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andré felipe de lima

DINO SANI FOI ÍDOLO EM TODOS OS CLUBES QUE DEFENDEU

Os italianos o queriam na Azzurra, mas o coração do brasileiríssimo Dino Sani o impediu de vestir o manto azul quatro vezes campeão mundial. No Palmeiras, no São Paulo, no Milan ou no Corinthians. Em todos esses clubes, o grande centromédio, que esteve na Copa de 58, na Suécia, brilhou intensamente. Conheça um pouco mais sobre esse ídolo do passado nas linhas a seguir.

por André Felipe de Lima


O menino Dino tinha apenas quatro anos quando ganhou do pai sua primeira bola. Sob as vistas dos pais, Caetano e Maria Sani, e de Claudia e Silvia, irmãs mais velhas que ele, chutava-a contra a parede, no fundo do quintal, sem imaginar, contudo, que aquele lúdico momento representava um preâmbulo de magistral carreira nos gramados daqui, da Argentina e da Itália. Foi aquele fundo de quintal o palco para o despertar do grande Dino Sani, um ídolo de uma época em que os volantes não se resumiam a jogadores de contenção. Eram, acima de tudo, craques de verdade.

“Meu pai não implicava, não falava nada. Acho que ele nunca foi me ver jogar bola. Acho que ele não foi, não. Eu nunca vi ele também. Ou ele olhava escondido. Não sei. Eu sei que eu me encaminhei sozinho. Ninguém me levou. Eu que fui pra lá. Eu gostava muito de jogar bola. Jogava bola na rua também, aquelas peladas da molecada, vinha com os dedos tudo arrebentado. Àquela época, a gente andava muito descalço, então na hora na pelada, meu filho, a gente chutava pedra, chutava tudo, viu. Aparecia ali, a gente chutava”, declarou Dino Sani ao projeto Futebol, Memória e Patrimônio, do CPDOC/FGV).

Descendente de italianos da Toscana e de Ferrara [os avós vieram junto com os Matarazzo e com a rica família trabalharam em São Paulo], Dino Sani é cidadão paulistano, nascido no dia 23 de maio de 1932. É reconhecido como um dos mais técnicos que já se viu na posição de centromédio. Já rapaz, defendendo o time de aspirantes do Palmeiras, isso ficou evidente. Tão evidente que, embora não justificasse a decisão que planejara, optou por abandonar os estudos no último ano ginasial no Colégio Oswaldo Cruz, onde só jogava handebol, para dedicar-se exclusivamente à bola de futebol. “E eu saía de casa, corria cinquenta metros de rua, pulava o rio, tinha um riozinho ali, subia no muro e caía dentro do Palmeiras. Ia brincar lá dentro. E ia treinar também, porque eu tinha onze, doze anos aí”.


Dino Sani foi campeão do mundo em 1958, era titular da seleção, mas perdeu a vaga para Zito. Atuando em clubes, teve como títulos mais importantes o campeonato paulista de 1957, pelo São Paulo, e o italiano, de 62, e a Copa dos Campeões, de 63, ambas pelo Milan. Era tão talentoso no domínio da bola que muitos o acusavam de individualista, o que especulavam ter influenciado Vicente Feola a substituí-lo por Zito na Copa da Suécia. Mas o que lhe tirou do time foi uma distensão muscular na virilha durante o jogo contra a Inglaterra.

Formado nas divisões de base do Palmeiras, Dino começou a carreira profissional no Alviverde, em 1949, durante um período de fartura de craques no Parque Antarctica, como Waldemar Fiúme, para quem Dino fazia de sombra na linha média, Rodrigues Tatu, Achiles, Liminha e Jair Rosa Pinto. Como não era aproveitado, foi emprestado, em 1950, ao XV de Novembro de Jaú, que disputava a segunda divisão paulista. Voltou ao Palmeiras em 1952, mas foi logo emprestado ao extinto Comercial da capital paulista junto com Gino Orlando, outra revelação das bases palmeirenses, que também acabaria contratado pelo São Paulo. Dino Sani jogou bem durante duas temporadas pelo time do interior e foi contratado pelo São Paulo, em fevereiro de 1954, para o lugar do centromédio e ídolo tricolor Bauer. No Tricolor, Dino Sani formou uma meia cancha formidável com o seu ídolo Zizinho mais a frente. Gino Orlando, seu ex-companheiro dos tempos de juvenil no Palmeiras, marcou muitos gols graças aos passes do volante, que durante a temporada de 1956 surpreendeu ao ser o segundo principal goleador do São Paulo ao assinalar 29 gols. Até 1961, Dino disputou 322 jogos com a camisa tricolor, venceu 169, empatou 81 e marcou 108 gols, segundo dados compilados por Alexandre da Costa para o Almanaque do São Paulo. Talvez não haja na história do futebol brasileiro um volante com faro de artilheiro como Dino Sani.

Em 1961, o Boca Juniors, que já tinha no elenco os brasileiros Paulo Valentim [ex-Botafogo], Maurinho [ex-São Paulo e Fluminense], Orlando Peçanha [ex-Vasco] e Edson [ex-América], pagou um milhão de dólares pelo passe de Dino Sani, que permaneceu apenas uma temporada na Bombonera, período em que disputou 14 jogos e marcou 4 gols. Ficou mais tempo na reserva de Rattin, que se tornaria um dos maiores ídolos da história do Boca Juniors. Porém, desde a Copa de 1958, o Milan tinha interesse pelo craque e a negociação se concretizou em 1961, com Dino estreando no dia 12 de novembro, quando o time vermelho e preto derrotou a Juventus pelo placar de 5 a 1.

As grandes conquistas na Itália tornaram-no ídolo local, mas o que fez mesmo Dino Sani cair nas graças da torcida milanesa foi um lance casual em que o craque brasileiro quebrou o nariz de Mauro Bicilcli, da rival Internazionale.


No rubro-negro de Milão, Dino jogou com Giovanni Trappatoni e Cesare Maldini, pai de Paolo Maldini, e marcou 14 gols em 62 jogos até sua despedida do clube, em 1964.

Àquela altura ídolo inegável dos italianos, Dino Sani acabou convidado para atuar pela seleção italiana na Copa de 1962, no Chile: “Não aceitei. Sempre joguei sério e não conseguiria enfrentar o Brasil. Continuei pela Europa e tenho certeza que sempre consegui elevar o nome do futebol brasileiro em todas as partidas que fiz”, alegou.

Faltava-lhe defender mais um clube do “Trio de ferro paulistano”, mas o Milan fez, em meados de 1964, jogo duro para que deixasse o clube italiano. “Meu contrato com o Milan havia terminado e, apesar de receber uma boa proposta para renovar, preferi voltar ao Brasil. Além das saudades, que já eram imensas, precisava estar no Brasil para cuidar dos negócios. Preferi deixar de ganhar um bom dinheiro na Itália para poder estar presente nas negociações dos meus bens. Realmente houve um impasse entre o clube e eu. Tudo porque me haviam prometido passe-livre ao final do contrato e, quando isso ocorreu, muitos clubes se interessaram por meu concurso. O Milan então se aproveitou da situação exigindo bastante dinheiro para me liberar. De nada adiantou garantir o que o que eu queria era voltar ao Brasil. Eles fizeram pé firme e acabaram conseguindo o que desejavam”. Mas por apenas alguns meses.

Repatriado em dezembro de 1964, Dino Sani, já acima dos 30 anos, baixou no Parque São Jorge com honras e pompas para jogar ao lado do garoto Rivellino, que o considera o melhor companheiro que já teve em campo. Seu passe custou 38 milhões de cruzeiros ao Milan.

Dino jogou 116 partidas pelo Timão entre 1965 e 68. Venceu 66, empatou 21 e marcou 32 gols, destaca Celso Unzelte, no Almanaque do Corinthians.

Em 1969, depois de três anos ensaiando a despedida dos campos, Dino aceitou o convite para treinar o Timão com a missão de acabar com o jejum de títulos paulista. Mesmo sem conquistas expressivas pelo Corinthians, foi convidado para treinar a seleção brasileira, às vésperas da Copa de 1970. Dino não aceitou, em respeito ao amigo João Saldanha, defenestrado do cargo.

No Internacional, Dino Sani ganhou três campeonatos gaúchos consecutivos, de 1971 a 73, ano do pentacampeonato do clube. Foi a sua melhor fase como técnico de futebol. O ex-volante treinou outros clubes brasileiros, como Goiás, Palmeiras, Coritiba, Fluminense, Flamengo e Ponte Preta, mas longe dos resultados obtidos com o Colorado.

No exterior, também lembraram de Dino Sani, que comandou Peñarol, clube que levou ao bicampeão uruguaio em 1978 e 79 e onde lançou o craque Ruben Paz, Boca Juniors [1984], Humiuri, no Japão, e a seleção do Catar. Dino treinava o time do Grêmio na final da Copa do Brasil de 1991, quando o time gaúcho perdeu o título para o Criciúma de Luís Felipe Scolari. Já rico e atuando como empresário na capital paulista, Dino Sani treinou o recém-fundado Ecus-Suzano-Sonda, em 2005.

Uma das grandes frustrações de Dino Sani foi não ter jogado no futebol carioca. Confessou isso durante uma entrevista à antiga Revista do Esporte. Azar dos clubes do Rio de Janeiro, porque deixaram de vibrar com um dos melhores jogadores da história do futebol brasileiro.

