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Copa do Mundo

BRASIL CONTRA ARGENTINA AO SOM DE ABBA E O JOGO NA CASA DO “INIMIGO” DE 1981

por Marcelo Mendez

Subimos a Rua Tanger.


A ideia naquele domingo de muito sol no Parque Novo Oratório era aceitar o armistício de paz do Tocão, que após quebrar meu nariz no “contra” entre Tanger de Baixo x Tanger de Cima, chamou a rapa nossa pra ver o jogo do Brasil x Argentina na casa dele. Ele topou as condições minhas: eu poder levar meus amigos de time da Tanger de Baixo.

Após conversa dele com a mãe, da mãe dele com as nossas, tudo foi acertado.

Minha mãe, Dona Claudete, se prontificou a ajudar com as coxinhas que ela já vendia pra ajudar nas contas de nossa casa. O Seu Antonio, pai do Jadão, descolou uma grana para os refrigerantes e então, munidos de tudo isso, eu, Jadão, Néinha, Pedrinho, Serginho e Denis subimos os 200 metros que precisávamos para chegar até a casa do Tocão.

– Tocãooooooooooo!!!

– Caraio, Marcelo, num grita!

– To chamando o cara, Jadão!

– Tem campainha, seu burro!

E então, com a atenção chamada pelo Jadão, acompanhado das risadas dos outros parceiros, apertei o botão da campainha na parede da frente do sobradão que o Tocão morava. Chamava atenção…

Em um bairro que ainda era bem precário, quando a vida era dura no Brasil de 1981, ver uma casa como a do Tocão impressionava bastante. Ele morava num sobrado na parte de cima da rua, uma casa bonita, com uma Brasília nova e um Dodge Polara na garagem. Seu pai, o Renato, trabalhava na Volks, era ferramenteiro por lá e a vida do Tocão era bem diferente da nossa.

Foi ele quem nos recebeu:

– Entra, Marcelo! Veio todo mundo?”

– Se num viessem, eu também num viria!

A chegada no sobrado do Tocão…

Ao me ver com a vasilha de salgadinhos cheia, Tocão me ajudou com o peso.

Os amigos se revezam na condução da sacola de guaranás antártica de litro, na época num existia o tal do pet, era tudo vidro, tudo meio desengonçado pra carregar. Na porta de entrada, Renato, Pai do Tocão nos recebeu.

Homem alto, com um topetão penteado pra trás, muito bem vestido, equilibrou o copo largo com alguma coisa dentro, em uma mão e com a outra, fez afagos na cabeça nossa. Perguntou do meu Pai, deu um sorriso e nos convidou pra entrar.

Dentro da casa, a gente se surpreendeu de novo. Diferente dos cômodos apertados que a gente dividia a casa era grande, arejada, com móveis novos, uns super ventiladores de teto instalados e a sala onde assistiríamos o jogo tinha uma TV em cores enorme, umas poltronas e sofás confortáveis e um aparelho de som último tipo, tocando uma música.

Cheguei perto e vi que o disco era do ABBA e a música, contando as faixas da bolacha, descobri que era “Angel Of Morning”. Foi nesse momento que Dona Dirce, mãe do Tocão, chegou com uma bandeja de um monte de coisas pra gente comer.

– Meninos, falei pra mãe de vocês que não precisava trazer nada. Mas já que são os salgadinhos da Dete, sei que são bem melhores que os meus, então a gente come junto, né?

Concordamos e então começamos petiscar, quando a campainha tocou. Tocão foi atender e voltou com Sandrão, Betinho, Luciano, Carlão e Dida. Era o time da “Tanger da Cima”

O rescaldo do nariz quebrado

Dona Dirce foi quem recebeu os caras, da mesma forma que nós fomos recebidos.

Os trouxe até a sala, nos apresentou, como se já não nos conhecêssemos tão bem, nos deixou sozinhos enquanto foi preparar algo. Nesse momento, rolou um clima meio estranho, de eles pra lá pro outro lado do sofá, nós pra cá. Foi Luciano quem quebrou o gelo:

– E aí? Precisamos marcar aquele “contra” de novo. Porque num acabou, né? Marcelo e Tocão estragaram tudo…

– Eu? Ele que deu um murro no meu nariz. Sorte de vocês que o Peu chegou, senão num ia ficar assim, não!

– Assim como, Marcelo? Com o nariz torto? – tirou onda comigo, Sandrão. Eu não deixei quieto. Levantei do meu lado do sofá e fui até ele:

– Torto vai ficar você, desgraçado…

– Calmaaaaa!!!” – era o Renato, Pai de Tocão.

