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Ajax

TIRA O TIME DE NOVO!

por Wilker Bento


O que mais gostava de fazer na infância e adolescência era jogar futebol. Minha igreja tinha uma quadra onde os meninos se reuniam às segundas ou quintas-feiras por volta das 18h para a brincadeira. Num dia bom, mais de trinta garotos apareciam, o que dava para formar seis times.

Como nem todos conseguiam aparecer na hora marcada, os times eram escolhidos assim que havia um número suficiente de jogadores. Aos poucos, os atrasados chegavam da escola ou do trabalho e formavam times na espera. O problema era que poderia acontecer daqueles considerados melhores aparecerem juntos ao mesmo tempo, formando um time mais forte que os outros. Essa equipe com garotos mais velhos e habilidosos nunca mais perdia uma partida e a brincadeira ficava sem graça. Assim que isso era observado, alguém gritava “tira o time de novo!” e todos concordavam em reorganizar os times, com os melhores jogadores sendo distribuidos igualmente entre as equipes e a brincadeira continuava até as 21h, quando fazíamos uma roda de oração e íamos para casa.

O futebol profissional passa por uma fase parecida na atualidade, onde parece ser necessário “tirar o time de novo” para não perder gradualmente seu interesse. Reflexo da desigualdade social que atinge o planeta, o futebol está cada vez mais desequilibrado e sem graça. Na Itália, que já teve o melhor campeonato do mundo nos anos 1980 e 1990, quando times como Napoli, Hellas Verona e Udinese conseguiam disputar títulos e contratar grandes craques, a Juventus foi campeã por nove anos consecutivos sem muito esforço, e só agora vai dando sinais de desgaste. Na Espanha, onde clubes do porte de La Coruña, Valência e Bétis já conseguiram bater de frente com a dupla Real e Barça, os dois gigantes dominam, dando espaço para o Atlético de Madrid conseguir alguma coisa de vez em quando. Na França, as hegemonias são uma tradição, com o Lyon ganhando tudo nos anos 2000 e o PSG dominando atualmente. E a situação é ainda mais grave na Alemanha, onde o Bayern é o clube mais forte há décadas, mas atingiu níveis absurdos recentemente, vencendo onze Bundesligas nos últimos quinze anos. O Gigante da Baviera tem mais que o triplo de títulos do segundo maior campeão, Nürnberg.

Os maiores clubes europeus já reconhecem a perda de valor das ligas nacionais e a chatice que elas se tornaram, mas ao invés de pensarem num jeito de fortalecer as equipes menores, a ideia da moda é a Superliga Europeia, com times definidos a partir de uma panelinha e protegidos do rebaixamento. Uma competição que enfraqueceria ainda mais os clubes médios e pequenos do continente e logo se tornaria igualmente monótona, com apenas a “nata da nata” brigando pelo título.

No Brasil, a situação não é muito diferente. Embora o critério para a divisão das cotas de TV tenha melhorado nos últimos anos, com o modelo 40-30-30 e o fim da “cláusula paraquedas” para os clubes grandes que são rebaixados, eles ainda recebem muito mais que as equipes restantes. Times que mereciam mais dinheiro e atenção da mídia nos últimos anos, como Athletico Paranaense, Chapecoense e Fortaleza, ainda penam para conquistar espaço. Não é raro que equipes caiam no ano seguinte ao acesso à Série A por não conseguirem bater de frente com os já estabelecidos na elite. E a situação é ainda mais grave nos estaduais, com clubes tradicionais do subúrbio e do interior relegados ao esquecimento na maior parte do ano. Um modelo insustentável.

Sim, é utopia pensar em igualdade total. Obviamente, times com maior torcida e desempenho histórico terão mais chances que os outros. Mas é preciso garantir que os clubes menores também tenham chance de crescer. Os norte-americanos já entenderam isso há muito tempo, ao fazerem da competição mais justa o seu negócio. Embora as suas ligas de basquete, hóquei e futebol americano também tenham seus bichos-papões, a distribuição de recursos é mais igualitária, o que possibilita que o troféu saia mais vezes das mãos de franquias dominantes. Há também o sistema de draft, onde as piores equipes têm preferência na contratação de jovens talentos, equilibrando o jogo a longo prazo. E mesmo na liga de beisebol, considerada a mais desigual entre as quatro, há um equilíbrio maior que no futebol atual – o último tricampeonato da World Series ocorreu em 2000. Ironicamente, o centro do capitalismo segue um modelo “socialista” em seus esportes…

Afinal, de que adianta termos os melhores jogadores do mundo concentrados num só lugar? Qual a graça de assistir um campeonato onde já se sabe de antemão quem ficará com a taça? Hoje a tecnologia proporciona chuteiras modernas, gramados impermeáveis, atletas desenvolvidos em plena forma, mas ainda assim os torneios em sua maioria são entediantes. Prefiro assistir um campeonato de bairro equilibrado que uma competição que envolva a elite do esporte bretão mas o mesmo time ganhe todos os anos.