SEM LERO LERO, BIRO-BIRO FOI ‘MELHOR’ QUE MARADONA

Se Biro-Biro foi ou não melhor que o “deus” argentino, pouco importa. O mais significativo de tudo é que hoje o grande ídolo da Fiel faz anos. Conheça um pouco mais sobre o incomparável craque que tantas alegrias proporcionou ao Corinthians

por André Felipe de Lima


(Foto: Reprodução)

Não há no Brasil inteiro quem não conheça a marca “Biro-Biro”. Apareceu um lourinho (ou parafinado, como o original) de cabelo encaracolado, e pronto, logo o chamam de Biro-Biro. Não há apelido mais apropriado. Esta marca, aliás, tem dono e se chama, na “razão social”, Antônio José da Silva Filho.

Se muitos não conseguem associar o nome e o apelido ao dito cujo, tenham certeza que isso não é problema para nenhum corinthiano que se preze. Biro-Biro é, para os fanáticos pelo Timão, mais que um ídolo, é – e os iconoclastas que me perdoem – a alma do Corinthians, que encarnou no Estádio do Morumbi, no nublado dia 12 de dezembro de 1982, quando estava em disputa o título de campeão paulista.

De um lado, o poderoso elenco do São Paulo, com Serginho, Renato, Oscar, Dario Pereyra e Valdir Peres, tentando o inédito de tri, do outro a Democracia Corinthiana, com seus inabaláveis mosqueteiros. Um deles, o mais ousado naquela tarde, o mais mítico… era o Biro-Biro.

Horas antes do inesquecível jogo, o quadro clínico do jogador não estava lá essas coisas. Uma forte gripe o incomodava. Após almoçar no hotel-concentração Planalto, subiu imediatamente para descansar. Quando embarcou no ônibus que levaria o time para o estádio, exibia olheiras e uma indisposição flagrante. Para piorar seu quadro, o tornozelo direito estava comprometido há semanas. O temeroso treinador do Corinthians, Mário Travaglini (1932–2014), confidenciara ao diretor Adílson Monteiro Alves que, sem Biro-Biro, o time também ficaria sem o contragolpe para abater o forte time Tricolor.

Mas o inigualável Biro-Biro ensinou no gramado como ser ídolo de uma torcida. Prendeu a bola, quando tinha de prendê-la, e marcou dois gols inesquecíveis. No final, o Timão derrotou o São Paulo pelo placara de 3 a 1 e o herói levantou o troféu, recusando qualquer proposta de troca de camisa com o adversário. “Essa eu prometi ao meu pai”. Afinal, o craque era fiel. Fiel como a apaixonada torcida corinthiana.

Regularidade. Essa a palavra-chave para toda a trajetória de Biro-Biro com a camisa do Corinthians. Quem bem o definiu foi outro ídolo inesquecível: Sócrates: “Ele não joga bem só nas finais. Joga bem sempre”. A mais pura e cristalina verdade.

Biro-Biro nasceu no dia 18 de maio de 1959 em Santo Amaro, Pernambuco. Filho de Cândido José da Silva e Ivanice Marques de Souza. O pai, portuário, separou-se da mãe quando Antônio e os três irmãos ainda eram pequenos. A vida foi muito difícil para o garoto. Mas a vida casca grossa ficaria para trás, e um dia o garoto de cabelo oxigenado encantaria a torcida do Corinthians e se tornaria um símbolo da raça alvinegra, jogando como meio-campo na virada da década de 1970 para 80. Enquanto o destino não cumpria seu vaticínio, a mãe de Antônio sustentava os filhos com os bolos que fazia, muitas vezes das mangas e cocos surrupiados pelo menino Antônio das árvores dos quintais alheios. Quem, afinal, não teve um dia de moleque na infância? E o coco era importante, pois o prato predileto do menino era camarão com coco, que dona Ivanice preparava como poucos.

A vida, contudo, permanecia difícil. Quando Dª. Ivanice conseguiu trabalho em São Paulo e deixou os filhos com a avó. Antônio, com 11 anos, morou com o pai em uma palafita. Tentou pescar caranguejo, mas um beliscão fez com que desistisse da vida de pescador antes mesmo de ser iniciada. E foi da paixão que o pai tinha por um doce feito de biri-biri (uma fruta da família da carambola e também é conhecida como limão-de-caiena), que nasceu o apelido que o projetaria para o Brasil: Biro-Biro. Antônio era a cara do pai. Nada mais natural do que herdar o apelido paterno.

O curioso é que Biro-Biro não era muito bom no que se propunha a fazer. Na escola, não era dos melhores; subir em árvore alta demais, nem pensar; chegou a se entusiasmar com o surfe – daí, a inconfundível cabeleira oxigenada; mas era, como rege a gíria surfista, maroleiro.

No futebol, era diferente. Chamava a atenção durante as peladas. Aos 14 anos, embora dizendo-se torcedor do Náutico, foi levado para o juvenil do Santa Cruz. O destino começava a esboçar seu traço. Biro-Biro passou em um teste no Sport e logo já estava no time juvenil do rubro-negro. Foi campeão juvenil em 1975 e repetiu o feito no ano seguinte. Já ostentava pinta de ídolo.

Em junho de 1977, quando dividia a sala de aula com o campo de futebol, Toinho Biro-Biro, que cursava o segundo ano do antigo científico do Colégio Pedro II, levou a torcida do Sport à loucura com um gol sensacional contra o Santa Cruz que garantiu o título do primeiro turno para o Leão de Recife. No colégio, foi recebido pelos colegas com o coro “Biro, Biro, Biro/Biro Tetéia”, paródia da garotada para uma famosa música do começo dos anos de 1970.


(Foto: Reprodução)

Passou a manhã de segunda-feira contando aos colegas sobre o grande feito e, em casa, em Olinda, onde morava com a família, não perdeu a chance de tripudiar do pai, torcedor fanático do Santa.

Num amistoso contra a Seleção Brasileira de novos, deu outro show. Não ficaria por muito tempo em Recife. Vicente Matheus, o folclórico presidente corinthiano, viu Biro-Biro contra a Seleção e não pensou duas vezes: “Quero Biro-Biro no Corinthians”.

Conseguiu. Pagou 2,5 mil cruzeiros em agosto de 1978 ao Sport, que queria 4,5 milhões, mas o garoto de 19 anos não era bobo. Entrou na Justiça e obteve os 15% do valor do seu passe que estava com o rubro-negro de Recife.

Matheus estava obcecado pelo bicampeonato. Afinal, o Timão, campeão em 1977, após impiedoso jejum de 23 anos, precisava recuperar definitivamente a hegemonia no futebol paulista. Tentara Falcão e Batista, ambos da máquina de jogar bola que era o Internacional. Nada conseguiu. Biro-Biro foi a melhor solução.

Os representantes do cartola do clube paulista foram à casa de Biro-Biro e o rapaz sequer teve a chance de dizer sim ou não. Só teve tempo de arrumar as malas e partir para São Paulo, sem discutir salário, valor do passe, luvas… não era uma proposta e sim uma determinação. Recebia do Sport 12 mil cruzeiros mensais. O Corinthians passou a pagar 20 mil.

“Eu não queria (deixar Recife), foram me buscar em casa quando meu pai estava viajando. Não entendia de negócios, nem entendo até hoje (em 1981, quando concedeu esta entrevista à “Folha de S.Paulo”). Nunca fiquei sabendo quanto realmente custou meu passe, e só fui receber os 15% a que tinha direito na Justiça. Deixei minha avó doente e vim, em agosto de 1978. Trazia roupa para uma semana, e só voltei para o Recife em dezembro. Dormi a primeira noite na concentração do Parque São Jorge, pedi para mudar e o Luciano (outro pernambucano, vendido pelo Sport ao Corinthians nessa mesma época, quando o clube de Recife entrou em liquidação por não disputar o campeonato regional) me levou para morar com ele num apartamento. Fiquei por lá”.

Em São Paulo, o garoto sentia-se mesmo muito só, mesmo dividindo o apartamento com Luciano e Jaime, que já conhecia de Recife. Tinha medo da cidade grande. A eloquência e o cimento paulistanos verdadeiramente assustam. Restava-lhe de consolo uma televisão.

“Corremos para comprar seu passe porque o São Paulo, com essa história de Marião e Chico Fraga, estava era querendo furar nosso negócio com o Sport. Mas nosso espião no Morumbi nos alertou a tempo”, contou José Teixeira, técnico do Corinthians na ocasião da chegada de Biro-Biro ao time.

“Quando deixei o Recife, eu nem mesmo sabia para que time estava me trazendo. Só sabia que vinha para São Paulo. E isso, falando em futebol, não me preocupou nada. O que a gente sabe, com um pouquinho de tempo para se adaptar, a gente mostra em qualquer lugar”.


(Foto: Reprodução)

Biro-Biro, que um dia lavou carros e vendeu mangas para ajudar a mãe em Recife, foi apresentado ao Timão exatamente no dia 10 de agosto de 1978. Chegou ao Parque São Jorge praticamente junto com Sócrates, que veio do Botafogo de Ribeirão Preto. “Falei que ia montar um time para brigar pelo título. Já trouxe o Sócrates e agora está chegando um garoto novo, que jogava em Recife. O nome dele é Lero-Lero”.

E a célebre frase de Vicente Matheus nunca mais foi esquecida pela crônica esportiva. O garoto era esforçado. Treinava bastante e logo garantiu vaga no time que conquistou o primeiro turno do Campeonato Paulista. Mas o Timão não garantiu o título estadual de 1978. A festa foi transferida para janeiro de 1980, quando Sócrates e Biro-Biro conduziram o Corinthians ao título do Campeonato Estadual do ano anterior, após tirar o Palmeiras do caminho, com um gol de canela assinalado por Biro-Biro.

