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Elso Venâncio

WALDIR AMARAL – UM BRASIL DE AUDIÊNCIA*

por Elso Venâncio

Waldir Amaral foi um dos grandes nomes do rádio brasileiro

Um dos ícones da narração esportiva brasileira é Waldir Amaral. Ele nasceu em Goiânia, em 17 de outubro de 1926, e com pouco mais de 20 anos conseguiu o diploma de advogado. A família, com todo orgulho do mundo, passou a chamá-lo de Doutor Waldir. Mas sua paixão era outra. Narrava futebol em sua cidade e, já no Rio de Janeiro, conferiu de perto o título do Botafogo, seu clube de coração, no Campeonato Carioca de 1948, após longo jejum de 13 anos.

Após fazer vários testes, Waldir passou e foi trabalhar na equipe da Rádio Continental, que tinha um slogan impressionante:

“A 100% esportiva e informativa!”

No comando da emissora, Oduvaldo Cozzi, que ousava como poucos, enviou o jovem Waldir à Finlândia para cobrir as Olimpíadas de 1952. Batizou o “afilhado” de ‘O Locutor Olímpico’. De repente, explodiu uma notícia bombástica: Cozzi, a grande estrela das narrações de futebol, aceitara retornar à Tupi, com o maior salário do radialismo nacional.

A princípio surpreso e assustado, Waldir Amaral viu na saída de Cozzi sua grande chance de se firmar. A consagração chegaria não muito depois: foi eleito por três temporadas consecutivas – 1956, 1957 e 1958 – como o “Melhor Locutor Esportivo do País”, na mais famosa premiação da época, a da ‘Revista do Rádio’. Os prêmios eram entregues, em pessoa, por ninguém menos do que o Presidente da República, em pomposa cerimônia realizada no Palácio do Catete.

Em 1961, uma nova sacudida no Rádio lembrou a revolução causada pela saída de Cozzi para a Tupi. O já famoso Waldir Amaral aceitou uma superproposta da Rádio Globo, valor que girava em torno de alguns milhões de cruzeiros. Ele encontrou na Rua do Russel 434, na Glória, a sua verdadeira casa. Rádio Globo — ‘Música, Esporte, Notícia’.

Foram 22 anos ininterruptos de sucesso: de 1961 a 1983. Waldir acumulou as funções de Diretor de Esportes e Diretor Comercial. O Rádio Esportivo vivia sua ‘Época de Ouro’ e a Globo assumiu uma posição incontestável de liderança em toda a programação.

“Deixa comigo” – dizia Waldir Amaral após a vinheta que anunciava seu nome.

“Indivíduo competente” – mandava, para quem fazia o gol. Quantas vezes ele disse “Indivíduo competente esse Zico…”

“O visual é bom. Roberto Dinamite tem bala na agulha” – falava, quando o craque vascaíno se preparava para cobrar uma falta.

“O relógio marca…” – assim informava o tempo de bola rolando.

“Choveu na horta do Fluminense” – nessa hora, ele só trocava o nome do jogador ou do clube, de acordo com o jogo narrado.

Roberto Marinho foi seu padrinho de casamento. Os dois almoçavam juntos quase toda semana. Um dia, caminhando pelo Centro, o jornalista – como gostava de ser chamado – comentou:

“Waldir, esses moradores de rua… A gente com tantas preocupações e eles aí, tranquilos…”

O locutor sorriu, e sem perder a oportunidade retrucou:

“Troca com eles, então, Dr. Roberto!”

Realizado profissionalmente, Waldir Amaral ainda passou pelas rádios Nacional e JB. Morava no Leblon e faleceu em 7 de outubro de 1997, a dez dias de completar 71 anos.

O Mestre do ‘Garotinho’ José Carlos Araújo – outro fenômeno do Rádio – foi-se embora deixando a certeza de que, durante 35 anos, pelo menos, comandou “Um Verdadeiro Brasil de Audiência”.*

*Colaborou: Peris Ribeiro

GAROTINHO HOMENAGEADO NOS 100 ANOS DO RÁDIO

por Elso Venâncio

Um documentário acaba de ser lançado para homenagear o Rádio, que está completando 100 anos de idade, e em especial, claro, o Radialismo Esportivo.