– Vai começar o jogo, vocês vão comer, beber guaraná e ver isso juntos. Vamo sentar que os times já tão no campo!

Com a narração do Silvio Luiz, via TV Record, a gente viu que os times de Brasil e Argentina estavam em campo.

Maradona, eu não te odeio…


Estava muito recente, nas nossas retinas de meninos, aquela festa de papel picado no titulo deles contra a Holanda na última Copa, a marmelada que eles armaram contra o Peru e o timaço que eles tinham que vinha reforçado com um camisa 10 que eu já começava a gostar.

– Porra, mas como pode um cara desse tamanho, dar tanto trabalho? Porque o Oscar num da uma chegada nele?

– Porque o Oscar não ta nem achando ele em campo, Jadão! – respondeu o Sandrão.

Aos meus 11 anos de idade, eu descobri que jamais ia conseguir odiar Maradona. Ele era aquilo que eu e qualquer um dos moleques da Rua Tanger poderíamos vir a ser. Um moleque de bairro, de uma favela Argentina, com um talento especifico, como única chance de mudar a sua vida. Se apegaria a isso com toda a fé e todos os pecados do mundo.  Seria nosso rival, mas jamais, nosso inimigo:

– Ah lá, fodeu! – Falou Néinha. Com toda habilidade do mundo, o 10 argentino entrou driblando e abriu o placar. E o primeiro tempo virou com aquele gosto estranho na goela. 

O coice que uniu a nação!

Na segunda etapa, o Renato já não estava mais ali com a gente.

A irmã e a mãe do Tocão também já faziam outras coisas. Na sala tínhamos nós que torcíamos pelo mesmo time, mas que não estávamos juntos ainda. Até que o Passarela resolveu dar um jeito nisso…

Uma jogada no meio, bola comum, sem nada de perigo pra lado nenhum e na dividida com Batista, Passarella dá um coice no meio da perna do volante nosso, pura maldade.

– Filho da puta! – gritou tocão.

– Filho, num fala palavrão… – disse Dona Dirce.

– Não, Dona Dirce! Tocão tá certo; Esse Passarella é um filho da puta mesmo! – disse o Jadão.

E nesse momento fizemos um corinho no meio da sala:

– Filho da puta, filho da puta, filho da puta…

– Mas o que é isso?!?! – indignou-se a Mãe.

Sorrindo, seu Renato, amenizou:

– Deixa os meninos, Dirce. Vamos lá pro outro quarto…


E então, sozinhos, começamos a comentar a patada do Passarella, juntos, sentando agora misturados, um do lado do outro, xingando tudo da seleção Argentina, torcendo pra valer. Ali, naquele momento, a sala da casa do Tocão virou uma arquibancada do Estádio Centenário onde rolava o jogo e juntos vimos o gol de Edevaldo, empatando para o Brasil:

– GOOOOOOOOOOOOOLLLLLLLL!!!

Abraçados como amigos que sempre fomos mesmo antes de sabermos que éramos, fizemos a festa naquele domingo à tarde. Enchemos a cara de guaraná e coxinhas de frango, nos saudamos e ficamos felizes como se a vida em 1981 fosse algo muito bom. E no final, Luciano arrematou:

– Acho que aquele “contra” que num acabou a gente num precisa mais jogar. Mas acho que a gente podia se juntar pra pegar o time da Rua Camerun. Vamo?

E no caminho para a Copa de 1982, surge um novo escrete no Parque Novo Oratório…

 

 

 

 

A COPA DO MUNDO DE 1986 SOB A VISÃO DE UM MENINO LOIRINHO

por Marcos Vinicius Cabral


Sentado na última cadeira da primeira fileira do lado contrário da porta na sala de aula, o suor escorria pelo rosto daquele menino loirinho de 13 anos.

Aquele espaço físico de aproximadamente 4m x 3m, sem ventilação e com pequenas janelas encardidas deixavam à mostra algumas folhas secas castigadas pelo tempo e sopradas pelo vento.

Vez ou outra, o som dos pássaros famintos pedindo comida no ninho que estava instalado no peitoral em uma das janelas tornava menos tediosas determinadas aulas.

E era para os alunos da 6ª série do CETHL (Colégio Estadual Técnico Henrique Lage), motivo de contemplação a relação daquelas espécies de aves.

Por mais que aquele menino loirinho fosse aplicado em Matemática do professor Feliciano, equações, raiz quadrada e porcentagem nunca foram seu forte.


