por Elso Venâncio, o repórter Elso
A transferência do Bebeto para o Vasco soava inacreditável. Parecia tão surreal, que eu anunciava a negociação pela Rádio Globo e a imprensa, em geral, mantinha-se calada.
Após um jogo entre Flamengo e Remo, em Belém, tive uma longa conversa com José Moraes, então procurador do craque. De cara, senti que teria de trabalhar a notícia, pois ela sacudiria duas gigantescas torcidas rivais. Era outra época, sem internet, que foi a responsável por sepultar o furo de reportagem. Hoje a informação é fracionada, sai sempre em tempo real.
O aperto de mão entre Eurico Miranda e José Moraes aconteceu ‘no fio do bigode’, em plena concentração do Brasil, em Teresópolis. O dirigente vascaíno era diretor de futebol da seleção brasileira, que conquistaria dentro em breve a Copa América após um longo jejum de 40 anos. Bebeto foi o artilheiro da competição. Marcou sete gols e era o maior jogador do país.
Zico ganhava US$ 20 mil por mês e, seguro do acordo feito por Bebeto com o Vasco, seu procurador pediu o dobro do salário que o maior ídolo da história do clube recebia.
No intervalo de uma das partidas do clube, na Gávea, pedi para a produção da rádio ligar para o presidente Gilberto Cardoso Filho, que estava em Portugal. Tivemos um ríspido diálogo, no ar, com Gilbertinho negando a possibilidade de perder o atacante:
“Estou jantando sempre com o (Antônio Soares) Calçada, aqui em Lisboa. Faz uma entrevista com ele.”
Retruquei que eu não confiava no então presidente cruz-maltino.
“Você está afirmando um fato que não existe! Bebeto é do Flamengo e ponto final.”
Pedi à Rádio para que ela preservasse a gravação da matéria. Senti Gilberto Cardoso completamente desinformado e imaginei a proporção do final do caso. Quando o dirigente se deu conta da rasteira que levou do amigo Calçada, tentou, sem sucesso, negociar o jogador para a Roma e, depois, o Bayern de Munique.
Uma comissão de ilustres rubro-negros dirigiu-se à Granja Comary. Márcio Braga, George Helal, Kleber Leite, Josef Bernstein e Moisés Akerman se reuniram para tentar convencer o artilheiro a permanecer na Gávea. Diante da repercussão do assunto, Bebeto, aconselhado pela esposa Denise, acabou recuando:
“Vou ficar no Flamengo.”
Já o procurador dele, não:
“Palavra é palavra, e ele vai cumprir.”
Naquela época, simplesmente, concretizava-se a maior transação do futebol brasileiro. O Vasco vendeu o meia Geovani para o Bolonha, da Itália, e depositou o valor do passe de Bebeto na Federação: US$ 2,5 milhões. O atacante foi ameaçado de morte e andava assustado, cercado por seguranças. À noite, em sua casa, na Barra da Tijuca, pelo menos dez guarda-costas cercavam sua mansão que ele recebeu do novo clube.
Foi a mais tensa e polêmica negociação da história do futebol brasileiro.