligou para o pai, que estava em Londres.

  • – Que coincidência espetacular! Me esperem aí, chego em 20 minutos! – disse Textor.

E foi mesmo.

Entre um drinque e outro, conversaram por mais de duas horas sobre o passado e o presente do Glorioso.

– Penso 24 horas em fazer um grande time.

O torcedor sabe das coisas, sente os novos ares. Voltou a caminhar nas ruas com a camisa alvinegra e a apoiar o time nos jogos. Textor não é bicheiro, como Emil. Mas, assim como ele, tem demonstrado enorme carinho por seu novo “negócio” – no caso, o Alvinegro de General Severiano.

Esperemos que a má fase acabe de vez e o time retome seu lugar de ponta no cenário esportivo nacional.

FUTEBOL BRASILEIRO: ASILO DE ÍDOLOS

por Elso Venâncio


O chileno Arturo Vidal, da Inter de Milão, quer jogar no Brasil – de preferência no Flamengo, que tem orçamento de um bilhão/ano. Nosso futebol erra ao contratar quem não têm mais espaço no exterior. Ninguém volta por vontade própria. Deu certo na Europa? Fica! O cara só é descartado quando já deu o que tinha que dar.

Aliás, teve um que contrariou a regra. Romário era o número 1 do mundo em 1995 e foi repatriado. Mas só veio porque avisou que não jogaria mais no Barcelona. Kleber Leite, presidente do Flamengo na época, falou grosso, avisando que depositaria o dinheiro na conta do clube catalão. Quatro milhões e meio de dólares, mais 25 por cento de impostos. Era muita grana… Hoje, o questionável Andreas Pereira vale três vezes mais. No tempo do Baixinho, os jornalistas estrangeiros invadiram a Gávea para decifrar o motivo da volta do melhor jogador do planeta à sua terra natal.

O jornalista Marcos Eduardo Neves, o “biógrafo dos biógrafos”, afirma que Romário voltou para ser o “Rei do Brasil”. Uma espécie de Chatô, tal qual o livro escrito por Fernando Morais.

Já o velho Arturo Vidal… bom, visão ele tem. Quer ser mais um a mamar nas tetas do futebol brasileiro.

Com Investidores e Liga chegando, a tendência é que os clubes se fortaleçam. O nosso problema é a dependência, que faz vender a preço de banana as novas joias que surgem. Empresários têm olheiros espalhados em toda parte. Viramos reféns.

“Craque o Flamengo faz em casa”. O slogan, com uma foto gigantesca do “Maestro” Junior cercado pelos jovens Júnior Baiano, Paulo Nunes, Djalminha, Marcelinho, Rogério e Marquinhos, foto essa que ficava no departamento de futebol rubro-negro, já é coisa do passado. A exceção da Era Zico e da equipe montada por Jorge Jesus em 2019, o clube mais popular do país não formava grandes esquadrões. Mas sempre havia um time raçudo, empurrado ainda mais da arquibancada, pela força da sua massa colossal.

Os Estados Unidos mudaram a filosofia dos anos 70 e 80. Contratava craques em fim de carreira. Como o nosso futebol gosta de fazer hoje. Neymar e Messi andam se oferecendo. Mas os dirigentes da terra do “Tio Sam” deixam claro que só se interessam por jovens com potencial. Não duvidem se, desta vez, os americanos, em médio prazo, passarem para um novo patamar no “Planeta Bola”.

SÓ DEUS SABE COMO VEIO O TETRA

por Elso Venâncio


A princípio, pensei que fosse piada de português, mas não é. Depois da enxurrada de portugueses, que chegam com uma gigantesca comissão técnica, há quem aposte que vai ser natural um representante da terra de Camões assumir a Seleção após a Copa.

Dois nomes lembrados: Jorge Jesus, pelo trabalho que fez no Flamengo e é adepto do jogo ofensivo, e Abel Ferreira, bicampeão da Libertadores com o Palmeiras.

Por que o treinador brasileiro ficou tão fragilizado? São eles os verdadeiros culpados?

Ao mesmo tempo que ficamos carentes de grandes jogadores, uma onda de retranca assumiu um protagonismo nunca antes visto no nosso futebol. O importante era vencer, não importava de que forma, e manter o emprego. Demissão? O caminho era justiça, direto! Tem profissional recebendo, simultaneamente e sem trabalhar, de dois ou às vezes três ou mais clubes.

Uma fatalidade tira o título do Brasil em 1982 e, doze anos mais tarde, em 1994, só Deus sabe como nos veio o título mundial. Talvez São Romário explique! A partir de então, o futebol-arte foi colocado para escanteio. O esquema fechado, buscando apenas o resultado, virou moda após a Copa dos Estados Unidos. Os times passaram a ter não dois, mas três cabeças de área.

Alguns técnicos ganharam fama e dinheiro com esse esquema. O camisa 10 foi sepultado. O armador, tipo Gerson, o ‘Canhotinha de Ouro’, foi para o saco. O ponteiro virou jogador de lado, obrigado a recuar para marcar. Ainda assim, fomos penta na Coreia e no Japão, com Felipão, adepto da escola gaúcha, e o seu futebol de força e resultados. O esquema, 3-5-2, mas tendo Ronaldo Fenômeno (três vezes eleito o melhor jogador do mundo), Ronaldinho Gaúcho (duas vezes o astro-rei do Planeta Bola) e Rivaldo (Bola de Ouro em 1999), um trio que, quando a redonda chegava ao ataque, resolvia.

