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UM PONTA ARRETADO

19 / outubro / 2020

por Valdir Appel 


As manhãs ensolaradas de sábado atraíam dezenas de curiosos aos campos de areia, próximos dos arrecifes das praias de Olinda, para ver um menino franzino e habilidoso partir para cima dos laterais adversários levando, com toques curtos e velocidade, a bola grudada aos pés descalços (característica que levaria para os gramados), gingando e driblando, saindo ora pela direita ora pela esquerda, e desnorteando os marcadores.

Nado chutava bem com ambas as pernas, o que lhe permitia alçar precisos cruzamentos que deixavam o centroavante do seu time na cara do gol.

No Náutico, jogou durante alguns anos ao lado de craques como Salomão, Bita, Nino, Lala, Rinaldo, Lula e Ivan, e se eternizou na memória timbu, conquistando títulos em todas as categorias. 

Uma partida contra o Vasco da Gama no Maracanã, em 1965, despertou o interesse do clube carioca pelo seu futebol, que o contratou pagando uma soma milionária pelo seu passe, no inicio de 1966. 

Integrou-se à equipe vascaína que excursionava pela Europa, estreando em Nápoles, depois de servir à Seleção Brasileira, convocado para definir o grupo que disputaria a Copa do Mundo.

O mineiro Tostão, o gaúcho Alcindo e o pernambucano Nado eram chamados de “os estranhos” porque não jogavam no eixo Rio-São Paulo.

Os estranhos se destacaram nos treinos, e Nado foi injustamente cortado daquela seleção política e saudosista que fez um enorme fiasco na Inglaterra.

Na fala mansa, Nado revelava um humor afiado e inteligente. De hábitos simples, era tolerante e de uma aparente timidez que, às vezes, era confundida com uma passividade que não possuía.

Foi durante três anos meu melhor amigo. Concentrávamos juntos e tínhamos as mesmas amizades no clube: Acilino, Joel, Buglê, Celso, Alcir, Moacir, Valinhos, Beneti e os seus conterrâneos Pedro Paulo e Adilson. Este grupo acostumou-se a tratar um ao outro como conterra (abreviação de conterrâneo), que Adilson, independentemente das origens de cada um, chamava os amigos.

Nado teve dias difíceis até superar uma marcação serrada por parte da imprensa, que lhe dava notas baixas mesmo naqueles jogos em que atuava bem. Nós tínhamos consciência de que o problema a ser superado era a má fase vascaína. 


O Vasco tinha um elenco forte, que não ganhava um título a mais de 10 anos, desunido e cheio de vaidades injustificadas, onde muitos se apegavam a umbanda para tentar derrubar o colega de posição, enquanto a torcida sofria e se desesperava nas arquibancadas com a falta de conquistas.

Uma historinha interessante aconteceu em 1967, e ilustra bem os momentos difíceis do pernambucano em São Januário. Nado contundiu-se às vésperas do embarque do time para uma excursão. Fez tratamento no joelho e conseguiu uma recuperação mais rápida do que a prevista. Já estava com fome de bola e pediu ao doutor Nicolau que o liberasse para treinar entre os aspirantes, e assim recuperar a forma mais rapidamente.

Célio de Souza, treinador dos aspirantes, colocou Nado no coletivo contra os juniores. Como sempre, a arquibancada do Vasco atraía vários sócios torcedores e alguns portugueses conselheiros, que gostavam de cornetear.

Nado simplesmente fez grandes jogadas, driblou, passou, cruzou e fez um gol. Ao término da prática, o baixinho saiu sorridente com aquela cara de menino que Deus lhe deu.

Um bigodudo senhor português virou-se para outro que estava ao seu lado na tribuna, e comentou:

– Veja lá, ó Pá! O nosso Vasco não toma jeito, gasta lá uns 100 milhões com um tal de Nado, e nós temos este gajo aí nos juvenis, que é bem melhor!

– Senhor, este gajo aí é o tal de Nado!

O ano de 1967 terminou de forma sombria para Nado, Oldair, Fontana e Brito, todos jogadores de seleção, barrados pelo Ademir Menezes. Nado era o mais decepcionado porque o técnico era seu conterrâneo.

Felizmente para todos, o ano de 1968 trouxe Paulinho de Almeida para comandar o Vasco. Fora o fato de ter sido um dos maiores ídolos da história do clube, agora tinha a oportunidade de fazer carreira como técnico.

Paulinho soube (como poucos!) unir o grupo e fazê-lo vencedor. Conquistou naquele ano o título de vice-campeão carioca numa campanha excelente e fez um ótimo campeonato brasileiro, chegando em terceiro lugar.

E Nado foi peça fundamental neste ano de muitas vitórias. Mostrou todo o seu futebol sob o comando de Paulinho e foi convocado três vezes para amistosos da Seleção Brasileira e uma vez pela Seleção Carioca que enfrentou a Paulista, perdendo por 3 a 2 em jogo de gala do Rei Pelé. Este jogo homenageou a Rainha Elisabeth, em visita ao Brasil.

E foi em um jogo pela Seleção Brasileira, formada por um time integrado praticamente por jogadores botafoguenses, que Nado recebeu sua consagração no maior estádio do mundo. 

A partida foi contra a Argentina, o Brasil venceu por 4 a 1. Nado deu tantos dribles nos defensores argentinos, que o Maracanã lotado se rendeu ao que parecia um Mané Garrincha ressuscitado. Foi convocado também para jogos da seleção oficial contra Alemanha e Iugoslávia.

Em 1969 sucumbiu sob o poder de Evaristo e padeceu até ser liberado pelo presidente João Silva, que lhe deu o passe pelos bons serviços prestados ao clube. 

Transferiu-se para o Olaria, onde teve a oportunidade de pregar uma peça na Seleção Brasileira que se preparava para a Copa do México, fazendo o gol que deu a vitória ao Olaria por 1 a 0 sobre os canarinhos B em pleno Maracanã, enfileirando Everaldo e Joel e tocando por baixo de Leão.

Conquistaria novos títulos no Fortaleza e no Ceará nos anos 1970 e 1974. 

 

José Rinaldo Tasso Lassálvia (Nado), nasceu em 15 de novembro de 1938 em Olinda PE.

Faleceu dia: 03.05.2013 (†74)

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