Já em Português, da professora Terezinha, sujeito, verbo e predicado faziam com que seu desempenho fosse satisfatório nesta disciplina.

Portanto, nada seria mais natural que a leitura e a busca incessante por informações fizessem que o menino loirinho se tornasse um ávido leitor da Reader’s Digest – revista mensal criada em 1922 por Lila Bell Wallace e DeWitt Wallace em Nova York – conhecida aqui no Brasil como Seleções e das manchetes esportivas, pois era também apaixonado por futebol.

Mas aquele ano de 1986 era ansiedade, ansiedade e ansiedade…

Era ano de Copa do Mundo e tanta ansiedade só seria atenuada à procura de informações quase sempre nas folheadas escondidas do jornaleiro nas páginas do Jornal do Brasil na banca próxima ao colégio.

Enfim, o domingo de estreia do Brasil se aproximava e era contra os espanhóis.

Aliás, os mesmos espanhóis que eram considerados favoritos na Copa de 1950 em solo brasileiro até o confronto pela fase final da competição, quando sofreram uma goleada de 6 a 1 para o escrete canarinho – Ademir da Guia e Zizinho só não fizeram chover naquela tarde no Maracanã – onde os 153 mil pagantes aplaudiram de pé os brasileiros.

Desde então, a Espanha passara a ser chamada de Fúria em virtude do encantamento de seu futebol apresentado naquela Copa.

E para não perder o brilho nos seus olhos, o menino loirinho, aflito, não escondia de ninguém a frustração se viesse a perder algum jogo caso fosse em um dia de aula.


E as partidas eram novamente no México, onde havíamos conquistado o tri com uma linha de produção dos operários da bola como Jairzinho, Gérson, Tostão, Pelé e Rivelino, que com o selo de qualidade, transformou aquele time em um fábrica de bons resultados e se transformou em um dos melhores nas vinte edições de Copas do Mundo.

Mesmo sendo um aluno exemplar, o menino loirinho não hesitaria em matar aula para correr para casa e ver seus heróis em ação.

Com os fantasmas da eliminação da seleção brasileira na Copa da Espanha, em 1982, assombrando e sobrevoando o imaginário dos amantes do bom futebol, havia no povo brasileiro, um misto de certeza e desconfiança.

Ainda mais que alguns acontecimentos infelizes pré-Copa seriam um presságio de coisas ruins.

E teria como não sê-los?

Ei-los:

Parecia mentira o 1° de abril, quando no amistoso contra o Peru, em São Luís (MA), o camisa 11 Éder Aleixo deu um tapa na cara de um adversário na lateral do campo.

Telê não hesitou e cortou o ponteiro que não mais vestiria a camisa amarelinha em jogos oficiais.

Já o outro ponteiro, Renato Gaúcho ficou de fora da lista final dos jogadores selecionados que usariam terno com as iniciais CBF bordadas no bolso do terno para viajar ao México.

O técnico brasileiro não engoliria a fatídica noite na esbórnia dele com o parceiro Leandro, em que chegaram noutro dia na concentração, na Toca da Raposa – que foi o centro de treinamentos utilizada para a preparação da Seleção Brasileira para as Copa do Mundo de 1982 e a de 1986 -, na cidade mineira.

Talvez o lateral Leandro, que surpreendeu a todos ao refutar sua segunda Copa do Mundo em solidariedade ao ponteiro gremista, tenha sido a ausência mais sentida por Telê.

Pouco tempo depois, o treinador dizia em entrevistas que precisava apenas de 40% de seu futebol, independente do estado de seus joelhos.

Mas Leandro não retrocedeu, manteve-se firme em não ir ao México e surgia Josimar, camisa 2 do Botafogo como seu substituto.

Na lateral esquerda, surgia um impressionante Branco – que sagrava-se tricampeão carioca pelo Fluminense –  que obrigaria o técnico a deslocar Júnior para o meio de campo, formando com Elzo, Alemão e Sócrates, os pensadores da equipe.

Com experiência comprovada na magia de um futebol envolvente como foi em 1982 na Espanha, Telê preferiu reservar três lugares cativos no banco: um para Cerezo, outro para Falcão e mais um para Zico.

Os dois primeiros estavam por deficiência técnica, enquanto nosso camisa 10, tentava se recuperar de uma grave contusão em seu joelho.


Era muita coisa negativa para uma seleção que buscava o Tetracampeonato Mundial.

