por Rubens Lemos
Ser vascaíno é desfrutar do privilégio da ansiedade. O Vasco é sedutor. Seja pela história, pela torcida, pelos timaços, pelas conquistas, pelas derrotas roubadas contra o Flamengo. O Vasco é tão fascinante que seu maior ídolo sorri triste. Roberto Dinamite exibe uma face de Quixote. Disparava petardos de granadeiro.
O Vasco é o time de quem ama sofrido, quem é apaixonado crônico ou vibra em jogo de segunda divisão. Eis o Vasco que superlotou o Maracanã Falsificado com 67 mil pessoas e estragou uma festa empatando com a rebaixada Chapecoense. O Vasco é o improvável, é o imprevisível, é o sentimento e o sofrimento.
Quando foi rebaixado duas vezes, o Vasco ostentava um time menos patético do que o atual. Quem salvou a raça cruzmaltina agora foi Vanderlei Luxemburgo. Ele mostrou o que um técnico é capaz de fazer com uma caricatura de equipe. Foi pinçando, pinçando, burilando, esmerando, até juntar 11 menos ruins para enfrentar uma batalha de anúncio perdido.
Os novos vascaínos, coitados, sofrem a falta de ídolos. Pikachu é esdrúxulo até no nome. O goleiro Sidão é para futebol de botão. Ribamar é um lastimar. Rossi é raça pura. Jamais jogaria nos escretes dos anos 1980 e 90.
Para que me faça compreender, é preciso dizer que vi jogar em 1987: Acácio; Paulo Roberto, Donato, Fernando e Mazinho; Dunga, Geovani (foto) e Tita; Mauricinho, Roberto Dinamite e Romário.
Vi também em 1993, Carlos Germano; Pimentel, Torres, Jorge Luís e Cássio; Leandro, Luisinho, Geovani e Carlos Alberto Dias; Valdir e Bismarck. Esse foi o time bicampeão. O do Tri alinhava Carlos Germano; Pimentel, Ricardo Rocha (um dos melhores zagueiros do mundo), Torres e Cássio; Leandro, Luisinho, Yan e Cafuné, apelido de Denner, a mistura de Garrincha com Pelé; Valdir e Jardel.
Denner morreu sufocado pelo cinto de segurança e a torcida do Flamengo ultrapassou a torpeza no clássico seguinte: “Ô Vascaíno por que estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu, foi o Denner que bateu no carro, quebrou o pescoço e depois morreu”.
Desde esse dia de 1994, perdi o respeito que não havia pelos flamenguistas. Eles são diferentes. São inconsequentes. Agora há pouco tempo, morreram os garotos da Gávea e o Vasco demonstrou irrestrita solidariedade. Pode ser a diferença. A média do caráter vascaíno é íntegra.
O Vasco venceu os últimos títulos de respeito em 2000. Ganhou a Mercosul e o Brasileiro. Romário, Juninho Paulista e Euller jogaram demais. E acabou. Os times do Vasco pareciam Itaperunas disfarçados, sem referências, tanto que Romário jogou até os 41 anos e com bola para titular da seleção brasileira.
Terminando em 12º lugar, o Vasco festejou. Precisa de um time de verdade no próximo ano, senão corre risco, deve expurgar a mentalidade tacanha, pequena, distante de suas tradições. Pensar grande e trazer dois ou três jogadores razoáveis, embora jogadores razoáveis sejam exceção no Brasil.
Olhaí de novo Pikachu com pose de Geovani. Não tira uma lasca. O Vasco continua na Série A. Para quem sofreu o que a massa passou, é mesmo para rogar aos céus. E agradecer a Luxemburgo. Ser Vasco emociona. Comove. Instiga. Basta escrever que a gente chora.
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