Cinco personalidades, em cinco episódios. Os dois primeiros, sobre Milton Neves e José Silvério, já podem ser vistos no Star Plus, canal de streaming da Disney. No fim do mês, toda a série estará disponível na ESPN.

Milton Neves, José Silvério, o gaúcho Pedro Ernesto Denardin, Osmar Santos e, fechando a programação, como grande atração, contando toda a sua história, o ‘Garotinho’, ou seja, José Carlos Araujo, fenômeno do Rádio e da Comunicação.

Recebi o repórter Marcelo Gomes e o produtor Rafael Valente para relembrar passagens marcantes relativas aos 19 anos em que estive ao lado do Garotinho. Foi ele quem me transferiu da Rádio Nacional, de Volta Redonda, para a Nacional, do Rio de Janeiro. Um ano depois, eu e Washington Rodrigues já estávamos ao lado dele, na Rádio Globo.

No final dos anos 70 Garotinho deixou a Rádio Globo para liderar a equipe da Nacional. Levou consigo nomes como Washington Rodrigues, Deni Menezes e Luiz Mendes. Incomodou a concorrente até se tornar líder de audiência. A poderosa Globo se rendeu, oferecendo um contrato irrecusável, e assim ele retornou à Rua do Russel ao final de 1984.

Profissional ao extremo, único locutor que se concentra, dormindo cedo na véspera dos jogos, Garotinho sempre chegava aos estádios, pelo menos, três horas antes de a bola rolar. Líder e profundo conhecedor do Rádio, sabe escalar o time, coloca cada profissional no lugar em que mais pode render.

Em cada canto do Brasil tem um ‘Garotinho’ a imitá-lo. E que, por ser assim, acaba sendo chamado também de ‘Garotinho’. A começar por São Paulo, com Osmar Santos, passando até por políticos, como o ex-governador do Rio Anthony Garotinho, que registrou o apelido, inclusive, incorporando-o ao próprio nome.

Em Campos dos Goytacazes, minha terra natal, Anthony Garotinho narrava futebol e corridas de cavalo. Usava alguns bordões famosos, como ‘Sou eu!’, ‘Voltei!’, ‘Vai mais, vai mais, Garotinho!’, ‘Brasileiro não vive sem rádio’, ‘Seu melhor companheiro’, ‘Você, do volante, obrigado pela carona que me dá’…

Nos anos 90 fui fazer um jogo do Flamengo em Cuiabá. A Rádio Globo colocava os repórteres nos mesmos voos e hotéis da delegação rubro-negra. Naquele domingo iriam Luiz Carlos Silva, como locutor, além do comentarista Afonso Soares. Por problemas técnicos, o avião não decolou. Os jogos não passavam pela tevê e precisei procurar um narrador. Queria saber quem era o melhor da cidade. Fui até à casa dele, me apresentei e fui recebido com um delicado sorriso:

– Eu sou o Garotinho!

– Mas, como?

– Sou o Garotinho daqui e também sou o mais ouvido da região! – respondeu, flexionando a voz e lembrando o verdadeiro ‘Garotinho’, José Carlos Araújo.

Para o documentário que alertei acima, no Rio foram ouvidos Washington Rodrigues, Eraldo Leite, Deni Menezes, Cícero Mello, Luiz Penido e Édson Mauro, dentre outros, além de mim. Em São Paulo chamaram Wanderlei Nogueira, Mauro Beting, Paulo Vinicius Coelho, Paulo Soares, Marília Ruiz e Oscar Ulisses. Em Porto Alegre, João Carlos Belmonte, José Aldo Pinheiro, José Alberto Andrade e o grupo de rock Nenhum de Nós, que fez bastante sucesso nos anos 80.

Ídolos do esporte também colaboraram, como Lance e Nenê. Nomes marcantes no Corinthians e no Santos, falaram sobre Milton Neves. Marcelinho Carioca, Marcos e Jamelli são fãs de José Silvério. Paulo Roberto Falcão e Baideck acompanharam de perto Pedro Ernesto. Casagrande e Raí recordaram passagens com Osmar Santos. Já Garotinho, por sua vez, foi saudado por Junior, o ‘Maestro’, e Donizete, o ‘Pantera’.