Se o pernambucano Gagliano Neto foi o primeiro locutor brasileiro a transmitir um jogo de Copa do Mundo – na França em 1938 -, Galvão Bueno, Luciano do Valle e Osmar Santos tentaram fazer com que a torcida brasileira acreditasse no título de uma seleção pragmática com suas respectivas narrações, que vinham recheadas de emoção e de uma inquietude jamais escutada pelos ouvidos daquele menino loirinho.

A bola ia rolar…

Em 1° de julho, no gramado do estádio Jalisco em Guadalajara, brasileiros e espanhóis se perfilaram para o ritual dos jogos em Copas do Mundo.

Coisa normal, aparentemente.

Bastou tocar o Hino à Bandeira e não o Hino Nacional, que o sorriso sem graça de Sócrates e o balançar negativamente de sua cabeça, demonstraram o que seria o futebol brasileiro naquela décima segunda edição de Copa do Mundo.


O sonho acalentado há quatro anos, quando sucumbimos para a Itália, ali, naquele momento foi determinante: o Brasil não ganharia aquele Mundial.

Se o menino José Carlos Vilella Júnior, então com 10 anos, estampou a capa do Jornal da Tarde chorando lágrimas torrenciais, dando ao fotógrafo Reginaldo Manente seu terceiro prêmio Esso de Jornalismo – considerado o Oscar para a imprensa – na derrota para a Itália, em 1982, aquele menino loirinho chorava silenciosamente, sentado no chão acimentado situado à Rua Dr. March, 70, no Barreto em Niterói.

Ali, rodeado por alguns vizinhos, ele é milhares de torcedores viram o Brasil vencer a Espanha por 1 a 0, graças ao árbitro australiano Christopher Bambridge, que invalidou um gol legítimo do espanhol Michel.

O Brasil venceu mas não convenceu.

No segundo jogo contra a Irlanda, um pobre futebol e o mesmo placar da estreia – 1 a 0 – e o pessimismo cada vez mais presente àquela seleção.

No terceiro jogo, com dois golaços de Josimar e uma vitória por 3 a 0 contra os irlandeses, o caminho ia se tornando firme com os passos dado pela equipe de Telê Santana.


No jogo seguinte, contra a envelhecida Polônia do craque Zbigniew Boniek – que já não era o mesmo de quatro anos antes – um 4 a 0 trouxe um serenismo à torcida e um euforia contagiante.

Contagiante sim e perigosa também!

A próxima fase seria um desafio ainda maior já que os três jogos iniciais não serviriam de parâmetro àquela altura do campeonato.

E chegava enfim, às quartas de final da Copa do Mundo.

De um lado a seleção brasileira de Edinho, Sócrates, Júnior e Careca enfrentaria a seleção francesa de Platini, Tigana, Giresse e Amoros, para ir à semifinal.

Naquele 21 de junho, completava-se 16 anos da conquista do Tricampeonato Mundial do Brasil em 1970 e era o aniversário de 31 anos de Michel Platini, o maior jogador francês da história até o surgimento de outro maravilhoso camisa 10: Zinedine Zidane!

E o Brasil fez, sem sombra de dúvidas, sua melhor exibição.

Não era a sombra do espetáculo que produziu quatro anos antes na Copa do Mundo da Espanha, mas era uma equipe com uma tática bem definida.

Era um clássico histórico, dramático e inesquecível!

Se o camisa 10 deles esbanjava talento nos gramados mexicanos, o nosso estava no banco e sem ritmo de jogo, entrando no decorrer das partidas.


Entrou no segundo tempo e aos 26 minutos na primeira bola que recebeu no meio campo, enfiou na diagonal para a entrada do lateral Branco que tocado pelo goleiro francês (até então um desconhecido), dentro da área, cometeu pênalti.

Os olhos do menino loirinho brilharam como nunca naquele momento.

Enquanto Branco com os punhos cerrados recebia o abraço forte do meio campista Alemão fazendo-o desabar no gramado e olhando o céu mexicano, o menino loirinho abraçava todo mundo, inclusive Carlinhos, um morador de rua que assistia a partida e era famoso no bairro.

Na hora da cobrança, Edinho pega a bola e dá ao Zico como se dissesse: “Toma. É sua. Só você sabe o que passou para chegar até aqui”.

O árbitro autoriza o Galinho, que bate mal e o camisa 1 da equipe francesa voa e defende.


Nesse instante os olhos do menino loirinho começam a ser uma nascente de lágrimas de diferentes sentimentos.

Elas escorrem pelo seu rosto inocente e incrédulo com o que havia acontecido, ele olha para o céu e busca resposta para sua pergunta: “Deus, por que o SENHOR deixou isso acontecer?”.