Logo após o sucesso repentino antes mesmo do campeonato de 1979, o craque – vá lá… – lourinho acabaria se soltando um pouco mais na Paulicéia Desvairada. O reflexo do desprendimento fora dos gramados era visível.

“Eu comia sanduíches, dormia tarde, treinava mal, fui facilitando. As gripes – por causa do tempo frio de São Paulo – sempre me pegavam, como as contusões. E eu fui caindo. Quando cheguei ao fim do poço, reserva sem chance no time, um mês machucado sem treinar, percebi que estava sozinho. Fiquei meio desesperado, queria voltar, pedi ao Isidoro Matheus (na época, vice-presidente de esportes do Corinthians, tio da esposa Luciane) que me deixasse voltar para o Recife. Não comia, nem treinava, nem jogava, nem tinha amigos”.

Diante desse contexto, não demoraram a surgir críticas de que Biro-Biro gostava da noite. O craque reconhecera que havia extrapolado. “A cidade me engoliu. Eu já conhecia tudo, conhecia bem, mas estava sem rumo, todos diziam que eu vivia em boates. Sei que isso é a morte do atleta. Quando pega essa fama, o sujeito está desgraçado. Nesse momento da minha vida, apareceram uns amigos pra aconselhar. O Luciano (ainda aquele Luciano, passando então por Juventus e Portuguesa de Desportos) deu força pra que eu não desesperasse. Tinha só o futebol pra me segurar aqui, sem ele era um nordestino igual aos outros todos, sem profissão nem jeito de me manter. Veio também ‘seu’ Jorge Vieira (treinador, em novembro de 1979), e eu passei a encarar as coisas com mais confiança”.


(Foto: Reprodução)

O segundo campeonato de Biro-Biro – jogando como ponta-esquerda – pelo Timão foi o já mencionado em 1982, ano, aliás, em que Sócrates institucionalizou no clube a Democracia Corinthiana, da qual Biro-Biro discordava. Achava que a diretoria concedia privilégios aos membros mais atuantes do movimento. Foi, talvez, uma das poucas vozes dissonantes do grupo de jogadores. Dizia que alguns tinham mais liberdade que outros e que não recebera o reconhecimento da diretoria.

Anos mais tarde, acirrou ainda mais as críticas: “Se a proposta deles fosse real, seria ótimo; mas a Democracia Corinthiana nunca existiu. Na verdade, existia só que para apenas dois ou três jogadores que muitas vezes não representavam a vontade do elenco”.

Política à parte, o bicampeonato aconteceu no ano seguinte. Biro-Biro, agora na ponta-direita. O craque disputou onze campeonatos paulistas e chegou a sete finais. Ganhou quatro. A última delas em 1988. Era o capitão do Timão. Foram 589 jogos pelo Corinthians, com 265 vitórias e 199 empates. É o quinto jogador que mais vestiu a camisa corinthiana em toda a história do clube. Marcou 75 gols. Tinha, portanto, crédito com a torcida.

E isso foi posto a prova em 1987, após uma derrota para o Atlético Mineiro de Telê Santana, quando a torcida ameaçou agredir os jogadores. O único “absolvido” e aplaudido de pé pelos torcedores foi Biro-Biro, o único a sair pelo portão principal do estádio.

Além dos títulos paulistas, conquistou a Taça Governador do Estado (1978), o Torneio de Hidalgo (1981), a Taça de Porto Alegre (1982), a III Taça das Nações de Los Angeles (1985) e o Torneio de Verão (1986–1987).

No Corinthians, das glórias guardou uma em especial: a esposa Luciane, sobrinha de Vicente Matheus. O curioso é que ela, somente depois de algum tempo de namoro, confessou ser sobrinha de Matheus. Biro, por sua vez, dizia se chamar Tony. Casaram-se em outubro de 1980 e têm três filhos.

No começo, a timidez de um monossilábico Biro-Biro impressionava Luciane: “Viu como ele melhorou, já está falando mais..”, disse ela ao jornal “Folha de S.Paulo”, logo após o Corinthians conquistar o Campeonato Paulista, em 1982. “Quando conheci, nem falava, era um sacrifício. Depois que passou a ler um pouquinho, ir mais ao cinema… Ele precisava disso, tem que dar entrevista toda hora. Imagine se continua como naquela época em que passou a me namorar em casa. Era minha mãe que precisava manter a conversa, ele respondia ‘é’, ‘não’, ‘obrigado’”, completou Luciane, que foi fundamental para que o ainda jovem Biro-Biro acertasse o prumo sem temor na gigantesca São Paulo.

Ele mesmo, em entrevista à “Folha de S.Paulo”, publicada em fevereiro de 1981, reconheceu isso: “Então, casei. Conhecia a Luciane de encontrar perto da escola, ela é também sócia do Corinthians, e nós achamos que era hora. Ela? Agora tem 18 anos. E me incentiva para estudar, sempre coloca um livro na bolsa, quando vou para a concentração. Prefiro assistir televisão (gosto mais dos desenhos do Pica-Pau, não sou muito chegado a novela), mas acabo lendo os livros. O último acho que foi de Francisco de Assis ou qualquer coisa assim. Sobre o quê? Olha, não lembro bem, mas era sobre uma história do que acontece na vida real das pessoas. Muito interessante”.

Biro-Biro era simplesmente inconfundível e não menos impagável. Nos dois primeiros anos em São Paulo, Biro-Biro era como um peixe fora d’água. Totalmente macambúzio, angustiado. Sentia falta da famosa sopa que a avó Maria Conceição fazia; e do café com leite, com pão com manteiga picado, tudo mexido na caneca pelas zelosas mãos da vovó.

Em São Paulo, perdera o mimo da avó Maria. Era um cara “largadão”, como se autodefiniu. Raramente sorria ou se enturmava.

Foi Vicente Matheus quem mais se preocupou com a melancolia de Biro-Biro e passou a incentivar o namoro dele com a sobrinha Luciane. “Esse rapaz precisa casar”. E assim foi feito. Com a aliança no dedo, o jogador passou a jogar ainda mais.

Mas o enlace de Biro-Biro com a sobrinha de Matheus era visto pelos outros jogadores como o motivo para o craque ter privilégios no clube. Era um Corinthians rachado pelo ciúme. O craque não estava nem aí para o disse-me-disse. Levava uma vida simples, sem ostentação, morando no populoso bairro Tatuapé e andando para lá e para cá em sua Brasília 79, contrastando com os carrões de outros craques de sua época. Seu estilo de vida construiu sua fama. Não havia corinthiano que com ele se identificasse. Tanto que lançou uma bola de futebol com o seu nome, que fez algum sucesso entre a garotada em 1987. No mesmo ano, o jogador pleiteou 15% do valor de seu passe, caso fosse vendido. Bateu boca com os cartolas. Disse que sairia, mas permaneceu no clube. Sabia, entretanto, que a carreira estava no fim.

Em novembro de 1978, sem ser candidato, Biro-Biro recebeu mais de 30 mil votos de protesto, como acontecera com o famoso voto no Cacareco – o rinoceronte do Jardim Zoológico paulistano que, nas eleições de outubro de 1959, para vereador da cidade, ganhou cerca de 100 mil votos –, e decidiu levar a política a sério.

Em 1988, foi eleito vereador pelo Partido Democrático Social (PDS), partido formado por políticos da antiga Arena, especialmente Paulo Maluf, com quase 40 mil votos. 
Se já havia ciúme de grande parte dos jogadores, o sentimento de indignação se acirrou, como escreveu Ariovaldo Izac, quando o então técnico Carlos Fascina (técnico do Corinthians entre o final de 1988 e o começo de 1989) começou a questionar se Biro-Biro teria realmente como conciliar a função de vereador com a de atleta.

A situação no Parque São Jorge ficou insustentável. Trocou, em 1989, a sede alvinegra pela da Lusa, no Canindé. Mas não brilhou. Apesar do retrospecto extremamente positivo no Parque São Jorge, não teve sorte na Seleção Brasileira.

Em 1996, pela manhã, Biro-Biro dava expediente na metalúrgica do sogro, à tarde era professor de futebol no Centro Educativo, Recreativo e Esportivo do Trabalhador (CERET), do Governo de São Paulo, tudo no Tatuapé, onde também mantinha uma agência de automóveis. Dois anos depois, a paixão pelo futebol prevaleceu.

O tímido – e de poucas palavras – Biro-Biro começou a carreira de treinador-jogador no Mauense. Passou também por Coritiba, Guarani, Botafogo de Ribeirão Preto, São Bernardo, Remo, Paulista, Nacional de São Paulo e, com 43 anos de idade, no Vera Cruz, de Santa Catarina. Parou de jogar em 2002.

Somente como treinador, trabalhou no Barra das Garças (Mato Grosso), no catarinense Tupi, no São Carlense, na Francana e no paulista Ranchariense. No Botafogo, aonde chegou a janeiro de 1994, após aceitar um convite informal de Sócrates, prometeu fundar a “Democracia Botafoguense”, em alusão ao movimento liderado pelo mesmo Sócrates no Corinthians, no começo da década de 1980.

Nunca deixou de lado o futebol. Mata saudades dos gramados em jogos pelo time de masters do Corinthians. Continua porém dividindo o campo com a política. Foi assessor parlamentar na Assembleia Legislativa de São Paulo e tentou, em 2004, sem sucesso, uma vaga na Câmara dos Vereadores da capital paulista.

Estava longe do noticiário esportivo até estrelar uma campanha publicitária da Coca-Cola, na qual a pergunta mobilizou muitos brasileiros: “Afinal, quem foi melhor, Maradona ou Biro-Biro?”. A brincadeira com os hermanos não poderia ter outro resultado: deu Biro-Biro na cabeça.

