por Valdir Appel
Por mais de 40 anos, o Vasco teve um mordomo que fez da rouparia o seu santuário.
O presidente João Silva pedia licença e apenas Fontana, Brito e Danilo Menezes eram (eventualmente!) autorizados a entrar naquele recinto.
Da janelinha daquele escaninho, seu Chico mostrava apenas seu magro rosto, sempre com um cigarro no canto da boca, rosnando em resposta um bom dia mal humorado e ranzinza, àqueles que timidamente o cumprimentavam.
Detestava futebol! Jamais foi visto na saída do túnel dando uma espiadinha no andamento de uma partida. Tomava conhecimento dos resultados apenas para saber se receberia bicho ou não.
Nos vestiários, os jogadores não tinham o que reclamar dos serviços do seu Chico. As cestinhas de material eram entregues por ele de forma impecável. Não cometia erros, não dava oportunidades a reclamações.
O que alegrava os atletas era a chegada de um jogador para testes. Sulista, então, era um prato cheio! Um de nós checava o material do recém-chegado e sugeria que ele fosse pedir atadura para proteger os pés.
– Seu Chico, o senhor poderia me ver uma faixa?
Chico ia até o armário da rouparia e trazia a faixa de campeão de 1958 e a entregava para o jogador:
– Pronto, aqui está a sua faixa.
– Seu Chico, é faixa para os pés!
– Ah, então o senhor quer uma atadura?
– Isso, isso, seu Chico!
Chico então lhe dava uma atadura. O cara dizia que eram duas. Chico replicava:
– Então, o senhor quer um par de ataduras!
Torcedores visitantes também nos deixavam felizes:
– Seu Chico, é uma honra conhecer o roupeiro mais famoso do Brasil! Venho de Itajubá, Minas Gerais, lá só tem vascaíno. Eu, por exemplo, sou doente pelo Vasco!
Chico esticava a mão para fora da rouparia e apontava o dedo:
– Entre na primeira porta a esquerda e procure o doutor Marcozzi. Doente, é com ele.
Chico não gostava do nosso treinador, Célio de Souza, e fazia questão de que todos soubessem. O goleiro reserva, Celso, atendendo a um pedido do Célio, foi ao vestiário pedir que seu Chico enviasse todos as bolas disponíveis para fazer um treinamento diferenciado.
– Pra quê todas as bolas?
– Sei lá, seu Chico!
– Pra quê todas as bolas, se uma já atrapalha vocês?
Novamente o Celso, sempre ele…
– Seu Chico, o seu Célio mandou pedir mais um jogo de camisas.
– Quem é o seu Célio?
– Ora, o seu Célio de Souza, treinador do Vasco!
– Não conheço nenhum Célio de Souza treinador. Volta lá e pede pra ele mandar o diploma!
Por conta do Ademir Menezes, passamos alguns constrangimentos…
Ademir costumava ir ao vestiário, quando o jogo era no Maracanã, para nos visitar. Nestas raras ocasiões, seu Chico saía do seu cubículo, se aproximava do grande Queixada, ajoelhava-se aos seus pés e os beijava, dizendo:
– Este sim, me deu muito bicho! Não estes merdas que estão aí, agora!
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