O silêncio toma conta dos quase 100 torcedores, que aglomerados naquele chão recém acimentado fazem daquele instante um momento doloroso e inesquecível.

O jogo terminaria empatado e o Brasil perderia na decisão dos pênaltis – Sócrates e Júlio César desperdiçariam suas cobranças e Platini também – por 4 a 3.


Fim de um sonho.

Se o goleiro italiano Zoff foi o vilão da história em 1982, o que dizer de Bats, que não deixou a geração de Zico e Cia. ir além naquele Mundial?

O amor irrestrito no coraçãozinho daquele menino loirinho pelas cores verde e amarelo se transformaria em ódio mortal pelas cores da França até bem pouco tempo atrás.

Aquele menino loirinho acreditou cegamente que o Brasil de Telê Santana na Copa do México seria campeão exatamente no melhor jogo que fizera naquela competição: contra os franceses!

Vem aí, a vigésima primeira edição de Copa do Mundo, a da Rússia, em junho.

Que não tenham mais meninos loirinhos chorando em silêncio e sendo desacreditados por aquilo que há de mais precioso no futebol: a magia da inocência de se acreditar!

Passados quase 32 anos daquela Copa do Mundo, aquele menino loirinho se lamenta até hoje e vive sonhando que o pênalti perdido pelo Zico foi tudo uma brincadeira de mau gosto dos deuses que dominam e cometem injustiças nesse esporte chamado futebol.

Em tempo: O menino loirinho se chama Marcos Vinicius Cabral, tem 44 anos, é escritor – lançou dois livros e está terminando o terceiro – é jornalista, chargista, taxista, pintor de quadros, colaborador do Museu da Pelada, coordenador do jornal niteroiense on-line A Metropole e craque da camisa 23 – numa clara alusão ao dia do nascimento de sua única filha Gabrielle Cabral – do Grêmio Recreativo e Esportivo Barabá, no Porto Velho em São Gonçalo.

O MUNDIALITO DE 1981 E O NARIZ QUEBRADO QUE UNE A NAÇÃO

por Marcelo Mendez

O ano de 1980 acabava.

Não dá para dizer que as coisas iam totalmente bem no Brasil da época.

Ainda vivíamos sob a égide de uma ditadura militar, que mesmo de ressaca, ainda incomodava um bocado. Já não havia mais o AI-5, que meu pai sempre me contou que era algo muito ruim, mas ainda havia censura, repressão e com a chegada da nova década, veio também a recessão e uma caça às bruxas que fez do meu Pai, uma de suas vitimas.

Com o indefectível tempero das perseguições ocasionadas pela participação latente do velho nas grandes greves do ABC Paulista, meu Pai foi demitido da multinacional que ele trabalhava. Então, aos 10 anos de idade, comecei a entender de coisas do Brasil que decerto eu não queria entender naquele momento…


Talvez por isso, o futebol tenha tomado conta de mim com tanta força.

Eu já jogava no E.C Nacional do Parque Novo Oratório, já acompanhava o futebol via rádio e TV, quando tinha, lia a Gazeta Esportiva e a parte de esportes do Jornal da Tarde e tudo isso ficou ainda melhor quando descobri que janeiro de 1981 já começaria com um tal Mundialito no Uruguai:

– É uma espécie de mini Copa do Mundo, filho. O Uruguai vai comemorar os 50 anos da sua primeira conquista e então, vai ter esse torneio! – Me explicou meu Tio Zezinho.

O Contra que nos uniu!

Era um janeiro quente!

Todos os sóis do mundo tomaram conta do Parque Novo Oratório naquele 1981. A novidade da minha vida era que eu tinha diminuído consideravelmente minhas idas até a casa dos tios e agora, tinha minha vida na casa nova na ladeira da Rua Tanger, pra valer.

No novo endereço, os novos amigos: Pedrinho, Néinha, Rogério, Serginho… E além do Nacional, os novos parceiros da rua me chamaram para formar o nosso time da “Tanger de baixo”, afinal éramos nós que jogávamos na parte da ladeira da rua, em detrimento da “Tanger de Cima” que jogava na parte em que a rua ficava plana. E no “contra” com eles o pau comia!

Em um desses, um clássico “Vira cinco, acaba dez, gol grande, com goleiro”, vencíamos por 8×4 e eu tinha feito um punhado de gols.