Cada programa terá uma hora de duração. O especial, contudo, ainda será ainda exibido pela ESPN. Digo aqui os dias e horários:

– ‘Milton Neves e Suas Paixões’. Dia 26 de julho, 1 da manhã
– ‘José Silvério, o Menino Chato’. Dia 25 de julho, às 23h55
– ‘O Vovô Locutor’, com Pedro Ernesto Denardin. Dia 27 de julho, às 22h30
– ‘Osmar Santos e os Irmãos do Rádio’. Dia 28 de julho (aniversário de Osmar), às 23h55
– ‘Coisas de Garotinho’, com José Carlos Araújo. Dia 29 de julho, às 23h45

É isso! Absolutamente imperdível! Ainda mais depois que fomos surpreendidos pela notícia de que Garotinho, aos 82 anos, passou por um cateterismo com o doutor César Medeiros. Então, boa recuperação ao maior nome do Rádio Esportivo Brasileiro! Que, se Deus quiser, em breve estará de volta aos microfones da Rádio Tupi e da Nova Brasil FM!

Abraço em todos!

TRICOLORES CHORARAM COM O ÍDOLO

por Elso Venâncio

A torcida tricolor chorou junto com Fred. Impressionante a reação da galera, não só no Maracanã, mas em todo o país, após o Ídolo entrar em campo, marcar e se emocionar durante a comemoração de seu gol contra o Corinthians.

É fundamental ter um Ídolo! Fred fez a torcida crescer. Apenas na semana passada, 8 mil associados a mais em apenas três dias. Incrível!

João Saldanha falava que clube grande podia até não conquistar títulos, mas a presença de um ídolo era obrigatória. Citava o Corinthians, ao longo do jejum de 23 anos. A torcida, com grandes contratações, se tornava cada vez mais apaixonada e gigantesca.

No mês em que o Fluminense completa 120 anos de fundação, Fred, aos 38 anos, aproveita o embalo para novas emoções. Ele se despede no próximo sábado, contra o Ceará. Amigos que moram fora do Rio me ligam querendo ir ao jogo, mas os ingressos estão esgotados.

Vamos aproveitar a empolgação da galera e relembrar momentos marcantes do tricolor. Qual o melhor time do Fluminense que você viu jogar? Qual é aquele que te traz as melhores recordações?

A Máquina que mais admirei foi a de 1976, já que houve duas, ambas formadas por Francisco Horta, o ‘Presidente Eterno’. Uma, em 1975; outra, no ano seguinte. Falo dessa: Renato, Carlos Alberto Torres, Miguel, Edinho e Rodrigues Neto; Carlos Alberto Pintinho, Paulo Cezar Caju e Rivellino; Gil, Doval e Dirceu.

Mas, que tal essa formação: Paulo Victor, Aldo, Duílio, Ricardo Gomes e Branco; Jandir, Delei e Assis; Romerito, Washington e Tato.

Em relação à Máquina Tricolor dos anos 70, Rivellino e Paulo Cezar Caju eram os principais craques do Brasil. O primeiro saiu quase expulso pela Fiel, após derrota para o Palmeiras na final do Paulista, em 1974. Já o ‘francês’ PC Caju foi repatriado ao Olimpique de Marselha. O artilheiro argentino Doval e o Capitão do Tri, Carlos Alberto Torres, eram duas outras estrelas de ponta naquela constelação.

O paraguaio Julio Cesar Romero foi um dos grandes ídolos do nosso futebol nos anos 80. Raçudo, rápido e habilidoso, Romerito levou o Fluminense ao tricampeonato carioca em 1985, após ter feito o gol do título do bicampeonato brasileiro, contra o Vasco de Roberto Dinamite, um ano antes. Delei, Ricardo Gomes, Branco… quanta gente boa! Além, claro, do infalível ‘Casal 20’: Washington e Assis faziam um ataque e tanto.