CÉSAR, O MALUCO BELEZA

Foi um dos melhores parceiros de área de Ademir da Guia. Os dois juntos marcaram muitos gols pelo Verdão. Hoje é festa para César Lemos. Conheça um pouco mais sobre esse grande ídolo do Palmeiras nas linhas abaixo

por André Felipe de Lima


César não era fácil. Principalmente se o adversário fosse o Corinthians. Na semana que antecedia a partida contra o rival mor, provocava os jogadores alvinegros. Os zagueiros, coitados, eram os alvos das frases mordazes e debochadas do atacante palmeirense, que prometia gols e apostava sempre 10 contra um na vitória do Verdão. Os programas esportivos de rádio e TV não falavam em outra coisa.

César era um exímio vendedor, sobretudo de bom humor, e sequer desconfiava do outro talento que não fosse o de marcar gols. Fez muitos pelo clube do Parque Antarctica. Oficialmente, 180 gols em 324 jogos, dos quais ganhou 170 e empatou 91. Só Heitor, do Vecchio Palestra, das décadas de 1910 e 20, marcou mais vezes. Inclusive no clássico entre Palmeiras e Corinthians. No placar, 16 gols para Heitor e 14 para César, que de “maluco”, apelido que recebeu da torcida e que não gostava nem um pouco, não tinha nada.

Antes de os jogos começarem, se aproximava dos zagueiros — importunados por ele a semana inteira pela mídia — e perguntava se a família estava bem, os filhos, sogra, papagaio… essas coisas. Conversava amenidades e gesticulava. Da arquibancada, a impressão era de que César provocava ainda mais o adversário. A galera vibrava com as cenas do cabeludo centroavante do Palmeiras, que jogava futebol na mesma medida em que arrumava confusões. Jogando contra o Corinthians, o Palmeiras vencia por 1 a 0 e era muito pressionado. César chutou uma das duas bolas para a arquibancada, e a pelota sumiu. O Timão empatou no começo do segundo tempo, e como ele fez cera pra recomeçar a partida, foi expulso. Mas deu trabalho, pois levou a única bola para o vestiário, obrigando jogadores, comissão técnica e representantes da Federação Paulista de Futebol a buscá-lo no vestiário.

Foi suspenso e não disputou nenhuma partida do Brasileirão de 1972, vencido pelo Verdão.

César Augusto da Silva Lemos nasceu em Niterói, no dia 17 de maio de 1946. Irmão dos também centroavantes Luisinho Lemos, que brilhou no América e no Flamengo, e Caio Cambalhota, César iniciou a carreira no clube da Gávea, em 1962, aos 16 anos. Disputou 58 jogos, dos quais venceu 32 vitórias e empatou 18, marcando 38 gols.


No final de 1966, chegava ao Palmeiras por empréstimo. Em depoimento ao maestro e escritor Kleber Mazziero de Souza, César recordou sua chegada ao Parque Antarctica. “Nem me fale! Eu fui recebido bem demais. Fiquei encantado com o ambiente e com o time. Eu, garotão, carioca, cheio de saúde, de pique, estava louco para arrebentar. Cheguei e me senti em casa”. Mas, em janeiro, teve de retornar ao Rio porque o Flamengo teria de pagar uma taxa extra para negociar, definitivamente, o seu passe com o Palmeiras. Tudo acertado entre os dois clubes, César embarcou para Lima, onde se juntou à delegação alviverde, que excursionava pelo Peru. Aimoré Moreira escalou-o paulatinamente, ora na ponta-direita, ora como centroavante. Jornais como o tradicional Jornal dos Sports sinalizavam que o Verdão havia encontrado o herdeiro de Vavá. Vaticínio preciso. César firmou-se e foi fazendo gols seguidos contra Fluminense, Corinthians e Santos.

O currículo do camisa “9” no Palmeiras explica a admiração por parte da torcida: foram três Paulistões conquistados em 1966, 72 e 74, dois torneios Roberto Gomes Pedrosa, em 1967 e 69, a Taça Brasil, em 1967, e os Brasileirões de 1972 e 73. Foi artilheiro do Paulistão de 1971, no vice do Palmeiras, com 18 gols. O campeão foi o São Paulo.

O último jogo pelo Verdão foi contra o São Paulo, partida que terminou empatada em 6 de outubro de 1974.

César trocou os “parques”. Do Antarctica rumou para o São Jorge. Pelo Corinthians, disputou 37 jogos e assinalou apenas 8 gols. No primeiro jogo vestindo a camisa do arquirrival, em 2 de março de 1975, o centroavante perdeu um pênalti no último minuto de partida contra o XV de Novembro de Piracicaba, pelo campeonato paulista.

O craque peregrinou por Santos, Fluminense, de Feira de Santana; Botafogo, de Ribeirão Preto; Rio Negro, de Manaus; Universidad Católica, do Chile; Salonica, da Grécia e Fluminense, do Rio, no qual parou, em 1977. Pela seleção nacional, esteve no elenco da Copa do Mundo de 1974, na Alemanha. Vestiu canarinho em 11 jogos, com seis vitórias, três empates e um gol.

Abandonou a carreira nos gramados e iniciou a de técnico, mas sempre dividindo o tempo com a de vendedor de carros. Investiu em concessionárias, mas não deu certo. O resultado não o desanimou e permaneceu no setor, mas como funcionário de outras empresas.

O “ex-maluco” mora na capital paulista e, em 1988, arriscou-se na política após aceitar um convite do deputado Afanásio Jazadji para concorrer pelo antigo PDS a uma vaga na Câmara dos Vereadores de São Paulo. Foi mal nas urnas, repetindo o fiasco no pleito de 1992. Creditou o insucesso eleitoral ao apelido do qual jamais curtiu.


César Maluco e Ademir da Guia

Pai de três mulheres e já vovô, César já deu o ar da graça na TV fechada, como apresentador esportivo. E o programa levou seu nome: “César na área”.

Mas, em 2006, o grande artilheiro passou por um revés. Sofreu um grave acidente automobilístico na avenida Heitor Penteado, na zona oeste de São Paulo. Só Deus sabe como sobreviveu. Mas as sequelas foram inevitáveis. Fraturou uma perna e operou o quadril, tendo de caminhar com o auxílio de um andador. Ocaso infindável, César ainda submeteu-se a várias cirurgias no estômago. Outro baque forte foi a morte da esposa, em 2011, vítima de câncer.

Igualmente nos gramados, César sempre foi um camarada com uma garra incomum. Escapou da morte aos trancos e barrancos da mesma forma que escapava dos zagueiros. Mas sempre com aquele velho e inconfundível sorriso nos lábios. “Pois é, um sorriso nos lábios”, como cantava Gonzaguinha. César Lemos foi mesmo um maluco… um maluco beleza!

ADÍLIO, O MENINO JOIA RARA

Um dos maiores ídolos da história do Flamengo, Adílio nasceu e cresceu na Cruzada São Sebastião, no Leblon. Quase vizinha ao campo da Gávea. E foi naquela campo que brotou um dos meias mais sensacionais que vi jogar. A seguir, um pouco da linda história de superação e glórias deste grande craque do passado.

por André Felipe de Lima


Muitos dizem não mais lembrar. Comigo, é diferente. Não esqueço aquela noite de 23 de setembro de 1982. Seria melhor se a recordação fosse a do “primeiro beijo” ou a de “um golaço que fiz no colégio”. Anseios comuns aos meninos na faixa dos treze anos. Mas não era nada disso.

Ouvido colado no rádio, acompanhava a final da Taça Guanabara sob as vozes de Waldir Amaral e Jorge Curi. Era fã deles. Vasco e Flamengo em campo e eu nem aí para a “convocação” da minha avó: “Vá dormir cedo, garoto, que amanhã tem colégio…”.

“Driblei” vovó, passei [de passagem…] pela escova de dentes e sentei-me à mesa da cozinha para acompanhar a radiofônica peleja. Tal e qual a um “Prometeu acorrentado”, lembro minuciosamente de tudo. E sofro.

Como torcedor do Vasco, goste ou não o leitor, imaginava Roberto Dinamite e Geovani paladinos da “forra”. Tínhamos de nos vingar da final do campeonato estadual do ano anterior. Maldito ladrilheiro, que acabou com o meu sonho de ver o campeão do mundo tombar diante da gente… mas essa é uma outra história, para outra crônica.

A verdade é que meus “paladinos” não funcionaram naquela noite “vinte e três” e o nosso menino prodígio, o Geovani, sucumbiu diante de um juiz que estava ali mais para oferecer espetáculo em um telejornal esportivo que para apitar um jogo de futebol. Foi uma presepada só.

O “paladino” do lado de lá e algoz dos vascaínos foi o responsável por uma das primeiras noites de insônia da minha vida de vascaíno e de um péssimo dia de aula na manhã seguinte, em que ouvi piadas de estilos duvidosos e grosseiros. Respondi à “altura” vocabular que o momento exigia. Mas, definitivamente, o “bicho-papão” tinha nome e chama-se Adílio. O mesmo, que em dezembro de 1981, fez o primeiro gol do 2 a 1 que deu, com a irresponsável colaboração do fatídico ladrilheiro, o título carioca ao Flamengo.

Apesar de mais uma desilusão pela perda do título daquela Taça Guanabara, confesso, tornei-me fã do Adílio. Foi craque e protagonista de uma história de vida das mais respeitáveis no universo do futebol.

Mesmo sofrendo pelo Vasco, evidentemente sem nunca imaginar que seria recompensado meses depois com o título de campeão estadual de 1982, reconhecia que ninguém era páreo para o Flamengo. Se Zico era a essência apolínea daquele time, cabia ao Adílio esbanjar o excesso, o êxtase total dionisíaco, da jogada que lembrava Garrincha nos melhores dias. Cabia ao Adílio o aplauso pela arte empregada na jogada. Culminasse ela em gol ou não.

