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andré felipe de lima

O PAI QUERIA VAVÁ MANCHETE. CONSEGUIU MAIS QUE ISSO

por André Felipe de Lima


“Desde garotinho fui levado a gostar do Vasco da Gama. Lá em Recife, onde nasci e me iniciei no futebol, cresci com o grêmio da cruz de malta em sonhos, pois, através do rádio e dos jornais acompanhava com o maior interesse as atividades dos vascaínos. Depois de me tornar profissional, tive o grande prazer de vestir a camisa cruz-maltina e ajudar o clube do meu coração a conquistar alguns campeonatos. Indo para a Espanha, coloquei o Vasco da Gama como meu segundo clube, pelo qual continuo torcendo como nos tempos de garoto”. A declaração apaixonada é de um torcedor ilustre, que neste dia 12 de novembro faria anos. Falamos do Vavá, o centroavante rompedor, endemoniado, que paralisou goleiros russo, francês e sueco na Copa de 58 e repetiu a dose na Copa seguinte, em 62, contra o arqueiro tcheco.

Contava pouco menos de 18 anos quando trocou o time juvenil do Sport pelos aspirantes do Vasco. Vavá era impressionante. Jamais um atacante habilidoso — embora alguns “das antigas” afirmem o contrário —, mas extremamente competente para fazer gols. O que, inegavelmente, demonstrara desde o começo em Recife. Seus primeiros momentos defendendo a seleção brasileira foi durante a Olimpíada de Helsinque, em 1952. Não conquistou medalha por lá. Mas o que o destino reservava para ele era simplesmente muito maior. Vavá brilharia antes no Vasco, conquistando o coração da torcida nos títulos de campeão carioca de 1952, de 1956 e de 1958, ano em que o mundo conhecera o “Leão da Copa”. Da Copa da Suécia. Da Copa do Mundo. Com os cruzamentos certeiros de Garrincha, Vavá balançou a rede de montão na Copa de 58. O mítico goleiro russo Yashin que o diga. Levou dois dele. Nosso Vavá foi fundamental para que conquistássemos pela primeira vez o “caneco”. Com ele em campo, repetimos a dose em 62, no Chile. “A verdade é que eu não era um trombador. Comecei jogando como meia-armador; depois como centroavante, tentei imitar o Ademir, mas logo voltei às minhas características. Eu era mais habilidoso que os centroavantes da minha época”, dizia Vavá. Quem discordaria dele?


Certa vez, Vavá tomou uma bronca do técnico Flávio Costa por ter se deixado fotografar sem dentes para a capa da revista Manchete Esportiva, em 1956. “Palhaço. Então você não se respeita?!”, esbravejara o treinador, como recordara o próprio Vavá. No começo, o craque, que não era desleixado, ficou meio injuriado com a bronca, mas entendeu o recado e passou a andar alinhado. Era obediente e zeloso dentro e fora dos campos. Aprendera ser assim desde pequeno graças à criação dos pais Ana e Odilon. Foi, aliás, o velho investigador de polícia Odilon o grande incentivador do menino Edwaldo Izidio Neto na prática do futebol.
Odilon gostava tanto de uma pelada que fundou o “Leão do Norte” só para ver o menino Vavá bater uma bolinha. Com 11 anos, o garoto mostrara a que veio. Na várzea, todos conheciam o prodigioso filho do Odilon, um pai saudavelmente ambicioso que mantinha uma obstinação: fazer o filho virar manchete de jornal ou revista.

A fama de Vavá chegou a um olheiro do Sport, que o convidou para um teste. O jovem foi mal, mas o treinador do time principal, o ex-goleiro do Fluminense Capuano, gostou do rapaz. Virou-se pro Vavá e falou: “Volte aqui de novo para um novo teste”. Vavá retornou, jogou pra burro e permaneceu no Sport. Com apenas 13 anos, era titular absoluto do time juvenil.

Pintara pelas bandas de Recife o olheiro vascaíno Ciel Barbosa. Tinha em mente levar Vavá para o Rio de Janeiro. Odilon ficou ressabiado. Afinal, Vavá trabalhava para ajudar aos pais nas contas da casa. O papo com velho não foi fácil. Mas Odilon concluiu que o Vasco era a materialização do antigo sonho de ver o filho nas manchetes dos jornais.