Que os responsáveis pelo futebol mundial abram os olhos e não destruam esse esporte tão amado por conta de uma visão limitada ao dinheiro. Por serem tão gananciosos, podem acabar matando a própria galinha dos ovos de ouro. Por isso, fica o apelo: TIRA O TIME DE NOVO!

AJAX, O GRANDE… EXEMPLO

por Idel Halfen


O clube holandês Ajax poderia render excelentes artigos em função de alguns fatos históricos.

A origem do nome do clube é uma delas. Fundado sob o nome de Union, mudou para Ajax influenciado por um herói da mitologia grega: Ájax, o Grande.

Outra curiosidade é o apelido “Joden” – judeu em holandês -, em função da localização do seu estádio antes da Segunda Guerra, cujo acesso passava por um bairro judeu. Ainda que alguns torcedores de equipes rivais se utilizem de canções anti-semitas nas partidas contra o Ajax, parte de sua torcida encampa o apelido a ponto de levar bandeiras de Israel ao estádio.

O próprio desempenho esportivo e sua influência no futebol mundial seriam boas fontes de artigos, porém, preferiremos focar aqui em algo que não fuja da proposta do blog, que é discutir marketing & gestão, o que nos leva a explorar mais uma vez a necessidade de os clubes terem objetivos grandes e de longo prazo, sendo o Ajax um ótimo exemplo.

O clube holandês ao notar que sua competitividade perante aos rivais europeus já não é a mesma de outrora – o time é detentor de quatro títulos da Champion League e três mundiais de clubes, o último em 1994/95 – aceitou abrir mão de parte de sua cota referente aos direitos de transmissão do campeonato holandês em prol dos demais clubes.

Com esta iniciativa, o Ajax espera que o campeonato holandês fique mais qualificado, já que os adversários teriam melhores condições de reforçar seus times e, consequentemente, atrair o interesse do mercado estrangeiro.

Este maior interesse renderia uma melhor comercialização dos direitos de transmissão internacional, aumentando o faturamento e promovendo um círculo virtuoso que daria ao clube um orçamento mais significativo que, se bem gerido, propiciaria a buscada competitividade.

Embora seja um raciocínio simples, há que se ter uma boa dose de inteligência para acompanhá-lo e, mais ainda, para segui-lo.

A reprodução de algo minimamente parecido no Brasil parece fora de cogitação. A falta de união dos clubes e a miopia de grande parte de seus gestores, nos leva a acreditar que só entenderão o quão incompetentes estão sendo quando a audiência do campeonato brasileiro estiver restrita aos torcedores de poucos clubes.


Eventuais tentativas de reversão deste quadro que se aproxima, podem vir tarde demais, quando talvez os atuais torcedores das equipes com menor orçamento estejam direcionando seu tempo e dinheiro para outras modalidades esportivas e/ou de entretenimento.

Quanto aos clubes que mais faturam, estes terão que se contentar em participarem – sem chances concretas de vitórias – de competições internacionais importantes, contratar jogadores sem mercado na Europa e perder suas jovens promessas para equipes internacionais.

Isto sem falar nos reflexos que esta “concentração de riquezas” causa na seleção.

Há quanto tempo o Brasil não ganha uma Copa? Há quanto tempo um clube brasileiro não ganha um Mundial de clubes?

Não é coincidência. Acreditem!

FAZER O CERTO DÁ TRABALHO

por Bruno Pereira Pinto


Que o Brasil talvez seja o maior centro exportador de mão de obra futebolística, isso não se discute. O país que revelou Arthur Friedenreich, Leônidas, Zizinho, Pele, PC Caju (não poderia esquecê-lo mestre) Zico, Romário, Ronaldo e mais recentemente Neymar, sem mencionar tantos outros, tem um potencial tremendo de produzir jogadores de alta capacidade técnica.

Mas hoje, vivemos uma crise sem precedentes.

As categorias de base dos clubes Brasileiros, uma vez capazes de nos agraciar com jogadores que nos levavam aos estádios, hoje são um celeiro de negociatas e sua efetividade é discutível.

Antes de fazer um passe no time profissional, garotos já tem empresários, assessores e um staff para cuidar da carreira. Staff esse que nada mais são que paparicadores, incapazes de apontar falhas para o crescimento pessoal e profissional do atleta.