Não me recordo de quem o marcava na final daquela Taça Guanabara. Creio que a “vítima” dele tenha sido um camarada chamado Nei. O “Neguinho bom de bola” — como o chamava o locutor Waldir Amaral — não dava colher de chá para ninguém do Vasco.

O tiro de misericórdia aconteceu com um dos gols mais fantásticos do Maracanã. Tão fantástico, tão dionisíaco, repito, que até mesmo pelo rádio era possível transportar-se ao Maracanã naquela noite para vislumbrar aquela joia rara.

Meu infortúnio começou após um lançamento de Zico, que enxergou Adílio na esquerda, pronto para “devorar” o incauto Nei e o goleiro Mazzaropi, o “rei do golpe de vista”.

Foi um incrível lançamento de uns 50 metros ou mais. Coisa de louco… ou seria de gênio? A segunda opção é a mais plausível.

Adílio dominou a bola pela meia-esquerda, com o lado direito do pé. Sem deixá-la cair passou pelo zagueiro do Vasco e conduziu-a por mais alguns metros até chutá-la contra o arco do goleiro Mazzaropi. Pobre coitado o arqueiro… a bola passou entre suas pernas. Gol do Flamengo. O único do jogo. Foi o gol “iô-iô”, brinquedo que divertia as crianças do início da década de 1980. Eu era exceção. Achava uma chatice aquilo. Fiquei com mais raiva ainda quando associaram o gol do Adílio com o desinteressante brinquedo.
Após o jogo, e com a taça na mão, o herói declarou que, na noite anterior ao clássico contra o Vasco, sonhara com o filho que ainda estava para nascer e com a jogada diante de um goleiro que não conseguira identificar. Azar do Mazzaropi e sorte do alvissareiro Adílio, que fez do gol do título o venturoso “filho” e de mim, um conformado.
Adílio de Oliveira Gonçalves nasceu no dia 15 de maio de 1956, no hospital Miguel Couto, vizinho ao clube do Flamengo. Cresceu na Cruzada de São Sebastião, um conjunto de prédios do Leblon, na zona sul, construído em 1955, por Dom Hélder Câmara, então bispo-auxiliar do Rio de Janeiro, para abrigar moradores da antiga favela da Praia do Pinto desocupada para a construção de um condomínio hoje conhecido como “Selva de Pedra”.

Embora generoso, o anseio de Dom Hélder por acabar com as favelas do Rio a partir da obra na Cruzada, no coração da elite da zona sul, não vingou.
Ao longo dos anos, os 10 blocos, cada um com sete andares, foi a marca do abandono do poder público, onde uma impiedosa pobreza prevaleceu, mas sem ofuscar a dignidade de muitas famílias que ali se instalaram. Uma delas, a do menino Adílio, outras, dos também ídolos do futebol Rui Rei, da Ponte Preta e do Corinthians, e Ernani, do Vasco.

SHOWS DESDE MENINO


Terceiro de seis irmãos, tinha sete anos quando chamou a atenção pelo domínio de bola que exibia. Vestia a camisa sete do time de pelada Sete de Setembro no dia em que ele e seus companheiros “apanharam” de 5 a 0 de um time rival de peladas. Humberto, um treinador da escolinha do Flamengo que estava por ali bisbilhotando tudo, encantou-se com Adílio. Com Humberto, haveria o primeiro momento dele no Flamengo.

Adílio começou a treinar no clube, mas por pouco tempo. Humberto foi embora para os Estados Unidos e o projeto com os meninos foi encerrado na Gávea.
Mas a bola era sua vocação. Não desistiria tão facilmente.
Se não havia chance no Flamengo, haveria no Royal, time da praia do Leblon. Foi nas areias da zona sul que o garoto bom de bola continuou dando seus shows.

Desde os seis anos, o futuro craque pulava os muros do clube para acompanhar ídolos da década de 1960, como Carlinhos e Nelsinho. A tira–colo o acompanhava o inseparável amigo Júlio César, que anos depois seria o ponta-esquerda do Flamengo campeão brasileiro em 1980. Por conta de seu dribles que muito problema de coluna causou em desavisados laterais direitos, Júlio César ficou conhecido como “Uri Geller”, em referência ao ilusionista que entortava, “com a força da mente”, garfos e colheres na TV brasileira dos anos de 1970.

Antes de ingressar, em 1968, no dente de leite e no futebol de salão do Flamengo, Adílio contentava-se em pegar bolas de tênis. Júlio César teve, porém um ingresso mais rápido nas divisões de base do futebol de salão do Flamengo. Era o camisa 10 do time. Adílio chegou depois, mas com vontade de “roubar” a “dez” do amigo. Até que um dia conseguiu e um indignado Júlio César decidiu chamá-lo para quebrar o pau… fora do clube, evidentemente.

A molecada fez coro e queria ver ambos saírem no braço. Adílio e Júlio César começaram a rodopiar de um lado para o outro como dois pugilistas a se estudarem antes da primeira bordoada a ser desferida.

Nada de pontapés, socos ou tapas. Os valentões foram perdendo o ânimo pelo embate e começaram a chorar, como duas crianças que eram. Apertaram a mão um do outro e, como diz a garotada, “ficaram de bem”. O que ambos não imaginavam é que aquela grande amizade faria muito bem ao time do Flamengo num futuro próximo.
Mas quase que o Flamengo perde Adílio: “Eu tinha dez anos e resolvi tentar a sorte no infanto do Fluminense. Quando vesti aquela camisa tricolor, me olhei no espelho e senti o pior grilo da minha vida. Um traidor. O que o pessoal da Cruzada São Sebastião ia dizer de mim? Treinei chorando e me mandei. Fui para a Gávea, queria ficar lá, mesmo que fosse encostado. O coração falou mais alto. Acho que o sujeito nasce Flamengo. Depois é que degenera. E eu não queria ser um degenerado…”.

O Flamengo deu sorte… e Adílio também. O clube nasceu para ele e ele para o Rubro-negro. Mantido no time dente-de-leite do Flamengo, o Maracanã conheceu um Adílio triunfal entre os meninos de sua idade, quando o time foi campeão de um torneio da categoria e o garoto, o grande herói da conquista. Foi carregado em triunfo na volta olímpica da molecada. Foi a primeira de muitas glórias de Adílio naquela grama histórica.

VIDA DIFÍCIL, MAS FELIZ

A vida, contudo, não era fácil para o futuro ídolo do Flamengo. Com a morte da mãe, dona Alaíde, na metade da década de 1970, Adílio passou a cuidar dos três irmãos mais novos, filhos do segundo casamento de sua mãe. Fazia o papel do pai, que morreu do coração no começo da década de 1960 quando Adílio ainda era criança. Com os carrinhos de feira, servia às madames do Leblon para ajudar no sustento dos irmãos, filhos do padrasto, que trabalhava como condutor de bondes. Adílio trocava fraldas, fazia mamadeira. Era “pai” e “mãe” ainda jovem. Muito jovem.

Quando nasceu, ganhou de presente após o parto um par de chuteiras que só usaria aos sete anos. Essa foi a única lembrança que guardou do pai, o padeiro Sebastião Peixoto, mineiro, de Três Corações — terra onde também nasceu Pelé.

Ao longo de 1976, com a carreira começando no Flamengo, ficou sem ver os três irmãos mais novos: Alexandre, o caçula, Ivã e Sebastião. Todos moravam com Baltasar, padrasto de Adílio, em uma localidade muito pobre de Santo Antônio de Pádua, no Norte fluminense.

Os dramas pessoais nunca o abalaram. Estava sempre bem disposto e aberto para a vida. Esta, como recompensa, preparava-lhe a glória.

Adílio sempre foi considerado — desde as categorias de base, onde o chamavam de Pelezinho da praia do Pinto — como um dos atletas mais simpáticos do clube. Imitava [e cantava!] James Brown para animar as modorrentas concentrações. 
Embora jogasse entre os profissionais com a camisa número oito, sempre vestiu a “dez” em todos os times que defendeu no Flamengo, do infantil ao juvenil. Mas conseguiu estrear no profissional com a “dez” porque Zico, o dono do manto sagrado, estava contundido.

Após o jogo, contra o Sport, recebeu elogios pela atuação. Os comentários eram de que um novo Zizinho pintara em Adílio. Na manhã seguinte, o garoto, empolgado com a repercussão, comprou todos os jornais que estampavam sua estreia no Flamengo.
A carreira de Adílio foi evoluindo no compasso de suas jogadas de gênio.

Aprendera [e muito!] com José Nogueira, professor da escolinha do Flamengo. “Era um homem durão, que fazia questão de testar a nossa força de vontade e a nossa disciplina. Se ele marcava um treino para s oito da manhã, a gente tinha de chegar às sete e meia. Eu me lembro que fiquei dois meses indo à escolinha sem participar de nada, até que um dia ele me explicou por que fazia isso: queria ver se eu tinha meso força de vontade. Pouco depois seu Nogueira foi para o Botafogo, mas morreu muito cedo”, contou Adílio, em 1976.