No dia 25 de fevereiro de 1951, Vavá e o pai desembarcaram no Galeão. Começara ali a grande epopeia de Vavá no futebol. Odilon permaneceu com o filho dois dias na hospedagem de São Januário. Precisava retornar ao Recife. Emocionado, abraçou Vavá e disse ao então presidente vascaíno Eurico Lisboa: “Meu filho está num grande clube, peço-lhe que o obrigue a estudar”.

Estudar, propriamente, Vavá não estudou, mas o que jogou de bola no juvenil do Vasco não estava no gibi. Sua predileção era espiar o time principal, o “Expresso da vitória”, com Ademir de Menezes, Danilo, Ely, Ipojucan, Maneca, Barbosa, Augusto… o rapaz estava fascinado.


A grande emoção foi o dia em que entrou em campo no Maracanã contra o Bangu, no dia 18 de janeiro de 1953, em jogo válido pela penúltima rodada do Campeonato Carioca do ano anterior. Ao Vasco, que estava desfalcado, caberia o empate para conquistar o título caso o Fla-Flu do dia seguinte também terminasse empatado. Aos fatos, portanto: Vavá, que jogara no lugar de Maneca, olhava para um lado, via Ademir; para outro, via Danilo. Não acreditava que estava lado a lado com os ídolos que tanto admirava. Um sonho para o jovem Vavá. Um sonho real que acontecia ali, diante dele, logo após marcar o gol da vitória contra o poderoso time do Bangu, que contava com Zizinho, Décio Esteves e Nívio.

Dali em diante, Vavá não parou mais de fazer gols no Vasco, depois no Atlético de Madrid, no Palmeiras, no futebol mexicano e, claro, na seleção brasileira.

Nesta segunda-feira, 12, é o dia do nosso Vavá, o que se tornou mais que uma simples manchete, como desejava o pai. O nosso Vavá tornou-se ídolo, um dos maiores da história dos clubes que defendeu e do escrete canarinho.

UM TIME DOS SONHOS DA JUVENTUS DE TURIM

por André Felipe de Lima


A Juventus de Turim completa 121 anos nesta quinta-feira, 1º. Respeitando a trajetória de grandes agremiações como Milan, Internazionale, Torino, Roma, Sampdoria, Fiorentina e Napoli, não há dúvidas de que o clube alvinegro é o principal da História do futebol italiano. Para homenageá-lo, escalei e desenhei aquele que, através dos tempos, é o time ideal, o time dos sonhos da “Vecchia Signora”.

No gol, escalei Dino Zoff (de 1972 a 1983), além de grande arqueiro com vários títulos pela Juve, foi o grande goleiro da Itália tricampeã mundial na Copa de 82. Zoff nos enfrentou naquele jogaço que eliminou o Brasil, no estádio Sarriá, em Barcelona. Na lateral-direita “convoquei” Pietro Rava (de 1935 a 1946 e de 1947 a 1950), que, na verdade, jogava mais como zagueiro direito, mas entra no time dos sonhos da Juventus por ter sido um dos melhores jogadores de defesa do futebol italiano em todas as eras. Conquistou apenas um campeonato italiano pelo clube, em 1950, mas foi titular absoluto da Azzurra bicampeã da Copa do Mundo, em 1938. 

A dupla de zaga fica por conta de Umberto Caligaris (de 1928 a 1935) e do líbero Gateano Scirea (de 1974 a 1988). O primeiro foi campeão mundial com a Itália em 1934 e foi o grande líder da Juventus campeoníssima da década de 1930. Quanto ao Scirea, é o melhor zagueiro italiano que já existiu. Só isso. Igualmente a Zoff, Cabrini e Paolo Rossi, também escalados neste time dos sonhos, o líbero fez parte da Azzurra campeã mundial de 82. Morreu prematuramente em setembro de 1989, em um acidente de carro.


Na lateral-esquerda o titular é Antonio Cabrini (de 1976 a 1989). Era zagueiro esquerdo, mas também atuava coimo lateral. Foi considerado o jogador mais bonito da Itália enquanto esteve na ativa nos gramados. Fora dele, deixava a mulherada em polvorosa. Cabrini garante até hoje ter tido um romance relâmpago com a atriz Sônia Braga. Ela nunca confirmou, mas também jamais negou o flerte com o craque italiano.

