por André Felipe de Lima
Escalar um Corinthians dos sonhos não é mole não, meus amigos. Há ídolos aos montes, em todas as posições. Mas ousamos escalar, com base nas pesquisas jornalísticas para a produção da enciclopédia Ídolos – Dicionário dos craques, o “onze” ideal da história do Timão. Esse time, embora hipotético, é indiscutivelmente épico e o segundo da série “Time dos sonhos”. Vamos lá, portanto, começando pelo melhor goleiro. Há alguma dúvida de que Gilmar dos Santos Neves (1951 a 1961) é o dono da posição? Titular em duas Copas do Mundo conquistadas pelo Brasil, a de 1958 e a de 62, creio não haver resistências ao seu nome. Gilmar disputou 395 jogos com a camisa alvinegra e conquistou quatro títulos: três Campeonatos Paulistas (1951, 52 e 54) e um Rio -São Paulo (1954). Há, porém, um séquito a segui-lo. Em uma ordem cronológica, o Corinthians vislumbrou em suas escalações arqueiros memoráveis. O primeiro deles foi Tuffy (1928 a 1931). Simplesmente brilhante. Rivalizava no coração dos torcedores com o centroavante Neco, outro ídolo corintiano na década de 1920. O jeito desleixado, com a barba e a costeleta sempre a fazer, e o indefectível uniforme negro chamavam a atenção da imprensa e da torcida. O sinistro apelido “Satanás” nasceu aí.
A popularidade estimulou a presença de Tuffy em propagandas dos jornais e, até mesmo, em um filme, o primeiro sobre futebol na história do cinema nacional. O Campeão de Foot-Ball, de 1931, película ficcional dirigida pelo humorista Genésio Arruda, também contava no elenco com outros craques/ atores da época, dentre eles, Friedenreich, Formiga e Ministrinho. O cinema comoveu tanto Tuffy, que, após encerrar a carreira no Timão em 1931, acabou comprando o Penha Teatro para rodar seus filmes prediletos. Outros grandes nomes no arco corintiano foram: Cabeção (1950 a 1954), saudável “rival” de Gilmar; Ado (1969 a 1974), “tri” mundial em 70; Tobias (1975 a 1980), herói do fim do longo “jejum”, encerrado em 77; Carlos (1984 a 1988), titular do Brasil na Copa de 86; Ronaldo (1988 a 1998), o goleiro que mais vezes (602) vestiu a cami sa do Timão, e Dida (1999 a 2002), que fechou o gol do na primeira conquista mundial do alvinegro, em 2000.
Para compor a zaga, há, na lateral-direita, outro nome que é, a meu ver, intocável: Zé Maria (1970 a 1983), o “Super Zé”. Esteve, ainda bem jovem, na Copa de 70, na reserva de Carlos Alberto Torres, o “Capita”, e foi campeão paulista com o Corinthians em 1977, 1979, 1982 e 1983. Filho de um fanático torcedor do Timão, Zé, que jogava pela Lusa antes de ir para o Timão, prometeu ao pai que um dia defenderia o clube da saudosa fazendinha e que o ajudaria a acabar com a escassez de títulos, que perdurava desde 1954. Zé Maria cumpriu o prometido. Defendeu o clube do coração do pai e foi capitão do time campeão de 77. Aliás, o gol redentor de Basílio começou com uma cobrança de falta do Super Zé. Após o apito final, o maior lateral-direito de todos os tempos, pelo menos para a fanática e fiel torcida corintiana, levantou a taça de campeão que o Timão não erguia havia 23 anos.
O Corinthians teve outras feras na lateral-direita. O primeiro foi Jango (1933 a 1943), o da famosa e decantada linha média “Jango, Brandão e Dino”, dos anos de 1940, em seguida, Idário (1949 a 1959), que jamais deixou de atender ao pedido dos torcedores, que, em uníssono, gritava “pega ele, Idário!”. O lateral não se intimidava e “pegava” o que via pela frente, ou bola, ou adversário, coitado, que ficava pelo caminho. Após o fulgor de Zé Maria, o Timão encontrou em Alessandro (2008 a 2013) outro grande lateral-direito. No período em que esteve no Timão, tornou-se capitão e a alma do time campeão de tudo: nacional, paulista, da Copa do Brasil, da Libertadores, Mundial…
A zaga central também tem dono: Domingos da Guia (1944 a 1948). Mesmo defendendo o Corinthians em fim de carreira, o “Divino”, pai do também “Divino” Ademir da Guia, maior ídolo do arquirrival Palmeiras, é figura certa na maioria das escalações de “Times dos sonhos” do Timão que pesquisei. Na revista Placar, de 1982, ele está lá. Em vários “times de todos os tempos” escalados pelos jornais e revistas nas edições especiais sobreo centenário do clube, em 2010, Domingos também está nelas. Ou seja, quase uma unanimidade. Mas antes de o Timão ter Domingos, brilhou na mesma posição o gigante Grané (1924 a 1932), um camarada que tinha um chute tão devastador, que, muitos contam, levou a nocaute vários goleiros. Os petardos que desferia contra as balizas adversárias renderam o apelido de “420”, o mesmo número do canhão alemão com o maior calibre da época. Mostrava-se versátil por também atuar pela lateral-direita. Nenhum outro jogador de zaga fez tantos gols pelo Timão como ele. Foram 50 em 179 jogos e, de quebra, quatro Campeonatos Paulistas (1924, 1928, 1929 e 1930). No miolo da zaga corintiana também brilharam Olavo (1952 a 1961), Goiano (1952 a 1959), um verdadeiro de “Deus da raça” para a Fiel, o “xerife” Moisés (1976 a 1978) e Chicão (2008 a 2013), símbolo da garra corintiana no novo milênio.