Geraldo, grande meia do Flamengo, morto precocemente em agosto de 1976, também apostava em Adílio. O “Assobiador”, como apelidaram Geraldo, “cansou” de simular contusões para que o rapaz tivesse a chance de mostrar, entre os profissionais, seu incomparável talento com a bola. O próprio Zico já afirmava, em 1979, que a “vida ficava mais mansa” com Adílio em campo porque os zagueiros adversários tinham mais um craque do Flamengo com quem se preocupar. Rubens, o Dr. Rúbis, ídolo do Flamengo nos anos de 1950, sempre disse a Adílio que seu drible curto e suas geniais jogadas na entrada da área renderiam faltas que fariam de Zico um dos maiores cobradores de bola parada da história do futebol brasileiro. Se alguém duvidou da irrefutável tese de Rubens, estrepou-se.

Entre 1977 e outubro de 1981, pouco antes de o Flamengo consagrar-se campeão do mundo, Adílio não só proporcionou a Zico muitos gols, mas também assinalou os seus. No período, o “Galinho” marcou 220, Cláudio Adão, 81, Tita, 64, e Adílio, ora veja, empatou com Nunes, o “artilheiro das decisões”. Ambos com 57 gols. Carpegiani, que era o “dono” da camisa oito, fizera apenas 12 gols. Como questionar a eficiência de Adílio?

Se em campo os bons resultados e os títulos apareciam para o Flamengo, é porque teve Adílio como um dos seus protagonistas. Não demorou para que o craque começasse a pensar no “pé de meia”.

Em 1980, Adílio conseguiu comprar um bom apartamento em Botafogo, na zona sul do Rio. Era o “Beco do Neguim Adílio”, como descrevia uma placa pendurada na parede do novo lar.

Até que Carpegiani se aposentasse, em 1981, Adílio disputou com Andrade a posição de meia-armador durante bastante tempo. Embora atuassem juntos em muitos jogos, somente com o fim da carreira de Carpegiani os dois assumiram suas posições no time titular. Andrade mais recuado e Adílio mais avançado. Os dois formaram com Zico um dos melhores meios-campos da história do futebol brasileiro.

O “PESO” DE CLÁUDIO COUTINHO


(Foto: Marcelo Tabach)

O técnico Claudio Coutinho, do time tricampeão estadual em 1979, definia Adílio como sua “bomba V-2”, uma “arma secreta” capaz de destruir os adversários em uma jogada genial.

Apesar dos elogios rasgados, Coutinho relutava em escalá-lo desde o começo dos jogos. A reserva o incomodava. Adílio só não explodia com o técnico porque, como frisava a todos, a vida lhe ensinou a ser malandro. “Melhor conversa para técnico é você mostrar bola para o público, para a imprensa. Aí, ele é quem fica em situação ruim”.

A indefinição de Coutinho deixou-o inseguro.

Adílio nunca escondera sua mágoa com a incômoda situação. Dizia que Coutinho mantinha Carpegiani para não magoá-lo. Carpegiani sabia que Adílio era uma fera nas quatro linhas. Quando assumiu como treinador do Flamengo, em 1981, preparando o time que se tornaria campeão do mundo, em dezembro, disse: “Ele é mais habilidoso do que o Zico. É um bailarino que sente cada gomo da bola. Claro, tem essas deficiências do chute e do cabeceio, mas isso são pequenos detalhes diante da técnica que destrói o meio-campo dos adversários”.

Na final do campeonato brasileiro de 1980, contra o Atlético, Adílio, que entrara no decorrer da partida no lugar de Carpegiani, mostrou que não poderia sair do time titular. “Naquela decisão Fla e Atlético, eu amargurado no banco e vendo que podia resolver a situação. A torcida começou a gritar meu nome e, aí, me levantei. Cheguei a pensar: ‘Agora vou lá e digo ao Coutinho: vou entrar, você tira quem quiser; já estou indo para o campo’. Algo me segurou, mas eu estava louco pra chegar junto do Capitão [Coutinho]. Com 20 minutos entrei no lugar do Carpegiani. Não disse nada. Ao pisar em campo, Júnior correu em minha direção: ‘Vamos lá, negão, faz este time andar’. Todos gritaram: ‘Vamos lá, negão’. Então, explodiu dentro de mim um gigante. Mas no vestiário, depois da vitória, eu era um homem triste — não jogara desde o início e por isso não me considerava campeão”.

Se Coutinho ainda não decidira escalá-lo como titular, caberia à torcida decidir: “O povo vai me dar a camisa oito”. Batata…

A popularidade era tão grande que até participação em novela da TV Globo Adílio fez. Em julho de 1980, ele, Rondinelli e Andrade, com suas respectivas companheiras, atuaram em um capítulo da novela Marina, que ia ao ar às 18h. Após a cena, gravada na antiga boate Regine’s, no Rio, os três craques do Flamengo foram cercados por caçadores de autógrafos. Ninguém menos que todo [ou quase todo] elenco da novela.

Adílio era uma unanimidade, até mesmo entre cartolas e técnicos, sobretudo Coutinho e Carpegiani, mas as confusas renovações de contrato foram retardando, até 1981, a posse definitiva da camisa oito do Flamengo. “Comigo, a perseguição é diferente. Meu contrato vence em abril [de 1981] e os dirigentes forçam o Modesto Bria a me barrar. Para não se desgastar, o técnico acaba conivente […] Os três meses que antecedem o fim de um contrato são horríveis. Os dirigentes e seus intermediários deixam de atender a gente nos mínimos detalhes, nos quebra-galhos. Dá indignação! Aí, você discute, briga e então vem a multa. É preciso ter muito autocontrole”.

Por muito pouco Adílio não trocou o Flamengo pelo Palmeiras, em maio de 1981. 
O então presidente do clube rubro-negro, Antônio Augusto Dunshee de Abranches, estipulou o passe do jogador em 70 milhões de cruzeiros e a imprensa especulava que até por menos poderia se desfazer de Adílio. Um completo suicídio futebolístico que, para o bem do Flamengo, não foi consumado.

O “Neguinho bom de bola” faz parte de uma geração de jogadores que faziam história nos clubes que os projetavam. Amor e fidelidade à camisa ainda existiam.

Adílio afirma que jogar no Flamengo foi o “maior orgulho” de toda a sua carreira. Com o rubro-negro, escreveu bela trajetória. Foram 24 títulos, entre os quais o Mundial de Clubes, em 1981. A Taça Libertadores da América, no mesmo ano. Uma penca de campeonatos cariocas [1978, 79, especial, 79, 81 e 86] e três campeonatos brasileiros [1980, 82 e 83]. Entrou em campo pelo Flamengo 611 vezes, venceu 471 partidas e empatou 147. Assinalou 128 gols.

Um dos jogos mais importantes da carreira de Adílio foi contra o Cobreloa, do Chile, no dia 20 de novembro de 1981, em Santiago. Era o segundo embate da “melhor de três” que valia a Taça Libertadores da América.

O Flamengo perdeu por 1 a 0 e Adílio saiu de campo com um corte no supercílio, após uma cotovelada intencional de Mário Soto, o mais violento zagueiro do Cobreloa. Do goleiro Raul, ouviu o seguinte: “Garoto, esqueça a pancada eu levou, esqueça tudo. Jogue como se fosse contra o Bangu, contra o Botafogo, contra um adversário do dia-a-dia. Jogue à procura de uma vaga na seleção brasileira.”. O ponta-esquerda Lico, que também apanhou muito naquele jogo contra os chilenos, levantou o astral de Adílio: “Dê um drible desmoralizante em Mário Soto, faça isso por mim.”. Adílio ouviria os conselhos e não decepcionaria.

Tudo se resolveu, portanto, no terceiro e decisivo jogo, realizado no dia 23 de novembro, no estádio Centenário, em Montevidéu. O Flamengo saiu vitorioso, com dois gols de Zico, mas com Adílio entre os grandes heróis daquela inesquecível noite.

DESPREZO DA SELEÇÃO BRASILEIRA


Se a camisa do Flamengo lhe traz boas recordações, a “amarelinha”, nem tanto. Adílio viveu uma época em que sobravam excelentes meios-de-campo no futebol brasileiro. Sócrates e Falcão, por exemplo, atuavam na mesma posição do jogador do Flamengo. Tanto que ambos foram convocados por Telê Santana para a Copa de 1982, na Espanha, e Adílio, em espetacular fase, foi rechaçado.

Melhor jogador do Liverpool derrotado pelo Flamengo na decisão do Mundial Interclubes, em 1981, o apoiador Souness tornou-se fã de Adílio desde aquele inesquecível dia 13 de dezembro. Para ele, nem mesmo Zico o superou naquela final. Souness sabia das coisas. Para ele, o lugar de Adílio era na seleção brasileira. “Como joga esse negrinho, hein? Por que não está na seleção? É infernal. Parece que tem a bola presa com um imã nos pés e, quando a solta, encontra sempre um companheiro desmarcado e próximo de nossa área. Hoje, pelo menos, o achei melhor até que Zico”.
Adílio vestiu a camisa da seleção nacional pela primeira vez em 1979, num amistoso contra a seleção da Bahia. O placar foi 1 a 1. Somente no dia 21 de março de 1982, época em que estava recém-casado com Rosemary, sua primeira esposa, voltaria ao time canarinho.

O jogo foi no Maracanã, contra a então Alemanha Ocidental, que tinha um escrete fenomenal, com Rummenigge e Hans Müller. Os brasileiros derrotaram os alemães com um belo gol de Júnior após receber um passe milimétrico de Adílio. Com atuação irrepreensível, a presença do jogador do Flamengo na lista de convocados para a Copa do Mundo era considerada certa. Inclusive pelo próprio técnico Telê Santana. Até hoje Adílio se recorda com frustração por não ter estado na Espanha.

Tinha de se contentar com a glória clubística. Essa, ninguém sequestraria dele. Basta lembrar da final do campeonato brasileiro de 1983, entre Flamengo e Santos, no Maracanã. Três a zero e o “tri” brasileiro direto para a Gávea.