E os campeões cariocas de 1969, com Flávio Minuano e o catimbeiro Samarone? Vitória na final sobre o Flamengo, diante de um público superior a 170 mil pagantes. 3 a 2, o resultado. O time era composto por Félix, Oliveira, Galhardo, Assis e Marco Antônio; Denilson e Lulinha; Wilson, Flávio Minuano, Samarone e Lula. Todos treinados pelo mestre Telê Santana.

Em 1970 veio a conquista da Taça de Prata, o Brasileirão da época, com Mickey sendo decisivo: marcou gol nos quatro últimos jogos. Nessa competição, os tricampeões no México estavam em campo. Nomes como Pelé, Rivellino, Tostão, Carlos Alberto Torres, Gerson e Cia…

O time campeão de 1964 também não deve ser esquecido. Ainda contava com o gigante Castilho no gol. Na decisão, 3 a 1 sobre o Bangu. A equipe? Castilho, Carlos Alberto Torres, Valdez, Procópio e Altair; Denilson e Oldair; Jorginho, Amoroso, Joaquinzinho e Gilson Nunes. Elba de Pádua Lima, o Tim, também conhecido como ‘El Peon’, era o comandante.

O Flu conquistou com brilhantismo os Cariocas de 1971, 73, 75, 76 e 80. Depois foi tri, de forma magistral, na década de 80. Até chegarmos ao histórico ano de 1995. Naquela temporada aconteceu o épico Fla-Flu do gol de barriga do Renato Gaúcho. Romário, o maior jogador do mundo, estava do outro lado e saiu cabisbaixo.

No novo milênio o tricolor levantou outros quatro canecos cariocas: em 2002, 2005, 2012 e este ano. Após a conquista da Copa do Brasil, em 2007, veio o vice da Sul-Americana e Libertadores. Em 2009, Fred liderou uma impressionante sequência de vitórias, evitando a queda para a segunda divisão. Surge, então, o time de Guerreiros. Na sequência, dois novos Brasileiros. Em 2010, após 26 anos, e em 2012.

No primeiro, Muricy Ramalho era o técnico e Emerson Sheik fez o gol do título: 1 x 0 sobre o Guarani, no Estádio Nilton Santos. O time entrou com Ricardo Berna, Mariano, Gum, Leandro Euzébio e Carlinhos; Diguinho, Valencia, Júlio César e Conca; Émerson e Fred. O argentino Conca foi, disparado, o melhor jogador do Campeonato. Participou de todos os jogos da campanha, sendo decisivo na maioria. Um espetáculo!

No tetrabrasileiro, em 2012, Fred se consagrou de vez no coração da torcida. Marcou duas vezes na decisão contra o Palmeiras, uma vitória por 3 a 2, em Presidente Prudente. Acabou sendo o artilheiro do Campeonato, com 20 gols. Hoje, é ídolo eterno das Laranjeiras.

Não podemos esquecer aquela equipe: Diego Cavallieri, Bruno, Gum, Leandro Euzébio e Carlinhos; Edinho, Jean, Deco e Thiago Neves; Wellington Nem e Fred. Abel Braga, o técnico campeão, era o mesmo que esteve também à beira do campo no título estadual deste ano. Aliás, nos três últimos Estaduais conquistados.

Mas, e pra você? Qual o melhor time tricolor, o título inesquecível e seu ídolo preferido?

A CONTURBADA DEMISSÃO DE ROMÁRIO

por Elso Venâncio

Uma dos maiores crises que o Flamengo viveu aconteceu depois da derrota de 3 a 1 para o rebaixado Juventude, no Alfredo Jacomi – partida que eliminou o Rubro-Negro do Brasileirão de 1999. Após o jogo, Romário teve seu contrato rescindido.

O ambiente andava carregado. Gilmar Rinaldi, dublê de dirigente e empresário, não mais aceitava as mil e umas regalias do Baixinho. A ida do craque junto a alguns companheiros à Festa da Uva, em Caxias do Sul, não passou de pretexto para a demissão. Todos sabiam que, ao retornar da Copa dos Estados Unidos com status de melhor jogador do mundo, o camisa 11 sempre fez questão de deixar claro a todos os presidentes dos clubes nos quais jogava que, treino para ele, só se fosse à tarde.