Para formar a dupla de zaga com Domingos da Guia, escolhemos o quarto-zagueiro paraguaio Gamarra (1998 a 1999). No curto período em que esteve no Corinthians foi campeão nacional de 98 e o melhor zagueiro do mundo, sobretudo após a fantástica participação na Copa do Mundo de 98, na França. Mas a quarta-zaga do Timão jamais ficou sem um “leão” para amedrontar os atacantes mais abusados. Del Debbio (1922 a 1931 e 1937 a 1939) foi, talvez, o primeiro destas feras na zaga alvinegra. Foi jogador e treinador ao mesmo tempo. Fato louvável. Depois dele, pintou por ali, na posição, o pai de santo Jaú (1932 a 1938), um dos convocados para a Copa do Mundo de 38, para a reserva de Domingos da Guia. Deixou, magoado, o Timão após um rumoroso caso de suborno, que jamais foi provado. Outro grande nome na zaga foi Homero (1951 a 1958), mais famoso pela truculência que propriamente pela técnica, que jamais esboçou nos gramados. Mas era firme e gozava de prestígio com a torcida. Depois dele, surgiu o carismático Ditão (1966 a 1967 e 1969 a 1971) e, uma década após Ditão sair do Corinthians, o clube trouxe o uruguaio Daniel Gonzalez (1982 a 1983), morto prematuramente em fevereiro de 1985, em um acidente de carro, no Rio de Janeiro.
A legião de ídolos do Timão é inesgotável. E ainda estamos completando a zaga, com a que é, sem pestanejarmos, o maior lateral-esquerdo de toda a história do clube. Falamos de Wladimir (1972 a 1985 e 1987). Nenhum outro jogador vestiu mais vezes a camisa alvinegra que ele. Foram 805 jogos e 32 gols assinalados, como afirma aquele que mais entende da história do Timão, o jornalista Celso Unzelte. Antes de Wladimir despontar, o Corinthians contou com outros dois grandes laterais na canhota: Dino (1940 a 1944 e 1947 a 1948), Goiano (que também atuava como zagueiro, e Oreco (1957 a 1965).
Vamos, agora, para a meia cancha memorável que escalamos para o Timão dos sonhos. Começamos com o centromédio Roberto Belangero (1947 a 1960). Um jogador clássico, brilhante, que teve grande chance de ir à Copa do Mundo de 1958 não fosse uma contusão, no ano anterior, a impedi-lo. Com Idário e Goiano, médios direito e esquerdo, respectivamente, formou uma célebre linha media na década de 1950. Na posição, outros craques se destacaram. Decididamente não foi fácil escolher o melhor volante da história do Corinthians. Afinal, pode se considerar “pecado” deixar fora do time um ídolo como Amílcar Barbuy (1913 a 1923) — líder da seleção brasileira campeão sul-americana em 1919 —, ou mesmo um cracaço como Brandão (1935 a 1946) — ícone do time no final do s anos der 30 e ao longo da década seguinte —, Dino Sani (1965 a 1968) — um dos maiores volantes da história e campeão do mundo em 1958 —, Ruço (1975 a 1978) — o cão de guarda da defesa no título paulista de 1977 —, Biro-Biro (1978 a 1988) — um dos mais carismáticos ídolos que já pisaram o Parque São Jorge —, Zé Elias (1993 a 1996) — símbolo da raça corintiana em seu tempo —, Vampeta (1998 a 2000 e 2002 a 2003) — simplesmente campeão do mundo em 2002 — e Rincón (1997 a 2000) — um colombiano mágico e líder do Timão campeão mundial, em 2000.
A “oito” é indiscutivelmente do Sócrates (1978 a 1984). Nenhum outro jogador atuou com tanta maestria como meia-armador do Corinthians. Nem antes e nem após a era do “Doutor”, que foi um dos mais emblemáticos craques brasileiros de sua época e titular absoluto daquela que foi, sem dúvida, uma das melhores formações de todos os tempos, a seleção brasileira da Copa de 1982, montada pelo mestre Telê Santana. Além dele, na posição, destacou-se Ricardinho (1998 a 2002), marcante e insinuante meia responsável por passes perfeitos que, invariavelmente, deixavam na cara do gol os atacantes Edílson e Luizão.
