por Paulo-Roberto Andel
Posso dizer que o último domingo foi um pouco diferente para mim.
Pensando em coisas de tempos atrás, muito tempo, e pesquisando na internet.
Hoje em dia a gente não tem mais os jornais em papel, mas pode navegar pelo Google, pela Hemeroteca da Biblioteca Nacional e achar as coisas mais interessantes em relação tudo que queremos, não é mesmo? Inclusive nossos times, nosso bom e velho futebol.
Num estalo me encontrei com o Fluminense de 30 anos atrás, o de 1991, aquele que tinha dificuldades de grana e conquistas. Passava alguns anos sem ganhar um título, mas reunia uma empolgação, uma beleza que é difícil de descrever, até mesmo de entender. Naquele momento, o Flu tinha acabado de contratar dois jogadores muito importantes: Bobô, que ficou pouco tempo no clube, mas deixou sua marca, e Ézio, um artilheiro que foi galgado à especialíssima condição de super-herói. Enfim, uma figura carismática e fundamental na história do Tricolor.
Abro o velho Jornal dos Sports, que já não é mais cor de rosa na tela do computador, e começo a me deparar com a alegria do Fluminense nas duas primeiras partidas no Campeonato Brasileiro, jogando nas Laranjeiras, fazendo a torcida sorrir e comemorar vitórias sobre Palmeiras e Goiás. Era uma promessa que não se confirmaria, mas que emanava confiança, vontade e prosperidade. O Flu tinha um time humilde, de pouco investimento financeiro e de jogadores em sua maioria desconhecidos, que não seriam campeões, mas queriam disputar títulos.
Aliás, durante todo o tempo em que Ézio passou pelo Fluminense, entre 1991 e 1995, o time disputou títulos. Não deixa de ser irônico que o maior de todos eles tenha sido em seus últimos momentos como jogador do clube, ao dar o primeiro toque no campo adversário, cujo desfecho seria o gol de barriga de Renato Gaúcho.
Ézio era mais do que um grande artilheiro e ídolo do Fluminense. Era um jogador marcado pela simpatia permanente, pela atenção que dedicava a todas as pessoas que lhe procuravam no clube. Não deixava ninguém sem comprimento. Sempre simpático, não deixava alterar o humor. Inclusive no próprio ano de 1995, ele passou por uma má fase, ficou no banco de reservas, mas aceitou sem reclamar. Era um gentleman.
Trinta anos depois, eu lembro de Ézio e da alegria que eu tinha nas Laranjeiras com meu time, mesmo sabendo que eram tempos difíceis tanto para o país quanto para nossa torcida e para mim mesmo. Era difícil, mas bom.
Neste domingo passei por sensações estranhas. Enquanto o Flu perdia o jogo no Campeonato Carioca para a Portuguesa, duas horas depois confirmava sua participação na fase de grupos da Libertadores 2021. Tudo isso sem torcida presente pelo momento em que vivemos, o que é inevitável.
Mas aí pensei tanto naqueles tempos de Laranjeiras, naqueles tempos de torcida unida, de promessa e esperança de quebrar uma situação desagradável que a gente já não conseguia há tempos. Era ilógico para o torcedor do Fluminense ficar anos sem títulos por ser uma situação muito rara, que só acontecera até ali em uma única vez, quando o clube ainda tinha o futebol amador, entre os anos 1920 e 1930.
Bobô era elegância, era sofisticação, um jogador de qualidade refinada misturada com a natural ginga baiana, depois homenageada grandiosamente por Caetano Veloso na canção “Reconvexo”. Deveria ter ficado mais tempo no Fluminense, uma pena.
Ézio logo se deu bem com ele. Era o artilheiro nato, oportunista, vibrante, rápido, que acreditava em todas as chances de gol e não deixava passar nada. Não foi à toa que se transformou num dos maiores artilheiros da história do Fluminense.
Lembro também do meu tempo de garoto. Eu era um jovem universitário Estudava na UERJ. E vivia muito feliz em ver as partidas no Maracanã, bem do lado da minha faculdade, ou em Laranjeiras, geralmente nos finais de semana acompanhando meu clube. Era sempre uma festa aquele lugar, é um barato para se assistir jogos e quem já passou por isso sabe o que eu quero dizer. Laranjeiras tem o gosto da casa dos tricolores.
Trinta anos depois, eu ainda amo bastante futebol, mas bate certa saudade inevitável. Passou rápido demais e tudo está muito vivo em minha memória. Deve ser coisa da elegância sutil de Bobô ou dos gestos precisos de Ézio, o mais humano dos super-heróis.
Nem falei de Válber e Torres, nem do Renato, que na verdade se chama Laércio. Fica para a próxima.
@pauloandel
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