O terceiro gol daquele jogo, aos 44 minutos do segundo tempo, foi de Adílio, após cruzamento do ponta-direita Robertinho.

Um gol épico. Inesquecível como aquele da Taça Guanabara de 1982, o do “iô-iô”, do qual não gosto de lembrar. Fazer o quê…

Aquele “peixinho” histórico do Adílio sacramentou a conquista e enlouqueceu as arquibancadas. Fotógrafos invadiram o gramado e o centroavante santista, Serginho “Chulapa”, baixou o pau no pessoal da imprensa. De nada adiantou a indignação dos jogadores do Santos. Flamengo campeão após o jogo “da vida” do Adílio, que acabara de ser pai de seu primeiro filho.

O craque chorava copiosamente após o feito irreprimível. “Sabe, irmão, eu costumo ficar na minha. Mas hoje liberei uma energia reprimida há muito, há muito tempo…”. Depois do filho, Adílio, após o gol sensacional do “tri”, lembrou-se dos amigos da Cruzada. “O Brown [apelido de Adílio entre os jogadores do Flamengo] fez uma partida divina”, assim definiu Zico, sobre a importância de Adílio, de forma inquestionável e unânime o melhor em campo, naquele Flamengo 3, Santos 0.

Zico foi embora da Gávea logo após a conquista do “tri” e Adílio herdou a camisa 10 do Flamengo.

É verdade, o manto pesou e, obviamente, Adílio não correspondeu às expectativas substituindo Zico. Ora o escalavam no meio, ora na ponta-esquerda, posição, que, diziam, Adílio detestava, mas até que gostava de atuar pela canhota. Tudo para reverenciar o amigo Júlio César, com quem chegou, em alguns momentos, a também disputar a camisa 11, nas divisões de base. Mas jogar mais avançado, como o Galinho, não era mesmo a sua praia. Sempre gostou de vir de trás, com a bola dominada, armando o jogo para quem estava mais a frente. Jogasse ele em qualquer posição, mostrava-se imprescindível para o time, sobretudo em jogos decisivos. Como na final da Taça Rio de 1983, quando marcou o único gol do jogo que deu o título ao Flamengo diante do Bangu, Repetiria a proeza na final da Taça Rio de 1985, contra o mesmo Bangu. Sua impecável atuação e o seu gol [o único do jogo] garantiram o Flamengo no triangular final do campeonato carioca. Aquela vitória foi mais que profissional. Foi pessoal. Uma justa volta por cima do craque que acabara de se separar de Rosemary e que por várias vezes ficou afastado do time por conta de seguidas contusões.

Aquele 1985 foi duro, mas também mostrou ao próprio Adílio o seu valor. Nunca fora expulso até então e, meses antes do título da Taça Rio, recebera da Caixa Econômica Federal o prêmio de jogador mais disciplinado da Taça de Ouro [o campeonato brasileiro]. “Se eu fosse violento em campo, não sobreviveria. Para quem nasceu onde nasci, seria suicídio não me controlar”.

No ano seguinte, mesmo com o Flamengo campeão carioca, o craque pressentia o fim da carreira. No dia 7 de outubro, sofrera uma entorse no joelho direito, durante um amistoso de “troca de faixas” contra a Internacional de Limeira, campeã paulista daquele ano.

O Flamengo perdeu de 3 a 0 e Adílio seguiu para a sala de cirurgia dias depois, em um hospital do Alabama, no sul dos Estados Unidos, onde foi operado pelo médico americano James Andrews, o mesmo que operara Zico, meses antes da contusão de Adílio. Extraídos os meniscos internos e externos do joelho, o meia só voltaria ao futebol em fevereiro de 1987.

O período fora dos gramados reforçou a vontade de Adílio, que morava na Barra da Tijuca, com o irmão Alexandre, na época com 15 anos, de concluir o curso de Educação Física, que iniciara em 1980, na Faculdade Castelo Branco, em Realengo, no subúrbio carioca.

Era o começo de uma nova fase na vida do jogador, que, naturalmente, começava a planejar seu futuro longe dos gramados.

O assédio e cobranças da torcida foram sempre intensos. Adílio era um dos craques do Flamengo e convivera muito bem com isso ao longo da carreira. No período em que esteve fora do time, mal podia sair à rua. Mas começou a perceber que, se o futebol oferece dinheiro e prestígio, também sequestra a liberdade.

HORA DE PARAR


(Foto: Marcelo Tabach)

Adílio percorreu todos os cantos do mundo, mas o máximo que conheceu foram aeroportos, hotéis e estádios de futebol. Nada mais. Recuperando-se da fatídica contusão no joelho, praticava um despretensioso e inofensivo futevôlei na praia quando um torcedor o repreendeu. “Estou esperando te ver no time e te encontro na praia?!”, esbravejou o torcedor. Adílio apenas pensou: “Vai ver que ele pretendia que eu ficasse em casa o tempo todo, protegido das tentações comuns”.

Por essas e outras se considerava “escravo do futebol”.

Adílio recebeu, em 1987, passe livre por atuar 10 anos no Flamengo, como profissional. Ofereceu-se para continuar na Gávea, mas a diretoria e o técnico Antônio Lopes não o quiseram mais lá. No dia 9 de setembro de 1987, o “Neguinho bom de bola” trocava o Rubro-negro pelo Coritiba. Era hora de reconstruir a vida. Levou para Curitiba a mulher Rosemary, com quem havia se reconciliado, e os filhos Bruna e Júnior.
A passagem pelo “Coxa” não foi das melhores. Mesmo assim não conseguia dar um ponto final na carreira. Deixou o Coritiba em junho de 1988, indo para o Barcelona, de Guayaquil, onde encontrou o treinador Edu — irmão de Zico — e Carlos Henrique, ex-ponta-esquerda do Flamengo. Atuar pelo fraco futebol equatoriano da época não foi saudável para Adílio, que deixou o Barcelona no mesmo ano em que lá chegou. Dali em diante, o declínio.

Tentou voltar ao Flamengo, em novembro de 1988, mas o então técnico Telê Santana, o mesmo que o preteriu para a Copa de 1982, vetou sua contratação. Jogou em times do interior do Brasil, como o Itumbiara de Goiás [1990], e do exterior, como o Alianza de Lima [1991/92], que o contratou após um amistoso do Itumbiara contra o clube peruano, em Lima. Passou também pelo modesto Santos, do Espírito Santo [1991], América, de Três Rios [1992], Avaí [1993], Friburguense [1994], onde conquistou o campeonato carioca da segunda divisão, Bacabal, do Maranhão [1995], Serrano, da Bahia [1995], pelo qual conquistou o campeonato baiano da segunda divisão, Barreira [1995], time do interior do estado do Rio, Barra Mansa, em 1995, e, por fim, Borussia Fuld, da Alemanha [1996].

Terminada a epopéia nos gramados, foi para o banco orientar às novas gerações. Teve uma escolinha de futebol no campo de terra batida localizado na saída do Túnel Rebouças, na Lagoa Rodrigues de Freitas, zona sul do Rio. Finalmente o Flamengo resgatou-o.

Como técnico das divisões de base do clube que o revelou ídolo, sagrou-se bi-campeão juvenil. Trabalhou cerca de cinco anos com Zico, no CFZ, e foi também técnico do Bahain, da Arábia Saudita. Assumiu, em 2005, o comando do time dos profissionais do Flamengo em algumas partidas, dividindo a tarefa com o ex-companheiro de meio-campo, Andrade. Mudou-se para a Ilha do Governador, com Sônia Nicolau, com quem está casado há 14 anos, e o filho Soni Adílio.

A LIÇÃO MATERNA


(Foto: Marcelo Tabach)

A vida de Adílio é exemplo para muitos jovens que almejam a carreira de jogador de futebol. Da mãe, dona Alaíde, que não chegou a ver o sucesso do filho “Pelezinho”, ouvia sempre: “Você tem de fazer as pessoas gritarem seu nome bem alto”. E ele fez.

Seu maior fã era ninguém menos que o maior ídolo da história do Flamengo. “Esse menino aí merece tudo, é um garoto joia. Sofreu muito: perdeu um irmão, a mãe, teve de tomar conta dos irmãos menores. Ele lavava e cozinhava para os garotinhos. É uma flor de rapaz”, disse Zico, em reportagem de Maurício Azêdo, para a revista Placar, em 1976. Na época, Adílio cursava, no Colégio Estadual Manuel Bandeira, onde este autor também estudou, o segundo ano científico, correspondente hoje ao ensino médio.

Adílio ficou longe da bebida, das drogas, das farras e teve o irmão mais velho, Paulo Roberto, de 24 anos, assassinado durante um assalto quando saía de um cinema com a companheira. Paulo trabalhava como trocador de ônibus e era o arrimo da família. Com sua morte, Adílio, ainda menino, assumiu a difícil missão. A mãe, com a morte do primogênito, definhou em depressão, morrendo, ainda jovem, aos 42 anos, após um derrame cerebral.

Tinha tudo para desviar-se do caminho reto, honesto: “Condições para fazer coisas erradas eu sempre tive. Vi muito amigo morrer na minha frente, polícia dando blitz à toa, mas sabia que tentar lutar com as mesmas armas era suicídio”.

Adílio escolheu ser um dos melhores no que fazia: jogar bola, sempre sob a mais rigorosa aura profissional.

Nos tempos de jogador [e como católico fervoroso], raramente recusava um pedido do padre Bruno Trombetta, da Pastoral Penal do Rio de Janeiro, para visitar presidiários e mostrar-lhes, além do belo futebol, ensinamentos de superação e dignidade que construíram um grande ser humano e um profissional exemplar. “Ele [padre Trombetta] ia lá em casa dizer que a minha carreira era importante para a transformação da Gávea”. Sem dúvida foi.