A confusão no Sul propiciou que o maior fã que conheci do atacante entrasse em ação. Presidente do Vasco, Eurico Miranda fez uma boa proposta, aceita pelo atacante mesmo sendo inferior ao que vinha recebendo no Flamengo.

Jorge Rodrigues, Grande Benemérito Rubro-Negro e muito querido por todos, chefiava a delegação do clube naquelas duas partidas a serem jogadas no Sul – contra o Juventude, em Caxias; e diante do Internacional, em Porto Alegre. Na volta ao Rio, ainda tentou um acordo entre os diretores e o ídolo. Alugou, inclusive, uma sala no edifício Rio Branco-1, no Centro, para uma reunião.

A confusão era generalizada. Romário tinha batido boca com Gilmar, desafeto de Eugenio Onça, um dos “dirigentes” da Gávea. A demissão do craque, anunciada pelo presidente Edmundo Santos Silva, teve o aval do vice Rodrigo Dunshee de Abranches. Naquele portentoso prédio da Praça Mauá, participaram da reunião Edmundo Santos Silva, Romário, Luizinho Moraes, o representante do jogador, e os dirigentes Júlio Leitão, Betinho e Capitão Léo.

No início da conversa, gritos altos ecoavam do lado de fora da sala. Partiam do diretor Júlio Lopes, que entrou no peito e na raça após ser barrado e ter que encarar e brigar com seguranças. Edmundo Santos Silva foi duro, mas Romário reagiu. Disse que era sujeito homem, mas no fim das contas tudo caminhava para um acordo, apesar do ambiente tenso. Combinaram, contudo, uma coisa: ninguém iria falar com a imprensa. Melhor deixar a poeira baixar. Tudo certo, o Baixinho voltaria a treinar na semana seguinte.

O curioso é que três participantes da reunião não saíram pela porta da frente. Da garagem subterrânea surgiu um carro com Júlio Leitão ao volante. O veículo foi imediatamente cercado pela imprensa. Ao lado dele estava o agente de Romário, mas… cadê o artilheiro? Sumiu! O maior ídolo brasileiro da época, hoje Senador da República, saiu – acredite se quiser – no porta-malas daquele carro. Para evitar contato com os jornalistas.

A novela, porém, não teve final feliz. O presidente do Vasco, informado da possível reconciliação, não perdeu tempo e contra-atacou. Foi direto encontrar Romário:

– Eu honro a minha palavra…

A resposta do goleador foi a seguinte:

– Quero dois milhões de dólares por ano!

Eurico deu uma baforada no charuto e sentenciou:

– Te dou dois milhões e meio. Melhor, três milhões.

Fim de papo, estava pra lá de selado o acordo. Romário esqueceu o Flamengo e voltou a São Januário 11 anos após sua ida à Europa. No começo do ano seguinte, durante o Mundial de Clubes que o Corinthians ganhou em pleno Maracanã, reviveu com o “animal” Edmundo a dupla de ataque de cinco anos antes. Assim como os mesmos problemas que tiveram quando no Flamengo.

Aliás, mesmos problemas que seguem tendo até hoje. Mesmo longe dos gramados.

JOÃO SALDANHA, “MEUS AMIGOS…”

João Saldanha começava seus comentários com seu tradicional “Meus Amigos…”. Era o comentarista que o Brasil inteiro consagrou. O ‘João Sem Medo’ – apelido dado por ninguém menos que Nelson Rodrigues.

Nas Eliminatórias para a Copa de 70, ele inovou, para surpresa dos jornalistas. Tirou do bolso um papel e, de cara, escalou um a um seus titulares: Félix; Carlos Alberto Torres, Brito, Djalma Dias e Rildo; Piazza, Gerson e Dirceu Lopes; Jairzinho, Tostão e Pelé. Oito deles seriam mesmo titulares no Mundial do México, porém, sob o comando de Zagallo.

– Meu time são 11 feras! – alegou. Eram mesmo. ‘As Feras do Saldanha’.