O garoto chega hoje na escolinha e avisa:

– Sou cabeça de área, meia de contenção, meia pelos extremos ou atacante recuado (o famoso falso 9).

Vi muito profissional nas categorias de base buscar títulos a qualquer custo. Ninguém se preocupa mais em formar jogador. Parar uma jogada com falta é mais importante do que tentar roubar a bola e sair jogando com ela.

Nosso futebol sempre foi criativo, com dribles, toque de bola, visando o gol. Vitórias convincentes! Exatamente como a Seleção se comportou contra o Chile e a Bolívia. Será que é tão difícil armar esquemas ofensivos?

MARIO VIANNA FALOU? TÁ FALADO!

por Elso Venâncio


Mario Vianna, “com 2 enes”, como pedia para ser anunciado, era um showman na Cabine 10, a “Cabine Pelé”, da Rádio Globo no Maracanã. Figura querida e popular, seus gritos no microfone ecoavam pelo estádio na época em que o torcedor não desgrudava o rádio do ouvido. Acompanhava os jogos atentamente e com um enorme binóculo:

– Errrrrrrrooouuuu!!!

– Gooooollll Leeeegal!!!

– Goool Iiiiilegal! Iiiiilegal!!!

– Lamano, Lamano, Lamano!!!

– Pênalti mal marcado não entra!!! Não ennnntraaa!!!

– Saiu da figura A para a figura B, Arnaldooo!!! (para o ex-árbitro Arnaldo Cezar Coelho)

– Eu vou descer, Armandinho! Armandinhoooo!!! (para o ex-juiz Armando Marques)

O rádio, até os anos 90, era o veículo pelo qual o torcedor ouvia futebol. Jorge Curi, Waldir Amaral, Doalcei Camargo e o ‘Garotinho’ José Carlos Araújo, que continua no auge, agora pela Rádio Tupi, eram os grandes nomes das transmissões esportivas no Rio de Janeiro.

Fui contratado pela Rádio Globo em 1985, pouco depois do José Carlos Araújo e do ‘Apolinho’ Washington Rodrigues. Viemos da Rádio Nacional, com Jorge Cury indo de imediato para a Rádio Tupi; e Waldir Amaral, para a Rádio Jornal do Brasil.

Mario Vianna foi mantido como comentarista de arbitragem. Chegava cedo aos estádios. Kardecista convicto, às vezes se concentrava e fazia previsões dos jogos. No México, em 1970, certa vez acordou Luiz Mendes pedindo para ele ligar para o Brasil, porque um irmão tinha falecido. Espantado, Mendes ligou e a notícia foi confirmada. Tinha, na época, mais de 80 anos, mas com um porte físico que chamava a atenção. Sempre foi bom de briga, desde os tempos em que integrava a Polícia Especial do ‘Estado Novo’. Aliás, ele e o ex-preparador físico – e técnico – Paulo Amaral policiavam a cidade, pilotando potentes Harley Davidson. Eram os temidos “boinas vermelhas” do Presidente Getúlio Vargas.

Nas minhas caminhadas pela Urca, eu o encontrava na Praia, em frente ao antigo Cassino. Chegava cedo, colocava sua barraca e se exercitava na areia. Era o ‘fiscal’ do balneário. Se alguém acendia um cigarro, imediatamente era repreendido:

– Aqui é lugar de saúde. Apague isso aí.

E quem se atrevia a contrariá-lo? Se chegava um criança, Vianna se transformava. Sorria, feliz. Queria brincar e virava criança junto. Falava que foi o primeiro a denunciar esquemas de corrupção na FIFA. Apitou a Copa de 1950 no Brasil e, em 1954, fez o jogo Suíça 2 X Inglaterra 1 – até ser expulso da entidade.

– Me excluíram porque denunciei a roubalheira.

No Natal, vestia-se de Papai Noel e rodava por seu bairro distribuindo presentes. Reza a lenda que estava em um trenó e contornou a Avenida Portugal, onde há hoje uma cabine da PM, entrando na Marechal Cantuária. Dentro de um bar, alguém gritou:

–Papai Noel é viado! Viado!

Na mesma hora, ele contornou o quarteirão, passou novamente pelo local e ouviu:

– Papai Noel é Viado!

Gargalhas surgiram…

Mario Vianna desceu correndo, agrediu quem lhe aparecesse pela frente e os provocadores, alguns bêbados, saíram correndo. A garotada comentou:

– Xiiii… O Papai Noel tá zangado.

Waldir Amaral, vibrando com o sucesso comercial e com a audiência da Rádio Globo na época de ouro do Rádio Esportivo, reuniu a equipe e parabenizou todo mundo:

– Vocês são extraordinários! São famosos! O Brasil inteiro nos ouve! Agora, preciso de uma frase para definir essa fase sensacional. Pensem! Pensem nela, por favor.

Titio Mario Vianna, como era carinhosamente chamado, cochilava. De repente, abriu os olhos e decretou:

– Waldir, Waldir, Waldir…. “Veja o jogo ouvindo a Rádio Globo!”

Verdade! Era como se o ouvinte estivesse à beira do gramado.

Waldir levantou os braços, levou as mãos à cabeça e se derreteu:

– Mario… você é um gênio!

Mario Vianna foi o mais corajoso e verdadeiro árbitro brasileiro. Ainda era o próprio VAR – cabia a ele decidir o que estava certo ou errado, de acordo com as regras do jogo. Os locutores repetiam sempre a frase:

– Mario Viana falou? Tá falado!

Saudades de personagens como ele no mundo do nosso futebol.