Da zaga para a meíuca. Vou escalar meu time com direito a volante, um meia armador, mas dois pontas de lança clássicos. Na cabeça de área escalei o ítalo-argentino Renato Cesarini, um jogador de estilo elegante, que armava o jogo como pouco. De 1929 a 35, foi o cérebro da vitoriosa Juventus dos anos de 1930, considerada um dos melhores times já vistos no “Calcio”. Para muitos cronistas de Buenos Aires, é um dos maiores craques também da história do River Plate. Para a armação no meio de campo, o nome escolhido foi o francês Zinedine Zidane (de 1996 a 2001). Um gênio que levou a França ao seu primeiro título mundial, em 1998, mas que também foi marcante defendendo a Juventus.


Ainda na meia cancha, o camisa 10 é Michel Platini (de 1982 a 1987). Talvez a única unanimidade (ao lado de Scirea, claro) em um time dos sonhos da Juve. O francês era soberbo, fora de série. Tão genial quanto o conterrâneo Zidane. Foi com ele e seus belíssimos gols que a Juventus tornou-se o melhor time do planeta (ao lado do Flamengo, de Zico) na primeira metade da década de 1980.

Para completar a meia cancha, escalamos Giampiero Boniperti (de 1946 a 1961). É considerado pela velha guarda dos torcedores como o maior jogador da história da Juve. Tornou-se importante diretor do clube e formou um trio avassalador com o ítalo-argentino Sivori e o galês John Charles, na década de 1950. Aliás, Sir John William Charles (de 1957 a 1962) também está neste time dos sonhos da Vecchia Signora. É ele nosso homem de área. Era estiloso. Craque de bola.


Para formar a dupla com Charles no ataque, ninguém menos que Paolo Rossi (de 1973 a 1975 e de 1981 a 1985). Teve uma carreira polêmica devido ao envolvimento com a máfia da loteria na Itália. Foi suspenso, voltou em 1982 para defender a Azzurra na Copa do Mundo. Destroçou a defesa do Brasil, com três gols, e tornou-se o grande nome da Itália tricampeã mundial. O nosso “carrasco” jamais ficaria de fora dessa escalação de sonhos da inigualável Juventus de Turim.

AUGUSTO, O PRIMEIRO BRASILEIRO QUE DEVERIA ERGUER A JULES RIMET

por André Felipe de Lima


Ele tinha um sonho: ser o pioneiro do gesto que seria imortalizado por Bellini, Mauro Ramos de Oliveira, Carlos Alberto Torres, Dunga e Cafu. Mas tudo não passou de um sonho [ou seria pesadelo?] para Augusto, o “capitão de 50”. O velho Jules Rimet desceu as escadas da tribuna de honra e entregou a taça para outro capitão, o da celeste uruguaia, Obdúlio Varela. “Não chorei, mas tive vontade”, confessou Augusto ao repórter Geneton Moraes Neto. Fim de jogo contra os uruguaios, o zagueiro vascaíno saiu do Maracanã diretamente para sua casa, no bairro da Ilha do Governador. Já era agente da polícia especial. No dia seguinte, ao chegar ao departamento em que trabalhava, no Largo da Carioca, ouviu gozações. Aceitou tudo calado. O glamour dos dias que antecederam a final da Copa acabou. Restou-lhe a frustração que o atormentou até o fim da vida.

O ex-zagueiro, que também atuou como lateral-direito, Augusto da Costa nasceu na cidade do Rio de Janeiro no dia 22 de outubro de 1920. Já era soldado da Polícia Especial do Exército quando iniciou a carreira nos juvenis do São Cristóvão, como ponta-esquerda. Em 1936, conquistou o seu primeiro título, ainda como juvenil pelo time da rua Figueira de Melo. No ano seguinte, novamente campeão juvenil, agora como lateral-esquerdo, após recomendação do treinador Palestini. Em 1940 foi campeão de aspirantes e no ano seguinte foi campeão do Torneio Municipal, conquista que os torcedores do São Cristóvão consideram como segundo troféu do campeonato carioca que o clube levantou. Demorou um pouco, mas em 1943, Augusto foi lembrado para compor a seleção carioca que acabou sendo campeã brasileira do mesmo ano.