Não só isso, mas as exigências de cartolas e mídia em relação as categorias inferiores são de um nível incompatível para a função da mesma; parece que títulos neste estágio são mandatórios, assim como no profissional. Não há um plano para o desenvolvimento e melhor aproveitamento dos jogadores da base. O Brasil sempre confiou na qualidade inata de seus jogadores. Mas não vemos um projeto sério de desenvolvimento do atleta do momento em que chega ao clube, até o momento em que integra o time profissional. Com isso, a fonte de talentos está secando.

Mas no mundo do futebol, existem aqueles que acreditam em um trabalho quase artesanal na confecção de um grande atleta. Um desses lugares é em Amsterdam, a casa do Ajax.

Quando cursei o Nível 1 do curso de treinadores da Federação Inglesa, comecei a estudar como trabalhar as categorias de base. Em quais os pontos focar para melhor desenvolver atletas. E um dos meus objetos de estudo foi a academia desse grande clube Holandês.

A integração entre os jovens e os profissionais começa no sistema de jogo; desde os tempos de Cruyff, o 4-3-3 é a formação base. O Ajax se prima por jogar de forma criativa e em velocidade, não importando qual o nível. Juvenil ou profissional, todos jogam da mesma forma. Assim, o atleta chega ao profissional já sabendo o que se espera dele taticamente. A ideia é desenvolver jogadores para o clube, com a mentalidade do clube.

Mentalidade essa trabalhada em detalhes. O chefe de desenvolvimento da base, Jan Olde Riekerink diz: “os atletas precisam ser “treináveis” e com vontade de aprender”. Ele continua: “o mais importante fator que podemos ensiná-los é responsabilidade pessoal. Eles podem ir para casa depois do treino ou ir ao Mc Donald’s. São crianças e não vou brigar com eles, mas precisam perceber que ser um profissional significa tomar as decisões corretas”.

A mentalidade trabalhada na base reflete no modo de jogar dos profissionais. Futebol é mais do que correr; todos querem jogar com a bola e não tem medo de fazê-lo. Jogam no mesmo sistema desde que chegam ao clube e, por isso, a adaptação ao time principal é muito mais fácil. Testes psicológicos ajudam a identificar o que precisa ser trabalhado nesta área, para que jogadores tomem melhores decisões durante o jogo.

A preocupação com o atleta se dá nos mínimos detalhes: um garoto que não vive perto de Amsterdam só é trazido quando, depois de um tempo sendo monitorado, o consideram pronto para a mudança e o colocam com uma família adotiva. Manter o máximo de normalidade é prioridade. 

Mas o fator que mais chama a atenção é o entendimento no processo de educação do jogador. Não tem como prioridade títulos na categoria de base, mas sim a educação técnica, tática e mental do jogador para que, ao chegar ao primeiro time, possa estar capacitado para aguentar a pressão e desenvolver seu trabalho.

O trabalho é tão compreensivo que todos são submetidos a um programa de habilidades atléticas. Em resumo, o clube desenvolve habilidades motoras que somente os treinamentos de futebol não são suficientes para o desenvolvimento pleno do atleta. A tecnologia de ponta utilizada na avaliação e desenvolvimento do atleta provê as informações necessárias para um trabalho extremamente metódico..

O investimento não e tão grande quanto parece. Os recursos do clube são bem aplicados e o trabalho é medido pelos resultados de longo prazo. 

Não é à toa que Ajax revelou, em anos mais recentes, Van Der Vaart, Snejider, Eriksen, Vertonghen, Alderwereild, De Ligt, De Jong and Van Der Beek. Voltando no tempo um pouco mais, Kluivert, Bergkamp, Davids,Frank e Ronald De Boer, para ficar nos mais famosos. 

Podemos concluir que, em um mundo onde dinheiro e imediatismo são fatores que regem o futebol, uma constante permanece: o trabalho longevo e frutífero do Ajax. 

Fazer o certo leva tempo e dá trabalho. Mas alguém tem prazer de fazê-lo.  

A SEGUNDA PELE

por Sergio Pugliese


A professora vascaína do Externato Coração Eucarístico, no Flamengo, curiosa em saber os times de coração de seus pimpolhos iniciou uma enquete: “Vascão!!!”, gritou o risonho, “Fred!!!”, animou-se o tricolor bochechudo, “Mengoooo!!!”, caprichou o comprido, “Loco Abreu!!!”, acenou o botafoguense, “Ajax!!!!”, bateu no peito Diego Parente, de 4 anos. A “tia” enrugou a testa e pediu mais detalhes.

– É o melhor time do mundo – resumiu. 

A pueril marrinha era apenas reflexo da assumida marrona do paizão Victor Parente, de 41 anos, pioneiro do Ajax do Aterro, time fundado em 1988 por amigos do Colégio Santa Úrsula em homenagem ao esquadrão holandês. De cara, ganharam o Campeonato do Aterro, na fase pós Jornal dos Sports. Participaram de 106 torneios, ganharam 50, jogaram 1.500 vezes, venceram 1.085, empataram 179 e “foram prejudicados” em 236. Marcaram 7.815 gols e sofreram 4.204.