Sua trajetória, da infância ao estrelato no Flamengo, motivou a TV Globo a produzir o episódio “Adílio, o craque da esperança”, para o seriado “Caso Verdade”, que foi ao ar, na mesma semana em que ele marcou o inesquecível gol do “tri” brasileiro do Rubro-negro, entre dois e seis de maio de 1983, às 17h30, com apresentação da atriz Nathalia Timberg e narração do goleiro Raul, além dos depoimentos de companheiros do Flamengo, como Tita, Júnior e Zico, e até uma participação de Pelé, ídolo de Adílio na infância.

A idéia de retratar a vida do craque na televisão partiu do ator Milton Gonçalves. Quem o interpretou foi Romeu Evaristo, na época o “Saci”, do Sítio do Pica-pau Amarelo, outra produção de sucesso da TV Globo, no começo da década de 1980.
Antes mesmo do “Caso Verdade”, por pouco não interpretou Pelé para o documentário “Isto é Pelé”, de 1974, dirigido por Eduardo Escorel e Luiz Carlos Barreto. Queriam levá-lo para filmar em Santos. A mãe não deixou. “Adílio tinha de estudar”, argumentou dona Alaíde. Mas para que ir para tão longe se ali do lado havia o Flamengo? Numa daquelas puladas pelo muro da Gávea, Adílio fugiu do seu Edmundo, o vigia do inconfundível cachimbo. O mesmo Edmundo que lhe aplicou uma carreira naquele dia o abraçou meses depois, quando Adílio, num Fla-Flu dos fraldinhas do futebol de salão, marcou um golaço após driblar todo o time adversário. “Nos abraçamos e ele passou a ser meu eterno amigo na Gávea”.

A história de Adílio não é somente medida pelo que fez dentro das quatro linhas ou por conta de sua difícil juventude. O craque é exemplo em todas as épocas de sua vida. E assim vem sendo.

Em agosto de 2011, com apoio da Ordem dos Advogados do Brasil [OAB], ele e o amigo Júlio César lideraram o grupo que fundou a Associação de Ex-Atletas de Futebol do Estado do Rio, cuja meta é auxiliar e reintegrar craques do passado no mercado de trabalho. Além do apoio aos ídolos de outrora, Adílio e sua Associação apoiam projetos sociais, sobretudo escolinhas de futebol em comunidades carentes.

Apesar da infância humilde, Adílio aprendeu inestimáveis lições de sua mãe. “Amar o próximo, como a ti mesmo” talvez seja a principal delas.

Apesar de aluno aplicado da Escola Henrique Dodsworth, na Gávea, na qual dona Alaíde era merendeira e ele uma espécie de “bibliotecário” e auxiliar de segurança que ajudava aos colegas a atravessarem a rua em frente ao colégio, Adílio cortou um dobrado por conta de um distúrbio de fala.

Acreditando ser didática com o menino, uma professora impôs alguns castigos a Adílio, que insistia em trocar o “erre” pelo “ele”. Diante do quadro negro, era obrigado a escrever dezenas de vezes a palavra “três” para nunca mais repetir “tlês”. Foi frustrante para os mestres e angustiante para o garoto, que cresceu e superou muito mais que as reprimendas escolares de seus mestres, ou “mestles”, como seguiu pronunciando, sem trauma nem rancor dos professores.

Talvez ali, diante de tanto rigor na educação, aprendera a ser também um bom professor. Estudar o estimulava. Queria ser médico, mas passou para a faculdade de Psicologia, da PUC. Acabou optando pelo curso de Educação Física, o ideal para atender à futuras gerações de jogadores que abrigaria após deixar os gramados.

Com o seu Grupo de Iniciação Esportiva da Cruzada [Gidesc], foi mais que um mestre. Foi quase um pai para muitos meninos também nascidos, como ele, na Cruzada São Sebastião. Nunca abandonou suas raízes. Mesmo nos tempos em que jogava pelo Flamengo, nem mesmo sua atribulada rotina de infindáveis jogos o impedia de ir à Cruzada para ver os meninos com a pelota nos pés. Chegava a filmá-los em ação para melhor estudá-los e indicá-los ao clube do coração. O que um dia foi seu sonho décadas passadas, também despertara aqueles garotos para o futuro.

Até hoje, quando um garoto começa a jogar bola na Cruzada São Sebastião logo lhe falam que ali, naquele terreno, pisou Adílio, um dos mais geniais e distintos jogadores da história do Flamengo. E os mais velhos insistem com a molecada: “Honrem, portanto, o chão do ‘Neguinho bom de bola’”.

GARRINCHA, UM CRAQUE ‘ITALIANO’ QUE POUCOS CONHECERAM

por André Felipe de Lima


Garrincha é, talvez, o jogador de futebol mais pródigo em histórias. Algumas realmente verdadeiras, outras, porém, parte integrante e indispensável do anedotário do futebol brasileiro. Vivemos assim, felizes com nossas histórias. O brasileiro, no fundo, confia nas mais diversas versões possíveis para reproduzi-las no dia seguinte. Isso nos faz diferentes e sempre sorridentes, sei lá. Talvez singulares. E, porque não, artistas. Sim, todos trazemos conosco um pouco do Garrincha. Ora tristes, é verdade, mas deliciosamente irresistíveis e, acreditem, felizes e lúdicos. Brincamos de viver como poucos.

Há muitas histórias do Mané que desconhecemos. Algumas delas, esse jornalista pretendia mostrar no documentário “Simplesmente passarinho”, que idealizei e comecei a produzir com o amigo e cineasta Marco Louro. Realizamos diversas entrevistas, com ex-jogadores, como Jordan, Altair e Coronel, a trinca mais famosa de “Joões” do Mané, e os tchecos da final da Copa de 62; amigos de Pau Grande, inclusive a primeira professora dele; personalidades do futebol, como o icônico João Havelange… enfim, gente à beça. O filme não conseguiu driblar a burocracia e o descaso com a cultura que afligem o Brasil. Mas vamos tocando (a vida) felizes… e contando histórias.

Garrincha era assim. Exímio contador de histórias e “tocador da vida” como poucos. Passava por ela da mesma forma que deixava para trás seus marcadores. Uma vez Elza Soares, companheira inseparável, levou-o a tiracolo para uma longa turnê na Itália, em 1970. Montaram residência na pequena Torvaianica. Elza queria tirar Garrincha do Brasil a todo o custo. No clássico “Estrela solitária”, Ruy Castro detalha essa desesperadora iniciativa da cantora para ajudar o companheiro, encalacrado com a justiça e muito deprimido. Mas essa é outra história. Mané estava na Itália e tinha que passar o tempo enquanto Elza cantava. Garrincha questionara: “O que farei enquanto a minha ‘Nega’ (como carinhosamente se referia a Elza) canta por aí?”. Ele pensou rápido, e veio a resposta: “Vou jogar bola, ora”.

Perto de Roma há uma pequena cidade chamada Sacrofano, que deve ter hoje cerca de 7 mil habitantes. Em 1970, quando Garrincha pintou por lá, deveria ter menos da metade que comporta hoje. Fez o mesmo em Mignano Monte Lungo, outra miúda “comune” italiana, ainda menor que Sacrofano, com pouco mais de três mil habitantes. Era o que Mané precisava naquele momento. Estava completamente duro e sem ter o que fazer enquanto Elza cantava. Calçou chuteiras e entrou em campo para disputar peladas com açougueiros e mecânicos. Embolsou por cada pelada cerca de 80 mil liras. Para os italianos, uma ninharia. Para Garrincha, a salvação da lavoura.

O time do Sacrofano era treinado por Dino Da Costa , ex-atacante histórico da Roma e da Juventus, com quem Garrincha jogou no Botafogo. Dino providenciou o show do Mané.


A deliciosa história foi recuperada pelo repórter Maurizio Crosetti, do jornal italiano La Repubblica, que ouviu, em 2016, personagens que arriscaram a honra ao tentarem, em vão, marcar Garrincha, que mesmo completamente fora de forma e já com sinais claros do devastador e impiedoso alcoolismo, deitou e rolou em cima dos italianos.

Carlo Sassi, um despretensioso lateral-esquerdo que jogou pelo modestíssimo e não menos despretensioso Sacrofano, tinha somente 20 aninhos quando ousou encarar um Garrincha já pra lá de Bagdá, mas ainda cascudo: “Garrincha estava sempre em silêncio, mas sorrindo. Ninguém conseguia tirar a bola dele. Ele marcou dois gols no canto, um no primeiro tempo e outro no segundo. Ele era um homem de pernas tortas, mas quão maravilhoso”, recordou o “João” italiano.

Crosetti fez a reportagem que todos nós, que amamos a história do futebol e, principalmente, a dos nossos ídolos, desejaríamos fazer.

Hoje, na sede da ASD Sporting Sacrofano, há fotos daquele memorável dia com Garrincha. Nosso Mané, cujas histórias andam tão esquecidas por nós, distraídos e lúdicos brasileiros, é para Edoardo Valentini, presidente do gentil Sacrofano, um “tesouro para todos”. Lá, na Itália, ou em qualquer canto do mundo, ainda se lembram do nosso Mané. Aqui, ainda sorrimos sem saber exatamente o porquê. Sorrimos ou choramos de histórias presentes sem que o passado nos instigue a nos prepararmos para o futuro. Não sabemos mais driblar nossa ignorância. Esquecemos que um dia fomos todos Mané. Mané Garrincha Futebol e “Vida” Clube.