Foi um jogador vigoroso e líder nato em campo. Em 1945 chegou ao Vasco para tornar-se capitão do time. Fez parte do “Expresso da Vitória” cruzmaltino que despontou no futebol brasileiro por quase dez anos, agregando nomes como o do goleiro Barbosa, Eli, Danilo, Jorge, Friaça, Maneca, Ademir de Menezes, Ipojucan e Chico. Augusto ficou no Vasco até 1953, quando encerrou a carreira. Foi campeão carioca em 1945, 47, 49, 50 e 52 e campeão invicto do sul-americano de clubes em 1948. Todos os títulos conquistados com a camisa do Vasco. Augusto atuou pela seleção carioca e foi campeão brasileiro interestadual em 1946. Disputou 311 jogos pelo Vasco marcando apenas um gol. Fez dois contra e jamais foi expulso, como apontam os dados levantados pelo pesquisador vascaíno Alexandre Mesquita.

Titular absoluto da seleção brasileira e capitão de 1948 a 1950, Augusto defendeu o escrete nacional em 20 jogos. Fez apenas um gol pela seleção. Estreou em 1947 formando a zaga com Aroldo e Nena da seleção que disputou dois jogos pela Copa Rio Branco. Conquistou a Copa América em 1949 e amargou o vice da Copa do Mundo de 1950, no Brasil. Após a tragédia no jogo em que perdeu o título mundial de 50 para o Uruguai, Augusto deixou o Maracanã indo diretamente para a sua residência na Ilha do Governador. No dia seguinte, trabalhou normalmente em sua repartição da Polícia Especial e teve que aguentar o deboche de colegas de trabalho.


Ao se aposentar dos gramados, em 1953, passou a exercer apenas a função de policial. Foi censor de filmes e de músicas durante o regime de ditadura militar no Brasil, entre 1964 e 1984. Um dos episódios mais comentados sobre a carreira de censor teria envolvido Augusto e o cantor e compositor Chico Buarque durante um show da cantora Maria Bethânia, na casa de espetáculos Canecão. Augusto foi lá especialmente para vetar a letra da música “Tanto mar”, composta por Chico, que, indignado com o censor, supostamente esbravejou: “Porra, Augusto, você perde a Copa e ainda vem me aporrinhar”. Constrangido, Augusto teria deixado a música ser tocada, mas vetado a letra.

O ex-craque vascaíno morou em Poços de Caldas, em Minas Gerais, durante bastante tempo. Casou-se duas vezes e teve dois filhos. Até 1994, mantinha um apartamento no Rio Comprido, bairro da Zona Norte carioca. Morreu aos 83 anos, na madrugada do dia 29 de fevereiro de 2004, ano bissexto, no Rio de Janeiro.

OS FATOS SEMPRE TIVERAM DIDI, NELSON…

por André Felipe de Lima


“Jogador é o Didi, que joga como quem chupa laranja”. O autor da frase, o mitológico ex-roupeiro do Botafogo, técnico de futebol de praia e “filósofo da bola” Neném Prancha estava coberto de razão. Talvez não tenha aparecido no futebol brasileiro um jogador com tanta classe. Que fazia dos gramados uma passarela. Didi era um modelo de elegância dentro e fora de campo. Esguio, não abaixava a cabeça de forma alguma e era capaz de lançamentos que deixavam a “menina” — como ele se referia intimamente à bola — nos pés de algum companheiro de time. Nos tempos de Fluminense, Carlyle e Orlando Pingo de Ouro marcaram muitos gols graças ao “garçom” Didi. No Botafogo, a lista de gente bem servida por ele contempla Paulo Valentim, Garrincha, Quarentinha, Amarildo. E na seleção? Vavá e até Pelé se esbaldaram nas redes adversárias após serem prontamente atendidos por Didi, o elegante, frio e calculista.


Jogava bola como se disputasse uma partida de xadrez. Não foi à toa que recebeu de Nelson Rodrigues o apelido de “príncipe etíope de rancho”, comparando-o ao personagem dos primórdios do carnaval carioca. Mario Rodrigues Filho endossa as palavras do irmão mais novo: “Jogava em pé, a não ser quando aparentemente se desequilibrava para enfiar um passe. Zezé Moreira apontava aquele preto de pescoço alto, feito de foca, equilibrando a cabeça, como o maior atacante do Brasil. Maior do que Zizinho”.

Se o Mestre Zizinho, provavelmente deprimido com a perda da Copa de 1950, já se preparava para antecipar o fim da carreira — o que, graças a Deus, não aconteceu imediatamente após o fatídico Maracanazo —, não teria com o que se preocupar quando viu aquele rapaz longilíneo realizar coisas indescritíveis com a camisa do Fluminense.