Numa bola dividida, com raiva do vareio que tava levando, Tocão o zagueiro da “Tanger de Cima” me deu uma cotovelada no nariz e o sangue desceu. Na hora o pau comeu, a treta começou e então, 10 moleques começaram a trocar sopapos no meio da rua, lindamente. A coisa só acabou quando o Peu, tio do Denis, nosso goleiro, apartou a coisa:

– Marcelo, limpa o nariz, aperta a mão do Tocão e voltem a ser amigos. O que se faz no campo, fica no campo! – me recomendou o Peu. Eu aceitei.

Tocão apertou minha mão, me pediu desculpas e ali senti que ganhei um amigo, desses que o futebol é capaz de nos dar.

– Marcelo, eu não queria te machucar. Mas num queria ficar tomando caneta, chapéuzinho, um monte de gol…

– Tá bom, Tocão. Mas num precisava quebrar meu nariz, né?

– Mas acho que num quebrou, não.

– Será?

– Deixa eu ver…

E depois do diagnóstico de Tocão, apalpando minhas fuças, ficou constatado que eu num tinha nada. Depois do jogo, o acordo com minha mãe era eu ir na venda do seu Mário comprar um quilo de lingüiça caseira pra nossa janta, na “caderneta de pagar depois”. O Tocão foi comigo e no caminho, falamos de futebol:

– Amanhã tem jogo do Brasil na tv, contra a Argentina, sabia?


– Claro que sim, o Mundialito. Cê vai ver na onde, Marcelo?

– Ah, em casa!

– Sua TV é em cores?

– Não, preta e branca…

– Então pede pro seu pai deixar você ver lá em casa. Da minha casa é colorida!

– Posso ir mesmo?

– Pode!

– Ah… mas só se eu puder ir com os caras do meu time!

Tocão pensou por alguns minutos e, então, compreendendo o espírito de corpo da situação, liberou a sala pra geral:

– Tá bom, Marcelo. Vou falar pra minha mãe, que vocês vão ver o jogo lá em casa.


Dá para dizer, portanto, que a Copa do Mundo de 1982, começou antes, a partir de um nariz quebrado e de uma porradaria generalizada. Foi depois daquele “contra” de rua x rua, que começou a torcida para aquela que viria a ser a maior seleção da minha geração. E não apenas isso.

Por conta da seleção de 1982, uma turma de moleques de uma rua da periferia de Santo André, no ABC Paulista, decidiu se juntar, se conhecer e se entender. Nascia ali a torcida para a seleção de 1982 e nascia também, as mais belas amizades que se pode ter.

E a partir dali, parou de ter “Tanger de Baixo” contra “Tanger de Cima”

A Rua Tanger passou a ser uma só…

COPA DO MUNDO DA MÚSICA

por Mateus Ribeiro

A Copa do Mundo está chegando, e já estamos todos no clima. Seja trocando figurinhas do álbum, seja fazendo simulações com a tabela, todo mundo já está se imaginando na Rússia.

Como sou ser humano, amo futebol (principalmente a Copa do Mundo), decidi que entraria no clima do Mundial, mas de maneira diferente: resolvi que era a hora de listar atletas que disputaram o maior campeonato de futebol do planeta, e que se aventuraram no mundo da música.

Nessa pequena lista, você encontrará de tudo: desde campeões geniais até jogadores não tão talentosos, seja cantando samba ou judiando de uma bateria. Sem mais conversa, vamos ao que interessa!

Alexi Lalas, o zagueiro rockeiro

É muito provável que você se lembre de Alexi Lalas, um dos maiores fenômenos da inesquecível Copa de 1994. Em razão de sua cabeleira e sua barba um tanto quanto chamativas, Lalas foi um dos jogadores mais falados durante o Mundial. Se fosse nos dias atuais, certamente viraria um meme.

Lalas não era apenas jogador de futebol. Desde sua adolescência, fazia parte de uma banda chamada Gypsies. Porém, seu “sucesso” veio com a carreira solo, com o zagueiro/guitarrista chegando a lançar dois discos enquanto jogador: “Far From Close”, em 1996, e “Ginger”, em 1998. Lalas ainda está na ativa, passeando por várias vertentes do rock and roll. Seu último disco, lançado em 2016, chama se “Shots”, e conta com a ótima “Big Break”, que pode ser conferida no vídeo.

Sócrates, um fã de sertanejo:

Que Sócrates é um dos maiores e mais emblemáticos jogadores da história do futebol brasileiro, todos nós estamos cansados de saber. O que muita gente talvez não saiba é que o saudoso Doutor tem um disco de música sertaneja lançado.

