por Eduardo Lamas Neiva
A discussão sobre a final do Brasileiro de 77 tomou conta do bar “Além da Imaginação”.
Idiota da Objetividade: – Aquela final foi a primeira do Brasileiro a ser decidida na disputa de pênaltis.
João Sem Medo: – E foi um festival de pênaltis perdidos. No fim, o São Paulo, que tinha um time mais pesado e se aproveitou do campo encharcado para se defender, acabou levando a taça.
Houve mais um burburinho, com os atleticanos reclamando muito da arbitragem. Então, Zé Ary interveio.
Garçom: – Minha gente, já que aquela decisão terminou nos pênaltis, vamos aproveitar para ouvir uma música aqui no som sobre o tema, até pra acalmar os ânimos que estão ficando muito exaltados. É “O medo do artilheiro na hora do pênalti”, de DJ Dolores, Lúcio Maia e Pio Lobato, com DJ Dolores e a Orchestra Santa Massa. Vamos lá!
O pessoal se diverte com a música e tudo fica mais sereno, quando João Sem Medo retoma a pelota.
João Sem Medo: – Meus amigos, eu falava antes dos nossos dirigentes, dos nossos maus dirigentes. A tabela, o número de clubes e o regulamento do Campeonato Brasileiro foram mudados diversas vezes.
Garçom: – Até hoje se discute quem foi o campeão de 87: Flamengo ou Sport.
Idiota da Objetividade: – E, por isso, quem deveria ficar com a Taça das Bolinhas, Flamengo ou São Paulo. A CBF instituiu esta taça para ficar com o primeiro clube que conquistasse primeiro três títulos seguidos ou cinco alternados. Mas isso, antes de reconhecer os títulos da Taça Brasil e do Robertão, pois se fosse depois, teria de ficar com o Palmeiras.
Garçom: – Que confusão!
Sobrenatural de Almeida: – Assombroso!
João Sem Medo: – Eles ataram o nó e o futebol conseguiu ficar mais desorganizado que o país naquela época. Depois da Copa do México, em 86, levaram todos os nossos jogadores para a Europa, com exceção do goleiro, e ficou por aqui o segundo escalão e as revelações. Não era mais possível aguentar competições deficitárias, nem estádios vazios. Aí veio o Clube dos 13, selecionaram 16 times, o que me pareceu certo, mas não era lá muito justo. Sport e Guarani resolveram melar a final do Grupo Amarelo e deixaram o juiz sozinho em campo. Enquanto isso, o Flamengo dava a volta olímpica no Maracanã carregando uma taça e o mérito de campeão brasileiro.
Alguns torcedores e ex-jogadores do Sport presentes protestam, mas João Sem Medo prossegue.
João Sem Medo: – Uma coisa é certa, foi justo virar a mesa e se insubordinar contra os campeonatos do Otávio Pinto Guimarães, Caixa D’Água, Rubens Hoffmeister e outros dirigentes que usufruíam do esporte na época todas as mordomias possíveis e imagináveis. O Clube dos Treze virou uma das mais sujas mesas da história de nosso futebol. O público prestigiou as duas partidas finais e deu o recado: queria assistir a grandes jogos.
Houve mais alguns protestos.
Idiota da Objetividade: – Em 1986 a CBF declarou que não tinha dinheiro para organizar o Campeonato Brasileiro com 40 times. Os principais clubes do Brasil, Flamengo, Fluminense, Vasco, Botafogo, Corinthians, São Paulo, Palmeiras, Santos, Cruzeiro, Atlético Mineiro, Grêmio, Inter e Bahia, então se reuniram, fundaram o Clube dos 13, obtiveram verba com patrocinadores e transmissão pela TV. Com o aval da CBF realizaram a Copa União, com mais três clubes: Goiás, Santa Cruz e Coritiba. Guarani, vice-campeão em 86, e o América do Rio, o quarto colocado, ficaram fora.
Ouvem-se protestos no público quando América e Guarani são citados.
Garçom: – Foi mesmo injusto com os dois clubes. Mas senhor…
Ceguinho Torcedor: – Idiota da Objetividade, prossiga, por favor…
Idiota da Objetividade: – A CBF montou um torneio paralelo, chamado de Módulo Amarelo, com os outros principais clubes, mas o América do Rio se recusou a participar. O Sport entrou no lugar do Inter de Limeira, campeão paulista do ano anterior. Para valorizar o seu torneio, a CBF sugeriu em reunião que o campeão e o vice do Módulo Amarelo disputassem o título brasileiro com o campeão e vice do Verde, que era a Copa União. O representante do Clube dos 13, Eurico Miranda, do Vasco, aceitou, mas a diretoria do Clube dos 13, presidido por Marcio Braga, do Flamengo, decidiu recusar a proposta. O impasse não foi resolvido até hoje.
João Sem Medo: – Acabou que o Sport e o Guarani disputaram a final da CBF, já em 88, e o time pernambucano foi o vencedor.
Garçom: – E os dois disputaram a Libertadores daquele ano, né?
Idiota da Objetividade: – Sim, e oficialmente não foi aceito nem pelo Supremo Tribunal Federal a divisão do título entre Flamengo e Sport, proposto pela CBF em 2011.
Sobrenatural de Almeida: – Isso sim é assombroso.
Idiota da Objetividade: – O campeonato de 88 também foi chamado de Copa União, teve a participação do América do Rio e serviu para apaziguar os ânimos. Ao todo, foram 24 equipes que disputaram a primeira divisão daquele ano.
João Sem Medo: – A competição também só terminou no ano seguinte e teve uma série de confusões.
Idiota da Objetividade: – Sim, uma delas ocorreu logo na primeira rodada. A CBF decidiu o regulamento em cima da hora, com três pontos para o vencedor e dois pontos para o time que vencesse a disputa de pênaltis, no caso de empate no tempo normal. Fluminense e Botafogo, que jogaram no Maracanã, tentaram se insurgir e não fizeram a disputa depois do jogo terminar empatado em 1 a 1. Houve depois um acordo e os dois times voltaram no meio de semana ao Maracanã apenas para a disputa de pênaltis.
Garçom: – Que confusão!
Sobrenatural de Almeida: – Assombroso!
João Sem Medo: – Uma barbaridade!
Ceguinho Torcedor: – Eu fui lá, os portões foram abertos e vi o meu tricolor vencer nos pênaltis. Se bem que eu já não precisasse dos portões abertos pra entrar no Maracanã.
Todos riem.
Garçom: – Bom, se o assunto voltou a ser pênalti, músicas não faltam. Vou colocar mais uma aqui pra tocar: se antes foi o artilheiro, agora é “O medo do goleiro diante do pênalti”, de e com Marco Ferrari.
Fim do Capítulo 37
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