por Marcos Vinicius Cabral
Uma chama aqueceu o coração de vários meninos de diferentes lugares do país e os ascendeu para a possibilidade.
Possibilidade esta que é um substantivo feminino que expressa a propriedade ou condição de alguma coisa que é possível ou que pode acontecer.
Segundo o filósofo grego Aristóteles (322 a.C), aluno de Platão e professor de Alexandre, o Grande, o conceito de dynamis (poder, força, energia constante), revela uma nova possibilidade que a matéria tem de se transformar em algo diferente do que é e ser a fonte de realização.
Portanto, a possibilidade é equivalente à racionalidade, e se refere ao que acontece nos processos de pensamento e corresponde ao não contraditório.
E foi crendo nisso que Arthur, Athila, Bernardo, Cauan, Christian, Francisco, Jhonatan, Jorge, Pablo, Samuel e Vitor, deixaram seus lares e foram em busca.
Em busca da possibilidade.
Possibilidade de ser um jogador de futebol, onde todos nós, quando jovens, indubitavelmente, vivemos isso.
Na vida, tudo é regido pela possibilidade e no campo esportivo, futebolisticamente falando, não seria exceção, mas sim regra.
Quem nunca treinou em clubes nas “peneiras” da vida?
Quem nunca deu dois nós nas chuteiras para não ter um passe comprometido com o cadarço desamarrado?
Quem nunca rivalizou com alguém para ser melhor e conquistar a posição de titular?
Quem nunca prometeu aos pais que se tornaria atleta profissional e daria uma vida melhor no futuro?
Quem nunca fez planos com a namorada de um serem três num horizonte rabiscado: ele, ela e o futebol?
Quem nunca chupou laranjas antes, durante e depois dos treinos para ganhar vitamina C e resistir à maneira bruta como são submetidos à cobaias de craques da bola?
Quem nunca se viu entrando em um Maracanã e ter seu nome gritado pela torcida ou xingado pela adversária?
Quem nunca se imaginou tendo um regozijo indescritível ao marcar um gol?
Quem nunca?
E foi essa possibilidade que os motivou a irem além.
Possibilidade que fizeram chegar aos montes e percorrer o mesmo trajeto, como formigas ensaístas que deixam por onde passam o feromônio – química que permite que se reconheçam e se interajam.
Vindo dos quatro cantos do Brasil afora, tais jovens haviam vivido catorze, quinze, dezesseis, dezessete primaveras, talvez inverno, outono e verão também.
Sonhavam com a possibilidade de serem jogadores de futebol, driblando a pobreza, a saudade do família, o convívio dos amigos, das namoradas e de uma infância que foi interrompida e trocada por treinos exaustivos.
Havia entre eles e a bola uma química tão harmônica que nem o cientista inglês Robert Boyle, considerado o pai dessa ciência no século XVII e o francês Antoine Lavoisier, maior estudioso no século seguinte, saberiam mensurar a razão do porquê.
Se deitaram no dia sete e não levantaram no dia oito.
Dormiam no alojamento do Centro de Treinamento George Helal, conhecido como Ninho do Urubu, zona oeste da cidade do Rio de Janeiro e tiveram – todos eles – seus corpos consumidos pelas chamas de um incêndio ainda não explicado.
A bola que nos dá tantas alegrias, hoje, nos faz chorar tamanha tristeza pelas perdas.
Talvez surgissem dessa garotada outros “Leandros”, “Mozeres”, “Juniores”, “Adílios”, “Andrades”, “Titas”, “Rondinellis”, “Zicos”, “Uri Gelleris”, “Bebetos”, “Zinhos”, “Adrianos” e “Petckovics”… nunca saberemos e nem o tempo nos dirá.
Enquanto há dois anos o futebol brasileiro se solidarizava com o “Somos Chape”, no acidente aéreo que vitimou 71 pessoas, entre jornalistas, jogadores e dirigentes, naquele 29 de novembro, hoje, todos são FLAMENGO!
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