Didi só não foi convocado por Flávio Costa, em 50, por ser ainda muito garoto. Um jovem Didi que encantou [logo quem…] os nossos algozes uruguaios um mês antes de a Copa começar no Brasil. Foram dois amistosos entre a “Celeste Olímpica” e o Fluminense, o “timinho”. Veja como as edições de 5 e 7 de junho da Gazeta Esportiva descreveram a performance do “timinho” e de Didi contra Obdúlio Varela, Julio Perez, Schiaffino e cia.: “O Fluminense agradou bastante, demonstrando ser um conjunto bem treinado, sem individualidades de destaque, mas com completo entendimento e identificação entre seus elementos, além de apresentar jogadores em estado físico perfeito. Com tais predicados, ele fez ver aos torcedores e cronistas uruguaios que o esquadrão designado para apresentar o Uruguai está longe do melhor estado físico exigido a seu jogo de conjunto, isso, o que é mais grave, a pouco menos de um mês da data em que estarão em campo em Porto Alegre jogando seu primeiro jogo de campeonato, que seria com a França […] Todos os cronistas frisam a importante contribuição do Fluminense, para pôr em relevo as falhas da seleção nacional, dando eventualmente o ensejo de saná-las, graças ao novo técnico Lopez, em cuja atuação se deposita grande confiança. Do quadro brasileiro, deixou profunda impressão a parelha dos zagueiros Píndaro e Pinheiro, bem como Didi, estranhando-se que não integrem a seleção brasileira para o torneio mundial”.


A trupe que intimidou o Uruguai e arrancou dois empates heroicos no estádio Centenário [1 a 1 e 3 a 3] foi composta por Veludo, Píndaro [Pé de Valsa] e Pinheiro; Waldir, Pé de Valsa [Emerson] e Mario; Santo Cristo, Didi, Silas, Carlyle e Tite.
O Fluminense liderado por um jovem Didi não deu colher de chá a um escrete uruguaio cansado e sem maiores pretensões no Brasil. Deu no que deu.

Zizinho estava coberto de razão ao definir Didi como herdeiro do futebol mágico, incomparável dele. “Herdei do Mestre Ziza o bastão de organizador de jogadas do futebol brasileiro”, lembrava sempre o craque, que ao deixar os gramados tornou-se treinador. Dos melhores, frise-se. Moldou seleções, como a boa peruana da Copa de 70, e grandes times, como a “Máquina Tricolor” de Francisco Horta nos anos de 1970. Mas nunca uma seleção brasileira. Fazer o quê… “Pior para os fatos”, diria o torcedor tricolor Nelson Rodrigues, ardoroso fã do Didi. Mas a verdade é que os “fatos” sempre tiveram Didi, Nelson.

Não o quiseram como técnico, mas nunca abririam mão do seu futebol.


Durante a Copa de 1958, nenhuma bola saía da defesa e chegava a Vavá, Garrincha, Pelé ou Zagallo sem antes passar por Didi, o maior “armandinho” de toda a história das pelejas nacionais. O frio Didi. Um comandante e seus comandados, embora Bellini fosse o capitão daquele escrete. Sem o meia, talvez faltasse ao Brasil a calma necessária para virar o jogo em cima dos suecos na final da Copa.

Os alvos escandinavos abriram o placar logo aos quatro minutos. Um goleiro Gilmar atônito. Todos estavam atarantados. Menos Didi, que foi ao gol, pegou a bola e, enquanto era abordado por desesperados companheiros, caminhava tranquilamente ao centro de campo para reiniciar o jogo como se toda eternidade estivesse a seu favor. “Não foi nada. Vamos encher [de gols] esses gringos”, dizia um Didi, que, naquele momento, estava mais para monge tibetano que para jogador de futebol. Mas só naquele momento, porque depois fez dois lançamentos de mais de 30 metros até Garrincha acertar os ponteiros com Vavá lá na frente e marcar o gol de empate. No final, a taça Jules Rimet debaixo dos braços e a estatística do cronista esportivo francês Gabriel Hanot: Didi acertou 48 passes, que para Armando Nogueira eram igualmente melífluos, brandos como o olhar da personagem machadiana Capitu. Não há como refutar a tese filosofal de Prancha. Entre chupar uma laranja e o futebol não havia diferença para Didi. “Eu não precisava correr. Quem precisava correr era a bola”. Didi domava as coisas e o tempo. A bola apenas o obedecia, resignadamente, porém feliz.