Emílio Garrastazu Médici, o mais tirano dos ditadores, gostava de futebol. Prisões, torturas e assassinatos se avolumavam, mas o Presidente da República costumava aparecer sorridente no Maracanã, com um radinho de pilha no ouvido. Confesso que era no mínimo estranho ver o carismático, valente e assumido comunista dirigindo a seleção em plena terra de generais.

Médici declarou que gostaria de ver o folclórico artilheiro Dadá Maravilha, o ‘Dario Peito de Aço’, convocado.

– Ele escala o Ministério dele, e eu a minha seleção! – bradou Saldanha, fulo da vida.

Duas semanas depois, estava demitido.

Luiz Mendes me disse que pegou João em casa no dia em que ele atirou no goleiro Manga, durante o jantar da comemoração do título carioca de 1967, conquistado pelo seu Botafogo sobre o Bangu de Castor de Andrade. No trajeto, entre Copacabana e o Mourisco Saldanha disse:

– Luiz, estão preparando uma tocaia pra mim. Não se meta. Briga minha é de talho, não de corte.

Édson Mauro, o ‘Locutor Bom de Bola’, me conta uma boa:

– Nos anos 70 João me disse que estava solteiro: ‘Não quero mulher me enchendo o saco. Separei de novo.’

Perto do fim do ano, Édson perguntou onde ele passaria o Natal.

– Sei lá.

– Quer ir comigo para Maceió?

– Vou, sim.

Nas praias e caminhando pelas ruas da capital de Alagoas, era parado a todo momento e dava atenção a todos, falando de política e futebol. As pessoas apontavam de longe para ele. Afinal, ali estava o “dono” da nossa seleção, o cara que todos brasileiros queriam ver dirigindo o escrete.

Viagem para a Europa? Passaporte na mão, alguém lhe pergunta sobre a mala:

– Essa calça jeans foi a maior invenção do americano. Camisa, agasalho, compramos tudo isso lá fora, e bem baratinho!

Vim ao Rio em 1983 para falar com o Saldanha, quando estava me formando em Educação Física na FOA – a Fundação Oswaldo Aranha, em Volta Redonda. Na matéria, futebol – um trabalho que fiz sobre Jornalismo Esportivo. No Maracanã, numa quarta-feira à noite, assisti à goleada do Flamengo sobre o São Cristóvão por 5 a 0. Esperei o fim da ‘Jornada Esportiva’ e caminhei até a cabine da Rádio Globo. Já passava da meia noite quando gravei uma longa entrevista com o João.

Descemos juntos no elevador. Ele foi para o estacionamento enquanto eu caminhei para a esquerda, mirando o antigo Portão 18. Do nada, seu Passat cinza deu ré e, nisso, ouvi a seguinte pergunta:

– O que você tá fazendo aí, garoto?

– Vou ver se pego um táxi.

– Você quer ser assaltado? Entra aqui! Vai pra onde?

– Rodoviária.

– Te deixo lá.

Saldanha era assim.

O Flamengo foi jogar certa vez em Itaperuna. Eu, pela Rádio Globo, como repórter; ele, na função de comentarista da Rádio Tupi. Começou um boato de que o João sumiu. Cidade pequena, os jornalistas se dividiram para procurá-lo. Em pouco tempo, visualizamos Saldanha sentado no banco de uma praça, bebendo cerveja e contando histórias para cerca de 40 pessoas.

Audacioso, crítico, verdadeiro, eram passagens verdadeiramente espetaculares. O que prova que Saldanha foi mesmo um marco no nosso Jornalismo. Uma figura simples e muito, muito popular!

A última vez que o vi aconteceu no Galeão, durante o embarque para a Copa de 1990, na Itália. Debilitado, em uma cadeira de rodas, um torcedor chega à sua frente e pergunta:

– E aí, João… tudo bem?

Ele olha sério para o sujeito.

O desconhecido insiste:

– Tá tudo bem, João?

– Como e que tá tudo bem? Você tá cego? Olha essa cadeira de m… aqui! Vai pra pqp…

Saldanha era assim.

João Alves Jobim Saldanha, gaúcho de Alegrete, amigo íntimo de Heleno de Freitas e primo do gênio Tom Jobim, era fã declarado de Garrincha, outro gênio. Saldanha foi um dos maiores personagens do Brasil no Século XX.