A camisa “10” é do Rivellino (1965 a 1974), e não se discute. Ousei “barrar” Marcelinho Carioca (1994 a 1997, 1998 a 2001, 2006 e 2010), o jogador que mais vezes levantou taças pelo Timão e, certamente, é o símbolo da melhor fase da história do clube, no final dos anos de 1990 e começo do novo milênio, um período em que o Corinthians conquistou campeonatos brasileiros, Copas do Brasil, campeonatos paulistas e, sobretudo, o primeiro mundial de clubes da Fifa. Mas Riva não tem adversários na posição. Mesmo sem ser campeão com o Timão e com a traumática saída do clube, o craque foi marcante na história do Corinthians e, acima de tudo, um dos gênios da seleção tricampeã da Copa do Mundo, em 1970. Para muitos, Rivellino é o maior jogador do Timão em todos os tempos. Estou entre estes que defendem a tese favorável ao Riva. Equivoca-se, contudo, aquele que resume a lista dos geniais pontas-de-lança corintianos aos dois craques. Ela extensa e conta com nomes fenomenais, destacando-se Servílio (1938 a 1949), Rafael Chiarella (1953 a 1963), Basílio (1975 a 1981), Palhinha (1977 a 1980), Zenon (1981 a 1985) e Neto (1989 a 1993 e 1996 a 1997).
Do meio de campo para o ataque, no melhor estilo “1-4-3-3”. Na ponta-direita “escalei” Luisinho (1948 a 1960 e 1964 a 1967), o “Pequeno polegar”. Jamais poderia deixá-lo fora do time. Se há uma legião de fãs que acha Rivellino o maior dentre os maiores do Timão, há também o coro favorável ao Luisinho. Tanto quanto Riva, Luisinho foi um exímio driblador. Sua passagem pelo clube foi marcada por uma idolatria incomum. Suas jogadas fizeram de Cláudio (1945 a 1957) o maior artilheiro da história do Timão e de Baltazar e Carbone goleadores implacáveis. Todos eles craques de um ataque que foi, talvez, o melhor que o alvinegro já teve e que foi protagonista de conquistas inesquecíveis, como o Torneio Rio-São Paulo, em 1950, 1953 e 1954, o campeonato paulista, em 1951, 1952 e 1954, este último o do 4º Centenário. Mas, além de Cláudio, houve grandes pontas destros de ofício no clube, como Filó Guarisi (1929 a 1931 e 1937), que se destacou na seleção italiana campeão do mundo em 1934, Paulo Borges (1968 a 1974), autor do gol que marcou o fim do tabu contra o Santos, de Pelé, e Vaguinho (1971 a 1981), o do título paulista de 77.
No comando do ataque, o centroavante Baltazar (1945 a 1957), o “Cabecinha de ouro”, é o nome certo, a meu ver. Foi um goleador que deveria ser parceiro de ataque de Ademir de Menezes na seleção brasileira da Copa de 1950. Pelo menos é o que defendiam a crônica paulista e, claro, a fiel corintiana. A popularidade de Baltazar era tão grande que o jogador ganhou um carro após ser escolhido o craque mais querido de São Paulo. O automóvel pegou fogo, mas a apaixonada torcida fez uma “vaquinha” gorda e comprou outro carro para o ídolo. Essa história (ou mito, talvez), os mais antigos devem recordar: o político Hugo Borghi disputava a eleição para o governo paulista. Durante o comício, teria dito à plateia que o Palácio dos Campos Elísios, então sede do poder executivo estadual, precisava de alguém com “cabeça”. O povo, em uníssono, emendou o coro como resposta: “É o Baltazar!”.
O “Cabecinha de ouro” teve grande adversários no posto de “maior centroavante” do Timão. Figuram na lista Teleco (1934 a 1944), Carbone (1951 a 1957), Flávio Minuano (1964 a 1969), Geraldão (1975 a 1981), Casagrande (1980 a 1981, 1982 a 1983, 1985 a 1986 e 1994), Viola (1986 a 1989 e 1992 a 1995), Edílson (1997 a 2000), Tévez (2005 a 2006), Emerson Sheik (2011 a 2015) e Ronaldo (2009 a 2011). Só “cabras cascudos”… e artilheiros, claro!
Na ponta-esquerda, temos Neco (1913 a 1930). Foi o grande atacante do Brasil no primeiro título que conquistamos, o Sul-Americano de 1919, no estádio das Laranjeiras. No Timão, jogava na ponta canhota, como centroavante ou mesmo no meio de campo. Era extremamente versátil. Teve fama de indisciplinado e, às vezes, irascível, mas isso jamais impediu a festa que a torcida fazia para ele. É tão relevante na história do clube que mereceu um busto na sede alvinegra. Outros brilharam na canhota, como De Maria (1927 a 1932 e 1935), companheiro de Neco no ataque, Simão (1953 a 1955) e Romeu (1976 a 1980).
Eis o Corinthians dos sonhos, que ousei desenhá-lo para o quadro eterno do Timão.
Na próxima edição da série “Time dos sonhos”, o maior Botafogo da história. Aguarde, comente e escale o seu “Fogão” ideal.
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