– Quase todos irregulares – afirmou o goleiraço Fábio Guimarães, o Mamão, há 20 anos defendendo as cores do azul e vermelho. 


Acir retoca a tatuagem de Mamão. No fundo, os irmãos Alex e Victor ao lado de Simão exibindo o seu escudo tatuado no braço.

O arquivo ambulante do grupo é Alex Parente, de 33 anos, irmão de Victor. Ele também tem sido o responsável pela renovação do time, mas quem continua fazendo comida boa é a rapaziada da panela velha. O vascaíno Victor é o artilheiro e marcou 1.428 gols nesses 24 anos de estrada, “quase todos merecedores de estátua”. Não, eles não são marrentos! A frase “O melhor time do mundo”, estampada no verso da camisa, é apenas uma lição de humildade. Eles não têm qualquer culpa por não encontrarem adversários a altura e não perderem há 18 meses!! Só após muita insistência revelaram cinco grandes rivais: Ellite, do talentoso PH, Ark, dos geniais irmãos Duda e Lelê, Geração 2000, de Dudu, Leo, Aureliano Bigode e Reyes de Sá Viana do Castelo, hoje camisa 13 da equipe A Pelada Como Ela É, Bussanha, do Roberto, e Juventude do Aterro, do craque Fábio. Sobre esse último, a lembrança da memorável final, em junho de 2011, às 22h, no campo 4, pela final do Campeonato da Liga do Aterro: 4×4 e vitória de 3×1 nos pênaltis.

– Foi um dia especial em nossa história – comentou Luiz Sabino, o Simão, autor de um dos gols e outro panela velha do grupo, há 21 anos no Ajax. 


Os outros foram marcados por Rafael, Luís Perna e Antônio Jr. Nos pênaltis, Perna, mais um, Batista e Rodrigo He Man liquidaram a fatura. A comemoração na barraca do Gaúcho, no próprio campo, varou a madrugada, mas para Simão partida marcante mesmo foi contra o Dínamo. O primeiro tempo terminou 4×0 para os rivais. No início do segundo fizeram outro, mas o jogo terminou 6×5 para o Ajax, com cinco gols de quem? Claro, do próprio! Como costuma dizer Seu Walter, craque dos saudosos Vasquinho de Olaria e Cruzeiro do Sul, de Petrópolis, “quem não tem dinheiro, conta história”. Ricardo Gaspar, Marcelinho, Vitinho, Claytinho, Batista Lambreta, Eduardo Parada, Diego Camargo, Luís Augusto, Miguel, Breno e Marcos Marreco se divertem! E tem mais, hein!

– Disputamos um campeonato em que a fase final foi no Maracanã e ganhamos quatro jogos lá – contou, orgulhoso, Alex, observado pela mulher Michelle, grávida.

Melhor pular a parte em que o craque aproveitou uma soneca da amada e foi jogar bola em plena lua de mel. Bem, o que importa é que ela está grávida! Ah, também teve o jogão contra a banda Iron Maiden, em 2001. O baixista Steve Harris marcou três, mas levou uma sacola cheia para a Inglaterra: 13 gols. Certamente pagou por excesso de bagagem. Volta e meia o Ajax também joga contra peladeiros argentinos, numa espécie de intercâmbio. Doze a zero foi o menor cartão de boas vindas. Uma história rica dessas, claro, foi gravada em DVD e exibida em sessão prive, no Artplex, de Botafogo. 

– Um espaço cult porque somos cults – explicou Victor, que gaba-se por ter convencido o radialista José Carlos de Araújo a gravar num estúdio um de seus gols.

Na site do time o número de acessos já atingiu a marca de meio milhão, mas eles não têm limites e querem muito mais. Na verdade, essa marra é amor. Um amor avassalador! Na semana passada, marcamos com eles num salão de beleza, no Flamengo. Iam retocar as tatuagens com o escudo do Ajax desenhadas por Acir. Estavam no estúdio, Alex, Victor, Mamão e Simão, mas Marco Aurélio, Daniel, Otair e Neto também rasgaram a pele com a marca dessa incontrolável paixão, que passam adiante na escolinha da Tavares Bastos, um belo trabalho social. O líder do grupo, Victor Parente, já enfrentou seis cirurgias no joelho, mas continua correndo atrás da bola, provocando os rivais com divertidos desafios. Agora, finaliza um livro, sonho antigo que pode até não superar Paulo Coelho na lista dos mais vendidos, mas contará a fantástica história de amigos de infância que cresceram obcecados por vitórias, ganharam fama no Aterro do Flamengo e hoje formam o maior time do mundo.