por Eduardo Lamas Neiva
Ao fim da homenagem de José Messias a Garrincha, houve rápida dispersão. Zé Ary, como ótimo mestre de cerimônias que vinha se revelando, fez a bola girar com um novo tema lançado para os nossos amigos.
Garçom: – O futebol tem cada expressão, né? Tem umas que acho muito curiosas e não sei de onde vieram. Zebra, por exemplo…
João Sem Medo: – Zé Ary, a expressão foi criada pelo técnico Gentil Cardoso na década de 60. Gentil, que é também o autor da frase “quem desloca recebe e quem pede tem preferência”, era técnico da Portuguesa da Ilha do Governador e antes de um jogo em 64 contra o Vasco disse que se seu time vencesse seria como dar a zebra no jogo do bicho.
Garçom: – Não tem zebra no jogo do bicho!
João Sem Medo: – Pois, então. A Portuguesa venceu por 2 a 1 e o termo ficou pra sempre.
Ceguinho Torcedor: – É, João, mas você criou várias também. Algumas eram do Neném Prancha e você levou pro rádio, não foi?
João Sem Medo: – Neném Prancha foi meu treinador na praia. Meu, do Heleno de Freitas, do Sandro Moreyra… Lembra disso, né? (fala em direção a Neném Prancha, que concorda com um gesto) Ele era, ou melhor, é um grande frasista. Diz as mais famosas, Neném!
Neném Prancha se levanta pra se dirigir a João e ao público.
Neném Prancha: – Obrigado, João. Bom, algumas das que criei foram “Jogador de futebol tem que ir na bola com a mesma disposição com que vai num prato de comida”; “Futebol é muito simples: quem tem a bola ataca; quem não tem defende”; “Se concentração ganhasse jogo, o time do presídio não perdia uma partida”; “Se macumba ganhasse jogo, o Campeonato Baiano terminava empatado”, “Futebol é uma caixinha de surpresa” e outras.
João, os amigos, o público, todo mundo aplaude no bar Além da Imaginação.
Garçom: – Esta última tem tudo a ver com a da zebra.
Sobrenatural de Almeida: – Caixinha de surpresa, zebra, isso tudo no futebol só existe por causa do papai aqui. Em 26, o São Cristóvão derrubou o favoritismo de Vasco, Flamengo e Fluminense e foi o campeão carioca.
Garçom: – Por falar em zebra, vamos então ouvir novamente o grande Zeca Baleiro, que é torcedor do Maranhão Atlético Clube, o famoso MAC, de São Luís? “Deu zebra” é o nome da música.
Terminada a música nas caixas de som do bar, Ceguinho retoma a pelota.
Ceguinho Torcedor: – O São Cristóvão foi campeão em 26 porque foi um clube à frente do seu tempo. Mario Filho, o Criador das Multidões, relatou isso no seu livro eterno: “O negro no futebol brasileiro”. Já naquela época o São Cri-Cri tinha um ônibus e seus atletas treinavam correndo nas areias da praia de Copacabana de chuteira e meiões. Os atletas do São Cristóvão chegando uniformizados à praia pareciam os aliados desembarcando na Normandia no Dia D!
João Sem Medo: – Um dia inesquecível, meus amigos! Tive a honra de desembarcar na Normandia ao lado do Marechal Montgomery.
Alguns na plateia não conseguem segurar o riso, mas João não percebeu ou fingiu que não ouviu. Sobrenatural de Almeida aproveitou a deixa no vácuo e retomou o assunto.
Sobrenatural de Almeida: – Olha, senhoras e senhores, além de uma forcinha minha, o segredo mesmo do São Cristóvão era o mingau da Negra Balbina e as gemadas com ovos da granja de Álvaro Novais. Coisa de outro mundo! Hahahaha
Ceguinho Torcedor: – Aquele era um time com saúde de vaca premiada!
Idiota da Objetividade: – O São Cristóvão foi campeão carioca de 1926 com uma campanha de catorze vitórias, dois empates e duas derrotas. O título veio após uma goleada de 5 a 1 sobre o Flamengo, que seria o quinto colocado, no antigo estádio da Rua Paissandu. A equipe que entrou em campo para a última partida formou com Paulino; Póvoa e Zé Luiz; Julinho, Henrique e Alberto; Osvaldo, Jaburu, Vicente, que foi o artilheiro do campeonato, com 25 gols, Baianinho e Teófilo. Participaram da campanha também Doca, Mendonça, Martins e Luis Vinhaes, que depois se tornou o técnico do time. Foram ao todo 70 gols marcados e 37 sofridos.
João Sem Medo: – É bom lembrarmos que, sete décadas depois, o São Cristóvão revelou o Ronaldo, que passou a ser chamado de Fenômeno na Itália.
Garçom: – Verdade, seu João! Vamos aproveitar então para fazer uma homenagem ao São Cristóvão?
Todos concordam.
Garçom: – Quase todo o time campeão de 26 está aqui. Peço que se levantem e sejam aplaudidos, por favor.
São muito aplaudidos, especialmente o artilheiro Vicente, quando apresentado.
Garçom: – Bom, vamos chamar ao palco um dos grandes cantores da história da nossa música para cantar a Marcha ou hino popular do São Cristóvão, composta por Lamartine Babo, que já se apresentou aqui e também merece aplausos. Com as senhoras e os senhores: Silvio Caldas.
Lamartine, primeiro, Silvio Caldas, depois, agradecem os aplausos.
Silvio Caldas: – Muito obrigado. Com muita honra gravei o hino deste clube tão tradicional do futebol brasileiro. Ainda mais porque eu nasci na Rua São Luiz Gonzaga, número 209, no bairro de São Cristóvão, o bairro imperial carioca.
Não sabia dessa origem da expressão “zebra” no futebol.
Legal!!
Muita gente não conhece, Ecio! E é uma história divertida, bem nossa, brasileira, carioca, principalmente. Obrigado pela presença e o comentário. Volte sempre. Abração.