por André Felipe de Lima
Provocar. Não há verbo mais adequado no dia a dia dos apaixonados debates clubísticos. Ora, em 1948, o Vasco conquistou o memorável Torneio Sul-americano, no Chile, o “irmão mais velho” da Taça Libertadores da América, feito devidamente reconhecido pela Conmebol. Pois bem, o Vasco da Gama é o primeiro campeão continental das Américas e fim de papo. Aliás, a Fifa, também reconheceu, enfim, o “título mundial” do Palmeiras, conquistado, no Maracanã, em 1951. Deveria fazer o mesmo com o Fluminense, que levantou a mesma Copa Rio, no ano seguinte, ou também fazer do Vasco um legítimo campeão do mundo, após a conquista do Torneio Octogonal Rivadavia Corrêa Meyer, competição que substituiu a Copa Rio, em 1953, e nem destaco aqui o badaladíssimo Torneio Internacional de Paris, realizado em 1957, quando o Vasco desbancou o poderoso Real Madrid, de Di Stéfano, Puskas, Gento e muitos outros craques, o Racing Paris e o alemão Rot-Weiss Essen. O fato é que todas estas grandes competições — destaco apenas a Copa Rio e o “Rivadavia” — contaram com mais de seis clubes oriundos dos principais centros futebolísticos do mundo. Torneios muitos mais disputados e infinitamente mais empolgantes que o insosso Mundial de Clubes bancado pela Fifa desde 2000. E, convenhamos, a International Soccer League, disputada em 1960, em Nova Iorque, e conquistada pelo Bangu, também é uma “copa do mundo” de clubes, ora essa. Nosso Alvirrubro carioca é, sim, em tese, campeão mundial, e ponto final. Pensou que parou por aqui? Nada disso. A mesma competição seria disputada até 1965, sendo que o “campeão do mundo” de 1962 — mesmo ano em que o Santos conquistava a sua primeira edição da Copa Intercontinental ou Mundial Interclubes, como queiram — foi o querido América do Rio de Janeiro.
Por aqui, a CBF decidiu que a Taça Brasil, várias vezes conquistada por Santos e Palmeiras, deveria ingressar na lista de campeonatos nacionais iniciada com o título do Atlético Mineiro, em 1971. É justo, em termos. A Taça Brasil, em sua fórmula, assemelha-se mais à atual Copa do Brasil. Já a antiga Taça de Prata, ou Torneio Roberto Gomes de Pedrosa, disputada entre 1967 e 1970, está mais adequada ao modelo deflagrado em 1971. O que muita gente esquece é que o Atlético Mineiro seria, em tese, o legítimo primeiro campeão nacional de clubes ao levantar heroicamente a Copa dos Campeões, de 1937, organizada pela extinta Federação Brasileira de Futebol (FBF). O Galo disputou a taça, em pontos corridos, contra outras cinco equipes, dentre elas Fluminense e Portuguesa de Desportos. Mérito indiscutível.
Essa barafunda de conquistas pode ser motivo para o Flamengo requerer junto à Conmebol o título de “Campeão Sul-americano”, de 1961. Isso porque, em fevereiro daquele ano, o rubro-negro foi campeão do primeiro Torneio Octogonal de Verão, que reuniu a nata do futebol continental. Em campo estiveram Boca Juniors, River Plate, Nacional de Montevidéu, Cerro Porteño, Corinthians, São Paulo e Vasco da Gama. Todos contra todos, ponto corrido para valer. Longe da fórmula do mata-mata da Libertadores, que é até emocionante, mas que pode resultar em algumas injustiças históricas.
Se o “Mundial” valeria para o Palmeiras, vale também para Fluminense e Vasco. Se Santos e Palmeiras assumiram a pecha de maiorais em taças nacionais, reconheça-se (ou, pelo menos, deveriam) o pioneiro título do Galo mineiro. Se a Conmebol reconheceu o Vasco de 1948, por que não reconhecer o Flamengo de 1961? Seria o rubro-negro, portanto, “tricampeão” continental após levantar a Taça Libertadores de 2019?
Tudo é realmente polêmico, mas um prato cheio para fazermos do futebol um inesgotável manancial de saudáveis e acalorados bate-papos. O que desejamos, realmente, é que nossos times sejam campeões. Se a Fifa ou a CBF não reconhecem as conquistas… azar delas, e, garçom, traga, por favor, outra gelada, porque o papo só está no começo.