Dois anos antes de disputar sua primeira Copa do Mundo, Sócrates gravou um disco de música sertaneja, intitulado “Casa de Caboclo”. O craque do Corinthians e da Seleção Brasileira gravou músicas como “Cabocla Tereza”, “Luar do Sertão” e Couro de Boi”. Para quem gosta de uma boa moda de viola, vale a pena ouvir este grande achado.

Júnior Capacete, um craque do samba: 

Um dos principais jogadores da história do Flamengo, Júnior, carinhosamente (ou não) chamado de Capacete, esbanjou talento e longevidade pelos gramados do Brasil e do planeta.

No ano de 1983, Júnior gravou um LP, com destaque para a música “Povo Feliz” (também conhecida como ‘Voa, Canarinho, Voa), tema da Seleção na triste Copa de 1982. Seu LP é algo difícil de se encontrar, mas enquanto não encontro, você pode ficar com essa regravação de 2014 para a citada música.

Petr Cech:

Em 2006, Petr Cech pintava como um dos melhores goleiros do mundo. A seleção da República Tcheca, que disputava seu primeiro Mundial, despertava curiosidade, e alguns até imaginavam que Nedved e sua turma poderiam fazer uma boa campanha. Isso não aconteceu, e o sonho acabou na primeira fase.

Essa foi a única participação de Cech em um Mundial. Sua carreira foi um sucesso, com títulos nacionais e continentais pelo Chelsea. Hoje, já em final de carreira, alterna bons e maus momentos no rival Arsenal.

Pelo menos depois que aposentar, o goleirão já sabe o que fazer: aulas de bateria, uma vez que seu kit sofre um pouco na mão do grandalhão. Mas imagina só se ele tivesse com as baquetas o mesmo talento que tem com as luvas? Desfrute de bons momentos em seu canal no Youtube:

Miguel Herrera cantando Ska: 


Miguel Herrera foi um lateral da Seleção Mexicana, e como a grande maioria dos seus companheiros de selecionado, nunca chamou muito a atenção pelo talento. Talvez você se recorde de seus espetáculos na Copa 2014, quando como treinador, proporcionou algumas cenas bonitas como essa:

Pois bem, mas se você acha que esse comportamento, e o fato de ter sido demitido do cargo de técnico da Seleção Mexicana por ter descido o braço em um jornalista foram suas maiores bizarrices, está redondamente enganado.

Em 2002, quando treinava o Atlante, o treinador gravou uma canção do ritmo SKA para ajudar a promover e divulgar o bom momento do clube. Clique no link abaixo, e assista essa preciosidade do mundo alternativo.

VIDEO| Miguel Herrera al grito de guerra – SanDiegoRed.com
La canción del género “Ska” que alguna vez hizo el ‘Piojo’ para el Atlantewww.sandiegored.com

Ümit Davala, o rapper Turco: 

Davala foi um dos pilares da Seleção Turca na inesquecível campanha na Copa de 2002. Chamou a atenção pelo seu futebol e seu penteado de gosto duvidoso.

Se você achou o penteado dele um tanto quanto alternativo, é porque não ouviu disco de Rap cantado em turco pelo ex jogador. Lançado no ano de 2004 , o disco chamado de “UD 2004” é um tesouro para quem gosta de curiosidades e excentricidades.

Ryan Babel, boleiro e rapper nas horas vagas: 

O atacante holandês está bem longe de ser um craque. Mesmo assim, conseguiu participar de poucos minutos entre os Mundiais de 2006 e 2010. Sua carreira em Mundiais não passa disso.

Talvez sua carreira como rapper seja mais interessante. Com o nome artístico de Rio, Babel tem participações em músicas de outros rappers. Mas seu melhor momento mesmo fica para a música gravada ao lado do compatriota Royston Drenthe (que chegou a jogar no Real Madrid). Vale a pena ouvir:

Raí, o homem que estava nos sonhos de Paula Toller: 

Achou que apenas Sócrates representaria a família Vieira de Oliveira? Achou errado, amante da música e do futebol.

No ano de 1993, antes de disputar sua primeira (e única) Copa, um dos principais jogadores da história do São Paulo participou do clipe da música “Eu tive um sonho”, da banda Kid Abelha. Raí faz um papel de Príncipe Enantado no clipe. Relembre esse grande crossover abaixo:

Tomas Brolin, dos gramados para as pistas de dança: 

No ano de 1999, as boybands estavam em alta. Nomes como BakstreetBoys, Five e N´Sync estavam no auge, e rodavam o mundo, fazendo shows para multidões.