LUISINHO LEMOS, O DOS GOLS ENDIABRADOS DO AMÉRICA

por André Felipe de Lima


De Andrada a Renato, goleiros que se notabilizaram no futebol carioca na primeira metade dos anos de 1970, a opinião era unânime quando perguntavam a todos qual o centroavante mais perigoso do momento: “Luisinho Lemos. Ele é um demônio. Corre, zanza, fustiga, chuta e cabeceia”. Que time não o queria no comando do ataque? O América foi o mais sortudo. Lusinho é, sem dúvida, o melhor centroavante da história do querido Alvirrubro, que voltou à primeira divisão carioca tendo como treinador o próprio ídolo.

Irmão de César “Maluco” Lemos e de Caio Cambalhota, Luisinho foi campeão da Taça Guanabara, em 1974; da Taça Rio, em 1982, e do Torneio Campeão dos Campeões, também em 82, defendendo com extrema devoção e amor as cores do seu querido América. Foi um jogador que não fugia do pau. Se o América tinha alma, ela se chamava Lusinho. Sem ele em campo, os gols escasseavam. Os números não mentem. Foram pouco mais de 300 gols que o consagraram como o maior artilheiro da história do clube da rua Campos Sales, na doce e incomparável Tijuca.


Quem deve ter lamentado muito foi o Fluminense, que o dispensou ainda juvenil. Telê e Pinheiro o treinaram. Luisinho “jogava” como ponta-direita. O “jogava” é entre aspas mesmo. Na verdade, jamais entrou em campo pelo tricolor. Apenas treinava. Foram dois anos (1968 e 69) infrutíferos. Por pouco não deixou para trás a ideia de ser jogador de futebol. Acabara de ingressar do serviço militar. Porém, jogando pelo time do Exército, a sorte parecia acenar para ele. Alguém do Vasco o viu batendo uma bolinha e queria levá-lo para São Januário. Lusinho topou, mas sob uma condição: manter-se amador. Talvez por receio de sofrer a mesma decepção que teve nas Laranjeiras, o jogador atuava apenas pelo time de aspirantes do Vasco, e com ele foi terceiro colocado da categoria em 1970.

Vendo que a situação do irmão não era fácil no Vasco, César o levou para o Palmeiras. No clube paulista, Lusinho tornou-se profissional, mas permanecia sem espaço. Como barrar o irmão, centroavante como ele e ídolo da torcida? Perambulou de forma fugaz pela Ferroviária. Voltou ao Parque Antarctica e, após uma transação com os cartolas palmeirenses, o César ficou com o passe do irmão, emprestando-o, em seguida, ao América.


Enfim, Lusinho teve o futebol reconhecido. Brilhou intensamente. Era tão ídolo quanto Edu, o irmão do Zico. O Flamengo o queria a todo custo, e conseguiu o passe do cabeludo e barbudão goleador. Pagou um cifra milionária. “Era dinheiro pra burro”, reconheceu Luisinho, que chegou à Gávea para formar dupla com o próprio Zico. Deu certo. Marcou 82 gols em 183 jogos. Média excelente. Mas não se sentia à vontade na Gávea. Certa vez, disse o seguinte ao repórter Lédio Carmona: “Os gols no América são muito valorizados. Aqui, nós marcamos um gol e somos considerados heróis. No Flamengo, por exemplo, o artilheiro faz três gols em um jogo e assim mesmo é fuzilado”.

Com a chegada de Cláudio Adão à Gávea, Luisinho foi perdendo espaço. Difícil para ele reconhecer que no Flamengo foi pouco valorizado apesar dos muitos gols que marcara. Afinal, desde garoto torcia pelo rubro-negro. Deu de ombros, superou a desilusão e seguiu seu rumo de volta ao América para levantar mais taças e marcar muito mais gols. Lá o valorizavam. Lá era ídolo incontestável. Lusinho já não era mais torcedor do Flamengo. Batia no peito o coração vermelho… vermelho do seu amado Mecão.

Luís Alberto da Silva Lemos, nasceu no dia 3 de outubro de 1951, em Niterói. Ah, o apelido “Tombo” nasceu como contraponto ao “Cambalhota”, do irmão Caio, e o América assim construiu o seu gigante artilheiro. A inesquecível legenda Luisinho Lemos.