O fenômeno rodou o planeta, e a Suécia não poderia ficar de fora. Um dos principais nomes da Seleção Sueca na Copa de 1994, Tomas Brolin fez parte do grupo Friends In Need, que executava um eurodance de gosto um tanto quanto duvidoso. O clip é tão inusitado quanto a música. A desenvoltura de Brolin como integrante de banda de adolescente mostra que escolher o futebol foi a melhor das opções.

Pelé, um pouco além do ABC: 

A lista tinha que terminar com o Rei. Pelé gravou uma música para promover os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro.

A canção, intitulada “Esperança”, é mais empolgante do que o jingle que dizia que “…toda criança tem que ler e escrever”. Porém, podemos dizer que como cantor, o rei continua sendo o maior jogador de futebol de todos os tempos.

E você, consegue se lembrar de algum outro craque (ou pereba) que participou de uma Copa do Mundo e foi fazer sucesso nos estúdios e palcos mundo afora? Caso se lembre, mande aí nos comentários!

Até a próxima!

TITE, RINUS MICHELS E LUAN

por Claudio Lovato


A se confirmar a informação de que Tite não levará Luan para a Copa da Rússia sob o argumento de que o jogador do Grêmio não tem posição definida em campo, e que por isso seria difícil encaixá-lo no time, estaremos diante de um descalabro.

Fico imaginando – vício de ficcionista, me perdoe – um papo entre o Tite e o Rinus Michels, com o brasileiro tentando explicar ao técnico da grande Holanda de 1974 (cuja morte está completando 13 anos neste mês de março) o porquê de não levar Luan para a Copa de 2018:

– Rinus, não dá para saber onde ele joga! Ele joga pelo meio? Pela esquerda? Pela direita? É armador? É atacante? Pô, não dá!

– Mas isso não é bom, Tite? Isso não dificulta a marcação para o adversário? Os caras não ficam desesperados procurando por ele em campo e quando se dão conta ele está colocando um companheiro em condições de finalizar? Foi o que eu ouvi.


– É, pode ser, mas isso pode confundir os companheiros também!

– Bom, e me perdoe pelo que vou dizer agora, mas aí é que entra a mão do treinador. Eu tive sob meu comando uns caras que também não guardavam posição e, olhe, acho que dá para dizer que provocamos algumas dores de cabeça em nossos oponentes.

– Mas temos que encaixar as peças direitinho, Rinus! Organização é tudo! Você sabe disso!

– Eu sei. Organizei o time de pelada mais bacana de todos os tempos.

– Então?!

– Mas não seja tão certinho, amigo!

– Cada jogador tem que saber onde jogar e cumprir à risca o combinado. Senão, a engrenagem não funciona. Até o Neymar sabe que tem que ficar no quadrado dele!

– Engrenagem. Por isso é que eu ficava contrariado, para não dizer outra coisa, quando nos chamavam de Laranja Mecânica”.

– O coletivo acima do individual, Rinus!

– Você está dizendo isso para mim?

– Me desculpe, não quero parecer presunçoso.


– Tite, me diz uma coisa, com sinceridade e humildade: você ainda não conseguiu entender o futebol do garoto, é ou não é?

– Claro que entendi! Só não vejo como colocar ele no time!

– Não, amigo, então você não entendeu.

– A ideia de time! A inexorabilidade da supremacia do conceito de coletividade!

– O que faz o todo é a soma das partes. E quanto melhores as partes que você tiver em mãos, melhor. Organize-as e depois dê o máximo de liberdade para que rendam tudo o que podem.

– O futebol de hoje não permite essas coisas, Rinus! Por favor!

– Pelo contrário! O futebol de hoje exige exatamente isso, talvez como nunca antes! Disciplina tática com liberdade para os jogadores! Ocupação de todo o campo, troca de posição, posse de bola, e então passe, passe e passe. Pelo que sei, esse rapaz do Grêmio se dá muito bem num esquema assim.

– É assim que já jogamos na Seleção!

– Mas pode ficar muito melhor. Pode ficar mais complicado para o adversário!

– Não sei se é necessário.

– Você é quem decide. Mas se eu posso pedir alguma coisa, é isto: considere levar o garoto pelo menos entre os 23.

– OK, vou considerar, Rinus.


– Sucesso para o Brasil lá na Rússia. Você tem ótimos jogadores. Mas talvez precise de alguém para bagunçar o coreto de vez em quando.

– Vou pensar, Rinus, vou pensar…

– Boa sorte. Abraço.

– Outro. Ah, sim, antes que eu me esqueça: o que o Cruyff acha disso?

– Melhor eu nem lhe dizer, Tite.